ARREPENDIMENTOS
Eu preferiria olhar para a frente e sonhar a olhar
para trás e sentir arrependimento.
– Anônimo
O arrependimento, assim como a culpa, nos mantém concentrados no passado. Você alguma vez já se olhou no espelho e pensou “O que estou fazendo aqui?”, “Será esta realmente a vida que desejo?”, “O que teria acontecido se eu não tivesse saído de casa?”, “E se eu dissesse àquela pessoa o que de fato penso dela?”, “Por que sinto medo do que as pessoas pensam a meu respeito?”, “As circunstâncias da minha vida seriam melhores se eu tivesse me mudado para outra cidade?”, “Eu estaria mais feliz se tivesse permanecido casado, ou se tivesse me divorciado?”.
Assim como a culpa, o arrependimento também faz parte da experiência humana. Nossos arrependimentos podem ser excelentes oportunidades de aprendizado, ou podem destruir nossa autoestima e nos impedir de crescer. Quando remoemos repetidamente nossas decisões passadas, corremos o risco de criar arrependimentos que corroem nosso presente.
No decorrer da vida, todos chegamos a um ponto em que olhamos para nossa existência com algum tipo de arrependimento. “Se eu não tivesse largado aquele emprego… Se tivesse me casado com outra pessoa… Se tivesse tido mais filhos…” O envelhecimento traz uma perspectiva mais ampla que nos permite avaliar as escolhas passadas e as consequências dos nossos erros. A maioria de nós fica com um profundo pesar por causa de oportunidades perdidas.
De onde vem o arrependimento? Acho que o arrependimento tem como origem experiências desperdiçadas. Ao olharmos para trás, sentimos que perdemos a oportunidade de fazer alguma coisa maravilhosa ou significativa. O arrependimento pode também ter origem em um sonho que negamos a nós mesmos. Digamos que você quisesse ser uma bailarina, mas não pudesse pagar pelas aulas de dança. Ou que quisesse jogar num time importante, mas não tivesse preparo físico suficiente. É possível que houvesse coisas que você poderia ter feito para melhorar seus recursos e suas habilidades, mas o tempo e as circunstâncias da vida o afastaram da concretização daqueles sonhos.
Outro tipo de arrependimento aflige pessoas que têm medo de assumir riscos. Talvez elas não tenham autoestima suficiente para acreditarem em si mesmas, ou talvez temam a responsabilidade, especialmente a de tomar decisões ou de fazer o trabalho necessário para alcançar o sucesso. Esses indivíduos podem se arrepender de ter escolhido o caminho mais fácil, de nunca terem testado a si mesmos ou as suas habilidades. Podem entrar num declínio emocional que os faz sentir ressentimento, rancor, raiva e depressão. Em muitos casos, tornam-se pessoas amargas e cínicas.
Outro tipo de arrependimento tem como origem a lembrança do modo como tratamos outras pessoas. “Eu não precisava ter gritado tanto com a minha filha quando ela era pequena”, “Poderia ter ajudado mais o meu vizinho quando ele adoeceu”, “Gostaria de ter me envolvido mais quando o meu sobrinho teve um problema com a bebida”.
A maioria dos arrependimentos tem a ver com laços de família. Uma grande parte do trabalho que faço se direciona a restabelecer relacionamentos entre membros de uma família. Uma discussão vira uma desavença que dura anos. O relacionamento acaba porque ninguém quer pedir desculpas, ninguém diz “Sinto muito”. Um desentendimento entre dois membros da família pode produzir um efeito nocivo nos demais. Não é divertido conviver com um irmão e uma irmã, ou uma mãe e um filho, que não se entendem. Também pode haver muito mal-estar e tristeza nas grandes festas. Quem convidar para o almoço de Páscoa? Quem visitar no Natal ou na passagem do ano? Quando membros da família não conseguem resolver suas diferenças, a única coisa que podem esperar é desconfiança, desrespeito e isolamento. Já transmiti a muitas famílias milhares de mensagens de seus entes queridos que se encontram no mundo espiritual. Quase todos se arrependeram de terem perdido momentos de união familiar por causa de suas disputas e teimosias.
A boa notícia é que podemos fazer alguma coisa para nos livrarmos dos arrependimentos e mudarmos nossa vida para melhor. Antes de tudo, precisamos saber que somos impotentes em relação ao passado. Ele já aconteceu, e não temos como fazê-lo retornar. Podemos viver apenas no momento presente, no agora. Essa é a oportunidade de avaliar nossas circunstâncias atuais, rever nossos valores e metas e começar a tomar decisões capazes de promover, daí para a frente, a vida que desejamos construir.
