Art. 328
Sujeito ativo
Qualquer pessoa, inclusive o funcionário público, quando atue completamente fora da sua área de atribuições (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração pública, levando-se em conta seu interesse patrimonial e moral (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É a função pública (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Usurpar (alcançar sem direito ou com fraude) o exercício de função pública (é o conjunto de atribuições inerentes ao serviço público, que não correspondem a um cargo ou emprego. Ex.: funcionário contratado pela administração para um serviço temporário). A pena é de detenção, de três meses a dois anos, e multa. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
Não há. Note-se que ínsito ao verbo – usurpar – já está o desejo de tomar conta do que não é seu de direito, de modo que não há necessidade de se falar em elemento subjetivo específico (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Comum; formal; de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível.
Momento consumativo
Quando houver a prática da usurpação, independentemente de prejuízo material efetivo para a administração.
Figura qualificada pelo resultado
A pena é de reclusão, de dois a cinco anos, e multa, se do fato resulta vantagem ao agente. “A lei, é certo, não falou em ‘vantagem indevida’. Aliás, seria desnecessário fazê-lo, pois é óbvio que se alguém se arroga qualidade, ofício, ou estado que não lhe diz respeito, toda e qualquer vantagem direta ou indireta, em gênero, ou em espécie, que venha a tirar do fato, é indevida, porque decorre de uma fonte indevida: a fraude ou artifício que levou outro particular a dar-lhe e a origem de tal vantagem num fato que na origem e na sucessão contém vício irremovível” (cf. Fernando Henrique Mendes de Almeida, Dos crimes contra a Administração Pública, p. 171).
Art. 329
Sujeito ativo
Qualquer pessoa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1), inclusive o funcionário público. “Se, porém, alguém comete a ação em que importa o fato, sendo embora funcionário, entender-se-á que, no caso, se equipara ao particular, pois não será considerada, logicamente, a sua qualidade eventual de funcionário para eximi-lo da responsabilidade que lhe cabe por um crime que cometeu, não na sua qualidade de funcionário, mas como qualquer particular” (cf. Fernando Henrique Mendes de Almeida, Dos crimes contra a Administração Pública, p. 176).
Sujeito passivo
É o Estado. Secundariamente, o funcionário ou outra pessoa que sofreu a violência ou ameaça. Lembremos que esta outra pessoa precisa estar acompanhada do funcionário público, encarregado da realização do ato legal, a quem presta auxílio (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração pública, levando-se em conta seu interesse patrimonial e moral (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É a pessoa agredida ou ameaçada (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Opor-se (colocar obstáculo) à execução de ato legal (é o ato lícito; o conceito de legalidade do ato não se confunde com justiça, pois contra ato injusto, mas legal, não é admissível a oposição), mediante violência ou ameaça a funcionário competente para executá-lo (fazê-lo cumprir) ou a quem lhe esteja prestando auxílio (dando apoio). A pena é de detenção, de dois meses a dois anos. Além disso, aplica-se cumulativamente a sanção resultante da violência (§ 2.º). Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
É a vontade de não permitir a realização do ato legal (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Comum; formal; de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível.
Momento consumativo
Quando houver a prática da resistência ativa, independentemente de prejuízo material efetivo para a administração.
Figura qualificada pelo resultado
A pena é de reclusão, de um a três anos, se, em razão da resistência, o ato não se executa.
Particularidades
a) não exige o tipo penal seja a ameaça grave (séria), embora deva ser a promessa de causar um mal injusto. Não se configura o delito se a pessoa “ameaça” o funcionário de representá-lo aos superiores, uma vez que é direito de qualquer um fazê-lo. Por outro lado, é preciso que tanto a violência quanto a ameaça sejam dirigidas contra a pessoa do funcionário, e não contra coisas. Lembremos, ainda, que ofensas não são ameaças, de modo que podem dar azo à configuração do desacato;
b) há diferença entre resistência ativa (vis corporalis ou vis compulsiva) e resistência passiva (vis civilis). A ativa consiste justamente no emprego de violência ou ameaça contra o funcionário público, servindo para configurar o crime; a passiva é a oposição sem ataque ou agressão por parte da pessoa, que se pode dar de variadas maneiras: fazendo “corpo mole” para não ser preso e obrigando os policiais a carregá-lo para a viatura; não se deixar algemar, escondendo as mãos; buscar retirar o carro da garagem antes de ser penhorado; sair correndo após a voz de prisão ou ordem de parada, entre outros. É o que Hungria chama de “atitude ghândica” (Comentários ao Código Penal, v. 9. p. 411), em referência à resistência passiva e política da não violência (satyagraha) recomendada pelo Mahatma Gandhi, na primeira metade do século XX, na Índia, contra os ingleses, através de conduta pela qual os indianos não atacavam os dominadores do seu território, mas também não desocupavam um determinado local, quando instados pelas forças policiais a fazê-lo. Acabavam agredidos pelos próprios agentes do Império Britânico, sem que agissem da mesma forma;
c) não basta que a vítima seja funcionário público, pois exige o tipo penal tenha ele competência para executar o ato. Se um oficial de justiça vinculado a uma Vara de Família pretende efetuar uma penhora, referente a mandado de Vara Cível, é evidente que não é “competente” para o ato. Pode, pois, o particular recusar-se a atendê-lo. Ressalte-se que o número de funcionários contra os quais se opõe o agente não faz nascer vários delitos de resistência em concurso formal, pois o objeto jurídico protegido é a administração pública, e não o interesse individual de cada um deles.
