Art. 338
Sujeito ativo
Somente o estrangeiro oficialmente expulso do país (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração da justiça (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É o ato oficial de expulsão do governo brasileiro (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Reingressar (voltar, ingressar novamente) no território nacional (todo espaço onde o Brasil exerce a sua soberania) o estrangeiro (é a pessoa que possui vínculo jurídico-político com outro Estado, que não o Brasil. Por exclusão, o estrangeiro é aquele que não é considerado brasileiro) que dele foi expulso (é a exclusão, por castigo, do estrangeiro que apresenta indícios sérios de periculosidade ou indesejabilidade no País). A pena é de reclusão, de um a quatro anos, sem prejuízo de nova expulsão após o cumprimento da pena. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
Não há (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Próprio (particularmente, de mão própria); formal; de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível.
Momento consumativo
Quando houver o reingresso, podendo inexistir efetivo prejuízo material para o Estado.
Particularidades
a) dispõe a Lei 6.815/80 (art. 67) que o cumprimento de pena não pode servir de pretexto para evitar a expulsão do estrangeiro, desde que seja conveniente ao interesse nacional. Portanto, entendemos que está revogada a ressalva final (“após o cumprimento da pena”) estabelecida no preceito secundário do artigo 338;
b) o crime é da competência da Justiça Federal (art. 109, X, CF).
Art. 339
Sujeito ativo
Qualquer pessoa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado. Secundariamente, a pessoa prejudicada pela falsa informação (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração da justiça (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É a investigação policial, o processo judicial, a investigação administrativa, o inquérito civil ou a ação de improbidade administrativa indevidamente instaurados (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Dar causa (dar motivo ou fazer nascer algo) à instauração de investigação policial (necessita ser o inquérito policial – que é procedimento administrativo de persecução penal do Estado, destinado à formação da convicção do órgão acusatório, instruindo a peça inaugural da ação penal –, não se podendo considerar os meros atos investigatórios isolados, conduzidos pela autoridade policial ou seus agentes, proporcionados pelo simples registro de ocorrência), processo judicial (envolve não somente as ações penais – sempre de interesse público, mas também as ações civis públicas), investigação administrativa (sindicâncias e processos administrativos de toda ordem), inquérito civil (procedimento administrativo, presidido pelo Ministério Público com a finalidade de colher provas para eventual propositura de ação civil pública) ou ação de improbidade administrativa (ação ajuizadas para apurar atos de improbidade administrativa previstos na Lei 8.429/92) contra alguém, imputando-lhe (atribuir algo a alguém) crime (para a contravenção penal há regra especial no § 2.º) de que o sabe inocente. A pena é de reclusão, de dois a oito anos, e multa. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
É a vontade de induzir em erro a autoridade (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo na sua forma direta (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Comum; formal; de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível.
Momento consumativo
Quando houver a instauração da investigação, processo, inquérito ou ação, ainda que não ocorra efetivo prejuízo material para o Estado ou para o denunciado.
Causa de aumento de pena
A pena é elevada de um sexto, se o agente se serve de anonimato (é a posição assumida por alguém que escreve ou transmite uma mensagem sem se identificar) ou de nome suposto (é a posição de quem escreve algo ou transmite uma mensagem adotando um nome fictício) (§ 1.º).
Causa de diminuição de pena
A pena é diminuída de metade, se a imputação é de prática de contravenção (§ 2.º). O fundamento é o desvalor da conduta, isto é, a menor potencialidade lesiva que propicia à vítima da denunciação caluniosa responder por uma contravenção penal do que por um crime.
Particularidades
a) a autoridade que age de ofício pode ser sujeito ativo do crime de denunciação caluniosa. Não se exige que somente um particular provoque a ação da autoridade para a instauração de investigação administrativa ou policial, inquérito civil ou ação civil ou penal, uma vez que, para assegurar o escorreito funcionamento da máquina administrativa, pode haver procedimento de ofício. Assim, o delegado que, sabendo inocente alguém, instaura contra ele inquérito policial; o promotor que, com igual ideia, determina a instauração de inquérito civil, bem como o juiz que, tendo notícia de que determinada pessoa é inocente, ainda assim requisita a instauração de inquérito, podem responder por denunciação caluniosa;
b) há posição contrária, sustentando que qualquer tipo de investigação, desencadeada a partir da notícia falsa, independentemente de inquérito instaurado, serve para configurar o crime do art. 339 (cf. Hungria. Comentários ao Código Penal, v. IX, p. 461; Rui Stoco, Código Penal e sua interpretação jurisprudencial, p. 4.112; Jorge Assaf Maluly, Denunciação caluniosa, p. 93);
c) torna-se imprescindível, para que se julgue corretamente o crime de denunciação caluniosa, o término da investigação instaurada para apurar a infração penal imputada, bem como a ação civil ou penal, cuja finalidade é a mesma, sob pena de injustiças flagrantes. Recomenda Hungria que “conforme pacífica doutrina e jurisprudência, a decisão final no processo contra o denunciante deve aguardar o prévio reconhecimento judicial da inocência do denunciado, quando instaurado processo contra este. Trata-se de uma medida de ordem prática, e não propriamente de uma condição de existência do crime” (Comentários ao Código Penal, v. IX, p. 465-466). Em igual sentido: Paulo José da Costa Júnior, Direito penal – Curso completo, p. 734;
d) o elemento do tipo alguém demonstra, nitidamente, tratar-se de pessoa certa, não se podendo cometer o delito ao indicar para a autoridade policial apenas a materialidade do crime e as várias possibilidades de suspeitos;
e) se a punibilidade estiver extinta (pela prescrição, anistia, abolição da figura delitiva, dentre outros fatores) ou se ele tiver agido sob o manto de alguma excludente de ilicitude ou de culpabilidade, enfim, se o inquérito for arquivado ou houver absolvição, por tais motivos, não há crime de denunciação caluniosa. Tal se dá porque havia possibilidade concreta de ação da autoridade policial ou judiciária, justamente pela existência de fato típico (havendo autor sujeito à investigação ou processo), embora não seja ilícito, culpável ou punível. Nesse rumo está a lição de Hungria (Comentários ao Código Penal, v. IX, p. 462);
f) a competência para apurar a denunciação caluniosa é da Justiça Estadual ou Federal, conforme a natureza do crime que foi imputado à vítima, logo, onde será apurado, bem como em razão da qualidade do ofendido.
É comum – embora possa ser imoral ou antiético – que uma pessoa acusada da prática de um delito queira livrar-se da imputação, passando a terceiro esse ônus. Ao indicar alguém para assumir o seu lugar, pretende desviar a atenção da autoridade, livrando-se da acusação. Ainda que indique terceira pessoa para tomar parte na ação penal ou na investigação por achar que ela teve alguma participação nos fatos, não se configura o crime. Não há, nessas hipóteses, elemento subjetivo do tipo específico, consistente no desejo de ver pessoa inocente ser injustamente processada, sem qualquer motivo, prejudicando a administração da justiça. A vontade específica do agente é livrar-se da sua própria imputação. Igualmente: Hungria (Comentários ao Código Penal, v. IX, p. 463). Entretanto, não descartamos, completamente, a possibilidade de o indiciado ou réu, pretendendo vingar-se de terceiro, utilizar o inquérito, onde já está indiciado, ou o processo que lhe foi instaurado, para delatar, maldosamente, alguém. A delação, segundo cremos, é a admissão por alguém da prática do fato criminoso do qual está sendo acusado, envolvendo outra pessoa e atribuindo-lhe algum tipo de conduta delituosa, referente à mesma imputação. Não se trata, simplesmente, de acusar outrem pela prática de um delito, buscando livrar-se da imputação, pois isso é um puro testemunho. A delação, que vem sendo admitida como meio de prova pelos tribunais pátrios, implica na assunção da autoria por parte do delator (nosso livro, O valor da confissão como meio de prova no processo penal, p. 213-214). Por isso, para ser assim considerada, é indispensável que o autor de um crime admita a autoria e indique terceiro. Essa prova pode ser suficiente para uma condenação, razão pela qual atenta diretamente contra a administração da justiça. Ademais, o indiciado ou réu não necessita assumir o crime, indicando outra pessoa para também responder pelo fato, como estratégia defensiva. Sua intenção, nesse caso, não é defender-se, mas prejudicar outrem, incluindo-o onde não merece, motivo pelo qual cremos poder responder por denunciação caluniosa. Afinal, configurado está o dolo direto e o elemento subjetivo específico. Defendendo que o réu não comete, jamais, denunciação caluniosa em seu interrogatório, pois tem o ânimo de se defender, acima de tudo, está a posição de Maluly (Denunciação caluniosa, p. 62).
