Acostumado a falar sobre seus planos de expansão de negócios e sua visão de 360 graus, Eike Batista foi obrigado a fazer uma manobra de 180 graus na EBX entre 2012 e 2013. Em vez de ampliar, cortar. Em vez de comprar, vender.
Em 2012, ainda mencionava, como argumento para justificar o otimismo, ter US$ 9 bilhões no caixa de suas empresas, mais que suficientes para enfrentar as desconfianças e dificuldades, que aumentaram naquele ano. No segundo semestre de 2013, Eike era obrigado a apresentar, nos balanços das empresas X negociadas em bolsa, uma dívida que havia subido de R$ 19 bilhões para R$ 22,5 bilhões em três meses — R$ 7 bilhões com vencimento em curto prazo —, e apenas R$ 2,4 bilhões para bancar esses compromissos.
O propulsor que havia levado Eike ao topo da onda dos bilionários agora o puxava para o fundo. A OGX chegara a valer R$ 72 bilhões, em outubro de 2010, o ápice da escalada da EBX. Em janeiro de 2013, valia menos de um quinto dessa fortuna, pouco mais de R$ 13 bilhões. Em lugar do espanto pelas realizações da companhia, analistas apostavam com desalento sobre o momento em que ela entregaria os pontos e pediria na Justiça condições de suspender o pagamento a credores para tentar uma recuperação.
Eike passaria o começo de 2013 às voltas com estratégias para salvar seu grupo, ou pelo menos parte dele. Ainda despertaria simpatias, algumas insólitas.
Em janeiro de 2013, o banco britânico Barclays entrou, com grande atraso, na fila dos analistas que ajudaram a empurrar cada vez mais alto os sonhos de Eike: ao anunciarem que iniciavam suas análises sobre empresas de petróleo e gás na América Latina, os analistas do banco sugeriram, como melhor opção de investimento no setor, as ações da OGX, que avaliavam ter potencial para subir, elevando-se dos quase R$ 5 que valiam na época para R$ 7 até o fim do ano. Como justificativa para a previsão, falavam do bom portfólio de áreas de exploração, a produzir ao longo de 2013, e o fato de a empresa ter aprendido com os erros do passado.
Em abril, foi a própria responsável pela fiscalização do setor de petróleo, a presidente da ANP, Magda Chambriard, quem, em entrevista à jornalista Denise Luna, da Folha de S.Paulo, elogiou a OGX, “uma empresa que investe mais do que as outras, até mais do que devia, faz as coisas mais rápido que as outras”. A executiva comparou a empresa de Eike à Petrobras, e deu preferência à petroleira X: “Na última reunião de diretoria, vimos os planos de avaliação da Petrobras, que são longos, enquanto que os da OGX levam cinco, oito meses.”
Ainda não se sabia que os campos avaliados como comerciais no mês anterior pela OGX seriam declarados inviáveis pouco tempo depois e que o poço que havia despejado petróleo em tempo recorde não tinha reservas para chegar ao fim de 2014. E Magda abria o verbo para defender o empresário: “Gostaria de ter mais ‘Eikes’ nos leilões; ele, pelo menos, entrega produção.”
Avaliação bem diferente reinava entre os sócios minoritários de Eike, que em tumultuada reunião de acionistas, em setembro, ouviriam o desabafo berrado por um deles ao garçom que lhe perguntou se queria café: “Não! Quero petróleo!”
Os sinais de deterioração do grupo EBX já eram evidentes quando, em dezembro de 2012, Eliezer Batista procurou o amigo Eduardo Eugênio Gouvêa Vieira, presidente da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro, a Firjan, onde o pai de Eike mantinha uma sala e uma legião de admiradores. Eike estava decidido a buscar alternativas para o grupo, e Gouvêa Vieira, bem-articulado no governo e no setor privado, aparecia a Eliezer como um bom condutor do processo. Faltavam executivos confiáveis para a nova fase da EBX, acreditava Eike.
