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A DETERMINAÇÃO DE AMINA

Dubhe acompanhou escrupulosamente a convalescência de Amina. Era uma garota de raça forte, tanto física quanto moralmente, pois não se deixava abater com facilidade: procurou tentar melhorar as próprias condições, acatando as prescrições do sacerdote e treinando todos os dias. Foi melhorando a olhos vistos, e a velha rainha só podia alegrar-se com isso.

Descobrira uma afeição nova por aquela neta indômita e atormentada. Sempre lhe quisera bem, mas nunca tivera de fato a chance de conhecê-la profundamente. As obrigações da corte e a redoma protetora na qual a mãe a mantinha sempre haviam impedido que estabelecesse uma ligação sólida com Amina. Mas nunca deixara de ter simpatia por ela, quanto a isso não havia dúvidas, pois percebera alguma coisa na menina. Agora sabia o que era.

A garota se parecia muito com ela, até demais. Tinham a mesma atitude em relação ao mundo. E ambas, em muitos casos, sentiam-­se deslocadas. Ela tivera Learco para ajudá-la, mas Amina não tinha o apoio de ninguém e, além do mais, estava passando por uma idade difícil.

Depois da conversa entre as duas, entretanto, a menina parecia ter mudado. Nunca mais mostrara sinais de rebeldia; ao contrário, parecia ter tomado uma decisão definitiva a respeito da vida. Uma decisão à qual se mantinha fiel com abnegação total. Dubhe ficou imaginando se não seria o caso de mandá-la de volta para casa. Afinal, ali estavam muito perto do campo de batalha, às vezes ela mesma participava dos combates, principalmente das operações mais delicadas, quando se tratava de guiar os exércitos em batalhas campais. Mas o que iria encontrar Amina ao voltar para Nova Enawar? Kalth escrevia bastante e contava de Fea, naquela altura completamente transtornada e incapaz de cuidar de si mesma. Nem pensar, então, que pudesse de alguma forma enfrentar o caráter rebelde da filha ou até mesmo ficar perto dela e ajudá-la numa hora tão difícil. O neto estava totalmente empenhado nos deveres do governo, e não se podia exigir dele que também tomasse conta da irmã. O palácio, naquela altura, era um lugar morto. Não era de surpreender que Amina tivesse decidido fugir.

De qualquer maneira, aqui é perigoso demais, continuava dizendo a si mesma Dubhe, e o problema permanecia sem solução.

Amina levou mais ou menos dez dias para se recobrar e ter condições de viajar. Naquele momento já não era possível adiar a decisão. Dubhe resolveu falar com ela para saber das suas intenções.

Convidou-a a jantar na sua tenda, ainda que normalmente fizesse as suas refeições com o resto da tropa. Seus homens tinham começado a dirigir-se a ela chamando-a de “general”, uma maneira jocosa para mostrar até que ponto a considerassem uma deles. Mas aquela era a última noite da neta no acampamento, e Dubhe queria passar algum tempo sozinha com ela, a fim de comunicar-lhe todo o seu apoio e afeto.

Comeram com prazer e falaram muito. Amina estava curiosa acerca dos aspectos administrativos do acampamento e queria saber tudo da guerra. Dubhe contentou-a respondendo com fartura de detalhes às suas perguntas. Afinal, sempre tivera o maior interesse pela espada e pelos combates.

– Acompanhei a sua recuperação e reparei que já pode andar sem maiores problemas – disse, a certa altura.

A expressão da neta mudou de repente. Endireitou as costas no assento e seu rosto ficou sério. Era uma mocinha bem esperta e, na certa, já tinha compreendido aonde a avó queria chegar. Dubhe achou que ela merecia a verdade, sem muitos preâmbulos.

– Acredito que já esteja na hora de você voltar para casa – declarou, secamente. Aí aguardou pela reação. Esperava por uma cena, com gritos e veementes sinais de protesto.

Em vez disso, Amina continuou com a mesma expressão séria de antes.

– Posso explicar por que não acho uma boa ideia? – perguntou, calma.

Dubhe anuiu, surpresa.

Devia ter preparado aquele discurso durante todo o tempo em que ficara de resguardo, pois foi falando com precisão e segurança, como se o tivesse aprendido de cor.