Art. 340
Sujeito ativo
Qualquer pessoa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração da justiça (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É a ação da autoridade (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Provocar (dar causa, gerar ou proporcionar) a ação de autoridade (o tipo menciona apenas ação, logo, podem o delegado, por exemplo, registrando um boletim de ocorrência, o promotor e o juiz, requisitando a instauração de inquérito policial, tomar atitudes em busca da descoberta ou investigação de uma infração penal, ainda que não oficializem seus atos, através da instauração do inquérito ou do oferecimento ou recebimento da denúncia), comunicando-lhe (fazendo saber ou transmitindo-lhe) a ocorrência de crime ou de contravenção que sabe não se ter verificado. A pena é de detenção, de um a seis meses, ou multa. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
É a vontade de fazer a autoridade atuar sem causa (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo na sua forma direta (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Comum; formal; de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível.
Momento consumativo
Quando houver a comunicação de infração penal inexistente, ainda que não ocorra efetivo prejuízo material para o Estado.
Particularidade
Cremos admissível a hipótese da tentativa inidônea (art. 17, CP) quando o agente, ainda que aja com vontade de provocar inutilmente a ação da autoridade, comunicando-lhe infração penal que sabe não se ter verificado, termina por fazer com que a autoridade policial ou judiciária encontre subsídios concretos de cometimento de um outro crime. Seria indevido punir o agente por delito contra a administração da justiça, já que esta só teve a ganhar com a comunicação efetuada. Aliás, também se configura crime impossível quando não há mais possibilidade de ação da autoridade (anistia, abolição do crime, prescrição, entre outros).
Art. 341
Sujeito ativo
Qualquer pessoa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração da justiça (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É a declaração falsa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Acusar-se (é a conduta do sujeito que se autoincrimina, chamando a si um crime que não praticou, seja porque inexistente, seja porque o autor foi outra pessoa), perante a autoridade (o agente do poder público que tenha atribuição para apurar a existência de crimes e sua autoria ou determinar que tal procedimento tenha início. Portanto, é a autoridade judiciária ou policial, bem como o membro do Ministério Público), de crime inexistente (não se aceita a falsa imputação de contravenção penal) ou praticado por outrem (é indispensável, para a configuração do tipo penal, que o sujeito se autoacuse da prática de crime cometido por outra pessoa, sem ter tomado parte como coautor ou partícipe). A pena é de detenção, de três meses a dois anos, ou multa. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
É a vontade de prejudicar a administração da justiça (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Comum; formal; de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível, embora de difícil configuração.
Momento consumativo
Quando houver a autoacusação, ainda que não ocorra efetivo prejuízo material para o Estado ou para terceiros.
Embora, no exercício do seu direito de defesa, que é constitucionalmente assegurado – ampla defesa – e não deve ser limitado por qualquer norma ordinária, tenha o acusado o direito de mentir, negando a existência do crime, sua autoria, imputando-a a outra pessoa, invocando uma excludente qualquer, enfim, narrando inverdades, não lhe confere o ordenamento jurídico o direito de se autoacusar falsamente. Nem em nome do princípio da ampla defesa é-lhe assegurado o direito de autoacusar-se, pois também é princípio constitucional evitar, a qualquer custo, o erro judiciário (art. 5.º, LXXV). Não havendo hierarquia entre normas constitucionais, deve o sistema harmonizar-se sem necessidade de que uma norma sobrepuje outra. Assim, sob qualquer prisma, evitar a autoacusação é tipo penal perfeitamente sintonizado com a segurança almejada pelo sistema jurídico-penal. Note-se que uma confissão, mormente quando feita em juízo, tem valor probatório dos mais fortes em nosso processo penal. Aliás, possui valor maior do que o devido, pois é costume desprezar a chance de a admissão de culpa ser falsa. Ainda assim, há contundência no depoimento de uma pessoa que, sem qualquer pressão aparente, admite, perante a autoridade, a prática de um delito. Essa conduta, se fosse penalmente admissível, iria causar a provável condenação de um inocente, com a inconsequente impunidade do autêntico autor do crime. E, não havendo delito, remanesce, ainda, o inaceitável erro judiciário do Estado, algo que a Constituição ressaltou expressamente não ser suportável, tanto que assegura indenização. Diante disso, qualquer pessoa pode defender-se, quando for acusada da prática de um delito, embora não possa ficar impune caso o faça com o ânimo de chamar a si uma responsabilidade inexistente.
Art. 342
Sujeito ativo
Somente a testemunha, o perito, o contador, o tradutor ou o intérprete (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado. Secundariamente, pode ser a pessoa prejudicada pela falsidade produzida (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração da justiça (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
Pode ser o depoimento, o laudo, o cálculo ou a tradução (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Fazer afirmação falsa (mentir ou narrar fato não correspondente à verdade), negar a verdade (não reconhecer a existência de algo verdadeiro ou recusar-se a admitir a realidade) ou calar a verdade (silenciar ou não contar a realidade dos fatos), como testemunha (é a pessoa que viu ou ouviu alguma coisa relevante e é chamada a depor sobre o assunto em investigação ou processo), perito (é a pessoa especializada em determinado assunto, preparada para dar seu parecer técnico), contador (é o especialista em fazer cálculos), tradutor (é aquele que traslada algo de uma língua para outra, fazendo-o por escrito) ou intérprete (conhecedor de uma língua, serve de ponte para que duas ou mais pessoas possam estabelecer conversação entre si), em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral. A pena é de reclusão, de dois a quatro anos, e multa (modificação da pena, para mais, introduzida pela Lei 12.850/2013). Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
É a vontade de prejudicar a administração da justiça (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Próprio (particularmente, de mão própria); formal; de forma livre; comissivo ou omissivo, conforme o caso; instantâneo; unissubjetivo; unissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
Não é admissível.
Momento consumativo
Quando houver a prática de qualquer das condutas previstas no tipo, ainda que não ocorra efetivo prejuízo material para o Estado ou para terceiros.
Causas de aumento de pena
A pena é aumentada de um sexto a um terço, se o crime é praticado mediante suborno ou se cometido com o fim de obter prova destinada a produzir efeito em processo penal, ou em processo civil em que for parte entidade da administração pública direta ou indireta (§ 1.º).
Causa de extinção da punibilidade
Se, antes da sentença no processo em que ocorreu o ilícito, o agente se retrata ou declara a verdade, o fato deixa de ser punível (§ 2.º).
Particularidades
a) a diferença fundamental entre negar a verdade e calar a verdade é que a primeira conduta leva a pessoa a contrariar a verdade, embora sem fazer afirmação (ex.: indagado pelo juiz se presenciou o acidente, como outras testemunhas afirmaram ter ocorrido, o sujeito nega), enquanto a segunda conduta faz com que a pessoa se recuse a responder (ex.: o magistrado faz perguntas à testemunha, que fica em silêncio ou fala que não responderá);
b) é essencial que o fato falso (afirmado, negado ou silenciado) seja juridicamente relevante, isto é, de alguma forma seja levado em consideração pelo delegado ou juiz para qualquer finalidade útil ao inquérito ou ao processo, pois, do contrário, tratar-se-ia de autêntica hipótese de crime impossível. Se o sujeito afirma fato falso, mas absolutamente irrelevante para o deslinde da causa, por ter-se valido de meio absolutamente ineficaz, não tem qualquer possibilidade de lesar o bem jurídico protegido, que é a escorreita administração da justiça;
c) quanto à opinião da testemunha, não configura o crime de falso, pois ela deve depor sobre fatos, e não sobre seu modo particular de pensar. Quando se indaga da testemunha sua opinião acerca de algo (como, por exemplo, a respeito da personalidade do réu), deve-se suportar uma resposta verdadeira ou falsa, valorando o magistrado da forma como achar melhor;
d) o direito de mentir da testemunha somente existe quando ela faltar com a verdade ou se calar evitando comprometer-se, vale dizer, utilizar o princípio constitucional do direito ao silêncio e de não ser obrigado a se autoacusar.