Em janeiro, Gouvêa Vieira foi nomeado vice-presidente do grupo, uma função honorária, sem poder de fato, e criou um “comitê de gestão”. Dele fariam parte figurões do mundo corporativo, entre eles Pedro Aragão, de um dos mais importantes escritórios de advocacia especializados em fusões e aquisições de empresas; Pedro Wongtschowski, conselheiro do grupo Ultra, um dos maiores conglomerados do país, atuante principalmente na área de distribuição de combustíveis; e o ex-presidente do BNDES e do banco UBS Eleazar de Carvalho Filho. A chegada do novo dirigente levantou rumores de que ele entrara no grupo para facilitar as conversas entre Eike e a Petrobras. Mas Gouvêa Vieira dedicou-se a um projeto mais ambicioso: organizar a EBX como uma corporação, subordinando as empresas X, legalmente, a um comando central, que buscaria sócios privados para a gestão.
A experiência com o novo integrante do grupo X foi um novo recorde para Eike: durou apenas cinquenta dias. Eike e Gouvêa Vieira divergiram nas negociações para ceder o controle da MPX ao sócio alemão, a empresa E.On, com apoio do BNDES. E pesou, especialmente, a rejeição de Eike ao plano de transformar a EBX em uma holding, reunindo nela as ações de Eike e das Centennials, com a procura de sócios estratégicos e abertura do capital em bolsa para a busca de novos parceiros.
O mapa de participações cruzadas entre as empresas de Eike era um emaranhado difícil de destrinchar, e seria necessário melhorar a gestão da EBX, especialmente no controle de seu fluxo de caixa, chegou a comentar Gouvêa Vieira com pessoas próximas a Eike.
Em 6 de março, dissolvia-se a parceria da EBX com o presidente da Firjan. E Eike se voltava a um velho conhecido, o também bilionário André Esteves, do BTG Pactual, matemático de formação e agressivo operador de finanças. O BTG Pactual foi encarregado da estratégia de salvação do Império X. Entre os problemas a serem enfrentados estava a relação com o fundo Mubadala, sediado em Abu Dhabi, credor de R$ 2 bilhões, e não sócio da EBX, como se imaginava.
O temperamento forte de Eike já trombara algumas vezes com o de Esteves, que era malvisto no círculo de conselheiros de Eliezer Batista. Mas havia sido Esteves um dos principais sócios na largada da OGX e um dos consultores preciosos durante os outros lançamentos das empresas X na bolsa. Entre a abertura de capital das companhias X e a operação de salvamento do grupo, o ambiente mudara radicalmente.
Era o fim da euforia com o Brasil e os emergentes; a China, que seguia como a maior compradora de produtos básicos brasileiros e ainda avançava, como investidora, em atividades de produção, para garantir suprimento de minério e petróleo, desacelerava seu crescimento e ameaçava reduzir o impulso que garantia à economia mundial. A economia brasileira atolava-se em baixo crescimento e alta inflação, o que obrigaria o governo a retomar a alta de juros — receita sempre indigesta para o mercado de valores porque, em um cenário de aperto, os investidores tendem a correr para títulos da dívida do governo federal, aplicação de rentabilidade mais segura.
Logo se armou uma estratégia pela qual Eike buscaria vender seu controle nas empresas X de maior potencial, usando o dinheiro para abater suas dívidas e reduzir o risco de falência. A situação da OGX e da OSX, porém, foi diagnosticada por Esteves como terminal.
As empresas pré-operacionais de Eike estouraram prazos para entregar aos acionistas os resultados prometidos. O caixa minguado ameaçava deixá-las sem condições de cumprir os ambiciosos planos de investimento. Isso não impedia que investidores de peso vissem potencial nos empreendimentos.
A MPX foi uma das primeiras empresas na linha de reciclagem do grupo X, uma das melhores na prateleira de liquidação de Eike. Ela chegou a 2013 com algum fôlego, graças a um novo sócio, a E.On, que buscava alternativas ao declinante mercado europeu e fechou negócio ainda no início de 2012 com a companhia do grupo EBX.
A operação de entrada da E.On na empresa de energia de Eike havia resultado na criação da última das empresas X lançadas na bolsa, a CCX, costela retirada da MPX, com direitos de mineração de carvão na Colômbia e projeto para construir um porto e uma ferrovia de 150 quilômetros. Caçula do grupo, a CCX teve história semelhante à de suas irmãs: começou em clima de otimismo triunfante e acabou fora da família.
