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14

Achados e perdidos

Naquele domingo, pouco depois do almoço, Paxton encontrou Willa no estacionamento da casa de repouso e elas caminharam juntas até o quarto de Nana Osgood. Willa estava pensativa, porém alegre, quase como se estivesse cautelosamente otimista com relação a alguma coisa. Paxton ficou imaginando se isso teria a ver com o fato de seu irmão não ter dormido em casa na noite anterior. Ela realmente queria perguntar a Willa, mas imaginou que isso era o tipo de coisa que só se compartilha com amigas.

— Como você está com relação a tudo que Nana Osgood nos contou na sexta-feira? — perguntou Paxton. — Eu não pude perguntar ontem, com Sebastian e Colin junto de nós.

— Estou bem. E você? — Willa olhou para Paxton, com uma ruga de preocupação se formando entre as sobrancelhas.

— Também estou bem — ela mentiu. — Ligeiramente preocupada com o que ela nos dirá hoje.

— Bem, não pode piorar, portanto isso significa que só pode melhorar, certo?

— Certo — disse Paxton, receosa, mas realmente querendo acreditar naquilo. Algo tinha de acontecer.

Paxton tinha trazido uma caixa de trufas de chocolate para dar a Nana Osgood, embora sua mãe tivesse dito para não fazer isso. Mas Paxton estava cansada de tentar mediar a relação de Nana Osgood e a nora, que brigavam como cão e gato. Isso era uma briga delas, não sua. E ela já tinha o suficiente com que se preocupar.

Depois que Paxton deu a caixa de chocolates a Nana Osgood, se sentou ao lado dela no sofá de dois lugares. Fez isso cuidadosamente, para não desalojar a avó, que provavelmente tinha o peso de uma folha de papel. Willa sentou-se na poltrona de frente para elas.

Agatha afagava a caixa de chocolates em seu colo. A primeira coisa que ela disse foi:

— Se a polícia for atrás de Georgie, quero que vocês digam o que eu lhes contei.

— Acho que não irão atrás dela — disse Willa. — Não tive nenhuma notícia de Woody Olsen. Você teve? — Willa perguntou a Paxton.

— Não.

— Não me interessa o que vocês acham — disse Agatha. — Se isso acontecer, prometam que contarão a eles!

— Tudo bem, Nana. Nós prometemos.

— Então, está bem. — Ela afagou a caixa de chocolates um pouco mais.

— O baile de gala é na sexta-feira — disse Paxton. — Eu ainda quero que você vá.

Agatha estalou a boca.

— Garotas tolas.

— Willa e eu notamos que a data da fundação do Clube Social Feminino coincide com a época em que Tucker Devlin desapareceu, há setenta e cinco anos. Isso é só uma coincidência?

— Não, não é coincidência. Não existe tal coisa. Na noite em que o enterramos, eu disse a Georgie que sempre estaria ao lado dela. Ela estava com medo. Estava grávida. E eu iria ajudá-la, independentemente de qualquer coisa. No dia seguinte, eu chamei nossas quatro melhores amigas e disse a elas que Georgie precisava de nós. Não dei detalhes, mas a cidade parecia saber que Tucker Devlin se fora. Tudo parecia diferente, como se estivéssemos despertando. Nós seis formamos o Clube Social Feminino exclusivamente para ajudar Georgie. Prometemos que jamais daríamos as costas umas às outras. Mesmo que isso nos amedrontasse, mesmo que fosse perigoso, nós prometemos nos manter juntas e fazer as coisas certas, porque ninguém mais faria. A família de Georgie não fez nada para ajudá-la. E a cidade toda viu como Tucker nos tratava, nos jogando umas contra as outras, e não fez nada para salvar o coração de suas filhas. Decidimos nos tornar uma sociedade de mulheres, um clube para assegurar que as mulheres fossem protegidas. O clube era algo importante naquela época. Não era como hoje.

— O que aconteceu para que as coisas mudassem tanto? — perguntou Paxton. Ultimamente, ela vinha tendo sensações mistas sobre o clube, e descobrir isso só a deixou mais confusa quanto ao seu papel na instituição.

— A vida aconteceu — disse Agatha. — Georgie deixou o clube aproximadamente dez anos depois, quando o restante de nós começou a ter seus filhos. Nessa época começamos a usar o clube como meio de comparações. Quem tinha a melhor cozinheira. Quem tinha o marido que ganhava mais. A vida de Georgie era muito diferente, e eu acho que ela já não se sentia parte daquilo. Mas eu mantive a minha promessa. Sempre estive presente quando ela precisou de mim. Ela só parou de pedir. Mas eu era bem próxima de Ham, e ele vinha a mim quando Georgie não vinha.

— A vovó Georgie era muito severa com meu pai — disse Willa. Paxton se virou para ela. Ela não entendeu o comentário, mas Willa obviamente pretendia chegar a algum lugar.