A Bíblia me diz isso
Jenny Haustead, uma mulher jovem e bonita, era a imagem perfeita da esposa e mãe. Uma mulher atraente, charmosa, loura, de olhos azuis e modos perfeitos, sempre impecável na forma de se vestir, Jenny chamava a atenção e causava admiração por onde passasse. Nada estava fora de lugar, e ela se esforçava para causar boa impressão. Dedicava-se aos dois filhos, Doug e Bobby, e nunca perdia um culto de domingo. Aparentemente, Jenny tinha uma vida ideal que logo começaria a desmoronar.
Vamos encontrar Jenny e sua família, 16 anos depois, em uma sessão que mostra como a teimosia e o arrependimento são capazes de provocar um enorme sofrimento.
Olhei para uma mulher de cinquenta e poucos anos que estava sentada na sexta fileira à minha esquerda, junto ao corredor. Naquela noite, vários espíritos tinham enviado mensagens para pessoas da fileira dela, e, sempre que eu falava, notava um espírito jovem e bonito em pé atrás dessa mulher. O espírito não dizia nada, mas me olhava insistentemente, como se quisesse saber se eu podia detectar a presença dele.
Finalmente, senti que precisava falar com aquele espírito. Olhei para a mulher de meia-idade sentada junto ao corredor e perguntei:
– A senhora conhece um homem louro que morreu com cerca de 26 anos?
– Não, acho que não – ela respondeu.
Ao ouvir a resposta, o jovem me agradeceu por tê-lo enxergado. Senti sua inquietação e sabia que ele não queria perder a oportunidade de transmitir o que vinha querendo dizer havia muito tempo. Ele começou a me enviar seus pensamentos.
– A senhora reconhece o nome Jen ou Jenny? Este homem está me dizendo isso. Ele também está falando sobre velejar e o nome Bob ou Rob.
– Meu Deus! Sim! Velejar! Este é o meu sobrinho Robert, Bobby, filho da minha irmã Jenny. Ele está aqui? Oh, meu Deus! Eu sinto muito, Bobby. A mulher começou a chorar.
– A senhora conhece uma Chris ou Christine, por favor?
– Sim. O meu nome é Christine.
– A senhora tem sonhado com o Bobby, não tem? – perguntei.
– Sim, mas os sonhos parecem mais pesadelos. Eu deveria ter…
– Bobby está me dizendo que, quando ele morreu, a senhora estava viajando e não chegou ao hospital a tempo.
Christine ficou chocada ao me ouvir dizer algo que apenas poucas pessoas sabiam. Levou a mão ao rosto e cobriu os olhos.
– Ele quer que a senhora saiba que ele não morreu sozinho. Ele diz que a senhora estava preocupada com isso.
Levantando a cabeça, a mulher olhou para mim.
– Ele não morreu sozinho? Oh, graças a Deus! Sinto muito não ter estado lá com você, Bobby.
– A senhora conhece a mãe dele? – perguntei.
– Sim, claro. Ela é minha irmã. O que é que ele está dizendo? Bobby de repente me passou uma sensação muito forte.
– Sinto que a mãe dele não gostaria do que estou fazendo. Ela não aprova esse tipo de comunicação. Isso vai contra as crenças dela. É verdade?
– Sim, ele tem razão. Ela é muito religiosa.
– Ele está me pedindo encarecidamente que transmita uma mensagem para a mãe. Diz que a perdoa, e que ela não precisa mais ficar presa aos seus arrependimentos. Os arrependimentos já lhe ensinaram o suficiente, e ela precisa se desapegar deles. Bobby sente muito orgulho da mãe e diz que ela é inteligente demais para seguir crenças intimidadoras.
– Vou transmitir isso a ela.
Bobby então me mostrou uma Bíblia.
– A senhora está familiarizada com a Bíblia e, em especial, com a passagem Levítico 18:22? – perguntei.
– Infelizmente, sim. Essa era a principal passagem que a Jenny usava para atacar o Bobby, por ele ser gay. Ela frequentava uma igreja evangélica e acreditava que o Bobby estava vivendo em pecado. Por causa de suas rígidas crenças, ela achava que ele estava indo contra a vontade de Deus.