– Sei que acha que o meu lugar é ao lado da minha mãe e do meu irmão, e pode ser até que você esteja certa. Pelo menos do seu ponto de vista. Depois do que eu fiz, acho normal que não confie em mim. Mas sinto que não posso voltar ao palácio. Sinto que o meu destino é outro.

Dubhe suspirou. Talvez a menina não tivesse mudado nem um pouco.

– Já falamos na vingança e em todas aquelas bobagens que lhe enchem a cabeça, e achei que você tinha entendido.

– E, de fato, não é a isso que estou me referindo. Por favor, deixe-me acabar. – Amina retomou o fôlego e prosseguiu de onde tinha parado: – Outro dia você disse que nós duas somos parecidas, e que quando nos acontece alguma coisa ruim precisamos dar uma chicotada no corpo e botá-lo para funcionar. Pensei muito naquelas palavras e as achei terrivelmente verdadeiras.

Tudo indicava que tinha encontrado o seu ponto fraco.

– Desde que papai morreu, senti dentro de mim uma raiva irrefreável. Tentei acalmá-la com a ideia da vingança, e a minha viagem se resumia justamente a isto: tentar calar aquela dor e acabar com tudo. Mas você me ajudou a entender que era uma coisa errada e, acredite, aprendi a lição. A raiva, contudo, continua intacta.

– É algo com que terá de aprender a conviver – interrompeu-a Dubhe. – Com o tempo vai ficar menos intensa, você vai ver, as coisas irão melhorar.

Amina meneou a cabeça.

– Acho que não e, lá no fundo, tenho certeza de que você tampouco acha.

Era verdade. Desta vez, Dubhe tinha sido pega.

– Depois também me falou do meu irmão – continuou Amina –, e fiquei impressionada com o que disse. Eu nunca dei muita confiança a Kalth. Mas, mesmo assim, até uma pessoa como ele conseguiu encontrar uma maneira de expressar a sua natureza para realizar algo de bom. Soube aproveitar todas aquelas horas gastas nos livros, que a mim pareciam uma total perda de tempo, para tornar-se nada menos do que um rei. E então pensei o seguinte: que talvez ele também estivesse cheio de raiva, que talvez se sentisse como eu. E a sua resposta foi arregaçar as mangas e salvar o reino do pai.

Dubhe, agora, ouvia com atenção. Percebia que havia uma nova consciência naquelas palavras, talvez Amina tivesse realmente pensado muito em tudo que acontecera, compreendendo qual fosse o seu destino.

– Escolhi o caminho errado – prosseguiu. – Joguei-me de cabeça na primeira coisa que podia afastar o sofrimento, e cometi um sério engano. Acredite, estou falando sério, e estou envergonhada. – Corou levemente, mas não parou: – Mas agora trata-se de mim e do que quero fazer. Acho que a coisa mais importante seja dedicar-me a alguma coisa útil para salvar a herança do meu pai.

– Fico feliz que tenha chegado a essa conclusão – aprovou Dubhe. – É justamente o que eu também achava.

Amina sorriu, tímida, mas continuou logo a seguir:

– Pois é, mas mesmo assim acredita que eu precise voltar a Nova Enawar. Já sei o que vai acontecer lá. Vão me prender no palácio, sem qualquer possibilidade de agir. Acabarei como minha mãe, que já não sai mais do seu quarto. Eu sei, porque era assim mesmo quando fugi.

– Não é verdade. Muita coisa pode ser feita mesmo dos aposentos de um palácio.

– Não diga algo em que você mesma não acredita. Pensei bastante naquilo que sei fazer – continuou Amina. – O estudo não é meu forte, nem todas aquelas coisas de mulher de que a minha mãe tanto gostava. Sempre estive interessada na espada, você sabe disso. E, portanto, o meu lugar é aqui.

A avó sacudiu a cabeça.

– Mantive-a aqui comigo só porque mandá-la viajar era perigoso demais. Este não é um lugar apropriado para você. Estamos em guerra, e eu, como já viu, luto pessoalmente nela. Não há defesas aqui, você está na linha de frente, e as coisas não têm nada a ver com o que se lê nos livros. Aqui se fala de sangue, de mortos, de homens que se tornam animais. Não há nada de heroico nisto tudo, e eu não quero que seja forçada a ver o que os meus olhos veem todos os dias.

