Uma nova espécie de Cyclorhamphus *
C. distinctus é uma das espécies menores, com o dorso coberto de grânulos e a membrana interdigital dos pés muito reduzida, procedendo de lugar bastante elevado. Lembra o asper Werner, mas distingue-se facilmente pela formação do pé, a pigmentação do lado ventral e outros caracteres; do granulosus de Lutz difere pela forma do pé e da mão. Aproxima-se bastante do Borborocoetes stejnegeri, encontrado na mesma serra, embora em nível muito mais elevado, porém não se confunde com ele.
Trata-se indubitavelmente de um Cyclorhamphus, porque em ambos os sexos existe o menisco e nos machos há também um disco inguinal. Aparece, todavia, um novo caráter na presença dos assim chamados espinhos nupciais, observados nas mãos de ambos os sexos, 2 na fêmea e 7 ou 8 no macho.
Todo o lado dorsal, incluindo as extremidades, é coberto de grânulos glandulares que podem formar pequenas cadeias, sinuosas, porém correndo principalmente em sentido longitudinal. Nas coxas e nos pés os grânulos invadem também o lado ventral. Este tem a pele gelatinosa e translúcida, pigmentada de preto e semeada de pontos brancos no tórax e na parte superior do abdome. Mais para baixo os ovos bastante grandes e de cor creme, vistos por transparência, formam nas fêmeas adultas uma área da mesma cor. O lado dorsal é de cor terracota ligeiramente alaranjada, com barras claras correndo dos olhos à margem superior dos lábios; há outra barra clara transversal mais grossa entre os olhos, e manchas claras e escuras sobre as mãos e os pés. Também nos machos, que têm a gula muito escura, há uma zona clara na parte terminal do ventre. Os grânulos são gelatinosos durante a vida, esbranquiçados nos exemplares conservados e sempre sem pontas córneas. O lado inferior das extremidades mostra em vida a cor de terracota clara que, depois da morte, transforma-se em branco-amarelado sujo. Os pontos brancos estendem-se também sobre o resto da barriga e o lado ventral das coxas.
A cabeça, bastante mais larga do que longa, tem um contorno ogival arredondado. É deprimida e, como o resto do corpo, adaptada para entrar em fendas de pedras. A posição característica dos olhos é indicada no desenho. Dentes vomerinos em duas séries lineares pouco separadas, bastante por trás das cóanas. Língua assaz larga, e chanfrada posteriormente. Três fêmeas apresentam na margem interior da mão, na altura do metacarpo, dois espinhos curtos e grossos, cor de azeviche. Nas mãos dos dois machos contam-se três vezes 7 e uma vez 8 espinhos semelhantes.
Os tubérculos carpais e tarsais são bem desenvolvidos e de cor mais clara.
O resto da face volar das mãos, assim como o lado inferior dos pés e a metade externa dos tarsos são enegrecidos. Na base dos dois últimos dedos há um rudimento de membrana interdigital de cor escura.
Todos os nossos exemplares procedem do mesmo lugar, onde foram colhidos em duas ocasiões, sendo a primeira em 26 de junho de 1930 e a outra em 1° de julho de 1931. Conviveram algum tempo no laboratório, mas não se conseguiram posturas, por ser a estação do ano imprópria. Em ocasiões posteriores a persistência da espécie no mesmo lugar foi verificada, mas não se conseguiu apanhar mais exemplares.
Todos os exemplares foram achados perto de Petrópolis, a cerca de 800 m de altitude, debaixo ou entre pedras que se encontravam dentro ou ao lado de um pequeno córrego que mais acima deslizava de um rochedo.
Tenho uma boa aquarela tirada de fêmea viva com ovos já bastante desenvolvidos. Infelizmente não se presta para reprodução em fotogravura, mas serviu para tirar o desenho a bico de pena que apresento. Depois de algum tempo de conservação a coloração geral e a pigmentação da face inferior tornaram-se menos distintas em todos os exemplares. Em alguns exemplares os grânulos concatenados formam um desenho mais claro.
Nota posterior. Outro macho, apanhado no mesmo lugar em 16 de outubro de 1931, mostrava de um lado 8 e do outro 9 espinhos nupciais. Conservou-se vivo no Rio de Janeiro durante dois meses.
Fig. 1 – Fêmea de Cyclorhamphus distinctus, vista de cima.
Fig. 2 – A mesma em aspecto ventral. A pigmentação preta do peito e da barriga, indicada no texto, foi omitida, e os pontos brancos são indicados por pontos pretos. O contorno dos ovos aparece por transparência.
Fig. 3 – Mão esquerda e antebraço do macho, vistos de cima.
Fig. 4 – O mesmo da fêmea.
A figura que acompanha o texto mostra a boca da fêmea aberta.
Todas as figuras representam o tamanho natural.