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PATRIMÔNIO GENÉTICO

Sumário: 19.1. Biodiversidade: 19.1.1. Previsão constitucional, definição e regulamentação; 19.1.2. Patrimônio genético, conhecimento tradicional associado e acesso/transferência de tecnologia19.2. Biossegurança: 19.2.1. A pesquisa com células-tronco embrionárias e o direito fundamental à vida; 19.2.2. A pesquisa com Organismos Geneticamente Modificados – OGM; 19.2.3. CIBio; 19.2.4. CNBS; 19.2.5. CTNBio; 19.2.6. SIB; 19.2.7. Órgãos e entidades de registro e fiscalização; 19.2.8. Responsabilidade civil e administrativa; 19.2.9. Regras de transição; 19.2.10. Licenciamento ambiental19.3. A situação brasileira19.4. Questões de concursos públicos comentadas.

19.1. BIODIVERSIDADE

19.1.1. Previsão constitucional, definição e regulamentação

A Constituição Federal, no seu artigo 225, § 1.º, II, determina que o Poder Público e a coletividade têm que preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético.

A biodiversidade ou diversidade biológica é definida pelo Dicionário Aurélio da língua portuguesa como “a existência, numa dada região, de uma grande variedade de espécies, ou de outras categorias taxonômicas de plantas ou de animais”.

Deveras, o Brasil ratificou a Convenção da Biodiversidade, que ingressou em nosso ordenamento jurídico por meio do Decreto de promulgação 2.519/1998, pois o Decreto Legislativo, por si só, não tem esse condão (DL 2/1994).

Para esse tratado, diversidade biológica “significa a variabilidade de organismos vivos de todas as origens, compreendendo, dentre outros, os ecossistemas terrestres, marinhos e outros ecossistemas aquáticos e os complexos ecológicos de que fazem parte; compreendendo ainda a diversidade dentro de espécies, entre espécies e de ecossistemas”.

A diversidade biológica brasileira é diferenciada, conforme narrado no sítio do Ministério do Meio Ambiente:

“O Brasil abriga o maior número de primatas com 55 espécies, o que corresponde a 24% do total mundial; de anfíbios com 516 espécies; e de animais vertebrados com 3.010 espécies de vertebrados vulneráveis, ou em perigo de extinção. O país conta também com a mais diversa flora do mundo, número superior a 55 mil espécies descritas, o que corresponde a 22% do total mundial. Possui por exemplo, a maior riqueza de espécies de palmeiras (390 espécies) e de orquídeas (2.300 espécies). Possui também 3.000 espécies de peixes de água doce totalizando três vezes mais que qualquer outro país do mundo.

Uma em cada onze espécies de mamíferos existentes no mundo é encontrada no Brasil (522 espécies), juntamente com uma em cada seis espécies de aves (1.622), uma em cada quinze espécies de répteis (468), e uma em cada oito espécies de anfíbios (516). Muitas dessas são exclusivas para o Brasil, com 68 espécies endêmicas de mamíferos, 191 espécies endêmicas de aves, 172 espécies endêmicas de répteis e 294 espécies endêmicas de anfíbios. Esta riqueza de espécies corresponde a, pelo menos, 10% dos anfíbios e mamíferos e 17% das aves descritas em todo o planeta”.

Outrossim, a Convenção da Biodiversidade definiu biotecnologia como “qualquer aplicação tecnológica que utilize sistemas biológicos, organismos vivos, ou seus derivados, para fabricar ou modificar produtos ou processos para utilização específica”.

Com o desiderato de regulamentação da Constituição e da Convenção da Biodiversidade, foi editada a Medida Provisória 2.186-16/2001, que regula o acesso ao patrimônio genético, a proteção e o acesso ao conhecimento tradicional associado, a repartição de benefícios e o acesso à tecnologia e transferência de tecnologia para sua conservação e utilização.

Pontifica o artigo 7.º, XIX, da Lei Complementar 140/2011, ser competência da União controlar a exportação de componentes da biodiversidade brasileira na forma de espécimes silvestres da flora, micro-organismos e da fauna, partes ou produtos deles derivados.

