Capítulo 38

CAROLINE

1957-1958

Quando, finalmente, deixámos Paris, a Mãe e eu viajámos por meio mundo. Índia e Itália. Um cruzeiro pela costa inglesa até à Escócia. A primeira coisa que fiz quando aterrámos de novo em Nova Iorque foi ajudar a organizar o baile anual de abril em Paris. Era uma elaborada angariação de fundos, que apoiava inúmeras associações de caridade, francesas e americanas, incluindo o meu novo Comité das Coelhas de Ravensbrück. Passara mais de uma década desde que Anise Postel-Vinay me dera a conhecer a causa, e tanto a Mãe como eu lhe tínhamos ficado tremendamente ligadas, correspondendo-nos regularmente com as mulheres polacas. Wallis Simpson, conhecida como Duquesa de Windsor, a americana divorciada que casara com o antigo Rei Eduardo VIII de Inglaterra, estaria presente e eu tencionava pedir o seu apoio.

O salão de baile do Waldorf nunca estivera melhor. Uma cavalgada de glitterati, as estrelas de Hollywood, e de VIP’s de Washington, no meio de infindáveis cumprimentos, de bebidas na mão. Porém, uma mulher roubava todas as atenções. Homens e mulheres, tinham os olhos postos em Marilyn Monroe.

Betty e eu éramos abelhas obreiras num comité que transformara um salão de baile na ideia que a fina flor de Manhattan tinha sobre um país das maravilhas francês. No centro do salão, um enorme espaço de dança, flanqueado por compridas mesas de refeição. Por cima do palco, colocámos uns panos tricolores e ajudámos a arrastar uma enorme estátua dourada do General Lafayette a cavalo mesmo para o centro, de onde saía de um mar de lírios brancos. A comissão de decoração fora bem financiada, já que este era um grupo de bastantes recursos económicos. Os homens vestiam smokings e as senhoras vestidos brancos, azuis ou vermelhos. Marilyn Monroe tinha um vestido de lantejoulas azul-noite, que exibia maravilhosamente as suas armas.

Nessa noite, eu própria me sentia uma mulher fatal, vestida com um Schiaparelli azul hortênsia com uma pequena cauda insinuante, que varria o chão enquanto passava por entre as mesas, desempenhando os meus últimos papéis decorativos. Até achava estar bastante bem, para quem já passava dos cinquenta.

Ia colocando uma rosa vermelha, sem espinhos, num frasquinho de plástico com água junto ao prato de cada convidada, enquanto lia os nomes nos cartões que marcavam os lugares, do género de lista Quem é Quem das estrelas de Hollywood e dos mandachuvas da política: o Senador John Kennedy, Jacqueline Kennedy, o Sr. Winston Guest, C. Z. Guest, Raymond Bolger, Gwendolyn Bolger.

Sr. Paul Rodierre.

Foi como um banho de água fria. Paul? Como é que não tinha sabido? Haviam passado dez anos desde a última vez que o vira. Ao seu lado, Leena Rodierre. Voltara a casar? Encantador. O que teria acontecido a Rena? Coloquei uma rosa junto ao prato de Leena e acabei rapidamente, porque não queria encontrar-me com ele. Lera o seu nome nas notícias aqui e ali, em relação a novos projetos e espetáculos, mas nunca tinha visto os seus filmes. O que poderia dizer-lhe?

Os atores Jean Marais e Françoise Arnoul, vestidos comum uniforme militar francês, iniciaram a noite, entrando no salão de baile numa carruagem aberta puxada por dois cavalos negros. Enquanto eu observava, Betty, radiante num vestido em organza azul, encontrou-me e ofereceu-me uma taça de champanhe.

– Devias ver os sacos de presentes este ano, Caroline. É tudo Dior. E, finalmente, bom caviar...

Os sacos de presentes eram, na realidade, malas tão cheias de objetos de luxo que os convidados precisavam de carregadores para as levarem até aos carros que os esperavam.

– Já viste toda esta gente do cinema? Terias sido grande no meio, se tivesses continuado a atuar.

– Olha ali, com a Gloria Swanson...

– Bem, esta noite estás preparada para o teu «grande plano». A sério, estás fabulosa. Gostaria de poder dizer o mesmo da pobre Wallis Simpson. Está um verdadeiro fóssil. Vi-a no toucador e ela elogiou o meu vestido. «É azul Wallis?», perguntou. Francamente. Tem de estar sempre tudo relacionado com ela.

– Foi bom ela ter vindo.

– Não foi nenhum sacrifício, Caroline. Ela vive lá em cima nas Torres. O pessoal tem de lhe chamar «Sua Alteza Real», ainda que não lhe seja oficialmente permitido usar tal título. E o duque está cá. Parece um bocado confuso. Acho que a Wallis o tem medicado.

– Pelo menos é boa publicidade para a causa.

– Achas? Então tenta afastar os repórteres da Marilyn e do Arthur.

– Vou pedir à Wallis para apoiar as senhoras polacas.

– Boa sorte, Caroline. Ela está completamente embriagada.