Há duas posições:
a) não é necessário o compromisso para a configuração do crime de falso, tendo em vista que toda pessoa tem o dever de dizer a verdade em juízo, não podendo prejudicar a administração da justiça. Além do mais, a formalidade do compromisso não integra mais o crime de falso, como ocorria por ocasião do Código Penal de 1890 (cf. Bento de Faria, Hungria, Noronha, Tornaghi, Tourinho Filho, Antolisei, Manzini, Maggiore, Ranieri, Marsich, Castillo, Levene, Grieco e Cantarano e Luiz Regis Prado, que fez menção aos primeiros, Falso testemunho e falsa perícia, p. 94);
b) há necessidade do compromisso, pois sem ele a testemunha é mero informante, permitindo ao juiz livre valoração de seu depoimento. Como ensina Fragoso: “Em relação à testemunha é indispensável que tenha prestado o compromisso legal, pois somente neste caso surge o dever de dizer a verdade”. Nessa posição, ainda, Espínola Filho, Menegale, Magalhães Drumond (menções de Luiz Regis Prado, ob. cit., p. 92-93).
Cremos mais acertada a segunda posição, mesmo porque é a única que está em sintonia com as regras processuais penais. O art. 203 do CPP é expresso ao mencionar que “a testemunha fará, sob palavra de honra, a promessa de dizer a verdade do que souber e lhe for perguntado (…)”. Em seguida, lê-se no art. 208: “Não se deferirá o compromisso a que alude o art. 203 aos doentes e deficientes mentais e aos menores de 14 anos, nem às pessoas a que se refere o art. 206” (neste dispositivo legal menciona-se que podem eximir-se de depor o ascendente, o descendente, o afim em linha reta, o cônjuge, ainda que separado, o irmão, o pai, a mãe e o filho adotivo do acusado). Ora, analisando-se em conjunto tais normas, tem-se o seguinte: o compromisso é o ato solene que concretiza, tornando expresso, o dever da pessoa que testemunha de dizer a verdade, sob pena de ser processada por falso testemunho. E nem se diga que é mera formalidade, cuja falta nem mesmo implica em nulidade, pois se está analisando a situação sob o prisma do sujeito ativo, e não do processo. Se a falta do compromisso vai ou não causar nulidade é irrelevante, diante da ausência propositada do alerta à pessoa que vai depor de que está obrigada a dizer a verdade. Aliás, somente poderia estar obrigada ou desobrigada de acordo com a lei. Por isso, quando o juiz olvidar o compromisso de pessoa que está legalmente obrigada a dizer a verdade, não se afasta o crime de falso. Entretanto, se, ao contrário, a ela expressamente não deferir o compromisso, deixando claro tratar-se de meras declarações, não há como punir o sujeito que mentiu. Sem o compromisso, não se pode exigir que o depoente fale a verdade, mesmo porque as pessoas que estão imunes à promessa de dizer a verdade são justamente as que não têm condições emocionais de fazê-lo ou, por conta de deficiência mental ou falta de maturidade, terminam não narrando a verdade. Como se pode exigir do pai do réu – eximido da obrigação de depor (art. 206, CPP) – que conte a verdade do que aconteceu, mesmo sabendo que o filho pode ir, graças ao seu depoimento, para a cadeia? Excepcionalmente, diz o próprio art. 206, parte final, quando por outra forma não for possível obter ou integrar a prova do fato e de suas circunstâncias, pode o magistrado determinar a inquirição dessas pessoas, embora sem lhes deferir o compromisso (art. 208). E por quê? Qual razão teria o legislador ao determinar para uns o compromisso e para outros, não? É evidente, para nós, que a intenção é diferenciar a testemunha do mero declarante. A testemunha tem o dever de dizer a verdade, porque compromissada, logo, sujeita às penas do crime de falso, que é a consequência jurídica do descumprimento do dever que assumiu. O declarante não possui o dever de narrar a verdade e está sendo ouvido por pura necessidade do juízo na busca da verdade real, embora não preste compromisso, como a lei assegura. O magistrado levará em consideração o seu depoimento com reserva, fazendo o possível para confrontá-lo com as demais provas dos autos. Não fosse assim e todos deveriam ser compromissados, sem exceção, respondendo pelo crime de falso. Entendemos, outrossim, que a obrigação de depor pode existir, mesmo para os que não forem compromissados – porque está expresso em lei (art. 206, fine, CPP) –, mas não com a incidência do art. 342 do Código Penal. A despeito da figura típica criada para punir o falso testemunho, como crime contra a administração da justiça, é preciso considerar que o sistema de produção de provas – alicerce da distribuição de justiça – é disciplinado pelo Código de Processo Penal, não podendo a lei penal interferir em seara alheia. Se há compromisso para alguns e não há para outros, é indispensável respeitar tal sistemática, sob pena de haver o predomínio indisfarçável do Código Penal sobre o de Processo. O mesmo se diga no tocante à vítima (art. 201), para quem também não se exige o compromisso de dizer a verdade, justamente porque é parte envolvida no fato delituoso, tendo sofrido a conduta e estando emocionalmente vinculada, em grande parte, à punição da pessoa que julga ser culpada por seu sofrimento. Tanto é verdade, que a vítima não se inclui no rol de testemunhas (está em capítulo diverso do referente às testemunhas) e não presta depoimento, mas “declarações” (art. 201, fine, CPP). E, arrematando, note-se o disposto no art. 210, caput, parte final, do CPP – “... devendo o juiz adverti-las das penas cominadas ao falso testemunho” –, que se refere, naturalmente, às testemunhas que prestam depoimento sob compromisso, e não aos meros declarantes (incluindo-se nestes as vítimas). Convém mencionar o raciocínio esposado por Antonio Carlos da Ponte, alegando ser dispensável o compromisso, que possui “conotação estritamente no campo valorativo das declarações da testemunha, de forma que sua dispensa serve apenas para considerar-se menos intenso seu valor probante. Em tal linha de argumentação, note-se que a Lei 8.455, de 24.08.1992, alterou diversas disposições do Código de Processo Civil, referentes à produção de prova pericial, dispensando o compromisso aos peritos e assistentes técnicos. Certamente, não é crível imaginar que, em decorrência da alteração sofrida pela lei processual civil, que deixou de exigir o competente compromisso por parte dos peritos, estes ficaram, consequentemente, à margem do tipo previsto no art. 342 do Código Penal, dirigido a testemunhas, peritos, tradutores e intérpretes, uma vez que o compromisso não integra o tipo penal” (Falso testemunho no processo, p. 35-36). Permitimo-nos discordar. No tocante às testemunhas, já expusemos o nosso entendimento, salientando que o compromisso não tem valor unicamente decorativo, nem formal, tanto assim que há pessoas dispensadas de depor e, se o fizerem, prestam depoimento como meros declarantes – ainda que o valor probatório da declaração possa ser superior ao do depoimento da testemunha. Quanto aos peritos, a dispensa do compromisso, formalizado no ofício judicial, não foi abolida, mas, ao contrário, foi estipulada em lei, com o fito de evitar burocracia. O art. 422 do CPC menciona que “o perito cumprirá escrupulosamente o encargo que lhe foi cometido, independentemente de termo de compromisso”. Fala-se em dispensa do termo de compromisso, e não deste último. Logo, o compromisso é previsto em lei, abrangendo toda pessoa que se dispuser a desempenhar a função de perito. Seria como a lei estabelecer que toda pessoa, ouvida em juízo, em qualquer situação, está automaticamente obrigada a dizer a verdade. Se assim fosse, estaria fixado o compromisso legal de dizer a verdade, o que não ocorre no contexto das testemunhas. Portanto, continua o perito obrigado a não falsear seus trabalhos, porque a lei faz a determinação expressamente. Merece ser mencionado, ainda, em matéria de direito comparado, o disposto no Código Penal alemão. Com finalidade expressa de punir quem mente em juízo, há dois tipos penais: a) declaração falsa sem compromisso, destinado à pessoa que, como testemunha ou perito, esteja depondo em juízo e falte com a verdade. A pena será de 3 meses a 5 anos (§ 153); b) perjúrio, que é o autêntico falso testemunho, de quem, compromissado a dizer a verdade, mente em juízo. A pena será de, no mínimo, um ano (§ 154). Por isso, mais uma vez insistimos, o crime de falso testemunho, previsto no Código Penal brasileiro, deve ser punido unicamente quando a pessoa prestar o compromisso de dizer a verdade. Quisesse a lei abranger as duas formas e deveria ter criado as duas figuras típicas compatíveis, pois são situações nitidamente diferentes.