19.1.2. Patrimônio genético, conhecimento tradicional associado e acesso/transferência de tecnologia

Conforme referido, são temas disciplinados pela Medida Provisória 2.186-16/2001, que busca a proteção da diversidade biológica brasileira, não se aplicando as suas disposições ao patrimônio genético humano, pois é tema regulado pela Lei 11.105/2005, conforme será visto.

Nos termos do artigo 7.º, XXIII, da Lei Complementar 140/2011, é competência administrativa da União gerir o patrimônio genético e o acesso ao conhecimento tradicional associado, respeitadas as atribuições setoriais.

Inicialmente, para o bom entendimento do assunto, é imprescindível se referir às definições legais. Considera-se patrimônio genético a informação de origem genética, contida em amostras do todo ou de parte de espécime vegetal, fúngico, microbiano ou animal, na forma de moléculas e substâncias provenientes do metabolismo destes seres vivos e de extratos obtidos destes organismos vivos ou mortos, encontrados em condições in situ, inclusive domesticados, ou mantidos em coleções ex situ, desde que coletados em condições in situ no território nacional, na plataforma continental ou na zona econômica exclusiva.

Já o conhecimento tradicional associado é definido como a informação ou prática individual ou coletiva de comunidade indígena ou de comunidade local, com valor real ou potencial, associada ao patrimônio genético

Por sua vez, o acesso ao patrimônio genético é a obtenção de amostra de componente do patrimônio genético para fins de pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico ou bioprospecção, visando a sua aplicação industrial ou de outra natureza, ao passo que o acesso ao conhecimento tradicional associado é a obtenção de informação sobre conhecimento ou prática individual ou coletiva, associada ao patrimônio genético, de comunidade indígena ou de comunidade local, para fins de pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico ou bioprospecção, visando sua aplicação industrial ou de outra natureza.

Fechando as definições julgadas básicas para a introdução do tema, o acesso à tecnologia e transferência de tecnologia é a ação que tenha por objetivo o acesso, o desenvolvimento e a transferência de tecnologia para a conservação e a utilização da diversidade biológica ou tecnologia desenvolvida a partir de amostra de componente do patrimônio genético ou do conhecimento tradicional associado.

De efeito, há um grande controle estatal sobre o nosso banco genético, com o desiderato de reprimir a biopirataria, pois o Brasil é a nação mais rica no mundo em diversidade biológica.

Lamentavelmente, o Congresso Nacional ainda não aprovou a Política Nacional de Biodiversidade, mas certamente a sua instituição ocorrerá em breve, já existindo princípios e diretrizes postos pelo Decreto 4.339/2002.

Para se ter acesso ao patrimônio genético brasileiro, é preciso obter autorização da União, que controlará o seu uso, comercialização e aproveitamento para quaisquer fins, vedado o acesso ao patrimônio genético para práticas nocivas ao meio ambiente e à saúde humana e para o desenvolvimento de armas biológicas e químicas.

Entretanto, no que concerne às comunidades indígenas e comunidades locais,1 foram preservados o intercâmbio e a difusão de componente do patrimônio genético e do conhecimento tradicional associado praticado entre si para seu próprio benefício e baseados em prática costumeira.

No âmbito do Ministério do Meio Ambiente, foi criado o Conselho de Gestão do Patrimônio Genético – CGEN, com composição fixada pelo Decreto 3.945/2001, a quem compete coordenar a implementação de políticas para a gestão do patrimônio genético, bem como estabelecer normas técnicas, critérios para as autorizações de acesso e de remessa, diretrizes para a elaboração do Contrato de Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de Benefícios e critérios para a criação de base de dados para o registro de informação sobre conhecimento tradicional associado.