– Ela e o Duque não fazem mais nada a não ser caridade.

– Desde que haja máquinas fotográficas por perto. E por falar nisso, ia deixar que descobrisses por ti própria, mas o Paul Rodierre está cá.

Bebi meia taça de champanhe de um trago só, sentindo as bolhas do gás descerem-me pelo estômago como fogo de artifício.

– Como é que sabes?

– Vi-o. Com a sua nova mulher. Uma atriz muito nova. Está com muito bom aspeto, bronzeado como um dandy de Palm Beach. Devem usar ambos espartilhos. – Betty olhou-me de lado, à espera da minha reação. – Agora não fujas.

– Está tudo bem – disse, com o estômago às voltas. – Por acaso já tinha visto os cartões com os lugares. Não tenho nada para lhe dizer.

– Bem, mas se falarem, é melhor ficarem longe das facas.

– Não sejas ridícula– argumentei, esvaziando ataça. Tinham passado anos desde a última vez que o vira e dificilmente sentiria ainda alguma coisa por ele.

Betty foi procurar o marido, a quem vira passar com duas taças de champanhe, e eu fui em busca de Wallis Simpson. Apesar de dizerem coisas contraditórias sobre ela, parecia uma mulher compassiva. Esperava que ela se mostrasse sensível ao sofrimento das senhoras polacas e nos desse o seu apoio.

Espremi-me por entre a multidão de convidados, com a cauda do meu vestido a ser atropelada por mais do que um sapato de verniz. Encontrei Wallis de um dos lados do salão, com Rosemary Warburton Gaynor, mulher do proeminente cirurgião plástico, Dr. William C. T. Gaynor, e presidente do baile. De perto, percebia-se por que razão Wallis aparecera quinze vezes na Lista Internacional das Mais Bem Vestidas. Erguia-se num vestido de renda branco Mainbocher e o cabelo escuro estava apanhado num coque apertado. O marido esperava por perto, a ouvir, desatento, o embaixador britânico, mas com os olhos treinados sobre Wallis, como um cão de caça idoso pronto para responder ao assobio do dono.

Wallis e Rosemary – como gazelas junto a uma fonte – estavam próximas do sítio onde Marilyn Monroe estava sentada com o marido, Arthur Miller. Fiquei por ali, à espera que Rosemary reparasse em mim, e aceitei outra taça de champanhe, para reforçar a minha coragem. Não era todos os dias que se pedia dinheiro à Duquesa de Windsor. Não tardou que a encantadora Rosemary me visse e aproximou-se, parecendo feliz pela distração.

– Oh, Caroline, venha conhecer a Duquesa.

De vestido comprido branco sem ombros e com a bainha ondulada, Rosemary puxou-me para mais perto.

– Vossa Alteza, posso apresentar-lhe a minha amiga Caroline Ferriday? Caroline Ferriday, apresento-te Sua Alteza, a Duquesa de Windsor.

Wallis hesitou e depois estendeu-me uma mão enluvada de cetim. Apertei-lha, questionando-me como se deveria tratar uma divorciada casa da comum rei que abdicara. Imitei Rosemary e escolhi cumprimentar com um «Vossa Alteza». Já tanto se tinha escrito sobre Wallis Simpson, que me parecia que a conhecia. A imprensa vivia obcecada com o mais ínfimo aspeto da sua vida – a alta-costura francesa, as suas mãos grandes, a verruga do queixo, a atitude desdenhosa e, acima de tudo, as suas joias. Rosemary acenou na direção da pista de dança.

– A Caroline tem andado extremamente ocupada a ajudar-nos a preparar tudo isto.

– Muito prazer em conhecê-la – cumprimentou Wallis.

O meu coração começou a bater mais depressa. Como abordar o assunto das Coelhas? Porque estava tão nervosa? Uma vez representara frente a uma audiência de Shriners* de fez vermelho, em Boston, que passara uma garrafa de gim pela fila da frente do teatro. Tinha sido muito mais assustador do que isto.

– Já viram a Marilyn Monroe? – perguntou, sem se dirigir a ninguém em particular. Olhou na direção do enorme grupo de gente reunido em volta da atriz e do marido. Uma equipa da televisão francesa, com os holofotes ligados, estava a entrevistá-los, sentados na sua mesa. – Todos os fotógrafos aqui presentes estão enfeitiçados por ela.

– É o vestido – sugeriu Rosemary.

– Nem sequer um olhou na minha direção – replicou Wallis.

A Sra. Gaynor virou-se para mim.

– A Caroline trabalha incansavelmente para os oprimidos, Vossa Graça. E tem uma reputação...

– Ah, sim? – perguntou Wallis, animando-se enquanto aceitava uma taça de champanhe de um empregado de libré, talvez à espera de alguma notícia escandalosa. Quando se tem a própria reputação afetada, nada mais agradável do que ouvir as desgraças dos outros.

– Uma excelente reputação, evidentemente – prosseguiu Rosemary. – Ela dirige o ramo americano de uma organização francesa que dá assistência a mulheres em necessidade. Já recebeu a Cruz da Liberdade e a da Legião de Honra francesa pelo seu trabalho.