Entendemos perfeitamente admissível, na modalidade de participação, o concurso de agentes. Nada impede, tecnicamente, que uma pessoa induza, instigue ou auxilie outra a mentir em juízo ou na polícia. O crime é de mão própria, é certo. Embora isso queira significar ter o autor de cometê-lo pessoalmente, nada impede tenha ele o auxílio de outrem. Há voz destoante afirmando tratar-se de exceção pluralista ao sistema monista ou unitário adotado no concurso de pessoas. Assim, teria querido o legislador punir aquele que presta falso testemunho ou produz falsa perícia (art. 342), e, em outro tipo penal, teria deliberado punir aquele que suborna testemunha ou perito (art. 343).Não nos parece seja este o caso. As exceções pluralistas à doutrina unitária do crime são específicas e não podem ser ampliadas pelo intérprete. A pessoa que mentiu deve responder pelo falso testemunho, enquanto aquele que a induziu ingressa no tipo como partícipe. Prevendo figura à parte, mas dando-lhe o destaque devido – até mesmo para que alguns não aleguem tratar-se de simples partícipe, reduzindo-lhe a pena –, quis o legislador tipificar o suborno (dar dinheiro para a testemunha mentir ou o perito falsear), no art. 343. A exceção criada é específica e não impede a incursão no art. 342 de quem é partícipe. Alguns outros argumentam ser incabível a participação porque o art. 343 pune a pessoa que suborna testemunha com a mesma pena do crime de falso testemunho. Logo, seria injusto punir o partícipe, que não suborna, com a mesma sanção daquele que alicia outro a mentir. O argumento é de justiça por comparação. Essa posição encontra-se superada pela modificação introduzida pela Lei 10.268/2001, que aumentou consideravelmente a pena do crime de suborno a testemunha e peritos em geral (art. 343), passando-a de 1 a 3 anos para 3 a 4 anos, mantida a multa. Logo, o partícipe do falso testemunho – aquele que induziu, instigou ou auxiliou a produção da mentira ou da falsidade – será punido com sanção bem menor que o autor do suborno da testemunha ou perito. A despeito disso, já sustentávamos, antes da reforma, ser indispensável considerar que muitos partícipes apresentam comportamento mais reprovável do que a testemunha que mentiu, merecendo, pois, exatamente a mesma sanção. Uma pessoa culta e preparada que induza outra, simples e ignorante, a prestar um depoimento falso pode apresentar comportamento muito mais daninho à sociedade do que a conduta do autor direto da mentira. Acrescente-se, ainda, que há pessoas com forte poder de argumentação que somente conseguem o seu objetivo – fazer alguém cometer o falso testemunho – justamente porque não lhe ofereceu dinheiro ou qualquer vantagem, mas o convenceu de que a justiça, naquela situação concreta, seria faltar com a verdade. Tivesse oferecido vantagem e não teria logrado êxito. Assim, nunca nos convenceu o argumento de que o suborno (art. 343) não poderia ter a mesma pena de quem convencesse outrem a mentir sem lhe dar, oferecer ou prometer dinheiro ou vantagem. Diga-se, a bem da verdade, que o desvalor da conduta é idêntico: convencer uma pessoa a mentir à autoridade, por dinheiro ou por força de argumentos escusos, tem a capacidade de ferir com igual intensidade a administração da justiça. Além disso, é preciso anotar que o lucro do agente que mente pode não ser visível, de forma que pode não estar configurado o suborno (figura do art. 343), e, ainda assim, o crime de falso é cometido (ex.: a pessoa, convencida pelo advogado do réu, embora sem qualquer promessa de vantagem imediata, mente em juízo para protegê-lo, crente de que, no futuro, poderá contar com favores do acusado ou mesmo do causídico). Logo, não vislumbramos óbice algum para a punição do partícipe no crime do art. 342. Acolhendo a tese de ser possível a participação: Antonio Carlos da Ponte, Falso testemunho no processo, p. 49-50; Luiz Regis Prado, Falso testemunho e falsa perícia, p. 121-126 e 146).
Art. 343
Sujeito ativo
Qualquer pessoa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado. Secundariamente, pode ser a pessoa prejudicada pela falsidade produzida (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração da justiça (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
Pode ser a testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Dar (presentear ou conceder), oferecer (propor para que seja aceito, apresentar) ou prometer (comprometer-se a fazer alguma coisa) dinheiro ou qualquer outra vantagem (é indispensável que a vantagem oferecida tenha algum valor econômico, mesmo que indireto, para o agente. Não fosse assim e seria completamente desnecessário ter a descrição típica mencionado o elemento dinheiro – moeda em vigor, que serve para, havendo troca, a obtenção de mercadorias e serviços –, bastando dizer qualquer vantagem) a testemunha (é a pessoa que viu ou ouviu alguma coisa relevante e é chamada a depor sobre o assunto em investigação ou processo), perito (é a pessoa especializada em determinado assunto, preparada para dar seu parecer técnico), contador (é o especialista em fazer cálculos), tradutor (é aquele que traslada algo de uma língua para outra, fazendo-o por escrito) ou intérprete (conhecedor de uma língua, serve de ponte para que duas ou mais pessoas possam estabelecer conversação entre si), para fazer afirmação falsa (mentir ou narrar fato não correspondente à verdade), negar a verdade (não reconhecer a existência de algo verdadeiro ou recusar-se a admitir a realidade) ou calar a verdade (silenciar ou não contar a realidade dos fatos) em depoimento, perícia, cálculos, tradução ou interpretação. A pena é de reclusão, de três a quatro anos, e multa. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
É a vontade de prejudicar a administração da justiça (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Comum; formal; de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; unissubsistente ou plurissubsistente, conforme o caso. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível na forma plurissubsistente.
Momento consumativo
Quando houver a prática de qualquer das condutas previstas no tipo, ainda que não ocorra efetivo prejuízo material para o Estado ou para terceiros.
Causas de aumento de pena
A pena é aumentada de um sexto a um terço, se o crime é praticado com o fim de obter prova destinada a produzir efeito em processo penal, ou em processo civil em que for parte entidade da administração pública direta ou indireta (parágrafo único).
Art. 344
Sujeito ativo
Qualquer pessoa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado. Secundariamente, pode ser a pessoa que sofreu a violência ou grave ameaça (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração da justiça (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É a pessoa que sofre a coação (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Usar (empregar ou servir-se) de violência (coação física) ou grave ameaça (séria intimidação), com o fim de favorecer interesse próprio ou alheio, contra autoridade, parte, ou qualquer outra pessoa (não somente a autoridade que conduz o processo, nem tampouco só a parte nele envolvida podem ficar expostas à coação, mas também outros sujeitos que tomem parte no feito, tais como os funcionários que promovem o andamento processual, a testemunha que vai depor, o perito que fará um laudo, o jurado, dentre outros) que funciona ou é chamada a intervir em processo judicial, policial ou administrativo, ou em juízo arbitral. A pena é de reclusão, de um a quatro anos, e multa, além da pena correspondente à violência. Havendo o emprego de violência, no lugar da grave ameaça, fica o agente responsável também pelo que causar à integridade física da pessoa, devendo responder em concurso material. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
É a finalidade de favorecer interesse próprio ou alheio em processo ou em juízo arbitral (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Comum; formal; de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível.