Cremos perfeitamente possível a configuração do crime de resistência se, durante a prática de um roubo, o agente voltar-se violentamente contra agentes da polícia que pretendam prendê-lo. A violência para assegurar a posse da coisa subtraída é uma, não se podendo confundir com a outra, usada para afastar o funcionário público do exercício da sua função, ainda que no mesmo contexto. Os objetos protegidos são diversos (patrimônio, no caso de roubo, e administração pública, no caso de resistência). Assim, não nos parece ser a violência decorrente do roubo, que tem por fim a obtenção da coisa móvel, a mesma utilizada contra a pessoa humana (agente do Estado) – ou mera decorrência, como alguns afirmam. Ressalte-se que a violência utilizada para matar alguém normalmente não é confundida com a que for usada contra policial que pretenda prender o homicida, respondendo o agente, nesse caso, por homicídio (ou tentativa) e resistência, em concurso material. A mesma visão deveria valer para os crimes patrimoniais violentos. Quando o roubo está consumado, há posição jurisprudencial no sentido que sustentamos: “Impossibilidade do segundo crime ser considerado como integrante do de roubo, uma vez que o primeiro já se encontrava consumado” (TJSP, Ap. 238.312-3/SP, 6.ª C., rel. Debatin Cardoso, 02.04.1998, v.u.). Entretanto, reconhecemos que há posição majoritária na jurisprudência em sentido contrário: “A resistência oposta por assaltante para evitar a prisão, quando perseguido logo após a prática do crime de roubo, não constitui crime autônomo; representa, tão somente, um desdobramento da violência caracterizadora do delito patrimonial” (STJ, REsp 173.466/PR, 6.ª T., rel. Vicente Leal, 24.08.1999, v.u., DJ 04.10.1999, p. 116).
Art. 330
Sujeito ativo
Qualquer pessoa, inclusive funcionário público. Para esta última hipótese, é indispensável que ele não esteja no exercício da sua função e a ordem não guarde relação com ela. Enfim, deve agir como se fosse particular, pois, do contrário, pode caracterizar prevaricação (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração pública, levando-se em conta seu interesse patrimonial e moral (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É a ordem dada (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Desobedecer (não ceder à autoridade ou força de alguém, resistir ou infringir) a ordem legal (comando lícito) de funcionário público. Exige-se conhecimento direto (na presença de quem emite o comando, por notificação ou outra forma inequívoca, não valendo o simples envio de ofício ou carta) por parte do funcionário ao qual se destina a ordem, sem ser por interposta pessoa, a fim de não existir punição por mero “erro de comunicação”, que seria uma indevida responsabilidade penal objetiva. A pena é de detenção, de quinze dias a seis meses, e multa. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
Não há. Note-se que o verbo desobedecer é do tipo que contém, em si mesmo, a vontade específica de contrariar ordem alheia, infringindo, violando (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo. O engano quanto à ordem a ser cumprida (modo, lugar, forma, entre outros) exclui o dolo. O fato será atípico por não existir a forma culposa (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Comum; formal; de forma livre; comissivo ou omissivo, conforme o caso concreto; instantâneo; unissubjetivo; unissubsistente ou plurissubsistente, conforme o caso. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível na forma plurissubsistente.
Momento consumativo
Quando houver a desobediência, independentemente de prejuízo material efetivo para a administração.