Christine acrescentou:
– Ela tentou fazer com que ele fosse “desprogramado”, exorcizado e tudo o que era possível. Mas Bobby continuava sendo o Bobby, um garoto maravilhoso que não podia mudar quem era. Infelizmente ele foi pego tendo relações sexuais com seu treinador de voleibol do colégio. Foi aí que o mundo perfeito da Jenny desmoronou. Por fim, Jenny afirmou que, se ele continuasse a viver um estilo de vida pecaminoso, ela o renegaria. Ele continuou, e ela rompeu com ele.
Eu não podia acreditar no que estava ouvindo.
– Há quanto tempo isso aconteceu?
– Há cerca de 16 anos. Depois disso, as comportas se abriram. Jenny passou a participar de passeatas de protesto sempre que havia eventos homossexuais na cidade. Então Bobby adoeceu e morreu.
– Ele está me dizendo que, após a morte dele, a mãe começou a compreender.
– Sim, ela começou a examinar suas crenças. Estudou a Bíblia profundamente e logo começou a perceber que tinha recebido informações erradas.
Christine continuou:
– Quanto mais Jenny estudava, mais ela se sentia traída por suas crenças religiosas. Percebeu que o filho não era um pecador e que ela o tinha condenado por pressão de sua igreja. Desde então, passou a sentir um grande arrependimento. Queria reparar o mal que causara ao filho, fazer alguma coisa em sua memória.
– E o que foi que ela fez? – perguntei.
– Ela é uma ativista em prol da prevenção da aids, e viaja por todo o país pregando o amor em vez do ódio. Agora frequenta uma igreja que aceita homossexuais. Ela diz que eles pregam o amor, e não o julgamento. Sente-se muito mais perto de Deus do que se sentia antes.
Bobby chorava lágrimas de amor. Ele tinha mais uma mensagem para transmitir.
– Ele está pedindo: Diga à mamãe que a amo.
Assim como Jenny, nos arrependemos ao perder entes queridos antes de termos tido a oportunidade de dizer adeus ou reparar mágoas causadas. Não é fácil passar o resto da vida nos perguntando “O que teria acontecido se…?”.
Como eu já disse, quando o arrependimento não é enfrentado de maneira positiva, ele pode arruinar o resto da sua vida. Já recebi milhares de cartas de pessoas do mundo inteiro que sofrem diariamente por causa de seus arrependimentos. Elas tentam levar uma vida normal, porém, até a situação delas ser resolvida de maneira saudável e construtiva, estarão apenas encobrindo suas dores.
É fundamental que as pessoas entendam as exatas consequências de levar arrependimentos desta vida para a seguinte. Precisamos nos livrar desses obstáculos emocionais e nos curarmos aqui. Quando os arrependimentos não são resolvidos aqui na Terra, eles se tornam parte do nosso espírito e nos atormentam no outro mundo.
Como os espíritos residem num mundo incorpóreo, todos os sentimentos e pensamentos ficam exacerbados, e qualquer entulho emocional que levem com eles se torna maior. O comportamento que eles escolheram na vida terrena fica mais intenso no mundo dos espíritos. Eu já disse muitas vezes que nesse mundo você não pode esconder seus pensamentos e sentimentos. As características do seu caráter e os traços da sua personalidade são expostos ao ar livre para que todos os vejam; você fica mental e emocionalmente nu. Ao compreender isso, você pode reavaliar suas posições inabaláveis enquanto ainda está vivo na Terra e buscar uma nova perspectiva para as escolhas que faz. Porque, quando morrer, infelizmente você não poderá se livrar do problema que não estava disposto a enfrentar na Terra. Meu melhor conselho é: reconcilie-se agora.
Imagine quanto é terrível para os espíritos que estão num estado de realidade intensificada sentirem seus arrependimentos terrenos. Muitas vezes, ouço espíritos gemerem: Se tivesse sabido disso enquanto estava vivo, eu teria agido de maneira muito diferente. Os espíritos muitas vezes expressam sentimentos que vão além do simples arrependimento. Eles imploram perdão e compaixão àqueles que estão na Terra, para que possam deixar para trás suas bagagens emocionais e passar para o próximo estágio evolutivo.
Por essa razão, espero que você, leitor, decida aprender com os sofrimentos, dores e arrependimentos dos outros e que aplique esse conhecimento à sua própria vida. Você não precisa sofrer por causa de questões mal resolvidas quando deixar este mundo. Você pode ser livre.
