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Os átrios grandes da esquadra fazem os passos dos dois homens ecoarem quando se cruzam com dois assistentes criminais que vão na direcção contrária. O chefe do Departamento de Homicídios, Nylander, detesta este tipo de conversas, mas sabe que é provavelmente a única oportunidade que vai ter hoje, por isso recalca a humilhação e caminha a passo com o vice-director da polícia, enquanto as frases entediantes se sucedem.

— Nylander, temos de apertar o cinto. A situação é igual para todos os nossos departamentos.

— Eu pedi mais pessoal para…

— É uma questão de timing. Neste momento, o Ministério da Justiça está a dar prioridade a outros departamentos que não o seu. Expressaram a ambição de fazer do NC3 o melhor departamento de cibercrime da Europa, e por isso estão a reter os recursos de outros departamentos.

— Não deviam ignorar o meu departamento. Temos necessidade de aumentar o pessoal nos últimos…

— Eu não desisti, mas ao menos recebeu uma ajuda.

— Eu não recebi ajuda nenhuma. Um único investigador que vai estar aqui uns dois dias porque foi mandado para casa da Europol não entra para a contabilidade.

— Ele vai ficar mais algum tempo. Depende da situação. Mas o ministério podia igualmente ter cortado o financiamento, por isso, neste momento, o melhor que temos a fazer é focar-nos nos aspectos positivos. Ok?

O vice-director da polícia parou, virou-se para Nylander para dar ênfase às suas palavras, mas Nylander quer responder que não está bem porra nenhuma. Falta-lhe pessoal, e tinham-lhe prometido que o problema ia ser resolvido, mas, em vez disso, foi deixado para trás por causa da merda do NC3, a abreviatura do chamado National Cyber Crime Center. É uma palhaçada burocrática monumental ter de colaborar com um investigador rejeitado, que caiu em desgraça em Haia.

— Tens um momento? — Thulin apareceu no pano de fundo, e o vice-director da polícia aproveita a interrupção para entrar na sala de reuniões e fechar a porta atrás de si. Nylander olha para o lugar de onde ele desapareceu por um instante, antes de se afastar pelo mesmo caminho por onde veio.

— Agora não, mas tu também não o tens. Vai falar com os guardas sobre a chamada de Husum, leva o tipo da Europol contigo e põe-no a trabalhar.

— Mas em relação à…

— Não tenho tempo para a nossa conversa agora. Eu conheço bem as tuas qualidades, mas és a pessoa mais jovem que já pôs os pés neste departamento, portanto, não te quero a levantar o nariz para tentares ser líder de grupo ou o que quer que seja que queres discutir na reunião.

— Eu não quero ser líder de grupo. Preciso de uma recomendação para o NC3.

Nylander para e olha para ela.

— O NC3. O departamento de cibercrime…

— Eu sei muito bem que departamento é. Porquê?

— Porque acho que o trabalho do NC3 é interessante.

— Ao contrário do quê?

— Ao contrário de nada. Só quero…

— Ainda agora começaste. O NC3 não contrata pessoas que estão a tentar progredir na carreira, portanto, não faz sentido candidatares-te a nada.

— Foram eles que me convidaram a candidatar-me.

Nylander tenta esconder a sua surpresa, mas percebe imediatamente que ela está a dizer a verdade. Olha para a pequena figura parada à sua frente. Que idade terá? 29, 30, à volta disso? Um pequeno pássaro estranho que não parece nada de especial, e depois lembra-se de como também ele a subestimou, antes de a conhecer verdadeiramente. Na sua avaliação da equipa, classificara os investigadores do departamento como de categoria A e B, e, apesar da idade, Thulin foi um dos primeiros nomes que anotou na categoria A, que o departamento iria consolidar, juntamente com investigadores experientes como Jansen e Ricks. E Nylander chegara mesmo a pensar torná-la líder de grupo. Não era grande fã de investigadores do sexo feminino, mas ela era mais inteligente do que a maioria e resolvia os seus casos a um ritmo que fazia os investigadores experientes parecerem parados. Thulin provavelmente considerava o nível tecnológico do departamento como estando ao nível da idade da pedra, e, uma vez que ele partilhava a mesma opinião, sabia o quanto precisava de gente como ela para fazer o departamento andar para a frente. Por isso, em duas ocasiões, usara as suas conversas para a lembrar de que ainda era nova ali e para se certificar de que ela não se ia embora.

— Quem te convidou?

— O chefe, como é que se chama? Isak Wenger.

O rosto de Nylander ensombrou-se.

— Eu gostei de trabalhar aqui, mas quero enviar a candidatura até ao final da semana.

— Vou pensar no assunto.

— Podemos combinar para sexta-feira?

Nylander começou a afastar-se. Por um breve instante, sente o olhar dela fixo no seu pescoço e sabe que ela vai visitá-lo na sexta-feira para pedir a recomendação. Foi a isto que as coisas chegaram. O seu departamento tornou-se uma incubadora da elite, dos novos favoritos do ministério, o NC3. E, assim que entrar na reunião do orçamento do seu departamento, vai confirmar uma vez mais essa prioridade sob a forma de números e das suas limitações. No Natal, três anos antes, Nylander aceitara o cargo no Departamento de Homicídios, mas coisas tinham parado, e, se não acontecesse algo depressa, não seria a oportunidade de carreira que Nylander esperava.