– Nem se aproxime desses canapés, querido... demasiado salgados – Wallis avisou o Duque, que estava por perto, aparentemente hipnotizado por uma bandeja de canapés de mousse de fígado que um empregado segurava.

– Sim, Vossa Graça, dirijo a Amigos Americanos da ADIR – acrescentei. – Damos apoio a mulheres que regressaram de campos de concentração. Ajudamo-las a reorganizar as suas vidas normais.

– Ainda? – questionou Wallis, voltando à conversa. – Quantos anos já passaram desde a guerra? O governo delas não ajuda?

– Um pouco, mas mesmo assim precisam de assistência. Estamos a trabalhar para que um grupo de mulheres de Ravensbrück, um campo de concentração alemão, próximo de Fürstenberg, obtenha indemnizações.

– O Duque e eu fazemos os possíveis para evitar qualquer lugar que tenha «berg» no nome.

Desde que o casal visitara Berlim, antes da guerra, onde fora recebido por Hitler, a imprensa recordava o faux pas, mesmo vinte anos depois.

– As mulheres são chamadas as Coelhas de Ravensbrück, Vossa Graça – expliquei. – Mulheres polacas, jovens raparigas na altura, que foram objeto de experiências pelos médicos de lá.

– Horrível – confirmou Rosemary.

– Polacas? – perguntou Wallis, com uma ruga entre as sobrancelhas. – Mas não trabalha para os franceses? É tudo tremendamente confuso.

A atenção de Wallis desviou-se para uma modelo que estava perto de nós, com uma mão na anca e a outra no ar, com uma pulseira de diamantes no pulso. O Duque ergueu as sobrancelhas para Wallis, como se estivesse a perguntar-lhe a opinião sobre a pulseira. Ela respondeu-lhe com um encolher de ombros evasivo.

– Ajudamos mulheres de qualquer nacionalidade que tenham regressado dos campos – respondi. – Na Polónia, as condições são especialmente difíceis. Muitas delas estão doentes, algumas a morrer, e ainda não receberam indemnizações, uma vez que a Alemanha Ocidental não reconhece a Polónia Comunista como país.

– De momento, não estou em posição de doar o que quer que seja. – Wallis olhou em volta da sala, talvez procurando uma saída. – Temos de fazer uma vénia por tudo o que nos dão. Nem sequer constamos da Lista Civil*, já imaginaram?Além disso, o mundo está cansado de tanta morte e destruição. As histórias até já aborrecem as próprias pessoas que passaram por elas. Quem é que não escreveu umas memórias?

Wallis voltou-se para o Duque, ajeitou-lhe o cabelo real com corte à Peter Pan e brincou com as medalhas de ouro e fitas no seu peito. Tirou-lhe o canapé que ele segurava, voltou a colocá-lo na bandeja de onde ele o tirara e pegou-lhe na mão.

– Vamos ver os cães. – Fez sinal ao empregado da bandeja de prata para os seguir. – Os pugs precisam de comer pelo menos de duas em duas horas – explicou, com um sorriso, caminhando na direção da saída.

– Dá-me licença, Rosemary – pedi. Aparentemente, Wallis não tinha o mínimo interesse pela minha causa.

– Boa sorte com atua angariação de fundos, querida – disse Rosemary, quando me voltei para sair. – Eu farei uma doação. E talvez seja referida na Saturday Review de Norman Cousins*. Afinal, ele e a sua querida esposa também ajudaram as raparigas de Hiroshima.

– Obrigada, Rosemary.

Avancei pela periferia do salão para ir buscar mais champanhe, magoada com a indiferença de Wallis. Tive o cuidado de fazer o jogo «Se fosse o Paul Rodierre, para onde iria?», de forma a evitá-lo. Ele instalar-se-ia o mais longe possível do espetáculo de moda. Provavelmente junto da comida. Definitivamente, junto do bar.

Contornei o bar e passei pelas modelos da Dior, que rodopiavam e se pavoneavam por entre os convidados. Um empregado passou pelo meio da multidão, oferecendo batatas microscópicas com creme amargo e caviar por cima. Nessa noite a comida iria ser assim toda em miniatura? Dirigi-me à bandeja, mas parei imediatamente, com a cauda do vestido presa.

– Importa-se? – disse, voltando-me.

Paul.

E, ao seu lado, uma criatura deslumbrante. Leena, sem dúvida.

– Nietzsche disse que uma dieta predominantemente à base de batatas leva ao consumo de álcool – disse Paul, com o sapato ainda em cima da minha cauda.

A sua voz deixou-me incapaz de falar. O facto de a sua amada ser quase demasiado bela para se poder olhá-la, com os olhos contornados por pestanas espessas e o tipo de rosto perfeito, ao qual um cigarro confere a quantidade certa de crueldade, também não ajudava. Era alta, insuportavelmente jovem e com umas pernas compridas.

– Vejo que me persegues – ironizou Paul.

A beber champanhe, a rapariga afastou-se para mais perto do espetáculo de moda, não se sentindo, aparentemente, ameaçada, se é que me tinha visto sequer.