A seguinte comunicação de um espírito mostra o tipo de dor a que me refiro. O espírito estava muito arrependido do que fizera aos seus semelhantes enquanto vivia na Terra e lamentavelmente, assim como tantos outros, percebeu tarde demais que suas ações tinham destruído a vida de muitas pessoas.
A falência de um banco de investimentos
No sudeste dos Estados Unidos, fiz uma demonstração para um grupo grande, formado por cerca de 40% de homens e 60% de mulheres. Esse percentual mudou radicalmente ao longo dos anos. Quando comecei a fazer sessões públicas, a plateia era geralmente composta por 80% de mulheres. Os outros 20% eram compostos por maridos levados à força pela esposa. Os tempos de fato mudaram.
Eu estava prestes a fazer um intervalo, quando um espírito vestindo um terno cinza apareceu, apontando insistentemente para uma mulher na plateia. Ele me disse que seu nome era Earl.
– Desculpe-me, senhora – dirigi-me a uma mulher de cerca de 75 anos. – A senhora reconhece o nome Earl?
A mulher olhou para mim, muito atenta.
– Não, não conheço nenhuma pessoa com esse nome.
– Ele está falando sobre o Savannah Savings – eu disse.
Ao ouvir isso, a atitude da mulher mudou por completo.
– Oh, aquele FDP? Li que ele tinha morrido. Bem, espero que apodreça no inferno!
A plateia ficou chocada com aquele comentário. Eu podia ouvir murmúrios por toda a sala. O homem sentado à direita da mulher sussurrou alguma coisa em seu ouvido.
Enquanto eu olhava tudo aquilo, Earl se postou na minha frente virando a cabeça de um lado para outro. Ela não vai me escutar. Vim com a esperança de poder fazê-la ver como me sinto.
Olhei para a mulher e perguntei:
– Qual é o seu nome?
– Trudy! – ela gritou.
O homem ao seu lado tentou acalmá-la.
– Esse homem, o Earl, está dizendo: Por favor, peça a essa adorável senhora que procure me perdoar. Lastimo profundamente o que aconteceu.
Ela não se importou nem um pouco com o pedido dele.
– Ele deveria se sentir muito mal depois do que fez. Que pilantra! Roubou todas as nossas economias! E eu não sou a única; ele roubou muitas outras pessoas.
Earl estava verdadeiramente perturbado enquanto prosseguia me contando o que tinha acontecido. Eu possuía uma empresa com um grupo de sócios. A minha função era captar investidores, e a deles era investir o dinheiro. Eu tinha muita habilidade para convencer as pessoas.
– Ele está dizendo que tinha um dom com as pessoas.
A mulher interrompeu.
– Grande coisa! O que devemos fazer agora, Earl?
– O Earl está dizendo que sente muito e que está profundamente arrependido. Ele não sabia que os investimentos não eram seguros e diz que isso não fazia parte da função dele. Ele está revivendo cada momento da própria existência, sentindo a dor que causou aos outros. Ele se pergunta repetidamente como poderia ter agido de maneira diferente. Está muito perturbado por ter arruinado tantas vidas. Ele quer que a senhora acredite que ele não pretendia prejudicar ninguém. Naquela ocasião, ele não podia ver o que consegue ver agora. Ele está dizendo: Eu preciso reparar o mal que causei com minhas ações.
Earl prosseguiu, contando que estava num tipo de centro terapêutico.
– Ele está me mostrando a situação em que se encontra. Eu o vejo numa atmosfera pouco iluminada, tomada pela aflição criada pela energia gananciosa dele. Ele não está sozinho. Outras pessoas como ele se encontram lá. Elas têm atitudes e comportamentos semelhantes. Há muita escuridão e infelicidade.
– Parece o inferno – a mulher disse com satisfação.
– Acho que a senhora está certa.
Fiz o possível para explicar para o resto da plateia o que eu estava vendo e sentindo.
– Nesse lado da vida, Earl está aprendendo como seu medo, sua ganância e seus desejos insaciáveis o cegaram. Ele achava que acumular dinheiro era mais importante do que qualquer outra coisa, e essa crença acabou se tornando a sua verdade. Agora que está vivenciando o mundo que ele mesmo criou, Earl se sente cercado por sua própria ganância e por seu próprio materialismo. Além de sofrer por seus pensamentos e ações, ele sente também a agonia daqueles a quem enganou. Ele tem muito trabalho a fazer.
