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Sedução

Art. 217

Artigo revogado pela Lei 11.106/2005.

Estupro de vulnerável

Art. 217-A

Sujeito ativo

Qualquer pessoa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).

Sujeito passivo

A pessoa vulnerável (menor de 14 anos, enfermo ou deficiente mental, sem discernimento para a prática do ato, ou pessoa com incapacidade de resistência) (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).

Objeto jurídico

A proteção à liberdade sexual (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).

Objeto material

A pessoa vulnerável (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).

Elementos objetivos do tipo

Ter (conseguir, alcançar) conjunção carnal (cópula entre pênis e vagina) ou praticar (realizar, executar) outro ato libidinoso (qualquer ação relativa à obtenção de prazer sexual) com menor de 14 anos, com alguém enfermo (doente) ou deficiente (portador de retardo ou insuficiência) mental, que não possua o necessário (indispensável) discernimento (capacidade de distinguir e conhecer o que se passa, critério, juízo) para a prática do ato, bem como com alguém que, por outra causa (motivo, razão), não possa oferecer resistência (força de oposição contra algo). As figuras estão previstas no caput e no § 1.º, do art. 217-A. A pena é de reclusão, de oito a quinze anos. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.

Elemento subjetivo do tipo específico

É a busca da satisfação da lascívia, implícito no tipo (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1). É que se pode chamar de elemento subjetivo de tendência (a ação segue acompanhada de determinado ânimo, que é indispensável à sua realização), tal como se dá nos delitos sexuais (cf. Bustos Ramírez, Obras completas, v. I, p. 834). Igualmente: Jiménez Martínez, Elementos de derecho penal mexicano, p. 514.

Elemento subjetivo do crime

É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).

Classificação

Comum; material; de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.

Tentativa

É admissível.

Momento consumativo

Com a conjunção carnal ou com a prática de qualquer outro ato libidinoso, independentemente de ejaculação ou satisfação efetiva do prazer sexual.

Crime qualificado pelo resultado lesões graves (art. 217-A, § 3.º)

Se da conduta do agente, exercida com violência ou grave ameaça, resultar lesão corporal de natureza grave (são as hipóteses descritas no art. 129, §§ 1.º e 2.º, do CP) para a vítima, a pena é de reclusão, de dez a vinte anos. O delito qualificado pelo resultado poder dar-se com dolo na conduta antecedente (violência sexual) e dolo ou culpa quanto ao resultado qualificador (lesão grave). Logo, são as seguintes hipóteses: a) lesão grave consumada + estupro consumado = estupro consumado qualificado pelo resultado lesão grave; b) lesão grave consumada + tentativa de estupro = estupro consumado qualificado pelo resultado lesão grave, dando-se a mesma solução do latrocínio (Súmula 610 do STF). Consultar o item “hipóteses possíveis”, comentando o art. 157 (Capítulo II). O crime é hediondo (art. 1.º, V, da Lei 8.072/90).

Crime qualificado pelo resultado morte (art. 217-A, § 4.º)

Se da conduta do agente, exercida com violência ou grave ameaça, resultar em morte da vítima, a pena é de reclusão, de 12 a 30 anos. O crime pode ser cometido com dolo na conduta antecedente (violência sexual) e dolo ou culpa quanto ao resultado qualificador (morte). Afiguram-se as seguintes hipóteses: a) estupro consumado + morte consumada = estupro consumado com resultado morte; b) estupro consumado + homicídio tentado = tentativa de estupro seguido de morte; c) estupro tentado + homicídio tentado = tentativa de estupro seguido de morte; d) estupro tentado + homicídio consumado = estupro consumado seguido de morte. Tecnicamente, dá-se uma tentativa de estupro seguido de morte, pois o delito sexual não atingiu a consumação. Porém, tem-se entendido possuir a vida humana valor tão superior à liberdade sexual que, uma vez atingida fatalmente, deve levar à forma consumada do delito qualificado pelo resultado. É o que ocorre no cenário do latrocínio, cuja base é a Súmula 610 do STF (“Há crime de latrocínio, quando o homicídio se consuma, ainda que não realize o agente a subtração de bens da vítima”).