Nasceu valendo R$ 1 bilhão, em maio de 2012, com direito a declarações de Eike de que sua produção, com carvão de altíssima qualidade, seria equivalente a um terço da produção do minério na Colômbia e três vezes a do Brasil. Laudo da avaliadora Brasil Plural, contratada pela própria empresa, porém, previa que só em 2016 as minas começariam de fato a produzir carvão, e os portos e ferrovias só estariam ativos em 2019. Apesar disso, dirigentes da empresa previam o começo da extração do mineral para o segundo semestre de 2013, e Eike já antevia os mercados para seu produto de altíssima qualidade: “Esse carvão colombiano será enviado para Europa e América do Norte, além de Brasil e Chile”, disse, em teleconferência a jornalistas. Quem apostou nessas promessas perdeu dinheiro.
No fim de julho, a CCX divulgava seu balanço, sem carvão e quase sem caixa, com menos de R$ 50 milhões para financiar suas operações. Acabou vendida, em outubro, para a empresa turca Yildirim Holdings, cujo presidente na sucursal colombiana, Alp Malazgirt, já previa, em janeiro, a uma revista especializada: “Colômbia é o novo Brasil.” Por R$ 50 milhões foram compradas as minas a céu aberto, e iniciaram-se conversas para adquirir, por R$ 400 milhões, a mina subterrânea, com enormes reservas, caso se comprovassem os dados fornecidos pelo grupo X, em negociações previstas para avançar 2014 adentro. Última a ser criada, a CCX também foi a derradeira a ter definido seu rumo fora da órbita do grupo X, em um ano de negociações e boatos intensos sobre o império decadente de Eike Batista.
Ao iniciar a operação-resgate das empresas X, o BTG Pactual criou um plano pelo qual Eike venderia uma parcela de suas ações da MPX à sócia E.On e lançaria no mercado de ações algo em torno de R$ 1,2 bilhão, permanecendo à frente da companhia. O plano corria o risco de terminar em fiasco nas bolsas. Ao final, os alemães da E.On compraram quase 38% da empresa, e Eike manteve pouco menos de 24%. O BTG Pactual também comprou uma parcela da empresa sob nova direção, o que ajudou os desafetos do financista a alimentarem a intriga de que o banqueiro estava ao lado do empresário apenas para salvar os investimentos que havia feito nas empresas X.
Eike, que chegara a chamar Esteves para ser sócio do que restava de seu grupo, iria, nos meses seguintes, queixar-se de que o banqueiro queria apenas garantir bons negócios para seus fundos de investimento. Dizia que estava sozinho, que não podia mais confiar em ninguém. Esteves, ao firmar o acordo para salvar o grupo X, em março, anunciara a disposição de lhe dar uma linha de crédito de até R$ 1 bilhão, mas a oferta foi cancelada em julho, após seguida deterioração do valor das empresas X nas bolsas e rumores de que a ligação com as empresas de Eike começava a causar dano à imagem do próprio BTG Pactual.
Em agosto, em entrevista à revista Veja, o banqueiro defenderia Eike contra acusações de má-fé, adiantaria que “uma ou outra empresa” do grupo não tinha “mais jeito” e confirmaria que os executivos da OGX retardaram a divulgação dos maus resultados na prospecção de petróleo na “esperança de que uma perfuração de última hora pudesse salvar a situação”. No mês seguinte, em palestra para investidores em Minas Gerais, comentaria que Eike cometeu “erros grosseiros de análise e avaliação”, com projetos “muito grandes, muito complexos (que) demandaram muito capital do mercado financeiro”.
Esteves insistia que Eike era “um grande empresário”, mas admitia: sua função seria “mitigar os danos dessa derrocada”. Os desentendimentos entre ele e Eike sobre os rumos a seguir e a constatação de que a OGX era praticamente irrecuperável e a OSX poderia seguir o mesmo caminho levaram Eike a buscar outros mitigadores de danos. E o empresário recorreu à consultora Angra Partners, especializada em negociações de reestruturação de dívidas e venda de empresas.
