A SPA: desarme-a!
Se temos muitos tijolos que não são utilizados num terreno, como podemos considerá-los: objetos úteis ou entulho? O excesso de informação torna-se entulho, que prejudica a ousadia, a capacidade de observação, a assimilação. Executivos que vivem sob a paranoia de se informar, que não são seletivos, esmagam sua originalidade e sua criatividade.
A SPA abarca o estresse profissional (síndrome de burnout), gerado pelo uso de telefones celulares, pelo excesso de atividades, de informações, de trabalho e pela competição predatória. Um profissional, a não ser em casos excepcionais ou horas muito específicas, deveria se proibir de usar telefone celular nos finais de semana. Sempre haverá problemas para resolver, sempre haverá atividades para executar.
Nesse mundo competitivo e consumista, ou aprendemos a ser seres humanos ou seremos máquinas de trabalhar. Muitos não sabem o que é ser um simples humano que anda no traçado do tempo em busca de si mesmo. Moram em belos endereços, mas nunca encontraram um endereço dentro de si mesmos.
Você tem a bomba da SPA em sua mente? Se tem, é preciso desarmá-la. Quem pensa excessivamente, sem nenhum gerenciamento por parte do Eu, reitero, sofre um desgaste cerebral altíssimo, com graves consequências para seu futuro profissional, emocional e social.
Nós podemos acelerar tudo no mundo exterior com vantagens: os transportes, a automação industrial, a velocidade das informações nos computadores, mas nunca deveríamos acelerar a construção de pensamentos. O fenômeno do autofluxo, que deveria ser a maior fonte de entretenimento, motivação e inspiração do Homo sapiens, tornou-se a maior fonte de estresse, ansiedade e sintomas psicossomáticos.
Níveis de gravidade da SPA
Primeiro nível da SPA: viver distraído
Trata-se daquela pessoa que senta na nossa frente e parece que está nos ouvindo, mas, de repente, começa a mover repetidamente os dedos ou bater as mãos sobre as pernas. Tenha certeza de que tal pessoa “viajou”, não ouviu quase nada do que falamos.
Os distraídos fazem parte de um grande grupo. Olham para uma direção, porém estão desligados. Leem um texto, mas não guardam nada. Como vimos, eles têm um Eu desconectado, desconcentrado.
Segundo nível da SPA: não desfrutar a trajetória
Trata-se daquela pessoa que senta para ler um jornal, revista ou livro e sempre começa a lê-los de trás para a frente. É tão mentalmente agitada que não tem paciência de seguir a trajetória normal.
Tal pessoa, em seus projetos, não desfruta do percurso. Não vê a hora de chegar ao ponto final. Pessoas com este nível da SPA, mesmo que lutem pelo sucesso, quando o alcançam não celebram o pódio. Partem para uma nova jornada. São algozes de si mesmas. Não se dão o direito da trégua. Só sabem “guerrear”, não sabem viver tempos de paz.
Ao mesmo tempo que são inteligentes, são incoerentes consigo mesmas. Não desfrutam do próprio sucesso; quem vai desfrutá-lo serão seus filhos, genros e agregados.
Terceiro nível da SPA: cultivar o tédio
Trata-se daquela pessoa que está tão estressada que, quando alguém a convida para ir a uma festa, se enche de júbilo. Não vê a hora de sair do trabalho e se arrumar. Todavia, quando chega à festa, os problemas não tardam a aparecer.
A velocidade de seus pensamentos é maior do que os movimentos da festa. Ela começa a estalar os dedos, olhar para os lados, se inquietar. Cinco minutos depois, está tão entediada e estressada que dá um grito: “Vamos embora!”.
Nesse nível da SPA, a pessoa está sempre procurando algo que não existe fora dela. Somente dentro. Tais indivíduos têm horror à rotina. Tudo os cansa logo. Dificilmente relaxam e curtem o ambiente. Geralmente acham os outros superficiais, com uma conversa maçante.
Quando estão em casa, pegam o controle da TV e deixam todo mundo maluco. Mudam de filme e programa a cada minuto. E sua mente é tão rápida que detesta comerciais.
Quarto nível da SPA: não suportar os lentos
Esse grupo é representado por aquelas pessoas que ficam tensas e irritadas ao conviver com pessoas vagarosas. São impacientes com quem não “pega” rápido as coisas, com quem não tem atitude, com quem demora para enxergar os problemas e trazer soluções.