Particularidades

a) A relação sexual pode ter sido “consentida” pelo ofendido, que, após, não reclama e pode até ter apreciado. Entretanto, por regras de experiência, captadas pelo legislador, é vedada a prática sexual com tais pessoas, visto que a maioria não tem discernimento suficiente, nem condições de autorizar o ato, logo, a vulnerabilidade de suas situações indica a presunção de ter sido violenta a prática do sexo. De todo modo, são previstas as formas qualificadas pelo resultado, pois é possível ocorrer a relação sexual com efetivo emprego de violência. Nesse caso, o resultado pode atingir consequências mais graves, como as lesões ou a morte da vítima. Em suma, por ser tipo penal especial em relação ao art. 213, sempre que a prática sexual envolver menor de 14 anos, enfermo ou deficiente mental ou incapaz de resistir, tipifica-se como estupro de vulnerável, levando-se em conta o art. 217-A.

b) Deve-se considerar o estupro de vulnerável e suas formas qualificadas pelo resultado nos mesmos termos em que se confere tratamento ao roubo e suas formas qualificadas, afinal, na essência, são idênticas modalidades de crimes compostos por duas fases, contendo dois resultados. Assim sendo, exige-se dolo na conduta antecedente (violência ou grave ameaça gerando o constrangimento) e dolo ou culpa no tocante ao resultado qualificador (lesão grave ou morte). Justamente por existirem, como possíveis, dois resultados (constrangimento violento + lesão ou morte), previu o legislador um crime único, com penalidade própria (§§ 3.º ou 4.º do art. 217-A, CP). Não está autorizado o juiz a quebrar essa unidade, visualizado concurso material (estupro + homicídio, por exemplo), onde não existem duas ações completamente distintas. Da conduta violenta, no cenário sexual, advém a morte da vítima. Inexiste concurso de delitos, mas um crime qualificado pelo resultado. Aplica-se, literalmente, o disposto pelo art. 19 do Código Penal, vale dizer, o resultado qualificador deve ocorrer, ao menos, culposamente.

c) Eliminou-se o disposto no art. 224 do Código Penal, relativo à presunção de violência, utilizada para conferir tipicidade aos crimes de estupro e de atentado violento ao pudor, quando obtida a relação sexual com pessoa vulnerável. Ilustrando, associava-se o art. 213 com o 224, a, do Código Penal, para criar a figura do estupro de menor de 14 anos, presumindo-se ter havido violência, em razão da incapacidade de discernimento da vítima. Cremos ter sido correta a eliminação da denominada presunção de violência, a fim de não criar a falsa dedução de que haveria, em direito penal, presunções (ilações, probabilidades) extraídas em concreto contra os interesses do acusado. Portanto, adotou a Lei 12.015/2009 a conceituação de vulnerabilidade (estado de quem está privado da capacidade de resistência, sujeito à lesão ou despido de proteção). Há variadas formas para alguém se encontrar, em algum momento da vida, vulnerável a algo. No contexto do art. 217-A, trata-se da capacidade de compreensão e aquiescência no tocante ao ato sexual. Por isso, continua, na essência, existindo a presunção de que determinadas pessoas não têm a referida capacidade para consentir. Entretanto, inseriu-se no termo vulnerável o que antes se denominava singelamente de presunção de violência. No tocante à idade da vítima, quando menor de 14 anos, tem a jurisprudência interpretado, majoritariamente, tratar-se de vulnerabilidade absoluta, que não admite prova em contrário.

d) Seguindo o prisma de união, no mesmo tipo penal, do estupro e do atentado violento ao pudor, criou-se a figura unívoca do estupro de vulnerável, já abrangendo tanto a conjunção carnal quanto a prática de qualquer outro ato libidinoso.