— Ela apenas morria de medo de que ele se tornasse alguém como Tucker. Ela morria de medo de tudo. Tinha medo de que exatamente isso acontecesse, que o corpo de Tucker fosse encontrado. — Agatha sacudiu a cabeça. — Tinha todas aquelas superstições porque queria que seu fantasma continuasse sepultado. Aquilo virou obsessão.

— Meu pai sabia que Tucker era o pai dele?

— Ela acabou dizendo que ele era um caixeiro-viajante e nunca mais o viu. Acho que ele deduziu o restante. O que Ham com certeza sabia era que sua mãe queria que ele vivesse uma vida modesta. E ele fez isso por ela. Foi uma pena que ele tenha morrido quando finalmente estava tomando seu próprio rumo.

Willa se inclinou para a frente:

— O que quer dizer?

— Ele ia vender a casa e viajar.

— Ele nunca me disse isso!

— Acho que ele não lhe disse muitas coisas.

Willa surpreendeu Paxton ao perguntar:

— Ele pediu demissão de seu emprego na escola por minha causa?

— Sim. Ele ficou muito impressionado com você. Embora eu não possa imaginar o motivo. — Agatha fez uma careta. — Todos aqueles trotes. E quando ele descobriu que você tinha saído da faculdade, simplesmente achou que você estivesse se encontrando.

— Ele soube que eu saí? — Não parecia possível, mas as sobrancelhas de Willa subiram ainda mais.

— Claro que ele soube.

— Como você sabe? — perguntou Paxton, impressionada por sua avó ter guardado não apenas seus próprios segredos como também os do pai de Willa. O que mais haveria dentro daquela cabeça-dura? Todos esses anos Paxton pensara que a avó não era nada além de uma velha cruel. Mas ela era complexa e profunda como ninguém imaginava.

— Ham e eu tivemos uma conversa muito longa quando chegou a hora de ele transferir a mãe para a casa de repouso. Ele ia viajar. Eu prometi cuidar de Georgie. — Ela endireitou os ombros. — Não que eu tenha deixado de fazê-lo.

Willa recostou-se em sua poltrona, parecendo repensar as coisas. Paxton aproveitou a oportunidade para perguntar:

— Por que você nunca me disse que o clube tinha se desviado de seu caminho? Talvez eu pudesse ter feito alguma coisa.

— Paxton, eu acredito que você tentou fazer o clube ter mais relação com as obras do que com o aspecto social e lhe dou crédito por isso, mas também acredito que seja mais porque você não tem amigos do que por um chamado superior. — Paxton recuou atônita, diante daquela afirmação. — Foi a amizade que deu início ao clube e, se algum dia quiser vê-lo como era, você precisa entender o que significa ser uma amiga. Eu sei que você sempre me olhou e pensou Eu não quero ser como ela. Bem, aqui está sua chance. As pessoas sempre dizem que a vida é curta demais para arrependimentos. Mas a verdade é que ela é comprida demais.

— Você irá ao baile de gala? — Paxton perguntou novamente. — Acho importante que esteja lá.

— Talvez. Continue trazendo chocolates e... talvez. Deixe-me comer em paz — disse Agatha, abrindo a caixa.

Paxton e Willa saíram do quarto. Cada uma perdida em seus pensamentos, caminhavam pelo corredor. Paxton seguia em direção à porta da frente quando Willa parou.

— Eu vou ver minha avó — disse Willa.

— Ah. Certo. Tudo bem.

— Você não quer tomar um café primeiro? — Willa apontou por cima de seu ombro, na direção do salão de jantar.

Paxton sorriu, quase aliviada.

— Sim. Seria ótimo.

Elas pegaram suas canecas e as encheram, depois caminharam até uma mesa próxima à janela, com vista para o jardim lateral.

— Por que você acha que nunca nos tornamos amigas? — perguntou Paxton, enquanto Willa esvaziava um pacotinho de açúcar em seu café. — Sempre notei a forma que você me olhava. Você jamais gostou de mim, não é?

— Não é isso — disse Willa.

— Então o que é?

Willa hesitou.

— Acho que, no ensino médio, era inveja. Eu detestava não ter o que você tinha. Acabei me ressentindo com minha família por causa disso, gostaria de voltar atrás e mudar isso. Como adultas, eu não sei. — Willa deu de ombros. — Você estabeleceu um padrão impossível e ninguém consegue alcançá-lo. E, às vezes, parece que você faz isso de propósito. Suas roupas são perfeitas. Seu cabelo é perfeito. Você faz malabarismo com um esquema de trabalho que exigiria três pessoas normais para cumprir. Nem todo mundo consegue fazer isso.

Paxton olhou dentro de sua caneca.

— Talvez eu faça de propósito. Mas é só porque todas parecem mais felizes do que eu. Todas têm suas casas, seus maridos, filhos, negócios. Às vezes, eu acho que há algo errado comigo.

— Não há nada errado com você — disse Willa. — Por que você nunca fez amizade comigo?