– Podes tirar o pé – disse eu.

– Tens o hábito de desaparecer – replicou Paul.

– Só quando sou provocada.

Manteve o pé sobre a cauda do vestido.

Imaginava que ele tivesse recuperado, desde a última vez que o vira, mas não estava a contar que estivesse com tão bom aspeto, elegante e extremamente bronzeado para abril.

– Preciso de despir o vestido?

– A festa começaria finalmente a ficar interessante. – Sorriu.

– Francamente, Paul. É um Schiaparelli.

– Estou a controlar as saídas do salão. – Libertou a cauda do vestido.

– Não te preocupes.

– Champanhe? – perguntou um emprega do que passava, com as taças borbulhantes sobre a bandeja de prata.

– Não, obrigada – recusei, com grande contenção. – Tenho de ir andando.

– Estava a pensar telefonar-te esta noite – disse Paul. – Imaginei que talvez ao menos a tua mãe falasse comigo.

– Após todos estes anos? Já não tem importância.

– Mas depois vim beber um conhaque. Sabes como é.

– Por acaso não sei.

– Esperava que estivesses aqui. Entre os teus.

– É por uma boa causa. – Encolhi os ombros.

– Champanhe? – perguntou outro empregado.

– Tinha esperança de que pudéssemos falar sobre tudo – disse Paul, agarrando em duas taças.

– Não há necessidade. Já passou quase uma década, Paul.

– Chegaste, sequer, a ler alguma das minhas cartas?

– Tenho mesmo de ir andando...

– Não tens, pelo menos, um pouco de curiosidade em ouvir a minha versão dos acontecimentos?

– Nem por isso. – Tirei-lhe um dos copos, com uma mão trémula.

– Não achas que me deves isso? Por me teres deixado?

– Se é assim que recordas o que se passou...– retorqui.

Observei a nova mulher de Paul, que olhava para uma modelo vestida de escarlate. Alguma vez teria provado foie gras? Como conseguia ser tão elegante, num país que torcia o nariz ao exercício vigoroso?

– Posso tirar uma fotografia, Sr. Rodierre? – inquiriu um fotógrafo, aproximando-se.

– Porque não? – concordou Paul.

Puxou-me para ele com mais força do que seria necessária e colocou um braço à volta da minha cintura. Continuava a usar Sumare. A sua nova mulher gostaria? Era impossível não gostar.

– Sorri, Caroline. Finge que gostas de mim.

O flash cegou-nos por um segundo.

– Obrigado, Sr. Rodierre – agradeceu o fotógrafo, afastando-se.

– Da última vez que estivemos neste salão, estive naquele palco – disse Paul.

Acenei e fingi que estava a recuperar do flash, receosa de começar a chorar caso falasse.

– Tens andado a bronzear-te – comentei, passado um instante.

– Cannes. Foi horrível. Detesto aquilo.

– Imagino. Então e Rena?

– Quem sabe? Da última vez que soube dela, estava na ilha grega de Hidra, na companhia de um jovem com metade da sua idade.

– Que bom para ela. – Estava a ser sincera. Rena merecia ter tempo para apanhar sol.

– Podes ter-me abandonado, Caroline, mas a vida continuou. Acho que nunca tomei as melhores decisões no que diz respeito a mulheres.

– Talvez a Quaresma seja uma boa altura para o fazeres.

– É bom ver-te novamente, C. – Sorriu. – Tens fome? Vou levar a Leena para conhecer algumas pessoas do cinema. Conheci um sítio junto ao Hudson...

– Ouve, Paul. É óbvio que eu nunca te conheci verdadeiramente. Vamos deixar as coisas ficarem por aqui. Talvez recordar apenas os bons momentos. – Voltei-me. – Tenho de ir.

Paul agarrou-me o pulso.

– Nunca houve nada melhor do que o tempo que passámos juntos em Nova Iorque. Deste cabo de mim, sabias?

– Por acaso, assim parece – respondi, vendo a sua Leena tirar um canapé de lagosta da bandeja.

– O que se passa contigo? Eu passei pelo inferno. Tu não foste a única pessoa afetada...

Mon cher – Leena chamava-o. – Estou esfomeada.

Enquanto fazia sinal a Paul para que a seguisse, parecia que eu era invisível.

– Vem aqui, querida – chamou-a Paul.

Leena caminhou na nossa direção. Tinha sido uma noite longa. Ainda ia ter de conhecer a mulher dele?

– Oh, por favor, Paul, prefiro não...

– Leena, quero que conheças... – Puxou Leena para si, comum braço em volta da sua cintura.

– Caroline Ferriday – exclamou a rapariga. – Como é que não a reconheci logo? – agarrou-me a mão e aproximou-se mais. – Conheço-a das fotografias. Com Helen Hayes. Que tal foi estar no mesmo palco que ela?

– Obrigada, mas tenho mesmo de ir andando.

– Ela vai fugir, Leena – avisou Paul. – Tens de a segurar.

– Oh, por favor. – Leena segurou-me o braço com a outra mão. – Faço o que quiser para almoçarmos. Em Paris. Da próxima vez que lá for.