No mesmo mês de maio em que Eike decidiu o futuro da MPX com os alemães da E.On, a petroleira OGX conseguia animar o mercado ao entrar cheia de força na 11ª rodada do leilão de áreas de exploração de gás feito pela ANP, com a aquisição de 13 dos lotes postos à venda. Chegou a anunciar que exploraria poços em sociedade, meio a meio, com a MPX, mas faltou fôlego novamente à “mini-Petrobras” do grupo X. Três meses depois, ela devolveu oito dos lotes comprados, inclusive o que pretendia compartilhar com a empresa de energia.
O parentesco com o grupo X constrangia os alemães, que de fevereiro a julho viram a empresa perder 20% de seu valor nas bolsas, apesar de considerada uma das melhores da mal falada família. Em agosto, mês em que as ações continuariam em queda e terminariam 40% abaixo do valor de fevereiro, o presidente do conselho da E.On, Jorgen Kildahl, confirmava ao jornalista Alexandre Rodrigues, da revista Exame, que os dirigentes haviam decidido mudar o nome da empresa, para deixar bem claro o divórcio com o império de Eike. E Eike acabava de adotar outra providência, mais prática: levemente estimulado pelos sócios, o criador do grupo X, que ocupara até julho a presidência do conselho de administração da companhia, para alívio dos sócios, pediu para sair do posto.
“A MPX é uma empresa independente, bem-administrada. Faz sentido mudar o nome e ter certeza de que somos percebidos desse jeito”, explicava Kildahl à Exame, em uma crítica quase explícita ao estilo X de administração. Só em setembro, para deixar para trás suas origens turbulentas, a MPX passava a exigir que a chamassem de Eneva (que desafetos do ex-bilionário espalharam ser uma abreviação para “Eike, never again”. No site oficial, a explicação para o nome é bem menos pitoresca: seria a combinação da letra E, de energia, com Neva, “que remete a ‘nova’”). Em novembro a Eneva compraria a OGX-Maranhão, parte da petroleira de Eike atuante nos poços de gás explorados no Nordeste — usados nas termelétricas da ex-MPX. Também rebatizaria sua nova afiliada, livrando-se do nome com X, para Parnaíba Gás Natural.
Confirmando as teses de amigos de que a aventura X foi capaz de deixar algum patrimônio ao país, a Eneva, mesmo bastante endividada, não deixava de ser uma empresa de respeito, capaz de fornecer 1,78 GW de energia, com outros 1,1 GW em instalação, algo como 4% do consumo do país, no total. Eike seguiria com 24% das ações da nova empresa. Suas ações estavam amarradas, como garantia, a empréstimos contratados ao Itaú BBA. Mas o anúncio de sua saída do conselho de administração da empresa faria subir as ações na bolsa, em despedida. Estava encerrada a era das previsões deslumbrantes.
Ficou um patrimônio, mas também um desafio para quem o assumisse. Ao chegar a setembro, a Eneva ainda lutava para dar lucro, prejudicada pelo aumento nos preços de combustível e por paralisações em suas usinas; sua dívida estava em cerca de R$ 5,5 bilhões, dos quais R$ 2,5 bilhões vencendo em curto prazo.
Como de praxe em toda a canibalização do grupo X durante 2013, pipocaram notícias na imprensa sobre as tentativas do empresário de vender a participação que lhe restou na MPX/Eneva, o que daria ao futuro comprador assento no controle da companhia. A japonesa Marubeni Corp., o fundo de investimentos australiano IFM Australian Infrastructure Fund e o fundo de pensões Canada Pension Plan Investment Board foram cogitados entre os possíveis interessados, mas a venda esbarrou nos preços acima do mercado pedidos pelo ex-controlador.
Após abrir mão do controle — e do nome — de sua empresa de energia, Eike buscou comprador para sua “Roterdã dos trópicos”, a essa altura desmoralizada pelos atrasos e pela falta de ligação ferroviária com o resto do Brasil. Conseguiu vender a LLX, responsável pelo Porto do Açu, ao grupo americano EIG Global Energy Partners, uma gestora de investimentos com base nos Estados Unidos detentora de participação também na Sete Brasil, empresa de fornecimento de serviços ao setor de petróleo que tem entre os sócios grandes bancos e a Petrobras.