image  PONTO RELEVANTE PARA DEBATE

Vulnerabilidade absoluta e vulnerabilidade relativa

Pode-se argumentar, num primeiro momento, ter a Lei 12.015/2009, ao criar o tipo penal do art. 217-A, sem nenhuma menção à presunção de violência, provocado a eliminação do debate acerca do grau de incapacidade para a compreensão do ato sexual. Em outros termos, a vulnerabilidade seria absoluta. Ter relação sexual com menor de 14 anos seria, sempre, estupro (art. 217-A). Assim não pensamos. A alteração da forma típica de descrição do estupro de pessoa incapaz de consentir na relação sexual foi positiva, mas não houve descriminalização da conduta. Ao contrário, gerou elevação da pena. Portanto, tendo ocorrido simples inovação de redação do tipo, não há força suficiente para alterar a realidade, nem tampouco os debates havidos, há anos, nas cortes brasileiras, ao menos em relação à presunção de violência ser absoluta ou relativa quanto ao menor de 14 anos. Expusemos em tópico anterior ter sido absorvida a presunção de violência pela nova denominação de vulnerabilidade. Ora, é preciso considerar, então, se esta vulnerabilidade é absoluta (não admite prova em contrário) ou relativa (admite prova em contrário). Partimos do seguinte ponto básico: o legislador, na área penal, continua retrógrado e incapaz de acompanhar as mudanças de comportamento reais na sociedade brasileira, inclusive no campo da definição de criança ou adolescente. Perdemos uma oportunidade ímpar para equiparar os conceitos com o Estatuto da Criança e do Adolescente, ou seja, criança é a pessoa menor de 12 anos; adolescente, quem é maior de 12 anos. Logo, a idade de 14 anos deveria ser eliminada desse cenário. A tutela do direito penal, no campo dos crimes sexuais, deve ser absoluta, quando se tratar de criança (menor de 12 anos), mas relativa ao cuidar do adolescente (maior de 12 anos). Desse modo, continuamos a sustentar ser viável debater a capacidade de consentimento de quem possua 12 ou 13 anos, no contexto do estupro de vulnerável. Havendo prova de plena capacidade de entendimento da relação sexual (ex.: pessoa prostituída), não tendo ocorrido violência ou grave ameaça real, nem mesmo qualquer forma de pagamento, o que poderia configurar o crime do art. 218-B, o fato pode ser atípico ou comportar desclassificação. Notícia de 12 de novembro de 2010, nos principais jornais de S. Paulo (Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo), informa a prisão de um rapaz de 18 anos, acusado de estupro de vulnerável, porque, no saguão do cinema de um shopping, estava dando um beijo num outro rapaz de 13 anos. O beijo era consentido e espelhava, apenas, a relação homoafetiva de dois jovens. Causando irritação aos frequentadores, foram instados a parar; recusando-se, acionou-se a polícia que, então, “descobriu” ser um deles menor de 14 anos. Foi o que bastou para a prisão em flagrante por estupro de vulnerável (art. 217-A, CP). Essa é a vulgarização do Direito Penal, que age como se fosse um jogo de roleta. Se ambos tivessem parado o beijo, quando advertidos, não haveria a prisão. Se fosse um casal heterossexual, possivelmente, nem mesmo seria instado a deter o beijo. Enfim, por puro casuísmo, encontrou-se um “estuprador” zanzando pelo shopping de S. Paulo. Essa situação não pode ser admitida pelo Poder Judiciário em hipótese alguma. Por isso, a relativização da vulnerabilidade é um imperativo de dignidade humana. José María Palacios Mejía, cuidando da precoce vida sexual de adolescentes em Honduras, muitos deles se juntando em uniões estáveis, já que começaram cedo a trabalhar e a participar da vida comunitária, diz ser injusta a atribuição de estuprador ao jovem que tenha relação sexual com pessoa menor de 14 anos. Inexiste, no caso, relevância jurídico-penal, tratando-se de comportamento que não entra em colisão com os cânones da vida social saudável, nem afeta a comunidade onde vivem os protagonistas. Em suma, ninguém se inquieta por um fato dessa natureza (Un caso particular de violación imprópria en la realidad hondureña, p. 973). Entretanto, ter relação sexual com pessoa menor de 12 anos, com ciência disso, provoca o surgimento da tipificação no art. 217-A, de modo absoluto, sem admissão de prova em contrário, para a tutela obrigatória da boa formação sexual da criança. No mesmo prisma, deve-se analisar o grau de enfermidade ou deficiência mental para se analisar se a vulnerabilidade é absoluta ou relativa. Considerando-a relativa está-se sinalizando para um discernimento mínimo para a relação sexual, desativando o comando existente no art. 217-A, § 1.º (“não tem o necessário discernimento para a prática do ato”). Finalmente, a vulnerabilidade pode ser relativa, conforme a causa a gerar o estado de incapacidade de resistência. A completa incapacidade torna absoluta a vulnerabilidade; a pouca, mas existente, capacidade de resistir faz nascer a relativa vulnerabilidade. Em todas as situações descritas acerca da vulnerabilidade relativa, pode-se desclassificar a infração penal do art. 217-A para a figura do art. 215. E, conforme o caso, considerar a conduta atípica.