Particularidades
a) para configurar o delito é fundamental a inexistência de outro tipo de punição. Ressalta, com pertinência, Nélson Hungria que “se, pela desobediência de tal ou qual ordem oficial, alguma lei comina determinada penalidade administrativa ou civil, não se deverá reconhecer o crime em exame, salvo se a dita lei ressalvar expressamente a cumulativa aplicação do art. 330 (ex.: a testemunha faltosa, segundo o art. 219 do Código de Processo Penal, está sujeita não só à prisão administrativa e pagamento das custas da diligência da intimação, como a ‘processo penal por crime de desobediência’)” (Comentários ao Código Penal, v. 9, p. 420). O mesmo não ocorre com a testemunha arrolada em processo civil, que, intimada, deixa de comparecer à audiência. Pode ser conduzida coercitivamente, mas não será processada por desobediência, em face da inexistência de preceito autorizador, como existe no Código de Processo Penal em relação à testemunha arrolada em processo criminal. Aliás, nesse contexto inclua-se o caso da ausência do réu, que tem o direito de estar presente às audiências do seu processo, mas não o dever. Logo, a sua falta já provoca consequência, que é o seu desinteresse em acompanhar a instrução com prejuízo para a autodefesa. Além do mais, conforme o caso, havendo indispensável necessidade da sua presença, pode o juiz conduzi-lo coercitivamente ao fórum ou, conforme a situação, decretar a sua prisão processual. Não pode, no entanto, determinar que seja processado por desobediência. A negativa do acusado, por outro lado, ao fornecimento de seus dados pessoais para a qualificação, algo que não está abrangido pelo direito ao silêncio, pode configurar o delito do art. 330 (questão que abordamos ao tratar do direito ao silêncio em nossa obra O valor da confissão como meio de prova no processo penal, p. 169). Portanto, havendo sanção administrativa ou processual, sem qualquer ressalva à possibilidade de punir pelo crime de desobediência, este não se configura;
b) quanto à questão referente à autoacusação, o réu pode não comparecer às audiências, mas deve fornecer seus dados pessoais para a qualificação em interrogatório. É preciso verificar que o direito ao silêncio guarda importante sintonia com a ausência do dever de se autoacusar. Outro exemplo é a inviabilidade de se obrigar alguém a fornecer material grafotécnico ou a participar de reconstituição de crime. O Estado deve obter, através do poder coercitivo que possui, as provas necessárias em outras fontes. Na realidade, muitas vezes, acaba sendo pior para o indiciado/réu não participar da reconstituição, porque sua versão não será computada, ou então deixar de fornecer material para o exame grafotécnico, que poderia excluí-lo, desde logo, das suspeitas que pesam contra sua pessoa. Por isso, é de se deixar ao seu critério, mas sem a ameaça do processo por crime de desobediência;
c) quanto à distinção do delito de desobediência e da contravenção de recusa de dados sobre a própria identidade ou qualificação, devemos ressaltar que o art. 68, caput, da Lei de Contravenções Penais (“recusar à autoridade, quando por esta justificadamente solicitados ou exigidos, dados ou indicações concernentes à própria identidade, estado, profissão, domicílio e residência”), aparentemente, conflita com o delito de desobediência. Assim não é. A Lei de Contravenções Penais estipulou, no art. 3.º, que, “para a existência da contravenção, basta a ação ou omissão voluntária”. O dolo ou a culpa somente são exigidos quando expressamente constarem do tipo. Logo, confrontando-se o disposto nessa Lei com o Código Penal, nota-se que, havendo dolo (embutido no verbo, como já mencionado, o elemento subjetivo específico, que é a vontade de insurgir-se contra quem deu a ordem) é caso de aplicação do crime de desobediência e não simplesmente da contravenção penal. Resta a esta, para quem ainda entende possível a sua configuração livre de dolo, bastando a voluntariedade, um campo de aplicação mais restrito (ex.: pessoa que não fornece seus dados à polícia, na via pública, para evitar ser testemunha de algum delito, mas sem a intenção de transgredir ordem legal). Por outro lado, caso seja acolhida a posição tomada por doutrina majoritária, atualmente, no sentido de que para todas as contravenções penais também deve ser exigida a prova do dolo ou da culpa, torna-se inaplicável a contravenção do art. 68, tendo em vista que a intenção de violação, de afronta à ordem dada legalmente, acarreta infração penal mais grave, que é a desobediência. É também a nossa posição, incluindo-se como fundamento o princípio da intervenção mínima, associado, naturalmente, ao princípio da culpabilidade (ver a nota 387 à Lei de Contravenções Penais em nosso Leis penais e processuais penais comentadas). Há nítida subsidiariedade da contravenção do art. 68 em face do disposto no art. 330 do Código Penal. Aliás, é a mesma situação que ocorre quando o sujeito atribui a si mesmo falsa identidade, com o fito de obter vantagem (note-se nesse caso que, além do dolo, há a especificidade da vontade). Havendo o referido elemento subjetivo específico, deve responder pelo art. 307 do Código Penal, e não pela contravenção penal do art. 68, parágrafo único (“(...) quem, nas mesmas circunstâncias, faz declarações inverídicas a respeito de sua identidade pessoal, estado, profissão, domicílio e residência”), que é igualmente subsidiário – a bem da verdade, nesta hipótese, explicitamente, ao mencionar: “se o fato não constitui infração penal mais grave”. Finalize-se, ressaltando que o delito previsto no art. 330 tem como objeto jurídico a administração em geral, que é seriamente comprometida, quando o indiciado/réu nega a sua qualificação. Deve-se, pois, reservar a contravenção penal para casos outros, que não envolvam esse específico contexto, para quem a entende aplicável ainda.
