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ARRANHAR

Era Bast arranhando a janela de Karou. As venezianas estavam fechadas pelos compridos trincos de bronze e, do outro lado do quarto, as tábuas de Mik estavam enfiadas nos sulcos do chão, pressionando a maçaneta e as dobradiças. A porta e a janela estavam bem fechadas; Issa e Karou, dentro do quarto, inquietas. Karou andava de um lado para o outro. Issa agitava a cauda. Esperavam alguma coisa acontecer.

E aconteceu.

O arranhar nas venezianas. Um sussurro rouco.

— Karou. Karou, abra a janela.

Karou recuou, assustada.

— Quem está aí?

— Sou eu, Bast. Estou de sentinela, não devia ter vindo aqui.

— E por que veio? — retrucou Karou com raiva.

Se Bast tivesse atravessado o pátio de manhã para se colocar ao lado dela, outros poderiam ter feito isso também. E se eles tivessem lhe dado apoio? Karou nem sabia o que teria feito. Aquilo tudo parecia tão fora de sua zona de conforto que ela só queria se encolher em um canto e chorar. Ah, Brimstone, você achou mesmo que eu conseguiria fazer isso? Bem, ele não poderia saber que o Lobo sobreviveria à guerra, pronto para frustrar cada passo seu.

— É... É o Lobo — disse Bast em resposta, e Karou sentiu como se todo o ar tivesse sido sugado do quarto. Ali estava o que faltava. O que Thiago tinha feito? — Ele levou Amzallag e as esfinges. Eu os vi lá da torre.

Levou? Karou e Issa trocaram um olhar alarmado. Karou escancarou a janela. Bast se apoiou no peitoril estreito, batendo suavemente as asas semiabertas para se manter equilibrada.

— Levou para onde? — perguntou Karou.

Bast parecia abalada.

— Para o fosso — sussurrou ela.

Mais tarde Karou se perguntaria se Bast tinha sido cúmplice ou apenas um peão de Thiago, mas naquele momento não suspeitou. Seu horror parecia real, e talvez até fosse. Talvez estivesse pensando que poderia ser ela a próxima a fazer aquela caminhada, por ter chegado tão perto de apoiar Karou. E talvez — provavelmente — estivesse pensando que nunca mais pensaria em cometer esse erro.

Não se fica contra o Lobo.

Com mãos trêmulas, Karou prendeu de novo o cinto com suas facas. Sentiu-se melhor com o peso das lâminas em lua crescente na cintura. A janela aberta estava a sua frente. Issa, ao seu lado, não podia sair por ali. Karou olhou para ela.

— Vou atrás de você, docinho. — Issa seguiu para a porta, as escamas ondulando. — Vá. Estarei logo atrás de você.

Karou saiu para a noite lá fora. Já estava sobre o baluarte quando Issa tirou as tábuas, colocou-as de lado e abriu a porta.

E deu de cara com Ten.