Momento consumativo
Quando houver a prática de violência ou grave ameaça, ainda que não ocorra efetivo prejuízo material para o Estado ou para terceiros.
Particularidade
Não se exige que se trate de causar à vítima algo injusto, mas há de ser intimidação envolvendo uma conduta ilícita do agente, isto é, configura-se o delito quando alguém usa, contra pessoa que funcione em um processo judicial, por exemplo, de grave ameaça justa, para obter vantagem (imagine-se o agente que, conhecendo algum crime do magistrado, ameace denunciá-lo à polícia, o que é lícito fazer, caso não obtenha ganho de causa). Nota-se que, no caso apresentado, a conduta não é lícita, pois ninguém está autorizado a agir desse modo, buscando levar vantagem para encobrir crime alheio. Por outro lado, se a conduta disser respeito ao advogado que intimide a testemunha relembrando-a das penas do falso testemunho caso não declare a verdade, trata-se de conduta lícita, pois é interesse da administração da justiça que tal ocorra, vale dizer, que diga a verdade do que sabe.
Art. 345
Sujeito ativo
Qualquer pessoa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado. Secundariamente, pode ser a pessoa contra a qual se volta o agente (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração da justiça (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É a coisa ou pessoa que sofre a conduta típica (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Fazer justiça pelas próprias mãos (obter, pelo próprio esforço, algo que se considere justo ou correto), para satisfazer pretensão (há de ser um interesse que possa ser satisfeito em juízo, pois não teria o menor cabimento considerar crime a atitude do agente que consegue algo incabível de ser alcançado através da atividade jurisdicional do Estado), embora legítima, salvo quando a lei o permite (a parte final do tipo penal – salvo quando a lei o permite – é desnecessária, pois óbvia. Se a lei permite que o agente atue dentro do exercício de um direito, torna-se evidente que não se pode considerar criminosa a conduta). É correta a sua tipificação como delito, até mesmo porque o monopólio de distribuição de justiça é estatal, não cabendo ao particular infringir tal regra de apaziguamento social. A pena é de detenção, de quinze dias a um mês, ou multa, além da pena correspondente à violência. Havendo o emprego de violência, fica o agente responsável também pelo que causar à integridade física da pessoa, devendo responder em concurso material. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
É a finalidade de satisfazer qualquer espécie de aspiração (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Comum; formal (há quem sustente ser material, de modo que só estaria consumado o crime se o agente satisfizesse a sua pretensão); de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível.
Momento consumativo
Quando houver a prática de qualquer conduta apta a concretizar a figura típica, ainda que não ocorra a efetiva satisfação da pretensão do agente ou prejuízo efetivo para a vítima.
Particularidade
É crime de ação pública ou privada, conforme o caso concreto. Inexistindo violência, deixa o Estado a ação penal sob a iniciativa exclusiva da parte ofendida. Porém, quando o agente empregar atos violentos, torna-se público o interesse, habilitando o Ministério Público a agir (parágrafo único).
Art. 346
Sujeito ativo
É o proprietário da coisa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado. Secundariamente, pode ser a pessoa prejudicada pela conduta (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração da justiça (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É a coisa tirada, suprimida, destruída ou danificada (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Tirar (arrancar ou retirar), suprimir (eliminar ou fazer com que desapareça), destruir (aniquilar) ou danificar (causar dano ou provocar estrago) coisa própria (objeto pertencente ao próprio sujeito ativo; pode ser coisa móvel ou imóvel), que se acha em poder de terceiro por determinação judicial ou convenção (deve estar sob a esfera de proteção e vigilância de terceiro, seja porque o juiz assim determinou, como, por exemplo, ocorre com coisa penhorada e guardada em depósito, seja porque as partes haviam acordado que dessa maneira aconteceria, como ocorreria com o automóvel alugado em poder do locatário). A pena é de detenção, de seis meses a dois anos, e multa. É tipo misto alternativo, significando que o agente pode praticar uma única conduta ou todas e o delito será um só. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
Não há (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Próprio; material; de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível.
Momento consumativo
Quando houver a subtração, supressão, destruição ou dano à coisa que estiver em poder de terceiro.
Art. 347
Sujeito ativo
Qualquer pessoa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado. Secundariamente, pode ser a pessoa prejudicada pela inovação artificiosa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração da justiça (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É a coisa, a pessoa ou o lugar que sofre a inovação (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Inovar (introduzir uma novidade capaz de gerar engano) artificiosamente (usar um recurso engenhoso, malícia ou ardil), na pendência de processo civil ou administrativo (não estão abrangidas as investigações de natureza civil e as sindicâncias), o estado de lugar, de coisa ou de pessoa, com o fim de induzir a erro o juiz ou o perito. A pena é de detenção, de três meses a dois anos, e multa. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
É a vontade de fraudar o processo, levando o juiz ou o perito a erro (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Comum; formal; de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível.
Momento consumativo
Quando houver a inovação, ainda que não ocorra efetivo prejuízo para o Estado ou para terceiro.
Causa de aumento
As penas são aplicadas em dobro, se a inovação se destina a produzir efeito em processo penal, ainda que não iniciado. Afinal, os efeitos no processo penal são sempre mais devastadores do que no processo civil ou administrativo, tendo em vista que o erro judiciário pode levar um inocente ao cárcere ou mesmo colocar em liberdade um sujeito perigoso.
Particularidade
Cremos fazer parte do direito de autodefesa do réu a inovação de certas coisas (como a modificação das características da arma utilizada para o homicídio, por exemplo, para não ser apreendida), de determinados lugares (a arrumação da casa, lavando-se manchas de sangue, após o cometimento do delito) ou de pessoas (buscar alterar a própria feição para não ser reconhecido). O crime destina-se, portanto, àquele que não é réu, diretamente envolvido no processo, mas busca alterar o estado de coisa, lugar ou pessoa para levar a erro o magistrado ou o perito.
Art. 348
Sujeito ativo
Qualquer pessoa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração da justiça (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É a autoridade enganada (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Auxiliar a subtrair-se (fornecer ajuda a alguém para fugir, esconder-se ou evitar a ação da autoridade que o busca) à ação de autoridade pública (pode ser o juiz, o promotor, o delegado ou qualquer outra que tenha legitimidade para buscar o procurado) autor de crime a que é cominada pena de reclusão. A pena é de detenção, de um a seis meses, e multa. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
É a vontade de ludibriar a autoridade, deixando de fazer prevalecer a correta administração da justiça (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Comum; material; de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível.
Momento consumativo
Quando houver a efetiva ocultação do procurado da autoridade pública.
Figura privilegiada
Se ao crime não é cominada pena de reclusão, a pena é de detenção, de quinze dias a três meses, e multa.
Imunidade absoluta (escusa absolutória)
Se quem presta o auxílio é ascendente, descendente, cônjuge ou irmão do criminoso, fica isento de pena.