Pessoas com este nível da SPA não conseguem ensinar duas ou três vezes, que já perdem a paciência. Acham que seus colegas de trabalho têm algum problema mental, QI baixo ou são relapsos, já que não conseguem acompanhar seu ritmo nem seu raciocínio. Elas não entendem que, normalmente, não são as pessoas que as rodeiam que são lentas; elas é que são rápidas demais. Elas é que são eficientes, proativas, determinadas, empreendedoras em demasia. E acompanhá-las é uma tarefa dantesca.
Os profissionais com este nível da SPA querem que todos sejam rápidos e estressados como eles, que todos vivam o mal do século. São ótimos para empresas, mas uma vez mais afirmo: são carrascos de si mesmos. Terão grande chance de ser os mais ricos de um cemitério ou os mais perfeitos do leito de um hospital. Vale a pena?
Quinto nível da SPA: preparar as férias dez meses antes
Este nível da SPA representa o grupo de pessoas que estão tão ansiosas com a velocidade alucinada de seus pensamentos que pegam o calendário e começam a planejar as férias dez meses antes. Isso porque as anteriores não conseguiram levá-las ao descanso. Em alguns casos, deixaram-nas mais estressadas.
Uma pessoa com este nível da SPA é inquieta, tica dia a dia, mês a mês, e espera ansiosamente as benditas férias. No mês anterior a elas, melhora seu humor. Quando chega o último dia de trabalho, abraça seus colegas de trabalho e diz só para si: “Fiquem no fogo, seus estressados; fui!”.
Tudo parece perfeito. Serão as melhores férias da sua vida, até que ela começa a arrumar as malas. Já na preparação, acha que a bagagem está em excesso e estressa filhos e parceiro(a).
No trajeto, já deveria começar a relaxar, mas se enerva com os péssimos motoristas que encontra pelo caminho. Impacienta-se no trânsito, acelera, breca, dá arrancadas. Não olha para o horizonte, não contempla a paisagem. Quer chegar ao destino, vestir uma roupa leve e colocar um chinelo. Logo estará aliviada.
No primeiro dia de férias, esse indivíduo não sabe por quê, mas não relaxou. No segundo dia, está tão irritado que parece um gerente financeiro cobrando tudo de todos. No terceiro dia, seus filhos e seu parceiro(a) não o estão suportando. No quarto, nem ele se aguenta. No quinto, está tão atacado pela SPA que quer voltar para o campo de batalha, o trabalho, pois só se sente vivo guerreando.
Sexto nível da SPA: fazer da aposentadoria um deserto
O sexto nível da SPA representa a pessoa que fica pensando ansiosamente na aposentadoria. Ela conta mês após mês, ano após ano, o tempo que falta para sair do caldeirão de estresse do seu trabalho. Gosta dos colegas, mas não suporta mais olhar para a cara deles. Quando seu chefe se aproxima, tem calafrios. E, se for ela mesma o chefe, quando pensa em cobrar metas dos seus colaboradores, tem insônia.
Qualquer coisa a irrita. Não curte sua empresa. Não mais ama desafios. Se for um professor, o barulho da sala de aula lhe parece uma câmara de tortura. Sonha com as férias como o ofegante sonha com oxigênio. Pensa em pescar, passear, sentar na varanda de casa, ler livros. Depois da travessia do deserto, a vida será um oásis, imagina.
Após uma espera prolongada, chega finalmente o grande momento: a merecida aposentadoria. Os amigos fazem festa. Ela está com o humor nas alturas. A primeira semana é maravilhosa: visita amigos, cuida das plantas, lê alguns textos. Mas as semanas se passam, os meses correm, e a SPA a pega na contramão.
O cachorro começa a irritá-la, os vizinhos tornam-se sisudos, ela não conquista novos amigos, começa a se sentir inútil, não sabe conversar sobre o trivial, só sabe falar de trabalho e viver sob pressão e cobranças.
Não se preparou para curtir a vida, descansar, contemplar o belo. O resultado de mais de três décadas de trabalho são a depressão e doenças psicossomáticas. O oásis da aposentadoria aumentou a temperatura da sua ansiedade.
Claro, há exceções. Nem todos estão nestes níveis da SPA, porém estou dizendo uma verdade que atinge, em menor ou maior grau, milhões de pessoas. Quem vive em guerra no trabalho e na sua mente fica viciado em batalhas. Nunca se esqueça de que o corpo se aposenta, mas a mente jamais o faz.
Devido aos altos níveis da SPA, as pessoas são muito ativas na atualidade. Estão em pleno vigor intelectual com 60, 70 ou 80 anos. E, frequentemente, têm uma necessidade vital de continuar a se sentir úteis à sociedade. Não podem se aposentar sem se preparar para ter uma segunda jornada de prazer, lazer, sonhos, trabalho filantrópico ou remunerado. Caso contrário, adoecem e deixam doentes os mais próximos.