— Ah, isso é simples. — Paxton sorriu ao levantar o olhar. — Você me assustava. — Isso fez Willa rir. — Sério. Você era tão quieta e intensa. Como se conseguisse ver através das pessoas. Se eu soubesse antes que você era a Piadista, talvez tivesse sido mais fácil conhecê-la. Pelo menos eu saberia que você tem senso de humor. Então, quando você voltou, pareceu não querer ter nada a ver com as pessoas com quem cresceu. Você assumiu o estilo de vida da National Street como se estivesse empinando o nariz para nós, como se fôssemos caipiras tolos.

— Não é isso — disse Willa imediatamente. — Não é nada disso. Depois que meu pai morreu, eu voltei para cá e percebi que nunca pude me desculpar por fazer parecer que ele não tinha feito o suficiente. Prometi a mim mesma e a ele que eu seria feliz com o que tinha. Todos os dias. Mas estar perto das pessoas com quem fui criada trouxe todas as minhas inseguranças de volta, então eu simplesmente me acostumei a evitar isso.

— Agora não tem como me evitar, sabe? — disse Paxton. — Você sabe dos meus segredos. Você usou spray de pimenta para me defender. Eu devo essa a você pelo resto da vida.

Willa riu e abanou a mão, descartando.

— Qualquer uma de suas amigas teria feito a mesma coisa.

— Não — disse Paxton. — Não teriam.

— Ah, eu quase me esqueci — disse Willa, enfiando a mão no bolso traseiro dos jeans. — Preciso devolver isso a você. — Ela entregou a Paxton uma folha de caderno dobrada.

— O que é?

— É uma anotação que você deixou cair, um dia, no corredor da escola. Eu a peguei e li. Depois disso, fiquei constrangida demais para devolver.

Paxton pegou o papel e o abriu. Assim que percebeu o que era, ela riu, surpresa.

— Minha lista de qualidades do homem com quem eu gostaria de me casar.

— Desculpe — disse Willa timidamente.

— Foi assim que você falsificou a minha letra naquele bilhete para o Robbie Roberts!

— Sim. Eu lamento muito, muito mesmo.

Paxton sacudiu a cabeça e colocou o papel na bolsa.

— Tudo bem. É só uma lista. Uma das muitas. Eu tinha me esquecido completamente dela.

— É uma lista que impressiona — disse Willa.

— Naquela época, eu sabia o que queria. — Paxton sorriu e decidiu ir em frente e perguntar a Willa o que ela estava morrendo para saber. — Falando em querer. Meu irmão não voltou para casa ontem à noite. Imagino que você não saiba nada sobre isso, ou sabe?

Willa desviou o olhar.

— Talvez ele tenha dormido no meu sofá.

— Então por que você está vermelha?

Willa se virou, com os olhos brilhando.

— Talvez eu tenha dormido ali com ele.

— Eu sabia!

Elas riram e Paxton subitamente sentiu que estava num bom clima com Willa. Ela nunca achou que fosse boa em fazer amizade. Mas talvez apenas estivesse tentando fazer amizade com as pessoas erradas.

Elas acabaram conversando por muito tempo depois que o café esfriou.

Horas mais tarde, depois que deixaram o salão de jantar e Willa foi ver sua avó, Paxton entrou no carro e imediatamente tirou o papel da bolsa e leu novamente a lista.

O FUTURO MARIDO DE PAXTON:

Será bondoso

Será engraçado

Será compreensivo

Saberá cozinhar

Saberá beijar bem

Será cheiroso

Sempre me fará surpresas

Vai discutir comigo, me deixando vencer às vezes, mas não sempre

Será misterioso

Sempre irá me amar, independentemente da minha aparência

A mamãe não vai gostar dele, o que significa que eu o amarei ainda mais

Ela se lembrava de tê-la perdido e ficar em pânico durante vários dias, pensando em onde poderia estar. Ela temera que algum garoto ridículo como Robbie Roberts pudesse encontrá-la e debochar dela. Mas os anos se passaram e Paxton se esqueceu da lista, uma das tantas coisas que ela conseguira deixar para trás.

Para onde tinha ido essa garota? Paxton ficou pensando. Era como olhar uma foto antiga de sua avó. Para onde tinha ido essa garota? Colin disse que era a única do grupo que não tinha mudado. Mas ela tinha mudado sim, de uma forma boa.

A garota que ela era não aprovaria a mulher que ela se tornara. Aquela garota sempre presumiu que, nessa idade, ela seria tão feliz quanto havia sido naquela época. O que aconteceu?

Ela ficou ali sentada, olhando o nada, com o papel no colo, até que seu celular tocou.

Ela olhou o visor. Era sua mãe, provavelmente imaginando por que ela ainda não estava em casa para a última prova de seu vestido de gala.

Com um suspiro, Paxton colocou o telefone e o papel de volta na bolsa e ligou o carro. Depois partiu.

De volta à vida que ela conhecia.