Particularidades
a) não são punidas as condutas de induzir ou instigar alguém a subtrair-se da ação da autoridade, podendo, no entanto, haver participação – por induzimento ou instigação – ao auxílio prestado por outrem;
b) há diferença entre o favorecimento e a participação. Para configurar-se o crime de favorecimento é indispensável que o auxílio seja prestado após o primeiro delito ter-se consumado, isto é, depois que alguém praticou o injusto, buscando esconder-se, fornece-se a ele o abrigo necessário. Se o sujeito oferecer abrigo ou qualquer tipo de ajuda antes do cometimento do crime, trata-se de participação. Além disso, é também curial destacar não ser o autor do crime de favorecimento o coautor do primeiro, pois, do contrário, estaria havendo indevida punição. Se o comparsa esconde o outro em sua casa, é natural que não responda por favorecimento, uma vez que está, identicamente, protegendo-se. É o que Hungria chama de autofavorecimento (Comentários ao Código Penal, v. 9, p. 507);
c) torna-se necessário aguardar o deslinde do processo anterior para o reconhecimento da prática do delito de favorecimento pessoal, pois, se houver absolvição, este crime deixa de existir. Entendemos que o favorecimento está configurado na hipótese de alguém prestar auxílio a criminoso ainda não condenado, não socorrendo o argumento de que o tipo penal fala em autor de crime, e não em acusado. Ora, justamente porque se fala em autor de crime é que não se fala em culpado. Assim, se o agente dá abrigo em sua casa a um procurado pela polícia, ainda não condenado, pode ficar sujeito às penas do favorecimento, desde que se aguarde a condenação do favorecido. Parece-nos cauteloso instaurar-se o inquérito, aguardando-se o deslinde do processo anterior;
d) não se configura favorecimento pessoal a hipótese do morador impedir a entrada da polícia, durante a noite, em seu domicílio, ainda que seja para capturar fugitivo. Trata-se de exercício regular de direito, garantido pela Constituição Federal, no art. 5.º, XI (“a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”);
e) não podem ser considerados autores de crime, para os fins do art. 348, os inimputáveis (menores de 18 anos e mentalmente insanos) simplesmente pelo fato de mencionar o tipo a palavra crime acompanhada da expressão “a que é cominada pena de reclusão”, que eles não podem receber, logo, estão afastados deste contexto.
Art. 349
Sujeito ativo
Qualquer pessoa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração da justiça (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É o proveito do crime (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Prestar auxílio (ajudar ou dar assistência) a criminoso (há de ser a pessoa que comete o crime, não se incluindo os inimputáveis, conforme já expusemos no contexto das particularidades do crime de favorecimento pessoal), fora dos casos de coautoria (leia-se também o partícipe) ou de receptação (há tipo específico para puni-lo), destinado a tornar seguro o proveito do crime (é o ganho, o lucro ou a vantagem auferida pela prática do delito; pode ser bem móvel ou imóvel, material ou moral). A pena é de detenção, de um a seis meses, e multa. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
É a vontade de tornar seguro o proveito do crime (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Comum; formal; de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível.
Momento consumativo
Quando houver a prestação do auxílio, independentemente de ocorrer efetivo prejuízo para o Estado ou para terceiro.
Art. 349-A
Sujeito ativo
Qualquer pessoa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado. Secundariamente, a sociedade, em virtude dos crimes que podem ser cometidos por conta da comunicação entre presos e comparsas em liberdade (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração da justiça, com ênfase à segurança pública (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É o aparelho telefônico de comunicação móvel, de rádio ou similar (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Ingressar (promover a entrada de algo em algum lugar), promover (propiciar, dar causa a algo), intermediar (colocar-se entre duas pessoas, servindo-lhes de ponte ou ligação), auxiliar (prestar ajuda ou socorro) ou facilitar (tornar mais fácil, favorecer) a entrada de aparelho telefônico de comunicação móvel (celular), de rádio ou similar, sem autorização legal, em estabelecimento prisional. A pena é de detenção, de 3 meses a 1 ano. Cuida-se de infração de menor potencial ofensivo, comportando transação. Note-se que a expressão “sem autorização legal” constitui elemento normativo do tipo, dependente de análise e interpretação segundo a legislação vigente. Não se trata de norma penal em branco, visto inexistir uma fonte normativa específica lidando com o assunto, tal como há no contexto das drogas ilícitas. O estabelecimento penal deve ser concebido de forma ampla, valendo para qualquer lugar onde exista o controle de entrada e saída de presos, provisórios ou condenados, em regime fechado, semiaberto ou aberto. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Comum; formal; de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível.
Momento consumativo
Quando houver a entrada do aparelho em estabelecimento prisional, ultrapassando o setor de fiscalização, destinado a recolher os objetos cujo ingresso é vedado no presídio.
Particularidades
a) nesse contexto, é possível a ocorrência do crime impossível, desde que o sistema de fiscalização seja tão eficiente, a ponto de tornar inviável a entrada de qualquer aparelho (ineficácia absoluta do meio). Pode-se, ainda, considerar o aparelho completamente inutilizado (impropriedade absoluta do objeto). Logicamente, o aparelho com defeito permite a configuração do delito, pois é considerado objeto relativamente impróprio. Torna-se indispensável o exame pericial para a verificação da potencialidade do aparelho (se impróprio ou não). Celulares sem crédito, com chip pré-pago, permitem a concretização do crime, o mesmo valendo para o celular introduzido sem bateria. São objetos relativamente impróprios;
b) para a configuração do delito não é preciso apreender o aparelho em mãos do preso. Basta que se descubra o referido aparelho dentro do presídio, contra as determinações vigentes, conseguindo-se, por certo, identificar quem promoveu o seu ingresso;
c) quanto aos equipamentos de segurança, destinados a bloquear a comunicação para telefones celulares e outros rádios transmissores com o mundo exterior, não há qualquer impedimento para a consumação do delito do art. 349-A. Não se leva nem mesmo em conta a eficácia do bloqueio, pois o tipo penal não faz referência à comunicação exterior-interior. Não se permite o ingresso do aparelho no presídio, afinal, ele pode dar margem à comunicação dos presos dentro dos muros do estabelecimento, o que é inadequado;
d) os aparelhos similares aos celulares e aos rádios devem adequar-se ao art. 60, § 1.º, da Lei 9.472/97, a saber: “Serviço de telecomunicações é o conjunto de atividades que possibilita a oferta de telecomunicação. § 1.º Telecomunicação é a transmissão, emissão ou recepção, por fio, radioeletricidade, meios ópticos ou qualquer outro processo eletromagnético, de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer natureza”.
Art. 350
Confronto com a Lei 4.898/65 (Lei de Abuso de Autoridade)
O art. 4.º da referida lei especial preceitua:
“Constitui também abuso de autoridade:
“a) ordenar ou executar medida privativa de liberdade individual, sem as formalidades legais ou com abuso de poder;
“b) submeter pessoa sob sua guarda ou custódia a vexame ou a constrangimento não autorizado em lei;
“c) deixar de comunicar, imediatamente, ao juiz competente a prisão ou detenção de qualquer pessoa;
“d) deixar o juiz de ordenar o relaxamento de prisão ou detenção ilegal que lhe seja comunicada;
“e) levar à prisão e nela deter quem quer que se proponha a prestar fiança, permitida em lei;
“f) cobrar o carcereiro ou agente de autoridade policial carceragem, custas, emolumentos ou qualquer outra despesa, desde que a cobrança não tenha apoio em lei, quer quanto à espécie, quer quanto ao seu valor;
“g) recusar o carcereiro ou agente de autoridade policial recibo de importância recebida a título de carceragem, custas, emolumentos ou de qualquer outra despesa;
“h) o ato lesivo da honra, ou do patrimônio de pessoa natural ou jurídica, quando praticado com abuso ou desvio de poder ou sem competência legal;
“i) prolongar a execução de prisão temporária, de pena ou de medida de segurança, deixando de expedir em tempo oportuno ou de cumprir imediatamente ordem de liberdade”.
Assim, participamos do entendimento majoritário de que o art. 350 do Código Penal foi inteiramente revogado pela Lei 4.898/65, que tem todas as possibilidades possíveis de abuso de autoridade previstas em suas figuras típicas (por todos, Delmanto, Código Penal comentado, p. 637). Entendendo terem sido revogados somente o caput e o inciso III, estando em vigor os demais (incisos I, II e IV): Paulo José da Costa Júnior, Direito Penal – Curso completo, p. 751. Damásio, Código Penal anotado, p. 991.