– Prefiro não...

– Pai, tem de a convencer.

Senti um arrepio percorrer-me os braços. Pai?

– Menina Caroline Ferriday, Leena Rodierre – apresentou Paul, com o seu sorriso mais perigoso do que nunca, ali tão perto.

Pascaline é o meu nome artístico, pode chamar-me Leena.

Como é que não tinha percebido?

– Eu também representei Balthazar, Menina Ferriday. Também foi o meu primeiro papel. O Pai contou-me tudo sobre si.

– Trate-me por Caroline, querida – pedi, olhando-a, perplexa. Leena era uma combinação perfeita dos pais. Era alta e tinha, sem dúvida, a presença do pai em palco. – Deve ter sido um Balthazar perfeito, Leena.

Rodeou-me com os seus braços e abraçou-me. A criança encantadora que eu encontrara no Orfanato Saint-Philippe. Pascaline. Nascida na Páscoa...

– Prometa que vem a Paris, Caroline – pediu, libertando-me. – Vou ter o meu primeiro papel como protagonista. Seria muito importante para mim se lá estivesse.

Acenei afirmativamente. Era a única coisa que conseguia fazer, para poder suster as lágrimas. Era uma querida e tinha o charme do pai.

– Claro, querida – acedi.

– Bem, temos de ir – disse Paul.

– O pai vai apresentar-me pessoas do cinema – explicou-me Leena.

Au revoir, Caroline – Paul deu-me um beijo em cada face e senti o arranhar familiar da sua barba, o meu cilício. – Que tal escreveres-me desta vez? A certa altura, até eu acabo por desistir.

– Não mudaste – disse eu.

– Creio que algures, em algum canto dos nossos corações, teremos sempre vinte anos. – Sorriu.

Desapareceu por entre a multidão e senti a antiga dor da sua partida, só que desta vez estava a ser um pouco menos difícil. Teria realmente acontecido? A filha de Paul convidara-me para ir a Paris?

Enfiei-me num táxi, depois de um bagageiro ter colocado na mala do carro o meu saco de presentes, cujo conteúdo eu destinara desde logo para a caridade. Enquanto o automóvel arrancava, pude ainda vislumbrar Paul por entre a multidão e senti uma onda de retrouvailles, outra daquelas palavras que não se consegue traduzir bem noutra língua, e que significa «a felicidade de reencontrar alguém que se ama, após muito tempo». Abracei-me ali mesmo, nas traseiras do carro, sem me sentir mal por ir sozinha para casa.

Escrever-me-ia? Talvez. E, se eu tivesse tempo, talvez lhe respondesse.

No dia seguinte, segui o conselho de Rosemary e telefonei a Norman Cousins, famoso editor da Saturday Review, esperando poder ir falar um pouco com ele no seu escritório. Talvez ele pudesse fazer uma referência às mulheres polacas na sua revista. Sugeriu-me que passasse por lá nessa tarde.

Sentei-me na receção, folheando um jornal. Procurei a página de sociedade por hábito e vi uma página inteira de fotografias do baile Abril em Paris. Mesmo por baixo de uma fotografia de Marilyn Monroe e do embaixador britânico, de olhar fixo no seu decote, estava uma fotografia minha com Paul. Apesar de o seu smoking ter um corte de estilo europeu – um pouco mais cintado – e de a cauda do meu vestido estar suja, formávamos um casal razoavelmente elegante. Na legenda lia-se: «Menina Ferriday e Paul Rodierre, de volta à Broadway?»

Estava ainda um pouco atordoada com a fotografia, quando a rececionista me conduziu, ao longo de um corredor decorado com enormes capas da Saturday Review com molduras em alumínio, até à sala de reuniões. Norman reunira o seu pessoal em volta da mesa, com um bloco de notas amarelo em cada lugar.

– Prazer em conhecê-la, Caroline – cumprimentou Norman, levantando-se. Era impossível não se ficar encantado com o seu bom aspeto à moda antiga e o sorriso generoso. Embora o laço mais simples possa não ser apropriado para qualquer homem, Norman usava o seu com desenvoltura. – Tem a nossa total atenção durante cinco minutos.

Foi até à extremidade da sala e encostou-se à parede. Durante um momento, senti-me intimidada por estar na presença de um editor tão distinto, conhecido em todo o mundo. As borboletas no meu estômago nunca mais se acalmavam e tinha a boca seca. Recordei o conselho de Helen Hayes, que sempre me ajudara em palco: «Não sejas aborrecida. Usa o corpo todo.» Endireitei-me e comecei em força.

– Sr. Cousins, uma vez que o senhor e a sua esposa conseguiram reunir uma considerável quantia em dinheiro para as Meninas de Hiroshima... – fiz uma pausa e olhei em volta da sala. O pessoal estava tudo menos atento. Brincavam com os relógios ou canetas e escrevinhavam nos blocos. Como podia comunicar-se com uma audiência tão distraída? – Pensei que poderia igualmente interessar-se por este grupo de mulheres, em circunstâncias semelhantes.