Cremos, conforme o caso, poder configurar o crime de desobediência. É certo que o sigilo profissional é previsto em lei e até mesmo o Código Penal o reconhece e protege (art. 154 – violação de segredo profissional), embora nenhum direito seja absoluto. O médico deve guardar sigilo sobre o prontuário do paciente, a fim de assegurar o seu direito à intimidade, como preceitua o Código de Ética Médica (ainda assim, pode revelar fato de que tenha conhecimento em razão da profissão se houver motivo justo, dever legal ou consentimento, por escrito, do paciente – art. 73 da Resolução 1.931, de 17.09.2009, do Conselho Federal de Medicina). E, do mesmo modo, o gerente de um banco deve assegurar o sigilo pertinente à movimentação da conta bancária do seu cliente, com o mesmo fito de garantir a intimidade. Ocorre que, para colaborar com o Poder Judiciário, na sua tarefa de apurar lesões ou ameaças a direito, pode o sigilo ser rompido, visto não haver direito absoluto. Se pode o sigilo bancário ser quebrado por ordem do magistrado, por que não poderia o sigilo médico? Por isso, quando for indispensável para apurar um crime – como a configuração da materialidade em crimes que deixam vestígios –, é lógico que deve o médico enviar ao juiz a ficha de atendimento do paciente (por vezes, vítima do crime que está sendo apurado), a fim de se formar um juízo acerca da prova. Não fosse assim e estar-se-ia negando aplicação ao art. 5.º, XXXV, da Constituição Federal (“a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”). É evidente que o caso concreto irá determinar o melhor caminho a seguir. Se o juiz deseja informações sobre o prontuário de um paciente que faz terapia, a fim de melhor conhecer sua personalidade, pode o médico recusar-se a fornecer, embora deva responder ao ofício, e não simplesmente ignorá-lo. Entretanto, no caso da ficha de atendimento, onde constam lesões corporais aptas a demonstrar até mesmo a ocorrência de uma tentativa de homicídio ou de outro crime grave qualquer, não se pode assimilar o sigilo médico como razoável. A lesão causada à vítima precisa ser apurada e depende, diretamente, da colaboração do médico, de forma que o Código de Ética não será, jamais, superior à própria Constituição Federal. Registre-se o disposto, atualmente, no art. 12, § 3.º, da Lei 11.340/2006, que cuida da violência doméstica: “serão admitidos como meios de prova os laudos ou prontuários médicos fornecidos por hospitais e postos de saúde”. Confirma-se a inviabilidade de se alegar sigilo médico para a formação da materialidade de um crime. Em sentido contrário, considerando justa causa para romper o sigilo apenas o consentimento do ofendido, denúncia de doença cuja notificação é compulsória, estado de necessidade e exercício regular de direito, encontramos: TJSP, MS 102.893-3, 5.ª C., 20.02.1991, v.u., rel. Denser de Sá, RT 668/280.
Art. 331
Sujeito ativo
Qualquer pessoa. Quanto ao funcionário como sujeito ativo, entendemos, na esteira de Fragoso e Noronha (Direito Penal, v. 4, p. 307), poder haver desacato, pouco importando se de idêntica hierarquia, superior ou inferior. Um policial, prestando depoimento, pode desacatar o juiz, enquanto este pode desacatar o colega, em igual situação. Cremos, no entanto, ser preciso cautela na tipificação do delito, pois a intenção do agente pode não ser o desprestígio da função pública, mas o abuso do poder que detém (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado. Secundariamente, o funcionário público humilhado (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração pública, levando-se em conta seu interesse patrimonial e moral (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objetos materiais
É o funcionário, mas também a sua honra (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Desacatar (desprezar, faltar com o respeito ou humilhar) funcionário público no exercício da função ou em razão dela (exige-se que a palavra ofensiva ou o ato injurioso seja dirigido ao funcionário que esteja exercendo suas atividades ou, ainda que ausente delas, tenha o autor levado em consideração a função pública). Pode implicar em qualquer tipo de palavra grosseira ou ato ofensivo contra a pessoa que exerce função pública, incluindo ameaças e agressões físicas. Não se concretiza o crime se houver reclamação ou crítica contra a atuação funcional de alguém. “Simples censura, ou desabafo, em termos queixosos, mas sem tom insólito, não pode constituir desacato. Nem importa que o fato não tenha tido a publicidade que o agravasse, especialmente. Importa, unicamente, que ele tenha dado, de modo a não deixar dúvida, com o objetivo de acinte e de reação indevida ao livre exercício da função pública. (...) No que toca às palavras oralmente pronunciadas, importam o tom acre e a inflexão dada à voz, quando as testemunhas possam, ao depor sobre o fato, auxiliar na prova de que a configuração do desacato é ou pode ser concluída como inegável” (Fernando Henrique Mendes de Almeida, Dos crimes contra a Administração Pública, p. 186). Deve constar na denúncia e na sentença quais foram exatamente as expressões utilizadas pelo agente. A pena é de detenção, de seis meses a dois anos, ou multa. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
Não há. Há posição em contrário, sustentando haver a vontade específica de desprestigiar a função pública, proferindo ou tomando postura injuriosa. Assim não cremos, pois o verbo é suficiente para essa conclusão. Desacatar significa, por si só, humilhar ou menosprezar, implicando algo injurioso, que tem por fim desacreditar a função pública. Entretanto, cremos correta a posição de quem, para a análise do dolo, leva em consideração as condições pessoais do agressor, como sua classe social, grau de cultura, descontrole emocional ou ira, pois, nessas hipóteses, pode (embora não deva ser regra geral) não se configurar a vontade de depreciar a função pública – o que está ínsito ao conceito de desacato, como já mencionado (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Comum; formal; de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; unissubsistente ou plurissubsistente, conforme o caso. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível na forma plurissubsistente.