– Sei disso, e concordo com você. Atravessei a metade do Mundo Emerso para chegar aqui e pude ver a guerra de perto. Sei o que é.

Alguma coisa no olhar dela convenceu Dubhe de que a menina sabia do que estava falando.

– Estão nos atacando e nós estamos nos defendendo. E eu sinto que poderia ser útil.

– Acha que sabe lutar, mas não é verdade. Já viu o que aconteceu com Amhal.

– Não estou nem um pouco convencida de saber lutar. É por isso que lhe peço para manter-me aqui e me treinar.

Amina soltou um longo suspiro e, finalmente, calou-se. Tinha dito tudo aquilo que devia. Agora era a vez da avó. E Dubhe estava sinceramente impressionada. Porque havia lógica e sabedoria naquilo que a neta dissera e a demonstração clara de que mudara. Muitas das coisas que ouvira da menina, ela mesma já tinha pensado. Era verdade que a corte não era um bom lugar para Amina, que lá dentro só poderia murchar, enredada nos deveres, nas convenções. E era verdade que um caráter como o seu tinha necessidade de ação. Havia um fogo naquela garota, algo que vibrava com a batalha. Pensara nisso desde o momento em que a vira chegar ao acampamento ferida. A sua teimosia, a sua perseverança ao enfrentar aquela viagem tremenda, quando levadas ao caminho certo, iriam produzir um guerreiro excepcional.

– Não – disse, afinal, sacudindo a cabeça. – Não pode pedir-me uma coisa dessas.

– Por que não me quer? Não quer treinar-me?

– Não é nada disso. Só não quero que siga o mesmo caminho que eu.

Dubhe sentiu um longo arrepio correr pela espinha. Porque fora com estas mesmas palavras que Sarnek, o seu Mestre, muitos anos antes tentara dissuadi-la de tornar-se um sicário. Amina era como a Dubhe de então, porém mais consciente, mais forte. Viu a história que se repetia, enroscando-se sobre si mesma num percurso tortuoso que sempre levava ao ponto de partida.

– Não é você que me impõe o seu caminho, nem sou eu a escolhê-lo. Quem decide por nós é a nossa natureza. E se agora você me disser não, eu sei que a vida encontrará, mesmo assim, um jeito de realizar os meus desejos. É o meu destino, avó. Você não pode mudá-lo.

Aquelas palavras diziam a verdade, e Dubhe sentiu-se abalada até o fundo da alma.

– Por favor, pense nisso. Não me enterre viva. – Seu rosto e seus olhos estavam cheios de uma súplica verdadeira e sentida.

– Dê-me um tempo – disse, finalmente, Dubhe, um tanto perdida.

Amina sorriu, um sorriso doce e grato. Aproximou-se. Abra­çou-a. No começo, ambas estavam meio constrangidas, mas não demoraram a se deixarem levar. Dubhe apertou aqueles ombros miúdos, e Amina envolveu com os braços o pescoço da avó. Finalmente sentiam-se próximas.

A rainha concedeu-se uns dois dias para pensar no assunto. Não era uma decisão simples, e queria tomá-la com a mente mais lúcida possível. Mas calar a emoção era difícil. De repente, Amina lembrava-­lhe o seu passado de forma dolorosa e viva. Nunca se perguntara como devia ter-se sentido Sarnek quando ela, pequena e perdida, cruzara com ele e pedira que a tornasse uma assassina. Agora quem tinha de tomar uma decisão parecida era ela. Recordava o que havia experimentado naquela época e imaginava se o mesmo se dava com Amina, se a menina visse nela a sua única tábua de salvação. A neta, na certa, não se encontrava sozinha e desesperada quanto ela estivera naquele tempo, mas chegara à beira dos mesmos abismos. Dubhe sentia-se oprimida por uma grande responsabilidade.

Como sempre, decidiu perder-se na luta. Empenhou-se mais do que o normal na frente de batalha, mas não adiantou. A frustração que tinha experimentado desde o começo devido à decadência do próprio corpo naqueles dois dias tornou-se mais aguda, ainda mais porque aconteceu uma coisa desagradável.