– São polacas? – perguntou Norman, brincando com o seu gravador portátil.

– Receio não poder continuar sem a vossa total atenção, Sr. Cousins. Como certamente compreenderá, preciso de usar o pouco tempo que temos de uma forma eficaz.

Norman e a equipa inclinaram-se para a frente, com os olhos postos em mim. Já tinha a minha audiência.

– Sim, são mulheres polacas, católicas, prisioneiras políticas, detidas pelo seu trabalho na resistência polaca. Ficaram presas em Ravensbrück, o maior campo de concentração para mulheres e usado para experiências médicas. Houve um julgamento especial de médicos em Nuremberga, mas o mundo esqueceu as suas vítimas e não houve qualquer ajuda ou apoio às sobreviventes.

Norman afastou o olhar para a janela, para a vista de retângulos de pedra creme-acinzentados e torres de água de Gotham, dez andares acima.

– Não sei se os nossos leitores estarão dispostos a colaborar em outra campanha, tão pouco tempo depois, Menina Ferriday.

– O projeto Hiroshima ainda nem sequer é oficial – disse um homem com uma constituição de limpa-cachimbos e uns óculos Dave Garroway pelo menos dois tamanhos acima do que seria conveniente para o seu rosto. Conhecia-o de vista como sendo Walter Strong-Whitman, um homem que frequentava a nossa igreja, mas que nunca me fora apresentado.

– Estas mulheres eram operadas tendo em vista uma complexa série de experiências – prossegui.

Distribuí pela mesa diversas fotografias de vinte por vinte e cinco centímetros e observei a mudança no rosto das pessoas, de repugnância a horror, enquanto as iam passando.

– Meu Deus, Caroline, já quase nem parecem pernas – comentou Norman, aproximando-se da mesa. – Esta aqui ficou sem ossos inteiros e sem músculos. Como é que ainda conseguem andar?

– Não muito bem, como deve imaginar. Tinham de andar aos saltos pelo campo. Foi em parte por isso que lhes começaram a chamar Coelhas. Mas também por servirem como cobaias de laboratório para os nazis.

– Como é que conseguiram regressar à Polónia? – perguntou Norman.

– Conforme puderam. A Cruz Vermelha Sueca conseguiu resgatar algumas. Outras foram enviadas para casa de comboio, quando os russos libertaram o campo.

– Quais são as suas necessidades imediatas? – perguntou.

– Estão a passar por terríveis dificuldades na Polónia, por causa da Cortina de Ferro, com pouco acesso a cuidados médicos modernos e sem ajuda do governo alemão – expliquei, aproximando-me.

– A Cortina de Ferro – exclamou o Sr. Strong-Whitman com uma gargalhada. – O melhor é nem nos metermos com eles...

– A Alemanha Ocidental compensou outros deportados, mas não as Coelhas, uma vez que não reconhecem a Polónia comunista como país. Algumas morreram de doenças simples, que podemos curar aqui.

– Não sei, Caroline – disse Norman. – Os russos não estão a cooperar com ninguém.

– Porque hão de estas raparigas sofrer por os seus opressores não lhes permitirem deixar o país?

– Murphy foi à Alemanha de Leste por causa da história da United Airlines – referiu um jovem da equipa.

– Isto pode funcionar como um artigo sobre viagens – sugeriu uma mulher vestida com um elegante casaco de xadrez.

– O cliente Pan America pode ajudar – lembrou outro.

– É uma péssima ideia, Norman – disse Strong-Whitman. – Não podemos estar sempre a contar com os nossos leitores para qualquer coisinha, dinheiro para isto e para aquilo. Eles não se podiam importar menos com a Polónia.

– Porque não experimentamos? – sugeri.

– Esta é uma revista literária, Menina Ferriday – contrariou Strong-Whitman. – Não podem esperar que façamos a cobertura de qualquer história de caridade com animais levada a cabo por algum clube feminino de Nova Iorque.

Clube Feminino? Respirei fundo.

– Podem manter elevados padrões de qualidade e ainda assim ajudarem os que precisam. Norman provou-o com as raparigas de Hiroshima.

– Podemos preparar uma peça na secção de Estilo de Vidae apresentar um endereço para doações – propôs Norman. – Lembrem-se, nada demasiado elegante. Talvez uma página.

– O músculo da caridade deste país já está atrofiado – insistiu Strong-Whitman. – Quantos anos passaram desde que a guerra terminou? Doze? Ninguém vai dar nada.

– Que endereço deveremos colocar? – perguntou outra jovem, com o bloco de notas na mão.

– The Hay, Main Street, Bethlehem, Connecticut – respondi.

Iam mesmo fazer isto? Senti todos os músculos do corpo relaxarem.

– Tem a certeza de que quer que o correio seja enviado para o seu endereço pessoal, Menina Ferriday? – perguntou a mulher.

– Como funcionamos correios em Bethlehem?– perguntou Norman. – Conseguem gerir a correspondência extra?

Pensei no nosso chefe da estação dos correios, Earl Johnson, branco como pão de forma com o seu chapéu branco de explorador e calções de caqui, tantas vezes induzido em erro por um nome mal escrito.

