Quanto a Tiago, logo que se viu livre da igreja, cujos responsórios negros lhe metem medo, foi para a rua atrás da casa brincar com os mais miúdos, pobre gente a quem só o sonho sustenta, que conversa por vezes do modo mais informal e fantástico:
– agora a gente finge que está ao telefone
– ê estou sozinho em casa
– e eu à caça da minha namorada
– e que mais? e que mais?
– nada mais
– faz de conta que caíste num poço
– e o poço é a tua mão ou a tua boca
– e depois de cair fiquei à espera do almoço
– e óspois do almoço fomos p’r’Arraiolos
– nã senhora
– e lá era a fêra e havia tourada e os palhaços
– no circle prà onde entrámos sem pagar
– e ó despois do circle?
– era já aquais noute e fomos pra casa
– e em casa estava a minha namorada e casámos
e, regressando a casa, Tiago lembra-se de repente que foi no pinhal, numa tarde pesada, quando as outras crianças se afastaram para colher flores como Piedade ordenara, esta o chamou para a sombra dum pinheiro, onde a caruma parda fazia fofa cama farta, se deitou num fremente sorriso de avidez e, levantando as saias e afastando as pernas largas sem tirar as calças, lhe disse que se podia deitar em cima dela para brincar, ele deitou-se sem saber o que fosse, só por obediência, corado já de pressentimento e de certo modo medo, deitou-se encolhido e apressado, vendo nessa altura que era uma coisa feia, que os outros meninos não podiam ver, sentiu-se muito quente, indolente, imóvel, eletrizado, ela beijava-o na boca com os lábios molhados, torcia-se de esgares, então apareceram os putos de volta e eles levantaram-se.