Momento consumativo
Quando houver o desacato, independentemente de prejuízo material efetivo para a administração.
Particularidades
a) a presença do funcionário é indispensável, pois o menoscabo necessita ter alvo certo, de forma que o funcionário público deve ouvir a palavra injuriosa ou sofrer diretamente o ato. Ainda que esteja à distância, precisa captar por seus próprios sentidos a ofensa, inclusive se for assistindo um programa de televisão (Antonio Pagliaro e Paulo José da Costa Júnior, Dos crimes contra a administração pública, p. 209). Se a ofensa for por escrito, caracteriza-se injúria, mas não desacato;
b) se o funcionário provoca a ofensa não configura desacato, quando o particular devolve a referida provocação, tendo em vista que não busca desprestigiar a função pública, mas dar resposta ao que julgou indevido;
c) se o funcionário público demonstra completo desinteresse pelo ato ofensivo proferido pelo agressor, não há que se falar em crime, pois a função pública não chegou a ser desprestigiada. É o que pode acontecer, quando um delegado, percebendo que alguém está completamente histérico, em virtude de algum acidente ou porque é vítima de um delito, releva eventuais palavras ofensivas que essa pessoa lhe dirige. Não se pode considerar fato típico, desde que o prestígio da administração tenha permanecido inabalável. Mas, caso o funcionário seja efetivamente humilhado, no exercício da sua função, a sua concordância é irrelevante, pois o crime é de ação pública incondicionada.
Art. 332
Sujeito ativo
Qualquer pessoa, inclusive funcionário público (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração pública, levando-se em conta seu interesse patrimonial e moral (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É a vantagem (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Solicitar (pedir ou rogar), exigir (ordenar ou reclamar), cobrar (exigir o cumprimento de algo) ou obter (alcançar ou conseguir), para si ou para outrem, vantagem (qualquer ganho ou lucro para o agente, lícito ou ilícito) ou promessa de vantagem (obrigar-se a, no futuro, entregar algum ganho a alguém), a pretexto de influir (inspirar ou incutir) em ato (pode ser lícito ou ilícito, pois o tipo penal não discrimina; deve ser futuro, e não passado) praticado por funcionário público no exercício da função. A pena é de reclusão, de dois a cinco anos, e multa. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
É a vontade de ter para si ou destinar a outrem a vantagem (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Comum; formal; de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; unissubsistente ou plurissubsistente, conforme o caso. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível na forma plurissubsistente.
Momento consumativo
Quando houver a solicitação, independentemente de prejuízo material efetivo para a administração.
Causa de aumento
A pena é aumentada da metade, se o agente alega ou insinua que a vantagem é também destinada ao funcionário.
Particularidade
Há de se exigir, para a configuração do tipo penal, que um sujeito qualquer – funcionário público ou não – solicite, exija, cobre ou obtenha de outra pessoa – funcionário ou não – qualquer vantagem, sob o pretexto de exercer influência em um funcionário público no exercício da função. Entende o STF que a influência pode ser exercida em funcionário público por equiparação, como, por exemplo, funcionário de sociedade de economia mista (HC 79.823-RJ, 1.ª T., rel. Moreira Alves, 28.03.2000, v.u., RTJ 176/1.251).
Art. 333
Sujeito ativo
Qualquer pessoa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração pública, levando-se em conta seu interesse patrimonial e moral (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É a vantagem (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Oferecer (propor ou apresentar para que seja aceito) ou prometer (obrigar-se a dar algo a alguém) vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo (prescrevê-lo) a praticar (executar ou levar a efeito), omitir (não fazer) ou retardar (atrasar) ato de ofício (é o ato inerente às atividades do funcionário). Se alguém, exemplificando, propõe vantagem (pode ser qualquer lucro, ganho, privilégio ou benefício ilícito, ou seja, contrário ao direito, ainda que ofensivo apenas aos bons costumes) a um funcionário público, levando-o a executar um ato que é sua obrigação, comete o delito previsto neste artigo. A pena é de reclusão, de dois a doze anos, e multa. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
É a vontade de fazer o funcionário praticar, omitir ou retardar ato de ofício (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Comum; formal; de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; unissubsistente ou plurissubsistente, conforme o caso. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível na forma plurissubsistente.