Entretanto, nos tribunais, inclusive no STF e no STJ, vem predominando a tese de se tratar de vulnerabilidade absoluta. Parece-nos que a preocupação dos magistrados seria avalizar a prática sexual envolvendo pessoas menores de 14 anos, desde que se permita a prova do seu discernimento, piorando a situação da prostituição infantojuvenil. Entendemos os bons propósitos dessa corrente, mas é preciso lembrar que nem todas as relações sexuais de adolescentes, mormente os que são maiores de 12 anos e menores de 14, inserem-se no âmbito do sexo pago. Diante disso, pode-se atingir o exagero desproporcional e injusto de se punir um rapaz de 18 anos porque teve relacionamento sexual com sua namorada de 13 anos, dentro do mais absoluto consentimento, muitas vezes, com as bênçãos das suas famílias. Seria o Estado se imiscuindo em demasia na vida íntima das pessoas e das famílias, sem um propósito razoável, pois não está verdadeiramente em jogo a dignidade sexual nessa hipótese.

Esperamos que, com o passar do tempo, e a sedimentação da Lei 12.015/2009, a vulnerabilidade seja considerada relativa pela maioria dos tribunais.

Mediação de vulnerável para servir à lascívia de outrem (rubrica inserida pelo autor)

Art. 218

Sujeito ativo

Qualquer pessoa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).

Sujeito passivo

A pessoa menor de 14 anos (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).

Objeto jurídico

A proteção à liberdade sexual (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).

Objeto material

A pessoa menor de 14 anos induzida à satisfação da lascívia de outrem (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).

Elementos objetivos do tipo

Induzir (dar a ideia, sugerir, persuadir) alguém menor de 14 anos a satisfazer (realizar, saciar) a lascívia (prazer sexual) de outrem. A pena é de reclusão, de dois a cinco anos. A figura criada pela Lei 12.015/2009 é desnecessária e somente trará confusão na sua aplicação. Em primeiro lugar, criou-se, na verdade, uma exceção pluralística à teoria monística, ou seja, a participação moral no estupro de vulnerável passa a ter pena mais branda. Afinal, se utilizássemos apenas o disposto no art. 29 do CP, no tocante ao induzimento de menor de 14 anos a ter relação sexual com outra pessoa, poder-se-ia tipificar na figura do art. 217-A (consumado ou tentado). No entanto, passa a existir figura autônoma, beneficiando o partícipe. Pode-se sustentar, num primeiro momento, que o verbo nuclear diz respeito somente a induzir, logo, quem instigar ou auxiliar poderia responder pelo art. 217-A em combinação com o art. 29 do CP. Assim não nos parece. Deve-se utilizar a analogia in bonam partem, para produzir resultado favorável ao réu. Aliás, seria ilógico que o indutor respondesse pela figura do art. 218, enquanto o instigador, pela figura do art. 217-A, com pena muito mais elevada. Lembremos, ademais, serem similares as condutas de induzir, instigar e auxiliar, tanto que todas são formatos de participação e não de coautoria. O tipo penal do art. 218 foi criado sem título dado pelo legislador. Entretanto, a figura é similar à prevista no art. 227 do Código Penal, merecendo idêntica rubrica, adaptada ao vulnerável. A pena é de reclusão, de dois a cinco anos. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.