Todos escutavam atentamente a história daquele espírito.
Eu me virei para voltar a falar com a mulher que estava na minha frente:
– Dona Trudy, embora a senhora conheça esse homem apenas pela maneira como ele a afetou, procure entendê-lo numa perspectiva mais ampla.
Earl continuou falando sobre a sua infância:
– Ele está me contando a história da vida dele. Ele sempre apanhava de seus dois irmãos mais velhos e era massacrado por eles. Por isso, cresceu com uma enorme falta de confiança em si mesmo. Ele queria que seu pai e seus irmãos o valorizassem, amassem e aceitassem.
– Por que você está falando sobre tudo isso? – ela perguntou. – Eu pouco me importo com o que aconteceu com ele.
Expliquei:
– Às vezes precisamos conhecer o passado de uma pessoa para compreender suas motivações. – Suspirei. – A senhora acha que é possível sentir alguma compaixão por Earl? Ele tem tentado ajudar a senhora e o Joe.
Ela ficou muito surpresa quando mencionei Joe, mas reagiu prontamente:
– Joe não precisa da ajuda dele, especialmente agora.
A seguir, Earl me enviou um novo pensamento.
– A senhora conhece um Dr. Watkins?
– Sim, ele é o médico do meu pai – respondeu o homem sentado ao lado dela, apresentando-se como seu filho Steven. Durante todo o tempo, sua atitude deixava transparecer que ele não acreditava muito no que eu estava dizendo.
Dirigi-me a ele:
– Earl está me dizendo que seu pai quase morreu, porque os médicos do hospital fizeram um diagnóstico errado. É verdade?
– Como é que o senhor sabe disso? – ele perguntou.
– Esse Dr. Watkins entrou direto no quarto do seu pai, não foi?
Enquanto eu descrevia o que o Earl estava me explicando, Steven foi ficando pálido.
– Esse Dr. Watkins enganou-se de andar e entrou no quarto do seu pai achando que ia ver outro paciente. Quando examinou seu pai, imediatamente descobriu o que nenhum dos outros médicos diagnosticara: que o seu pai tinha uma reação alérgica nos pulmões.
Houve um murmúrio de surpresa na plateia.
Steven reagiu:
– Nós nos perguntamos como aquele estranho pôde entrar no quarto do meu pai e fazer um diagnóstico correto. Aquilo não fez nenhum sentido na ocasião. Achamos que nossas orações tinham sido ouvidas e que aquele médico fora enviado por Deus.
– Sim, ele foi – confirmei. – Foi Earl que fez com que o médico saltasse no andar errado e examinasse seu pai.
– Não acredito! – Steven exclamou.
– Pois eu acredito! – gritou Dona Trudy. – Se ele conseguiu nos convencer a entregar-lhe todo o nosso dinheiro, por que não conseguiria persuadir um médico a ir onde ele queria que ele fosse?
Todo mundo riu.
Percebi que a capa de dureza dela estava começando a se desfazer. Trudy por fim compreendera que Earl não era de fato uma pessoa má, mas que simplesmente tinha se envolvido em circunstâncias ruins.
Ela olhou para o filho e, a seguir, para mim.
– Diga ao Earl que não se preocupe mais. Eu o perdoo. Ela hesitou. – O senhor pode dizer-lhe mais uma coisa?
– Claro.
– Agradeça por ter me trazido meu Joe de volta!
– Ele pode ouvir a senhora.
Pedi à plateia que enviasse amor e perdão para que Earl pudesse sair da escuridão e ir para a claridade. E disse também a Trudy quanto se orgulhava por ela ter perdoado aquele homem.
O grande segredo
Muitas vezes pude ver como as sementes do ódio, da crueldade e da negligência são plantadas na criança. Os primeiros anos de vida modelam a percepção de quem somos e têm profunda influência em nossas ações futuras. A criança espera que o adulto cuide dela e a proteja. Mas quando o adulto não tem noção do que é certo ou errado, porque não aprendeu isso com os pais, as consequências podem ser devastadoras. É desolador ver a que extremo de crueldade o ser humano é capaz de chegar.
Durante minhas comunicações com os espíritos, consigo decifrar a antiga natureza humana deles e constato como algumas são extremamente perniciosas. No entanto, sinto uma grande compaixão pela maioria deles. É muito fácil julgar os outros, porque o julgamento nos coloca numa posição de poder. Quando nos amamos tal como somos, e amamos os outros tal como são, há muito pouca razão para a crítica.