Tinha planejado uma missão nos mínimos detalhes. Tratava-se de sabotar um acampamento inimigo não muito distante. Decidiu participar pessoalmente. Reuniu um grupo de homens, os melhores que tinha, e partiram de noite: o momento mais oportuno para aproveitar ao máximo o elemento surpresa. Estabelecera que caberia a ela distrair a sentinela. Uma coisinha de nada, que já fizera dúzias de vezes. Só tinha de atraí-la em campo aberto e deixá-la fora de combate. Tudo fora calculado, não havia margem para erros.

O grupo mais consistente dos seus homens já estava pronto, ocupando sua posição. Ela se encontrava sozinha com um jovem. Atraiu a atenção da sentinela jogando uma pedra, e o guarda aguçou os olhos. Não demorou quase nada para ele fazer a coisa mais óbvia: dirigir-se à origem do ruído. Dubhe preparou-se para o ataque. Seguraria o soldado pelo pescoço jogando-o ao chão. Então um corte na garganta. Seco, preciso. Questão de um minuto e teriam o caminho livre.

Viu-o chegar e examinar as moitas em que ela se escondera. E deu o bote. Mas alguma coisa saiu errada. Talvez fizesse barulho demais, talvez não fosse bastante rápida. O fato é que errou a presa e não conseguiu pegar o elfo que saiu gritando para o acampamento. De nada adiantou o impulso com que o agarrou e afundou a lâmina em seus pulmões: o alarme já fora dado. Tiveram de desistir e se retiraram.

Ficou remoendo a coisa por um dia inteiro. Seu corpo já não respondia a contento, sua mão já não era tão forte.

Lutar já não é comigo. Em combate sou totalmente inútil.

O pensamento atiçava a sua raiva, e a frustração tornava-a emotiva demais, para um general como ela.

Foi naqueles dias que o acampamento recebeu as provisões. Che­gavam uma vez por mês, através de um mercador que se prontificava a trazer os mantimentos de Nova Enawar. Transportava comida, armas e homens, os poucos que sobravam ainda em condições de lutar. Naquela manhã, enquanto Dubhe cuidava da distribuição dos víveres, reparou num rosto conhecido. Parecia sair diretamente do seu passado. Aqueles cabelos longos, em trancinhas, aquela pele escura, curtida pelo sol, eram inconfundíveis. Aproximou-se e tocou no seu ombro.

– Tori... – murmurou. O gnomo que lhe vendia poções e venenos quando ela era uma ladra, em Makrat, continuava o mesmo de então.

Ele, por sua vez, demorou algum tempo para reconhecê-la.

– Minha rainha... – disse, afinal, e seu rosto se iluminou.

Ficaram na tenda de Dubhe e conversaram longamente lembrando o passado. Já fazia cinquenta anos que não se viam, e mesmo assim não parecia ter passado tanto tempo.

– Quando vi a senhora de braços dados com Learco quase não consegui acreditar – disse Tori, rindo.

– Trate-me por você – disse Dubhe. – Afinal de contas, mesmo sendo uma velha, você continua sendo mais idoso que eu.

Tori piscou o olho.

– É a bênção e a maldição de nós, gnomos: temos uma vida longa! – exclamou, e levantou a caneca de cerveja com a qual brindaram.

Falar do presente foi difícil para ambos. Seguiram por caminhos completamente diferentes, e parecia que das pessoas que haviam sido não sobrava, agora, mais nada.

– Já não faço grandes negócios. Só trabalho para o exército. Poderia ter aproveitado para começar a vender alguma poção, dizendo que cura a peste, mas não faz o meu estilo – explicou Tori.

– Muito em breve não trabalhará nem mais conosco – comentou Dubhe com amargura.

Pareceu-lhe natural confessar suas preocupações. Tori fora a única pessoa em que confiara desde o começo. As suas maneiras diretas, a disposição para ajudá-la, todas as vezes que ela precisara, eram coisas de que se lembrava muito bem e pelas quais ainda se sentia agradecida.

– Acontece que já não tenho a força de antigamente – acrescentou com um sorriso cansado. – A guerra é para os jovens.