Elemento subjetivo do tipo específico

É a satisfação do prazer sexual de outrem. (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).

Elemento subjetivo do crime

É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).

Classificação

Comum; material (torna-se indispensável, para a consumação, que ocorra o contato sexual entre o menor e outrem). Optamos pela forma material, porque o mero induzimento (dar a ideia) é muito pouco, para justificar uma pena de reclusão, de dois a cinco anos; por isso, torna-se fundamental exigir o resultado naturalístico para a consumação (satisfação da lascívia); de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.

Tentativa

É admissível.

Momento consumativo

Com o contato sexual entre o menor de 14 anos e terceiro.

Satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente

Art. 218-A

Sujeito ativo

Qualquer pessoa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).

Sujeito passivo

A pessoa menor de 14 anos (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).

Objeto jurídico

A proteção à liberdade sexual, em especial no prisma moral (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).

Objeto material

A pessoa menor de 14 anos que presencia o ato sexual (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).

Elementos objetivos do tipo

Praticar (realizar, executar, levar a efeito), na presença (à vista de alguém, diante de alguém) de menor de 14 anos, ou induzi-lo (sugerir, persuadir) a presenciar (assistir ou ver algo) conjunção carnal (cópula entre pênis e vagina) ou outro ato libidinoso (ação geradora de prazer sexual), com a finalidade de satisfazer lascívia (luxúria, prazer sexual) próprio ou de outrem (esta última parte integra o elemento subjetivo do tipo específico). Trata-se de tipo misto alternativo, composto de duas condutas possíveis: praticar ato sexual na presença de menor de 14 anos ou persuadir o menor a presenciar qualquer ato sexual. A realização de ambas as condutas perfaz um só delito, desde que no mesmo cenário contra idêntica vítima. O crime é inédito na legislação penal brasileira e advém de taras sexuais envolvendo menores, particularmente crianças, gerando situação merecedora de punição. O agente do crime não tem contato físico com o menor de 14 anos, sob pena de incidir na figura do estupro de vulnerável (art. 217-A), mas deseja que a vítima assista ao ato sexual. A satisfação da lascívia se dá justamente em razão da audiência existente para a prática sexual sob qualquer aspecto (conjunção carnal ou outro ato libidinoso). A pena é de reclusão, de dois a quatro anos. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.

Elemento subjetivo do tipo específico

É a satisfação do prazer sexual próprio ou de outrem (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).

Elemento subjetivo do crime

É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).

Classificação

Comum; formal (torna-se dispensável, para a consumação, a efetiva satisfação da lascívia); de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.

Tentativa

É admissível.

Momento consumativo

Com a visualização, pelo menor de 14 anos, da prática sexual.

Particularidades

a) Os termos presença e presenciar não significam proximidade física, mas realização do ato sexual à vista do menor de 14 anos. Pode se configurar o delito pela visualização da prática sexual pela Internet, por filme pornográfico ou outro meio permissivo para atingir a captação das imagens pelo menor.

b) O delito do art. 218-A não se confunde com o crime previsto pelo art. 241-D da Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente). Nesta figura típica, o acesso da criança ao material pornográfico destina-se a convencê-la a com o agente praticar qualquer ato libidinoso. No caso do art. 218-A, a mera presença do menor durante a prática sexual é o objetivo do agente para a satisfação da sua lascívia ou do prazer de outrem.

c) Embora o tipo penal descreva somente o verbo induzir, por interpretação extensiva, deve-se incluir a instigação e o auxílio, afinal, são similares formas de participação.

Favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual de vulnerável

Art. 218-B

Sujeito ativo

Qualquer pessoa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).

Sujeito passivo

A pessoa menor de 18 anos e maior de 14 anos (afinal, quando menor de 14 anos for envolvido em qualquer atividade sexual, configura-se o estupro de vulnerável) ou a pessoa enferma ou deficiente mental (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).

