Carros de polícia com luzes azuis a piscarem no tejadilho bloquearam a pequena rua nas duas extremidades, e os jornalistas mais ansiosos já começaram a chegar. Alguns vêm com fotógrafos e estúdios móveis, para transmitirem em directo para o próximo noticiário, apesar de não irem obter nenhuma informação da polícia para além do que conseguem ver do lado de fora da barreira. Um grupo de residentes também se reuniu ali, e, pela segunda vez em apenas uma semana, observam, chocados, a casa do número 7. Não é um bairro que tenha muitos acontecimentos, para além de pequenas festas e separação de lixo, e Thulin imagina que se passarão muitos anos até que os acontecimentos daquela semana sejam esquecidos.
Thulin saiu para a rua em frente à casa para telefonar e dar as boas-noites a Le, que aceitou alegremente passar mais uma noite na casa do avô. Mas Thulin tem dificuldade em concentrar-se na conversa, e, enquanto Le lhe fala de uma nova app e de um encontro para brincar com Ramazan, revê os acontecimentos da noite. Quando se dirigia para o centro pela Ring 2, percebeu que o carro preto podia ser o Mazda 6 de Hans Henrik Hauge, e foi por isso que voltou para trás. Mas Hauge escapara, e, depois da perseguição, ela encontrara Hess caído no chão de cimento da garagem, ainda atordoado e ferido, mas concentrara-se imediatamente no MacBook que Hauge aparentemente tentara levar consigo. Chamara os técnicos, informara Nylander, e lançaram um mandado de captura de Hans Henrik Hauge, até ao momento sem resultados.
Agora, o espaço está novamente repleto de técnicos vestidos de branco, desta vez em frente à garagem. Têm o seu próprio fornecimento eléctrico e instalaram projectores com luzes brancas fortes. Uma tenda branca foi montada no caminho de acesso à casa, e a maior parte das caixas de plástico da garagem foi trazida para o exterior para facilitar o acesso ao quarto lá em baixo. Thulin termina a conversa com a filha e dirige-se para a garagem no momento exacto em que Genz sai do espaço lá em baixo com a sua câmara. Parece cansado quando tira a máscara que lhe protege o rosto e faz o seu relatório.
— Os materiais usados na construção deste espaço indicam que foi construído na mesma altura que a nova garagem. A escavação é suficientemente pequena para Hauge poder tê-la feito com uma escavadora comum, se tiver alugado uma para abrir espaço para os alicerces. Não deverá ter demorado mais do que alguns dias se tiver conseguido trabalhar continuamente. O espaço era insonorizado quando a porta do alçapão estava fechada — que só podemos supor que era o que Hauge preferia.
Thulin ouve em silêncio, enquanto Genz continua. Alguns brinquedos de Magnus Kjær foram encontrados naquele quarto, juntamente com cremes, garrafas de refrigerante, velas aromáticas e outras coisas. Também havia uma instalação eléctrica lá em baixo e uma ligação de wi-fi. Os estudos preliminares não revelaram outras impressões digitais para além das do rapaz e de Hans Henrik Hauge, e Thulin acha tudo aquilo inconcebível. Até agora só lera sobre aquele tipo de casos ou ouvido falar deles nas notícias. Josef Fritzl, Marc Dutroux ou sejam quais forem os psicopatas do momento, e tudo isso sempre lhe pareceu irreal até àquele dia.
— Para que é que servia o wi-fi?
— Ainda não sabemos. Parece que Hauge veio até cá para fazer desaparecer algumas coisas, mas ainda não sabemos ao certo quais. Por outro lado, encontrámos alguns códigos num caderno numa caixa de cartão. Algo que indica que ele usava um sistema peer-to-peer anónimo. Talvez para transmitir.
— Transmitir o quê?
— O Hess e os técnicos informáticos estão a tentar desbloquear o Mac que ele tentou levar, mas a password está a dar-lhes problemas, portanto, parece que vamos ter de o levar para o departamento para o desbloquear.
Thulin recebe um par de luvas descartáveis das mãos de Genz e faz menção de passar por ele para entrar na garagem, mas ele pousa-lhe uma mão no ombro.
— Talvez devas deixar os técnicos ocuparem-se disso. Eles ligam assim que for possível, a informar-te.
Thulin percebe pela expressão dos seus olhos escuros que a intenção é boa. Ele quer poupá-la, mas ela continua a dirigir-se para o alçapão.