Momento consumativo
Quando houver o oferecimento ou a promessa, independentemente de prejuízo material efetivo para a administração.
Causa de aumento
A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário, efetivamente, retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional.
Particularidades
a) carteirada é a expressão utilizada para demonstrar o ato de autoridade que, fazendo uso de sua função, exibe seu documento funcional para conseguir algum préstimo de outra autoridade ou funcionário público. Tal ato não é corrupção ativa, podendo, no máximo, conforme o caso, configurar tráfico de influência (art. 332);
b) não se exige que, para a configuração da corrupção ativa, esteja devidamente demonstrada a corrupção passiva (art. 317). Logo, não se trata de delito bilateral.
Art. 334
Sujeito ativo
Qualquer pessoa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração pública, levando-se em conta seu interesse patrimonial e moral (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É a mercadoria, o direito ou o imposto devido (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Importar (trazer algo de fora do País para dentro de suas fronteiras) ou exportar (levar algo para fora do País) mercadoria (é qualquer coisa móvel passível de comercialização) proibida (norma penal em branco, dependente de outras regras para se saber o que é lícito importar e exportar), configurando-se o contrabando próprio, ou iludir (enganar ou frustrar), no todo ou em parte, o pagamento de imposto (é uma espécie de tributo, isto é, prestação monetária compulsória devida ao Estado em virtude de lei) ou direito (outros pagamentos necessários para a importação ou exportação de mercadorias, como a tarifa de armazenagem ou a taxa para liberação da guia de importação) ou devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo (ICMS, por exemplo) de mercadoria, aperfeiçoando o contrabando impróprio. A pena é de reclusão, de um a quatro anos. Nas mesmas penas incorre quem pratica navegação de cabotagem (“realizada entre portos ou pontos do território brasileiro, utilizando a via marítima ou esta e as vias navegáveis interiores”, conforme art. 2.º, IX, da Lei 9.432/97), fora dos casos permitidos em lei (norma penal em branco, dependente do conhecimento de outras regras); pratica fato assimilado (é o fato semelhante ao contrabando ou descaminho, previsto em legislação especial. Exemplo disso é o disposto no Decreto-lei 288/67, tratando da Zona Franca de Manaus), em lei especial, a contrabando ou descaminho; vende (aliena por certo preço), expõe à venda (deixa à mostra para alienação), mantém em depósito (conserva em determinado lugar) ou, de qualquer forma, utiliza (faz uso de algo) em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial (cuida-se de atividade habitual, desempenhada com regularidade e frequência), mercadoria de procedência estrangeira que introduziu (inseriu) clandestinamente (de modo oculto ou ilegítimo) no País ou importou fraudulentamente (onde há emprego de artifício para iludir) ou que sabe (incidência do dolo direto) ser produto de introdução clandestina no território nacional ou de importação fraudulenta por parte de outrem; adquire (obtém ou compra), recebe (aceita em pagamento ou acolhe) ou oculta (esconde ou encobre), em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria de procedência estrangeira, desacompanhada de documentação legal (trata-se de uma receptação específica para o contexto do contrabando ou descaminho), ou acompanhada de documentos que sabe serem falsos (§ 1.º). Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Norma de equiparação
Equipara-se às atividades comerciais, para os efeitos do art. 334, qualquer forma de comércio irregular ou clandestino de mercadorias estrangeiras, inclusive o exercido em residências (§ 2.º).
Elemento subjetivo do tipo específico
Não há (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo. Nas formas vender, expor à venda, manter em depósito ou utilizar em proveito próprio ou alheio mercadoria estrangeira que sabe ser produto de introdução clandestina ou importação fraudulenta, exige-se o dolo direto (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Comum (próprio nas formas previstas no § 1.º, c e d), formal (material, quando se concretizar as condutas “vender” ou “utilizar”, em proveito próprio, do § 1.º, c, ou os modos “adquirir”, “receber” e “ocultar” do § 1.º, d), de forma livre, comissivo (pode ser omissivo na modalidade “iludir o pagamento”), instantâneo (permanente nas formas “expor à venda”, “manter em depósito” e “ocultar”), unissubjetivo, unissubsistente ou plurissubsistente, conforme o caso. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível na forma plurissubsistente.
Momento consumativo
Quando houver a prática da conduta prevista no tipo, podendo inexistir resultado naturalístico (quando o delito for formal) ou concretizar-se efetivo prejuízo (na modalidade material).