– São de primeira categoria – respondi. – Todos os anos são inundados por correio, porque todos querem o carimbo de Bethlehem nos seus cartões de Natal. Os nossos correios conseguem lidar com isso.

– Então fica Bethlehem – disse Norman. – Parabéns, Caroline. Vamos ver se conseguimos trazer as suas Coelhas para os Estados Unidos.

Norman acabou por escrever um excelente artigo com quatro páginas sobre as Coelhas.

Começava «À medida que inicio este artigo, compreendo que a minha maior dificuldade será convencer as pessoas de que o que aqui é dito não é um vislumbre das profundezas de um inferno imaginário, mas sim parte do nosso mundo...» e ia ficando cada vez melhor, explicando pormenorizadamente e com rigor o drama das raparigas e a sua cruel situação.

Quando a Saturday Review saiu, chegaram algumas cartas, uma delas perguntando se as Coelhas precisavam de um agente teatral, outra se alguma das senhoras estaria disponível para uma apresentação num clube 4-H*. Enfrentei a realidade. De facto, o país estava cansado da caridade.

Na semana seguinte, numa gloriosa e quente manhã de outono, tão enevoada que parecia ver-se o mundo através da gaze de um queijo, acabei de dar de comer aos cavalos no estábulo e fui até ao posto de correios, para recolher a nossa correspondência. A nossa porca, à qual a Mãe dera o nome de Lady Chatterley, seguia-me de perto, aparentemente incapaz de me deixar longe da vista.

Passei pelas amigas da Mãe do Litchfield Garden Club reunidas no jardim, que molhavam as bolachas de coco de Serge – com a forma de uma tábua de lavar roupa – em ponche, com os copos de cristal brilhando como arcos-íris enquanto bebiam. Sally Bloss, a lugar-tenente da Mãe, ainda de tamancos de jardim, o lenço posto como um babete, estava de pé, à frente do grupo, a falar sobre o tema do dia: vespas, as amigas do jardim. Nellie Bird Wilson, pequena e de cabelo escuro, estava ao seu lado, ela própria magra como uma vespa, a segurar no ar um ninho, fino como papel, presumivelmente vago. O calendário social da Mãe estava bastante mais preenchido do que o meu, com o clube de jardinagem, as festas de caridade em Nutmeg Square e no Clube de Dança de Roda e ainda o treino da equipa de basebol.

Quando cheguei aos correios, do outro lado da rua, apenas a alguns passos em relação à TheHay, a bandeira dos Estados Unidos por cima da porta convidou-me a entrar e deixei a Lady Chatterley como nariz colado à porta envidraçada. O nosso pequeno posto de correios era como uma coelheira de pequenos compartimentos, aninhada sob a asa da mercearia Johnson Brothers. Este era um ponto de encontro da cidade, com a nossa única bomba de gasolina e a arca de gelados.

Encontrei Earl Johnson na sala do correio, um espaço que não era maior do que um armário. Estava sentado no seu banco alto, com uma parede branca de cubículos de correio polvilhados de envelopes atrás de si. Pela sua roupa, Earl gostava da zona neutra da roda das cores, dando até a impressão de poder vir a tornar-se indistinto do seu correio, se ficasse ali quietinho durante tempo suficiente. Na sua testa brilhavam gotas de suor, sem dúvida por causa dos dez minutos de árdua separação da correspondência matinal.

Earl inclinou-se para mim através da janela e fez deslizar um folheto referente à próxima feira de Bethlehem na minha direção.

– Que calor – soprou, incapaz de me olhar nos olhos.

Eu seria assim tão assustadora?

– É verdade, Earl.

– Espero que não tenha vindo ao barbeiro lá em baixo. Hoje ele não está a trabalhar.

– É a única coisa para mim? – Peguei no folheto.

Earl levantou-se e deslizou para fora do pequeno cubículo.

– Pode dar-me aqui uma ajuda, Menina Ferriday?

A vida do campo tem os seus encantos, mas senti uma súbita saudade e apreço pela Estação de Correios da Rua 34 de Manhattan, aquele eficiente complexo maciço de colunas.

– É mesmo preciso Earl?

Fez-me sinal para o seguir pelo corredor das traseiras. Parou junto a uma porta fechada.

– Bem...? Abra-a.

– Não posso – admitiu, com um encolher de ombros.

– Então, por amor de Deus, vá buscar a chave. – Abanei-me com o folheto.

– Não está trancada.

Agarrei na maçaneta, rodei-a e depois empurrei a porta com a anca, mas apenas abriu uma fresta para o quarto escuro.

– Está alguma coisa a bloquear a entrada, Earl. O que é que faz o dia todo? Não deve ser muito difícil manter as coisas arrumadas.

– Clyde! – chamou Earl, em voz alta. O sobrinho do Sr. Gardener chegou a correr.

– Sim, Earl? – respondeu o querido Clyde, que não era mais gordo do que duas folhas de papel.

– Vê se consegues entrar ali – pediu.

