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Thulin olha brevemente para Hess pelo espelho retrovisor, quando acelera e se afasta. Quando ela abrira a porta do carro em frente à casa, ele olhara para a casa e dissera que preferia ir a pé, e ela não se importara.

Ela vira na primeira rua à direita para fora do bairro e faz dois telefonemas a caminho da cidade. O primeiro é para Nylander, que atende imediatamente, e torna-se óbvio que estava à espera daquilo. Ela ouve a mulher e filhos dele em pano de fundo e, quando lhe conta o resultado da visita aos pais de Kristine Hartung, ele parece satisfeito com a explicação. Antes de desligar, ele insiste que a informação tem de ser tratada como confidencial, para os media não fazerem um grande alarido e incomodarem os pais da rapariga, mas Thulin não presta muita atenção, pois já tinha concluído o mesmo.

Depois liga à terceira fotografia na árvore da sua família, o homem a quem a filha chama avô — o sempre leal e robusto Aksel, a quem deve tudo. Sente-se feliz ao ouvir a sua voz e a sua calma, e ele diz-lhe que estão sentados a jogar um videojogo desportivo coreano que é muito complicado e que não percebe nada daquilo. Ao longe, Le pergunta se pode dormir na casa do avô, e Thulin acede, embora não queira ficar sozinha naquela noite. Aksel percebe-o no seu tom de voz, e ela apressa-se a dizer que está tudo bem e desliga. Pela janela do carro, vê as famílias que regressam a casa com sacos de compras e sente-se inquieta enquanto tenta afastar esse pensamento: uma rapariga vende um boneco feito de castanhas a um homem à beira da estrada, e esse boneco acaba por aparecer numa casa de brincar em Husum. Fim da história. Toma uma decisão e vira para a rua Store Kongensgade.

Um homem idoso com um casaco de pele e um cão pequeno junto ao peito sai para a rua e olha-a com desconfiança quando ela entra sem tocar à campainha. Ela sobe a ampla escada entre os grandes apartamentos e, quando chega ao segundo andar, ouve a música vinda do apartamento. Bate à porta uma vez, mas depois abre-a sem esperar e entra para o grande átrio. Sebastian está de pé, com o telemóvel na mão, tendo acabado um telefonema, e sorri, surpreso, ainda de fato, que é aparentemente o único uniforme aceitável no seu ramo.

— Olá?

Thulin despe o casaco.

— Despe-te, tenho meia hora.

As mãos dela abrem-lhe o fecho das calças e depois começam a trabalhar no cinto, até que ouve o som de passos.

— Onde guardas o saca-rolhas, rapaz?

Um homem idoso com feições marcadas entra com uma garrafa de vinho, e, durante uma pausa na música, Thulin apercebe-se da cacofonia de vozes vinda da sala.

— Este é o meu pai. Pai, esta é a Naia. — Sebastian apresenta-os e sorri, e duas crianças perseguem-se pelo corredor e entram na cozinha.

— Prazer em conhecer-te. Entra por um momento, querida!

Antes de Thulin ter tempo de olhar em volta, vê-se rodeada pela mãe e pelo resto da família de Sebastian. Depois de ter recusado o convite três vezes, agora sabe que vai ter de jantar com eles.