“As negociações vão acelerar, agora que não há mais associação direta com a figura do antigo controlador. Nosso telefone não para de tocar”, dizia, entusiasmado, o presidente da EIG, Blair Thomas, em outubro, à jornalista Marina Durão, da Agência Estado, ao falar das expectativas de atrair indústrias ao Porto do Açu. Era uma maneira de despachar Eike para o esquecimento, uma tentativa de disfarçar o fato de que, mesmo com as mudanças, o sr. X manteve ainda 20% das ações da companhia, e seus executivos permaneceram no controle das operações. A venda da LLX marcou o afastamento entre Eike e André Esteves. Desconfiado, o comandante do grupo X fez o negócio sem passar pelo antigo parceiro.
A sinergia entre as empresas X, sempre elogiada por Eike como uma das qualidades de seus empreendimentos, mostrou, durante as tentativas de salvar o grupo, seu lado negativo: com o fiasco da petroleira, afundou-se também o projeto de criar a “Embraer dos mares”, seu estaleiro OSX, que, ao ser anunciado, apresentava como trunfo as encomendas “garantidas” de quatro embarcações destinadas à exploração de petróleo pela OGX, e um potencial de R$ 30 bilhões em contratos da empresa-irmã. Em agosto, o encolhimento da OGX provocaria o cancelamento das encomendas, deteriorando a situação do estaleiro.
A OSX, por sua vez, era a empresa-âncora do porto da LLX, uma das primeiras a garantir o aluguel de parte dos 90 mil km2 da chamada “retroárea” do Açu. Quebrada a cliente OGX, sem necessidade de tanto espaço, a empresa que construiria navios e plataforma para a busca de petróleo de Eike devolveu metade dos seus 3,2 km2 de terreno alugado à LLX, para economizar uma despesa de cerca de R$ 100 milhões anuais.
Não faltou aviso a Eike de que suas pretensões de armador estavam superdimensionadas. Carlos Bellot, presidente da OSX, em agosto demitido entre os vários executivos degolados na reestruturação do grupo X, chegou a tentar, ainda em janeiro de 2012, trazer o empresário a uma realidade administrável. Olhando a carteira de encomendas da empresa, com mais de vinte navios processadores e armazenadores de petróleo e mais de trinta plataformas fixas, sugeriu reduzir a conta a cerca de um décimo. “Você não devia ser executivo da minha empresa, usa calças curtas”, reagiu Eike, humilhando o subordinado em reunião com outros executivos do grupo X — já acostumados, aliás, a esse tipo de reação.
De calças-curtas seria uma boa definição, em 2013, para a situação em que se viram os controladores da OSX.
Já na criação, o estaleiro de Eike foi um sinal dos limites para a magia do então maior bilionário do Brasil. Seu lançamento de ações, em março de 2010, ano do auge do grupo X, teve de início o objetivo de captar até R$ 9 bilhões dos novos investidores, meta logo ajustada para R$ 3 bilhões, devido a sinais de encolhimento do mercado de valores. A empresa conseguiu só R$ 2,4 bilhões e teve de recorrer a empréstimos bancários para fabricar ou arrendar suas plataformas e seus navios de exploração de petróleo.
Nos anos seguintes, esforços para aumentar as encomendas da empresa, como o fornecimento de sondas para a prestadora de serviços Sete Brasil, foram frustrados pela Petrobras, que desaconselhou seus fornecedores a ampliarem investimentos. E a demora em começar a produção fez com que a OSX perdesse contratos com outros clientes do setor privado. A partir de junho de 2012, com o malogro dos poços da OGX, as encomendas do estaleiro de Eike minguaram, a ponto de inviabilizar a companhia. Em novembro de 2013, dias depois do pedido de recuperação judicial da OGX, a OSX era obrigada a tentar evitar a falência pedindo na Justiça um prazo de recuperação para seus negócios.