Objeto jurídico

A proteção à liberdade sexual (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).

Objeto material

A pessoa menor de 18 e maior de 14, enferma ou deficiente mental inserida em qualquer forma de exploração sexual (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).

Elementos objetivos do tipo

Submeter (subjugar, dominar, sujeitar), induzir (dar a ideia, sugerir, persuadir) ou atrair (seduzir, chamar a atenção de alguém para algo) pessoa menor de 18 anos ou que, por enfermidade (doença) ou deficiência (retardo) mental, não tiver o necessário (indispensável) discernimento (juízo, perspicácia, critério) para a prática do ato (só pode ser o ato sexual, pois envolve prostituição e exploração sexual). Outra forma alternativa é facilitar (tornar acessível, à disposição) a prostituição ou a exploração sexual com relação às mesmas vítimas, impedir (obstar, colocar obstáculo) ou dificultar (tornar complicado) o abandono dessas práticas sexuais. O tipo penal contém, em nosso entendimento, algumas falhas. A primeira já foi apontada: é preciso que a vítima seja maior de 14 anos, pois, do contrário, estar-se-ia incidindo na figura do estupro de vulnerável (consumado ou tentado, na forma de participação). Por outro lado, denomina vulnerável o menor de 18 anos, algo incompatível com o exposto pelo art. 217-A. E repete, identicamente, o enfermo e o deficiente mental, também constantes do art. 217-A. Ora, confirma-se a intenção legislativa de apontar para a existência de graus de vulnerabilidade: absoluta (não comporta prova em contrário) e relativa (comporta prova em contrário). O menor de 18 anos é relativamente vulnerável, de modo que alguém, com 17 anos, procurando a prostituição por conta própria, sem ser seduzido à atividade por qualquer pessoa, não pode ser tutelado pela lei penal. Tem pleno discernimento para a prática sexual e vê vantagem no ato do comércio do sexo. Logo, inexistentes a submissão, o induzimento, a atração por parte de terceiro, nem mesmo a facilitação, o impedimento ou a dificuldade para abandonar aquilo que ele mesmo procurou e quer para si. O fato é atípico. De outra parte, a pessoa, com 14 anos, pode ser atraída à prostituição, sem discernimento para o mundo onde ingressa, daí por que surge a vulnerabilidade comprovada e a punição faz-se merecida de quem com esse menor tenha relação sexual. No tocante aos enfermos e deficientes mentais dá-se o mesmo: não possuindo discernimento algum para o ato sexual, a vulnerabilidade é absoluta, logo, configura-se o estupro (art. 217-A); possuindo discernimento razoável, a vulnerabilidade é relativa, portanto, pode configurar-se o art. 215, sem pagamento algum para a prática sexual, ou o art. 218-B, quando houver exploração sexual. A pena é de reclusão, de quatro a dez anos. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.

Elemento subjetivo do tipo específico

Somente existe na forma cumulada com pena de multa, prevista no § 1.º, do art. 218-B: “com o fim de obter vantagem econômica” (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).

Elemento subjetivo do crime

É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).

Classificação

Comum; material (torna-se indispensável, para a consumação, que ocorra a prostituição ou exploração sexual); de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.

Tentativa

É admissível, nas formas impedir e dificultar. Não cabe tentativa nas formas submeter, atrair, induzir ou facilitar, pois é crime condicionado. É preciso a prática da prostituição ou outra forma de exploração sexual para a consumação. Logo, a simples atração, sem chegar à prostituição é fato penalmente irrelevante.

Momento consumativo

Com a prática da prostituição ou outra forma de exploração sexual pelas vítimas.