– Sim, senhor – respondeu, satisfeito por ter uma missão adequada ao seu tamanho. Deslizou pela abertura da porta, como um percevejo a deslizar por baixo de um caixilho de janela.

– Abre a porta, Clyde – indiquei, tentando espreitar pela fresta.

– Não consigo, Menina Ferriday. Está tudo cheio de tralha até à frente.

– Tralha? – Onde é que Clyde ia arranjar aquelas palavras? – Tem mesmo de limpar isto, Earl.

Earl empurrou com o pé um pequeno tronco de madeira.

– Retira o que estiver a tapar a porta, Clyde – disse eu. – Abre os estores das janelas e assim já podemos ajudar.

Ouvi barulho dentro do quartinho, um resmungo de Clyde e o som do correr dos estores.

– Está quase, Menina Ferriday.

Clyde abriu a porta e um encantador sorriso encheu-lhe o rosto, os dentes brancos como as teclas de um piano. A divisão estava repleta de sacos de lona com a indicação de U.S. MAIL impressa a azul, cada um deles suficientemente grande para albergar o próprio Clyde. Os sacos cobriam o chão e o balcão em volta. Alguns até tinham rebentado as pegas de corda, a abarrotar de tal maneira de cartas e embrulhos. Aventurei-me por entre a avalanche de envelopes.

– É tudo endereçado a algumas Coelhas, Menina Ferriday – disse Clyde. – Veja, uma do Havai.

– Meu Deus, Earl – exclamei, meio tonta. – É tudo para nós?

– Há mais dez na carrinha. Têm sido colocados aqui através das janelas.

– Que aconteceu ao lema «Nem a neve, a chuva, o calor ou a escuridão da noite impedem os carteiros de levar a cabo a sua missão», Earl?

– Perdão, menina?

– Porque não me avisou?

Agarrei numa mão-cheia de cartas com remetentes de Boston, Las Vegas... México?

– No Natal tenho mais quinze empregados – explicou Earl. – No verão sou só eu. E há mais sacos na cave. O barbeiro nem consegue lá entrar.

O Sr. Gardener orientou o clube de jardinagem da Mãe num comboio de carrinhos de mão e transportámos o correio para The Hay, com Clyde montado sobre um dos sacos, como se fosse um pónei, e Lady Chatterley esforçando-se para nos acompanhar. Abrimos todas as cartas, separámo-las em pilhas na mesa da sala de jantar e lêmo-las.

– A revista Seventeen está a desenhar uma linha de roupa para as raparigas! – disse Sally Bloss. – O Dr. Jacob Fine, no Hospital Beth Israel está a oferecer assistência médica...

Nellie Bird Wilson agitou uma carta em papel do Roy Rogers. – Kevin Clausen, de Baton Rouge, envia-nos a sua mesada.

– Que querido – comentei, tomando notas de tudo.

– Hospital Nacional Judeu em Denver, Caroline. – A Mãe já nem conseguia abrir os envelopes suficientemente depressa.

– Universidade Estadual de Wayne – disse o Sr. Gardener. – Dr. Jerome Krause, dentista.

Sally levantou uma carta com um cabeçalho com um castelo azul. – A Disneyland de Anaheim está a oferecer passes... As meninas serão convidadas de honra do Sr. Disney.

– A Fundação Danforth envia um cheque, Caroline – informou a Mãe. – E grandalhão.

– A Companhia Converse Rubber quer criar uma coleção de calçado feminino – leu Nellie, abanando-se com um envelope.

– Roupas e malas da Lane Byrant – anunciou Serge.

Organizámos uma pilha para os radiologistas e osteopatas que ofereciam cuidados médicos e outra para os dentistas que ofereciam limpezas. Outra pilha para os hospitais que ofereciam camas. Famílias residentes em Bar Harbor até San Diego abriam-lhes as portas das suas casas. Ao cair da noite tínhamos dinheiro e cheques que totalizavam um valor superior a seis mil dólares, mais do que suficiente para lhes pagar a viagem.

Na Saturday Review seguinte, Norman disse que os Estados Unidos eram «eletrizantes na sua generosidade» e eu estava entorpecida de felicidade.

As nossas Coelhas vinham para a América.

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* A Shriners International, antigamente conhecida como Ancient Arabic Order of the Nobles of the Mystic Shrine, é uma organização ligada à Maçonaria, conhecida por manter hospitais para crianças. Apesar do nome, não está ligada ao Islão nem a qualquer grupo religioso. Os seus membros usam um fez vermelho. (N. da T.)

* Lista dos que beneficiam de pagamentos por parte do governo, no âmbito da monarquia britânica e do orçamento real. (N. da T.)

* Norman Cousins foi um jornalista político, autor e professor americano, defensor da paz mundial. (N. da T.)

* 4-H É uma rede global de organizações de juventude cuja missão é ajudar os jovens a alcançar o seu máximo potencial, sendo o seu nome uma referência aos quatro H, «head, heart, hands, and health». Nos Estados Unidos, a organização é administrada pelo National Institute of Food and Agriculture do Departamento de Agricultura. (N. da T.)