Antes de ver submergir suas duas empresas do ramo de petróleo, Eike ainda conseguiu pôr a salvo uma terceira companhia X, sua mineradora. Na prática, o que a salvou foi o porto Sudeste, vinculado à companhia, que havia despertado interesse de outras companhias do setor de minério, em busca de alternativas para embarque de seu produto ao exterior. Após meses de negociação, a MMX Porto Sudeste, subsidiária da companhia que controla as instalações portuárias em Itaguaí, no Rio de Janeiro, acabou nas mãos da trading holandesa Trafigura e do fundo de investimentos árabe Mubadala, um dos maiores credores do grupo X. A MMX manteve 35% das ações da antiga subsidiária.
A venda veio em boa hora: em novembro, a MMX seria obrigada a apagar da contabilidade R$ 900 milhões em ativos inexistentes, ao reavaliar suas minas de Serra Azul e Bom Sucesso, em Minas Gerais, que, mais uma vez, mostravam ser bem menos valiosas do que pintavam as fantasias de Eike. Com a venda do controle da MMX Porto Sudeste, em outubro, o empresário transferiu aos compradores mais R$ 1,3 bilhão em dívidas — mantendo ainda, como nas outras firmas, uma participação minoritária. Os novos donos permitiram à MMX pensar em um novo futuro, renegociando dívidas com bancos privados e o BNDES, na expectativa de retomar as obras das instalações portuárias, paralisadas à espera de dinheiro.
Ações da MMX foram transferidas por Eike ao seu credor árabe, o fundo Mubadala, que renegociou em junho seus empréstimos de R$ 2 bilhões com a EBX, recebendo parte em dinheiro e trocando por avais mais confiáveis as garantias, antes vinculadas a empresas X em dificuldades. Cerca de US$ 1,5 bilhão que permaneceram como crédito ao dono da EBX passaram a ter, como garantia, empresas fechadas do grupo, como a IMX, de eventos culturais, e, principalmente, a AUX, dona de uma promissora mina, a La Bodega, na Colômbia.
Notícias de uma possível venda da AUX, com a Bodega de Eike e suas outras minas, fizeram parte, durante 2013, dos boatos que cercaram o desmonte do Império X. Mas, estabelecida no começo da década, em período de forte alta nas cotações do ouro, a AUX certamente daria mais um prejuízo ao empresário caso mudasse de mãos em uma época de queda no valor do metal, em 2013.
A venda do patrimônio que sobrou na MMX passou a ser um dos recursos de Eike para cobrir suas dívidas, cujo tamanho exato é desconhecido, já que ele comprometeu uma parte de suas finanças pessoais para servir de aval a créditos das empresas do grupo. Para a Bloomberg, em cálculo divulgado em novembro, de bilionário, Eike só teria a dívida: mesmo vendendo suas propriedades, ao fim de 2013, o ex-magnata teria um patrimônio negativo, próximo a menos R$ 1 bilhão.
Já não mais o “ícone no mundo dos negócios” descrito em sua autobiografia, Eike Batista passou a uma situação que evoca seus tempos de infância: jogado, sem fôlego, em um ambiente gélido, aprendendo a lutar pela sobrevivência. Em setembro de 2013, em sua entrevista, rompendo o silêncio de meses, ao Wall Street Journal, viu-se obrigado a comentar a própria bravata, sobre a invulnerabilidade de seus negócios.
“Essas coisas são, de algum modo, à prova de idiotas, porque você pode vendê-las mesmo num mercado louco”, insistiu.
Naquele mês, o Journal notaria um novo hábito de Eike, que outros interlocutores do empresário constatariam também em outubro e em novembro: ele estava encantado com o empresário norte-americano Elon Musk, criador da empresa de pagamentos na internet Paypal, da agência de viagens espaciais SpaceX e da montadora de carros elétricos Tesla Motors. O dono do grupo X encomendou um vídeo sobre o empreendedor dos Estados Unidos e passou a mostrá-lo a visitantes, apontando as soluções de Musk para os problemas em suas empresas como exemplo da capacidade de enfrentar dissabores e manter-se em atividade.
“Musk disse que começar uma empresa é como comer vidro; eu estou comendo vidro”, disse Eike ao jornal norte-americano. Seria uma boa definição, se ele estivesse iniciando, e não encerrando, sua aventura como o piloto do bólido X.