O gnomo deu de ombros.

– A experiência conta, e você tem bastante. Todos falam bem de você, os seus homens só têm elogios. Você mudou o rumo da guerra.

Dubhe desviou os olhos.

– Mas deste jeito não se pode vencer. Claro, os homens ficam contentes vendo a rainha ao seu lado, até combatendo com eles. Mas na batalha eu sou um peso morto. – Levantou uma das mãos, contemplando as rugas que teciam a pele. – Estou velha e fraca, e o meu corpo já não serve para certas coisas. Ah, se eu pudesse ter de volta a juventude... E não pense que se trata de vaidade. Só gostaria de ter a força e a agilidade de antigamente – concluiu, desconsolada.

Tori estava imóvel diante dela e rodava lentamente a caneca.

– Acha que realmente precisa?

Dubhe olhou para ele, interrogativa.

O gnomo colocou a caneca na mesa e se aproximou quase com ar de conspiração.

– Estudei muito nestes anos todos. E a minha arte progrediu. Digamos que descobri... umas coisas.

Ela continuou a fitá-lo, em dúvida.

– Inventei novos filtros, com propriedades diferentes dos venenos que lhe vendia. Digamos que ampliei o meu campo de ação. E obtive resultados interessantes. Alguns deles podem devolver o antigo vigor.

O coração de Dubhe deu uma reviravolta. Sabia que o gnomo estava dizendo a verdade. Quando ainda trabalhava para a Guilda dos Assassinos conhecera a temível Rekla, a Guardiã dos Venenos, que continuava com aparência jovem mesmo já sendo idosa.

– Trouxe comigo o meu mostruário – disse Tori –, embora estas coisas não tenham agora muito mercado. Tenho um vidro no meu carro...

Voltou a endireitar-se e esperou a reação dela. Dubhe continuou curvada sobre a mesa, em silêncio.

– Não creio que você precise – acrescentou o gnomo. – Mas se quiser experimentar...

Dubhe tomou um gole de cerveja e avaliou cuidadosamente a proposta.

– Quanto custa? – perguntou.

– Para você, nada – disse Tori, sorrindo. Então voltou a ficar sério. – Dura pouco, só o tempo de um combate. E exige um alto preço: quando o efeito acaba, a pessoa fica mais velha que antes. Quanto mais você toma, mais rapidamente envelhece.

– É uma espécie de pacto diabólico.

– Isso mesmo, infelizmente.

Dubhe não podia negar a si mesma que estava tentada. Mas era uma loucura, e se dava perfeitamente conta disso. E se o efeito se esvaísse durante o combate? E se encurtasse demais a sua vida, quem iria liderar os seus homens?

Poderia, de qualquer maneira, guardar a poção comigo. Para um caso de necessidade, pensou.

– Só quero salientar que se trata de uma solução desesperada, sabe disso, não sabe? – frisou Tori.

– Traga uma ampola – disse ela, decidida.

– Como quiser – respondeu o gnomo, fitando-a demoradamente. Engoliu o último gole de cerveja e se levantou.

Dubhe entrou na tenda de Amina quando já anoitecera. A garota estava na cama, mas ainda não dormia.

– Vovó... – disse com voz sonolenta.

Dubhe sentou-se ao lado dela e a olhou.

Talvez fora a visita de Tori que a tivesse levado de volta à idade da neta, ou talvez o fato de descobrir cruelmente os limites do próprio corpo. Quem sabe.

– Tomei a minha decisão.

Amina levantou-se apoiada nos cotovelos; o sono parecia ter sumido de repente.

– Ficará comigo, e eu a treinarei.

Um sorriso incrédulo espalhou-se no rosto da menina.

Dubhe levantou um dedo.

– Mas há duas condições: não irá lutar enquanto eu não achar que está pronta e obedecerá a qualquer ordem minha sem protestar. Estamos de acordo?

Amina anuiu com entusiasmo.

– Obrigada! – exclamou, abraçando-a.

Dubhe colocou a mão na sua cabeça.

– Não tenha tanta pressa em agradecer – disse, baixinho, e esperou jamais ter de se lamentar daquela escolha.

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