Causa de aumento de pena
A pena é aplicada em dobro, se o crime de contrabando ou descaminho é praticado em transporte aéreo (§ 3.º).
Particularidades
a) pode-se aplicar, nesse contexto, o princípio da insignificância. A introdução, no território nacional, de mercadoria proibida, mas em quantidade ínfima, ou o não pagamento de pequena parcela do imposto devido configuram típicas infrações de bagatela, passíveis, conforme o caso, de punição fiscal, mas não penal;
b) a competência é da Justiça Federal, pois o imposto ou direito a ser recolhido, como regra, destina-se à União, além de que, na maioria dos casos, ocorrer o delito em região alfandegária, cuja jurisdição é federal. Excepcionalmente, pode ser da Justiça Estadual (ex.: quando deixar de ser recolhido o ICMS incidente sobre importações);
c) a diferença entre “introdução clandestina” e “importação fraudulenta” consistente no seguinte: nas duas situações, há uma forma de contrabando, embora, no primeiro caso, a mercadoria ingresse no País sem passar pela zona alfandegária. Portanto, penetra no território nacional às ocultas. Na segunda situação, o agente traz a mercadoria para o País, introduzindo-a pela zona alfandegária, mas liberando-a sem o pagamento dos impostos devidos. Em ambas, na primeira figura, o próprio agente que vende, expõe à venda, mantém em depósito ou utiliza em proveito próprio ou alheio, diretamente, introduziu ou importou a mercadoria. Há, ainda, uma segunda figura, quando o agente pratica as condutas típicas valendo-se de produto introduzido ou importado por outra pessoa.
Art. 335
Substituição deste tipo penal pela Lei 8.666/93
O delito de impedimento, perturbação ou fraude de concorrência foi substituído por lei especial, notadamente pelos seguintes artigos: “Art. 90. Frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo do procedimento licitatório com o intuito de obter, para si ou para outrem, vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação: Pena – detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa”; “Art. 93. Impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de procedimento licitatório: Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa”; “Art. 95. Afastar ou procurar afastar licitante, por meio de violência, grave ameaça, fraude ou oferecimento de vantagem de qualquer tipo: Pena – detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa, além da pena correspondente à violência. Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem se abstém ou desiste de licitar, em razão da vantagem oferecida”; “Art. 96. Fraudar, em prejuízo da Fazenda Pública, licitação instaurada para aquisição ou venda de bens ou mercadorias, ou contrato dela decorrente: I – elevando arbitrariamente os preços; II – vendendo, como verdadeira ou perfeita, mercadoria falsificada ou deteriorada; III – entregando uma mercadoria por outra; IV – alterando substância, qualidade ou quantidade da mercadoria fornecida; V – tornando, por qualquer modo, injustamente, mais onerosa a proposta ou a execução do contrato: Pena – detenção, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa”; “Art. 98. Obstar, impedir ou dificultar, injustamente, a inscrição de qualquer interessado nos registros cadastrais ou promover indevidamente a alteração, suspensão ou cancelamento de registro do inscrito: Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa”. Comentamos esses tipos penais em nossa obra Leis penais e processuais penais comentadas.
Art. 336
Sujeito ativo
Qualquer pessoa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração pública, levando-se em conta seu interesse patrimonial e moral (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É o edital, o selo ou o sinal identificador ou que cerra algo (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Rasgar (dividir em pedaços, romper ou desfazer) ou, de qualquer forma, inutilizar (tornar inútil ou destruir) ou conspurcar (macular ou sujar) edital (é o ato escrito emanado de autoridade administrativa ou judicial para dar avisos ou intimações, devendo ser afixado em locais públicos ou de acesso ao público, bem como pela imprensa, a fim de ser conhecido por alguma pessoa determinada ou por vários interessados) afixado por ordem de funcionário público; violar (devassar ou profanar) ou inutilizar selo ou sinal (qualquer marca destinada a identificar algo) empregado, por determinação legal ou por ordem de funcionário público, para identificar (determinar a identidade) ou cerrar (fechar ou encobrir) qualquer objeto. A pena é de detenção, de um mês a um ano, ou multa. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
Não há (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Comum; formal; de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível.
Momento consumativo
Quando houver a prática de qualquer das condutas previstas no tipo, podendo inexistir efetivo prejuízo material para a administração.
Particularidade
Transcorrido o prazo de validade do edital, não pode mais ser objeto material deste delito.