Particularidades

a) Passa-se a prever punição para o cliente da pessoa (menor de 18, enfermo ou deficiente mental) submetida, atraída, induzida à prostituição ou outra forma de exploração sexual, bem como com a pessoa que tem a exploração sexual ou prostituição facilitada, obstada ou dificultada para o abandono. É o previsto no art. 218-B, § 2.º, I, com a mesma pena de reclusão, de quatro a dez anos. Entretanto, há de se observar não somente o caráter da vulnerabilidade, que é relativa, admitindo prova em contrário no tocante ao discernimento da vítima, como também é fundamental encontrar o menor de 18 ou o enfermo ou deficiente em situação de exploração sexual por terceiro. A prostituição, em si, não é ato criminoso. Inexiste tipificação. Logo, quer-se punir, de acordo com o art. 218-B, aquele que insere o menor de 18 anos no cenário da prostituição ou outra forma de exploração sexual, facilita sua permanência ou impede ou dificulta a sua saída da atividade. Por isso, passa-se a punir o cliente do cafetão, agenciador dos menores de 18 anos, que tenha conhecimento da exploração sexual. Ele atua, na essência, como partícipe. Não há viabilidade de configuração do tipo penal do art. 218-B, § 2.º, I, quando o menor de 18 anos e maior de 14 procurar a prostituição por sua conta e mantiver relação sexual com outrem. Afinal, ele não se encontra na “situação descrita no caput deste artigo” (expressa menção feita no § 2.º, I, parte final). Quisesse o legislador punir a prostituição juvenil por inteiro, deveria ter construído o tipo penal de forma mais clara, sem qualquer remissão ao caput.

b) Busca-se punir, igualmente, o proprietário, gerente ou o responsável pelo local em que se verifiquem as práticas referidas no caput do artigo, ou seja, onde ocorra a exploração sexual do menor de 18 anos, do enfermo ou deficiente mental. Do mesmo modo, é preciso considerar que a remissão feita ao caput exige a prova de que o menor de 18 anos, por exemplo, esteja submetido por terceiro à prostituição ou à exploração sexual. O menor de 18 anos, que age por conta própria, não permite a adequação típica às várias situações descritas no caput. Logo, o responsável pelo local onde ocorra a prostituição ou exploração sexual necessita ter conhecimento de que há submissão, atração ou induzimento à prática sexual, ou que ocorre facilitação, impedimento ou dificultação para o abandono. Do contrário, ausente o dolo, inexiste infração penal.

c) Inseriu-se, em vários tipos penais, pela Lei 12.015/2009, a expressão exploração sexual. O art. 234-C a definia, mas foi vetado. Logo, passou a constituir elemento normativo do tipo, dependente de valoração. Em primeiro plano, deve-se considerar a sua similitude com a prostituição, pois o próprio texto legal menciona a prostituição ou outra forma de exploração sexual. Explorar significa tirar proveito de algo ou enganar alguém para obter lucro. Unindo esse verbo com a atividade sexual, visualiza-se o quadro de tirar proveito da sexualidade alheia ou enganar alguém para atingir práticas sexuais. Explora-se sexualmente outrem, a partir do momento em que este é ludibriado para qualquer relação sexual ou quando o ofendido propicia lucro a terceiro, em virtude de sua atividade sexual. A expressão exploração sexual difere de violência sexual. Logo, o estuprador não é um explorador sexual. Por outro lado, exploração sexual não tem o mesmo sentido de satisfação sexual. Portanto, a relação sexual, em busca do prazer, entre pessoa maior de 18 anos com pessoa menor de 18 anos não configura exploração sexual. Desse modo, podemos considerar crimes ligados à exploração sexual as figuras dos arts. 215, 216-A, 218-B, 227, § 2.º, parte final, e § 3.º, 228, 229, 231 e 231-A.

d) Prevê-se, no caso de punição do gerente, proprietário ou responsável pelo local onde se verifique a exploração sexual, como efeito obrigatório da condenação, a cassação da licença de localização e de funcionamento do estabelecimento. Embora efeito obrigatório, o juiz precisa estabelecê-lo na sentença condenatória, propiciando a execução imediata após o trânsito em julgado. Do contrário, se omissa a decisão, parece-nos deva servir a sentença condenatória de instrumento para que, na esfera administrativa ou civil, promova-se a interdição do local. A legitimidade para tanto é, primordialmente, do Ministério Público.