Art. 351
Sujeito ativo
Qualquer pessoa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração da justiça (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É a pessoa fugitiva (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Promover (dar causa, impulsionar ou originar) ou facilitar (tornar mais fácil, acessível sem grande esforço) a fuga (é a escapada ou o rápido afastamento do local onde se está detido) de pessoa legalmente presa ou submetida à medida de segurança detentiva. A pena é de detenção, de seis meses a dois anos. Se houver emprego de violência, aplica-se também a pena resultante desta (§ 2.º). Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
Não há (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo ou culpa, conforme o caso (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Comum; material; de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível.
Momento consumativo
Quando houver a fuga da pessoa legalmente presa ou submetida à medida de segurança.
Figura qualificada
A pena é de reclusão, de dois a seis anos, se o crime é praticado a mão armada (com o emprego de qualquer tipo de arma, própria ou imprópria, como instrumento), ou por mais de uma pessoa (concurso de duas ou mais pessoas), ou mediante arrombamento (abertura forçada, rompendo-se obstáculo material) (§ 1.º).
Outra figura qualificada
A pena é de reclusão, de um a quatro anos, se o crime é praticado por pessoa sob cuja custódia ou guarda está o preso ou o internado. Aplica-se somente em relação ao caput e não à figura do § 1.º, cuja faixa de aplicação da pena é mais elevada.
Figura culposa
A pena é de detenção, de três meses a um ano, ou multa, no caso de culpa do funcionário incumbido da custódia ou guarda.
Art. 352
Sujeito ativo
Somente o preso ou a pessoa submetida à medida de segurança detentiva (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado. Secundariamente, é vítima a pessoa agredida durante a fuga (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração da justiça e a proteção à incolumidade física (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É a pessoa agredida (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Evadir-se (fugir ou escapar da prisão) ou tentar evadir-se (é a forma tentada que está equiparada à consumada) o preso ou o indivíduo submetido à medida de segurança detentiva, usando de violência contra a pessoa (é a coação física exercida contra ser humano, não se incluindo, naturalmente, a violência contra coisas, como ocorre com o detento que serra as grades da prisão, por exemplo; não se encaixa também a grave ameaça). A pena é de detenção, de três meses a um ano, além da pena resultante da violência. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
É a vontade de escapar da prisão legal, valendo-se de violência (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Próprio (especificamente, de mão própria); material; de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
Não é admissível, pois é delito de atentado.
Momento consumativo
Quando houver o emprego de violência visando à fuga.
Particularidade
A fuga violenta exercida no momento da decretação da prisão configura o delito de resistência. Mas se o indivíduo já estiver preso legalmente e tentar fugir ou conseguir fugir mediante o emprego de violência, concretiza-se o crime do art. 352.
Art. 353
Sujeito ativo
Qualquer pessoa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado. Secundariamente, o preso maltratado (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração da justiça e a proteção à incolumidade física (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É o preso arrebatado (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Arrebatar (tirar com violência) preso (é somente a pessoa cuja prisão foi decretada, incluindo-se aqueles que, cautelarmente, foram detidos – prisão temporária, preventiva ou semelhante – e os que estão cumprindo pena), a fim de maltratá-lo, do poder de quem o tenha sob custódia ou guarda (é indispensável que o preso esteja custodiado ou guardado legalmente). A pena é de reclusão, de um a quatro anos, além da pena resultante da violência. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
É a vontade de maltratar o preso arrebatado (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Comum; formal; de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível.
Momento consumativo
Quando houver o arrebatamento do preso, ainda que não seja maltratado.
Art. 354
Sujeito ativo
Somente o preso (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração da justiça (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É a disciplina carcerária (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Amotinarem-se (revoltar-se ou entrar em conflito com a ordem vigente) presos (não vale o tipo para as pessoas sujeitas à medida de segurança detentiva), perturbando a ordem ou a disciplina da prisão (o delito é de concurso necessário, embora somente se possa falar em motim ou revolta, com perturbação da ordem, quando houver mais de três presos sublevando-se). A pena é de detenção, de seis meses a dois anos, além da pena resultante da violência. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
Não há. O verbo “amotinar-se” já indica a vontade de perturbar a ordem vigente (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Próprio (aliás, de mão própria); material; de forma livre; comissivo ou omissivo, conforme o caso; permanente; plurissubjetivo; unissubsistente ou plurissubsistente, conforme o caso. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível na forma plurissubsistente.
Momento consumativo
Quando houver o confronto com a ordem vigente, no estabelecimento penal, perturbando-a.
Particularidade
Há quem sustente devam os presos praticar efetivos atos comissivos, com violência contra pessoas e coisas, perturbando seriamente a ordem e disciplina internas da cadeia. Não cremos desse modo. O tipo fala em sublevação de presos para perturbar a ordem e a tranquilidade do presídio, o que pode dar-se, perfeitamente, na chamada “desobediência ghândica”, ou seja, todos se recusam a voltar às suas celas, permanecendo horas a fio no pátio interno, causando desordem e confusão generalizada.
Art. 355
Sujeito ativo
Somente o advogado (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado. Secundariamente, a pessoa prejudicada (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração da justiça (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É a pessoa que sofre o prejuízo ou a coisa que permite a materialização da conduta do agente (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Trair (ser desleal ou enganar), na qualidade de advogado ou procurador, o dever profissional (ver o Código de Ética e Disciplina da OAB), prejudicando interesse, cujo patrocínio (existência de mandato ou nomeação feita pelo juiz para cuidar de uma causa), em juízo, lhe é confiado. A pena é de detenção, de seis meses a três anos, e multa. Nas mesmas penas incorre o advogado ou procurador judicial que defender (sustentar com argumentos ou prestar socorro), na mesma causa, simultânea (é o que ocorre ao mesmo tempo) ou sucessivamente (é o que vem em seguida), partes contrárias (pessoas que possuem interesses contrapostos numa relação processual, tais como ocorre entre autor e réu). Exige-se, no entanto, que o advogado ou procurador pratique algo concreto, não bastando o mero recebimento de procuração ou a nomeação feita pelo juiz. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
Não há (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Próprio; material; de forma livre; comissivo ou omissivo; conforme o caso; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível na forma comissiva.
Momento consumativo
Quando houver o ato de traição, ainda que inexista prejuízo material efetivo para o Estado ou para terceiros.
Art. 356
Sujeito ativo
Somente o advogado ou procurador judicial (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado. Secundariamente, a pessoa prejudicada (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração da justiça (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
São os autos, documentos ou objetos de valor probatório (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Inutilizar (invalidar ou destruir), total ou parcialmente, ou deixar de restituir (sonegar ou não devolver o que é devido) autos (é termo que designa o conjunto das peças que constituem um processo), documento (é qualquer escrito, instrumento ou papel público ou particular destinado a produzir prova em juízo) ou objeto de valor probatório (é qualquer coisa material destinada a convencer o juízo acerca da verdade de um fato), que recebeu na qualidade de advogado ou procurador. A pena é de detenção, de seis meses a três anos, e multa. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
Não há (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Próprio; material (na forma “inutilizar”) e formal (na modalidade “deixar de restituir”); de forma livre; comissivo (“inutilizar”) ou omissivo (“deixar de restituir”); instantâneo (permanente na forma “deixar de restituir”); unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível na forma comissiva.
Momento consumativo
Quando houver qualquer das condutas típicas, ainda que não se concretize prejuízo efetivo para o Estado e para terceiros.
Particularidades
a) a intimação pessoal do advogado ou do procurador é imprescindível para a configuração do tipo penal, pois, do contrário, pode-se estar punindo alguém por mera negligência, e o crime é doloso, não culposo;
b) a restituição dos autos, documento ou objeto antes da denúncia ser oferecida é irrelevante para a configuração do tipo penal, que tem por objeto jurídico, já lesionado, a administração da justiça. Pode o juiz levá-la em consideração como atenuante (art. 65, III, b, CP). Não cremos possível afirmar, sem a devida prova, que a mera devolução, antes do oferecimento da denúncia, elimina o dolo. Portanto, fixado – e ultrapassado – o prazo para a restituição, somente a prova de um motivo de força maior poderia demonstrar a ausência de dolo.
