A coleção de crustáceos do Dr. Adolpho Lutz*

Bertha Lutz

Os dois primeiros trabalhos zoológicos de Adolpho Lutz versaram sobre crustáceos. Redigidos aos 22 anos de idade, já demonstram perfeita segurança no abordar do assunto, preocupação com a bibliografia anterior e interesse pela distribuição geográfica. Revelam, sobretudo, um ponto de vista nitidamente evolucionista e darwiniano. O primeiro desses trabalhos versa sobre a fauna cladócera de Berna e foi laureado com o prêmio oferecido pela Sociedade de Ciências Naturais. O segundo, feito durante os meses em que Lutz cursou a Universidade de Leipzig, foi apresentado pelo professor Leuckart.

A primeira espécie animal descrita por Lutz acha-se no fim do primeiro trabalho, tratando-se de Alona verrucosa. Ali figuram também variedades suas, a saber: Scapholeberis mucronata v. brevicornis e v. longicornis. O trabalho sobre a fauna cladócera de Leipzig dá uma diagnose diferencial do macho de Alona acanthocercoides Fischer e indica mais uma sub-espécie de Daphia hyalina i.e. var. mülleri.

Só meio século mais tarde, Lutz voltou a publicar sobre crustáceos, motivado por dois filódopes interessantes encontrados em poças, ao correr de uma viagem feita para estudos de lepra, no Rio Grande do Norte. Não obstante, continuará a acompanhar o assunto, tanto assim que os seus relatórios de viagem mencionam as espécies vistas.

Quando Lutz estudava os Culicoides ou “maruins” que, à noite, atravessavam as malhas dos mosquiteiros nos quartos do último andar de Manguinhos, interessou-se também pelos caranguejos do mangue, verificando que os buracos dos guaiamus serviam de biótopo às larvas e pupas de Culicoides reticulatus Lutz. Passou a coletar os crustáceos que ocorriam no manguezal fronteiriço ao Instituto, mais ou menos na altura da atual Avenida Brasil.

Lutz expôs as diversas formas obtidas num dos mostruários de zoologia do Museu do Instituto Oswaldo Cruz, do qual foram retirados, mais tarde, por outrem. Ao iniciarmos a arrumação e organização das Coleções Adolpho Lutz, os espécimes foram encontrados e enviados à Ilha do Pinheiro, onde está localizado o laboratório de hidrobiologia do Instituto.

Os caranguejos coletados pelo próprio Dr. Lutz achavam-se acrescidos de alguns moluscos marinhos e vários peixes curiosos que lhe eram trazidos pelos pescadores de Inhaúma, de quem Lutz era médico gratuito e paternal.

No arquivo de Lutz foi encontrada uma lista de crustáceos de Manguinhos que coletara. Consultado o Dr. Lejeune de Oliveira sobre a lista, opinou que deveria ser incluída entre os “Trabalhos avulsos de zoologia dos invertebrados” de um dos volumes comemorativos da Obra de Lutz. Os nomes foram atualizados pelo Dr. Lejeune de Oliveira, cujos comentários mostram como foi subseqüentemente empobrecida a fauna local de crustáceos, não só pelo desenvolvimento urbano mas principalmente pelos diversos graus de poluição. Vão acompanhadas de fotografias de alguns dos espécimes de Lutz.

Reproduzimos a seguir as notas inéditas e os trabalhos sobre crustáceos, publicados em revistas pouco acessíveis aos estudiosos, mormente no Brasil.