Constantemente me surpreendo ao verificar como os espíritos podem nos ajudar a expandir a nossa compreensão enquanto passamos pela Terra. Na próxima comunicação com um espírito, espero que você veja uma situação muito perturbadora sob uma nova perspectiva.
– Qual é o seu nome, por favor? – perguntei à bonita loura sentada na fileira do meio.
– Cassandra, mas todos me chamam de Sandy.
Enquanto sintonizava o campo energético dela, pude imediatamente perceber a sua aura multicolorida. Do pescoço para cima, percebiam-se belas emanações de dourado, azul e cor-de-rosa. Isso indicava uma grande capacidade de amar que poderia ser aplicada à espiritualidade, se ela assim o decidisse.
Em geral, quando os meus guias espirituais me mandam examinar a aura de uma pessoa, eles o fazem para que eu possa ver se ela está se agarrando a um padrão antigo, um sofrimento passado ou um trauma emocional. Se esse sofrimento passado não for tratado, ele poderá afetar a saúde física, mental, espiritual e emocional do corpo. No caso de Sandy, para mim ficou bastante óbvio que alguma coisa estava errada. Na aura dela havia algo que vejo frequentemente. Na parte central do seu corpo, entre o coração e o umbigo, vi cores escuras, marrons e acinzentadas. As vibrações dessas cores eram muito lentas. Eu sabia que, nessa área, as cores deveriam ser verdes e amarelas, e a frequência da vibração, muito mais rápida. As cores mais escuras em Sandy me mostraram que ela estava emocionalmente fechada. Alguma coisa lhe acontecera, e ela estava com medo de sentir.
Eu a confrontei.
– Sandy, você é uma pessoa que tem grandes ideais, mas que sente medo de deixar uma pessoa se aproximar de você emocionalmente. Isso é verdade?
– Sim, acho que sim. – Ela deu uma risada nervosa. – É bem possível.
Eu a sintonizei num nível mais profundo.
– Você foi traída, há muito tempo, por alguém em quem confiava. Correto?
– Não sei. Isso não acontece com todo mundo? – ela perguntou.
– Não, não necessariamente – respondi.
A seguir, vi girando do lado esquerdo dela uma energia que se manifestou como um homem. Senti que ele estava ligado àquela situação e que era ou o pai ou um tio dela. Recebi uma informação daquele espírito.
– Você reconhece o nome Alfred? – perguntei.
Sandy olhou para baixo. Percebi que aquela era a última pessoa que ela podia esperar que aparecesse. Seus olhos se encheram de lágrimas e o rosto ficou muito vermelho.
Repeti a pergunta:
– Você conhece um Alfred?
– Sim, é o irmão do meu pai. Meu tio Alfred.
Eu podia sentir seu desconforto ao falar sobre ele.
– Ele deseja enviar amor para a família e está me dizendo que dezembro foi significativo.
– Ele morreu em dezembro.
A seguir, muito de repente, Alfred me mostrou algumas imagens, pedindo que as transmitisse para Sandy.
– Ele está me mostrando um relógio de bolso e uma escada. Você sabe do que se trata?
Totalmente surpresa, Sandy olhou nos meus olhos, e percebi que tinha atingido um ponto sensível.
– Dane-se ele e tudo mais! – ela gritou.
Eu sabia, como no caso de Dona Trudy, que uma reação de raiva muitas vezes é gerada por uma mágoa profunda.
Mentalmente perguntei a Alfred: “Por que você está aqui?”
Ele respondeu mentalmente: Para curar o coração dela. Sou o responsável por isso. Preciso reparar meu erro.
Sandy me perguntou, enquanto eu falava com o espírito:
– Ele está lhe contando sobre a escada e o relógio?
– Não, não está. – Tive uma forte sensação de que aquele homem estava muito envergonhado. – Ele quer que eu lhe diga que ele sente muito. Acha que você não vai compreender, mas ele sente muito.
– Sente muito? Você está me gozando? Será que ele não percebe que arruinou minha vida? Nunca pude ter um relacionamento decente… – A voz dela quase sumiu.
A plateia ficou em silêncio, esperando ouvir mais.
Sandy levantou o rosto.
– Os homens que escolho ou me batem ou me usam de alguma maneira. Tudo isso graças ao bom tio Alfred.