Art. 337
Sujeito ativo
Qualquer pessoa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado. Secundariamente, pode-se incluir a pessoa prejudicada pela subtração ou inutilização (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração pública, levando-se em conta seu interesse patrimonial e moral (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É o livro oficial, o processo ou o documento (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Subtrair (retirar ou tirar às escondidas) ou inutilizar (invalidar ou destruir), total ou parcialmente, livro oficial (é o livro criado por força de lei para registrar anotações de interesse para a administração pública), processo (refere-se o tipo, na realidade, aos autos, que é o conjunto das peças componentes do processo, incluindo-se, nesse contexto, também os autos de processo findo) ou documento (qualquer escrito, instrumento ou papel, de natureza pública ou privada) confiado à custódia (entregue, em confiança, para ser guardado) de funcionário, em razão de ofício, ou de particular em serviço público (excepcionalmente, pode-se encontrar um particular atuando em função pública, como, por exemplo, o perito judicial nomeado que recebe documentos para realizar um exame). A pena é de reclusão, de dois a cinco anos, se o fato não constitui crime mais grave. Cuida-se de infração penal subsidiária, ou seja, somente se pune a conduta descrita neste tipo penal caso não se configure delito mais grave (ex.: art. 305). Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
Não há (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Comum; formal; de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível.
Momento consumativo
Quando houver a prática de qualquer das condutas previstas no tipo, podendo inexistir efetivo prejuízo material para a administração.
Art. 337-A
Sujeito ativo
Somente os administradores de empresa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado, especificamente o INSS (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a proteção à seguridade social (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É a folha de pagamento, o título próprio da contabilidade da empresa, a receita, o lucro auferido, a remuneração paga ou creditada ou outro fato gerador de contribuição previdenciária (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Suprimir (eliminar ou fazer desaparecer) ou reduzir (diminuir) contribuição social previdenciária (espécie de tributo destinada à seguridade social) e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:
a) omitir (deixar de fazer ou mencionar algo) de folha de pagamento (montante total da remuneração que o empregador irá pagar aos trabalhadores colocados a seu serviço) da empresa ou de documento de informações previsto pela legislação previdenciária, segurado empregado (pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário), empresário (titular de firma individual urbana ou rural), trabalhador avulso (trabalhador, urbano ou rural sem vínculo, a diversas empresas, com intermediação do sindicato da categoria) ou trabalhador autônomo (prestador de serviços de natureza urbana ou rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego) ou a este equiparado (ex.: garimpeiro, ministro de confissão religiosa) que lhe prestem serviços;
b) deixar de lançar mensalmente nos títulos próprios da contabilidade da empresa as quantias descontadas dos segurados ou as devidas pelo empregador (pessoa que admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço) ou pelo tomador de serviços;
c) omitir, total ou parcialmente, receitas (é o faturamento da empresa ou do empregador, que significa o ganho bruto das vendas de mercadorias e de serviços de qualquer natureza) ou lucros auferidos, remunerações pagas ou creditadas e demais fatos geradores de contribuições sociais previdenciárias. A pena é de reclusão, de dois a cinco anos, e multa. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
Cremos haver a exigência, como em todo delito de natureza fiscal, do elemento subjetivo específico, que é a vontade de fraudar a previdência, deixando de pagar a contribuição (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Próprio; formal; de forma livre; omissivo; instantâneo; unissubjetivo; unissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
Não é admissível.
Momento consumativo
Quando houver a prática de qualquer das condutas previstas no tipo, independentemente da constatação de efetivo prejuízo material imediato para o INSS.
Causa de extinção da punibilidade
Ocorre a extinção da punibilidade se o agente, espontaneamente (sem subterfúgio, com sinceridade), declara (demonstra à previdência o montante que deveria ser recolhido, mas não foi pela omissão de dados praticada) e confessa (afirma o devido) as contribuições, importâncias ou valores e presta as informações devidas à previdência social, na forma definida em lei ou regulamento, antes do início da ação fiscal (pensamos ser o início da propositura da ação para cobrar o devido em juízo; há quem defenda bastar a tomada de medida administrativa contra o devedor – § 1.º).
Perdão judicial
O juiz pode deixar de aplicar a pena ou aplicar somente a de multa se o agente for primário (ver o conceito no capítulo relativo à reincidência) e de bons antecedentes (ver o conceito no capítulo da aplicação da pena, dentre as circunstâncias judiciais), desde que o valor das contribuições devidas, inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele estabelecido pela previdência social, administrativamente, como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas execuções fiscais (§ 2.º). Não se deve confundir, no entanto, pequeno valor, não justificador da ação fiscal do Estado, com valor ínfimo. Este último permite a configuração do crime de bagatela, isto é, a aplicação do princípio da insignificância, que torna atípica a conduta de não recolher ou repassar quantia ínfima à previdência social.
Causa de diminuição da pena
Se o empregador não é pessoa jurídica e sua folha de pagamento mensal não ultrapassa R$ 2.214,79 (valor de 2004, apenas para servir de exemplo), o juiz poderá reduzir a pena de um terço até a metade ou aplicar apenas a de multa (§ 3.º). Esse valor será reajustado nas mesmas datas e nos mesmos índices do reajuste dos benefícios da previdência social (§ 4.º).
Particularidade
É crime da competência da Justiça Federal e a ação é pública incondicionada.