Art. 357
Sujeito ativo
Qualquer pessoa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração da justiça (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É o dinheiro ou a utilidade recebida ou solicitada (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Solicitar (pedir ou buscar) ou receber (aceitar em pagamento) dinheiro (é a moeda em curso oficial no País) ou qualquer outra utilidade (deve ser entendida como algo significativo, como o é o dinheiro), a pretexto de influir (tendo por finalidade inspirar ou insuflar) em juiz (é a autoridade judiciária, componente do Poder Judiciário, encarregada de aplicar o direito ao caso concreto), jurado (é o juiz leigo, que funciona, exclusivamente, no Tribunal do Júri para julgar crimes dolosos contra a vida), órgão do Ministério Público (é o Promotor de Justiça, de 1.ª instância, ou o Procurador de Justiça, de 2.ª instância), funcionário da justiça (é o funcionário público que exerce suas atividades no Poder Judiciário), perito (é a pessoa especializada em determinado assunto, preparada para dar seu parecer técnico), tradutor (é aquele que traslada algo de uma língua para outra, fazendo-o por escrito), intérprete (conhecedor de uma língua, serve de ponte para que duas ou mais pessoas possam estabelecer conversação entre si) ou testemunha (é a pessoa que, sob compromisso de dizer a verdade, narra um fato juridicamente relevante). A pena é de reclusão, de um a cinco anos, e multa. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
É a finalidade de influir na ação do juiz, jurado, membro do Ministério Público, funcionário da justiça, perito, tradutor, intérprete ou testemunha (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Comum; formal; de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; unissubsistente ou plurissubsistente, conforme o caso. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível na forma plurissubsistente.
Momento consumativo
Quando houver a prática de qualquer das condutas típicas, ainda que não se concretize prejuízo efetivo para o Estado e para terceiros.
Causa de aumento de pena
A pena eleva-se de um terço, se o agente alega (apresenta como explicação) ou insinua (dá a entender de modo indireto) que o dinheiro ou utilidade também se destina a qualquer das pessoas referidas neste artigo (parágrafo único). Ao valer-se dos verbos alegar e insinuar, o tipo penal deixa claro que tais pessoas não estão envolvidas no fato, mas são usadas pelo agente para a obtenção da vantagem.
Art. 358
Sujeito ativo
Qualquer pessoa (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado. Secundariamente, o terceiro prejudicado (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração da justiça (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É a arrematação judicial ou a pessoa que desta toma parte (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Impedir (impossibilitar a execução ou obstruir), perturbar (causar embaraço ou agitar) ou fraudar (lesar através de engano ou ilusão) arrematação judicial (é a venda em hasta pública promovida pelo Poder Judiciário); afastar (pôr de lado ou tirar do caminho) ou procurar afastar (ter por finalidade tirar do caminho) concorrente ou licitante, por meio de violência (coação física, nesse caso, deve voltar-se contra a pessoa, e não contra coisas), grave ameaça (é a intimidação séria e grave), fraude (é o ardil promovido para enganar) ou oferecimento de vantagem (é propor qualquer favor, lucro ou ganho). A pena é de detenção, de dois meses a um ano, ou multa, além da pena correspondente à violência. Trata-se de tipo alternativo-cumulativo, isto é, se o agente praticar as condutas “impedir”, ou “perturbar”, ou “fraudar” arrematação judicial responde por um só crime (alternatividade), porém, caso cometa uma dessas (ex.: perturbar arrematação) e também a segunda parte do tipo (ex.: afastar, mediante fraude, licitante) pratica dois delitos em concurso material. E, valendo-se de violência, soma-se ainda a pena resultante desta. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
Não há (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Comum; formal (nas modalidades “perturbar” e “procurar afastar”) e material (nas formas “impedir”, “fraudar” e “afastar”); de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
É admissível.
Momento consumativo
Quando houver a prática de qualquer das condutas típicas, ainda que, eventualmente, não se concretize prejuízo efetivo para o Estado e para terceiros.
Art. 359
Sujeito ativo
Somente a pessoa suspensa ou privada de direito por decisão judicial (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.1).
Sujeito passivo
É o Estado (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.2).
Objeto jurídico
É a administração da justiça (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “b”).
Objeto material
É a função, atividade, direito, autoridade ou múnus (ver Parte Geral, capítulo XII, item 3.3, “a”).
Elementos objetivos do tipo
Exercer (desempenhar com habitualidade) função (é a prática de um serviço relativo a um cargo ou ofício), atividade (qualquer ocupação ou diligência), direito (é a faculdade de praticar um ato), autoridade (significa o poder de dar ordens e fazer respeitar decisões) ou múnus (é um encargo, como, por exemplo, ser defensor dativo), de que foi suspenso (é a cessação por um determinado período) ou privado (é o tolhimento definitivo) por decisão judicial. Há posições doutrinárias sustentando haver necessidade do trânsito em julgado da referida decisão. Assim não nos parece. Qualquer decisão proferida regularmente por magistrado, de caráter provisório ou definitivo, deve ser cumprida. Se houver alguma ilegalidade, a parte interessada pode questionar por recurso próprio, mas deixar de cumpri-la, a pretexto de ser provisória, não tem sentido. Por outro lado, argumenta-se que tal delito, previsto no art. 359 do CP, volta-se apenas a decisões criminais e, particularmente, às antigas penas acessórias, hoje substituídas pelos efeitos da condenação (art. 92, CP). Não entendemos desse modo. A lei é clara ao mencionar somente a expressão decisão judicial, sem qualquer referência à sua natureza. Pode-se, então, tratar tanto de decisão civil quanto penal. A Lei 8.429/92 (Improbidade Administrativa) prevê, por exemplo, hipótese de afastamento do servidor, em decisão proferida por juízo civil. Logo, não mais é o magistrado da área criminal o único a proferir decisões impeditivas do exercício de cargo, função, atividade, direito, autoridade ou múnus. A pena é de detenção, de três meses a dois anos, ou multa. Conferir o capítulo XIII, item 2.1, da Parte Geral.
Elemento subjetivo do tipo específico
Não há (ver Parte Geral, capítulo XIII, item 2.1).
Elemento subjetivo do crime
É o dolo (ver o capítulo XIV da Parte Geral).
Classificação
Próprio; formal; de forma livre; comissivo; habitual; unissubjetivo; plurissubsistente. Sobre a classificação dos crimes, ver o capítulo XII, item 4, da Parte Geral.
Tentativa
Não é admissível, por se tratar de delito habitual. Há quem sustente ser crime instantâneo, ou até permanente, desprezando o significado consagrado do verbo exercer, como conduta que somente se perfaz em formato repetido, constante ou frequente (vide os artigos 282 e 284 do Código Penal).
Momento consumativo
Quando houver a prática habitual da função, atividade, direito, autoridade ou múnus, de que estava suspenso ou privado.
Particularidade
Não se pode aplicar este artigo para o condenado que infringiu a pena alternativa de interdição temporária de direitos, pois, para essa hipótese, existe solução própria, consistente na revogação do benefício concedido, com a transformação da pena em privativa de liberdade.
O mesmo critério será utilizado para quem infringir as condições da suspensão condicional do processo (art. 89, Lei 9.099/95). Afinal, a consequência será o prosseguimento do processo criminal.
O afastamento do marido ou companheiro do lar ou a proibição de se aproximar da ofendida, medidas protetivas de urgência, previstas no art. 22, II e III, da Lei 11.340/2006, constituem ordens judiciais, que, se violadas, podem implicar em crime de desobediência (art. 330, CP). Não se configura o crime do art. 359, pois não se trata de função, atividade, direito, autoridade ou múnus.
A suspensão ou a proibição de dirigir veículos, advinda da prática de crime de trânsito (arts. 294 e 296, Lei 9.503/97), constitui decisão judicial vedando o exercício de um direito, mas há tipo penal especial para disciplinar o caso (art. 307, Lei 9.503/97). Não se aplica, pois, o disposto pelo art. 359 do Código Penal.