Fiquei surpreso com a sinceridade com que ela se expunha na frente de um bando de desconhecidos. Mas sabia que aquela comunicação poderia ser benéfica não apenas para ela, mas para as outras pessoas da plateia que podiam se identificar com aquela experiência.
O Alfred continuava repetindo: Diga a ela quanto eu sinto.
Em vez de acolher o que eu dizia, Sandy me perguntou:
– Você sabe o que o relógio de bolso e a escada significam? – E prosseguiu imediatamente: – Meus pais saíam todos os sábados à noite. Tio Alfred ficava tomando conta de meu irmão e de mim. Quando meu irmão adormecia, meu tio perguntava se eu queria dar corda no relógio de bolso dele. Eu dizia que sim. Ele dizia que, se eu fosse boazinha, o encontraria na prateleira do armário embaixo da escada. Você compreende? Ser boazinha era deixar ele me tocar… – Mais uma vez a voz dela sumiu.
– Quanto tempo isso durou? – perguntei. – Você contou isso para alguém?
– Cinco anos, e não, não contei a ninguém, e me arrependo de não ter contado para a minha família. Guardei esse segredo dentro de mim a vida inteira – ela disse com muita amargura na voz.
Alfred mentalmente me enviou diversos pensamentos:
– Ele quer que você compreenda que, quando era pequeno, também sofreu abuso, e associou amor a abuso.
– Estou pouco me importando! Ele devia saber o mal que estava fazendo, já que também aconteceu com ele.
O abuso sexual é algo muito difícil de ser encarado e curado.
– Bem, este talvez seja um começo. Pelo menos, você está falando sobre esse assunto. Quanto mais você falar sobre a mágoa e a dor, mais conseguirá deixá-las para trás.
Ela ficou quieta, pensando no que eu tinha acabado de dizer.
Alfred continuava me enviando seus pensamentos.
– Ele está terrivelmente arrependido de ter magoado você. Ele quer que você, por favor, tente compreender.
– Não sei se posso. Eu deveria ter contado isso para alguém, mas não sabia como. Eu me arrependo de não ter dito nada.
– Você era uma menininha. Não se castigue pelo que aconteceu.
A seguir, Alfred me enviou a imagem de um carro voando pelo ar.
– Alfred sofreu um acidente de carro? Foi assim que ele morreu?
– Sim, ele estava bêbado e saiu da estrada.
– Ele caiu num despenhadeiro? – perguntei.
– Caiu, sim.
A seguir, recebi um pensamento incomum e o transmiti:
– Sandy, seu tio está me dizendo que não estava bêbado no acidente de carro.
– Não? E daí?
– Ele está me dizendo que sentia tanta vergonha de ter molestado você, que não conseguia mais viver com essa culpa. Ele se matou.
– O quê? – ela balbuciou surpresa.
– Ele quer que você saiba que não foi a única pessoa que sofreu. Ele lhe traz o amor dele e está pedindo a sua compreensão.
Ao ouvir essas palavras, Sandy desmoronou e chorou copiosamente. Suas lágrimas tinham levado anos para se formar, e, a cada soluço, as energias marrom e cinza que a cercavam iam ficando cada vez mais fracas.
Existem muitos tipos de arrependimento. Há os insignificantes, como não ter telefonado para alguém no dia do aniversário, ou não ter comprado uma ação antes que o valor dela subisse. Os arrependimentos maiores incluem coisas como não aceitar um determinado emprego, ou não protestar quando um amigo lhe conta uma piada racista. Por fim, além desses, existem os grandes arrependimentos como o que acabamos de ver.
Os arrependimentos podem apodrecer dentro de nós, causando uma vida de equívocos e críticas e mantendo-nos num estado de estresse e pesar constante. O arrependimento se prende à nossa aura, causando muitos problemas em níveis diferentes. Se pudéssemos ver como os arrependimentos embaçam nosso raciocínio, nossas decisões e nosso entendimento espiritual, deixaríamos de lado aquilo que não podemos mudar e faríamos as pazes com nós mesmos.
Até as piores ofensas podem ser perdoadas. Como no caso de Sandy, a mera abertura a uma nova percepção a ajudou a desapegar-se de seu desapontamento. Ao sentir compaixão pelo tio, que tinha vivenciado circunstâncias semelhantes, ela pôde começar a reparar o dano feito à sua alma. Por fim, ela precisaria descobrir, em seu coração, a vontade de se perdoar, de se amar e de se sentir digna. Esses são os ingredientes necessários para a cura total.