O Conselho de Gestão ainda terá as seguintes competências, na forma do artigo 11, da MP 2.186-16/2001, podendo deliberar sobre:

“a) autorização de acesso e de remessa de amostra de componente do patrimônio genético, mediante anuência prévia de seu titular;

b) autorização de acesso a conhecimento tradicional associado, mediante anuência prévia de seu titular;

c) autorização especial de acesso e de remessa de amostra de componente do patrimônio genético à instituição nacional, pública ou privada, que exerça atividade de pesquisa e desenvolvimento nas áreas biológicas e afins, e à universidade nacional, pública ou privada, com prazo de duração de até dois anos, renovável por iguais períodos, nos termos do regulamento;

d) autorização especial de acesso a conhecimento tradicional associado à instituição nacional, pública ou privada, que exerça atividade de pesquisa e desenvolvimento nas áreas biológicas e afins, e à universidade nacional, pública ou privada, com prazo de duração de até dois anos, renovável por iguais períodos, nos termos do regulamento;

e) credenciamento de instituição pública nacional de pesquisa e desenvolvimento ou de instituição pública federal de gestão para autorizar outra instituição nacional, pública ou privada, que exerça atividade de pesquisa e desenvolvimento nas áreas biológicas e afins:

1. a acessar amostra de componente do patrimônio genético e de conhecimento tradicional associado;

2. a remeter amostra de componente do patrimônio genético para instituição nacional, pública ou privada, ou para instituição sediada no exterior;

f)    credenciamento de instituição pública nacional para ser fiel depositária de amostra de componente do patrimônio genético;

V – dar anuência aos Contratos de Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de Benefícios quanto ao atendimento dos requisitos previstos nesta Medida Provisória e no seu regulamento;

VI – promover debates e consultas públicas sobre os temas de que trata esta Medida Provisória;

VII – funcionar como instância superior de recurso em relação a decisão de instituição credenciada e dos atos decorrentes da aplicação desta Medida Provisória;

VIII – aprovar seu regimento interno”.

“O CGEN, órgão de caráter deliberativo e normativo criado pela MP 2.186-16 no âmbito do Ministério do Meio Ambiente, é integrado por representantes de 19 órgãos e entidades da Administração Pública Federal (Ministério do Meio Ambiente; Ministério da Ciência e Tecnologia; Ministério da Saúde; Ministério da Justiça; Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento; Ministério da Defesa; Ministério da Cultura; Ministério das Relações Exteriores; Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior; IBAMA; Instituto de Pesquisa Jardim Botânico do Rio de Janeiro; CNPq; Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia; Instituto Evandro Chagas; Embrapa; Fundação Oswaldo Cruz; Funai; Instituto Nacional de Propriedade Industrial; Fundação Cultural Palmares) com direito a voto.

O CGEN é presidido pelo Ministério do Meio Ambiente, atualmente representado pela Secretária de Biodiversidade e Florestas, e reúne-se, ordinariamente, uma vez por mês, preferencialmente em Brasília, DF. O Departamento de Patrimônio Genético – DPG, da Secretaria de Biodiversidade e Florestas – SBF/MMA, exerce a função de Secretaria-Executiva do CGEN. O CGEN possui cinco câmaras temáticas, de caráter técnico, que subsidiam as discussões do Conselho. São elas: Procedimentos Administrativos, Conhecimento Tradicional Associado, Repartição de Benefícios, Patrimônio Genético Mantido em Condições ex situ e Acesso à Tecnologia e Transferência de Tecnologia. O CGEN, por meio de sua Câmara Temática de Procedimentos, está avaliando a melhor maneira de ampliar a representação da sociedade no Conselho”.2

Além de proteger o conhecimento tradicional associado das comunidades indígenas e locais, o legislador reconheceu expressamente o direito desses povos de decidir sobre o uso de seus conhecimentos tradicionais associados ao patrimônio genético, inclusive o declarando patrimônio cultural brasileiro, não podendo ser obstados a preservação, a utilização e o desenvolvimento de conhecimento tradicional de comunidade indígena ou comunidade local.

Foi ressalvada a propriedade intelectual, de modo que a proteção ao conhecimento tradicional associado não a prejudicará ou limitará, em claro dispositivo que atende apenas aos interesses econômicos.

Entrementes, a concessão de direito de propriedade industrial pelos órgãos competentes, sobre processo ou produto obtido a partir de amostra de componente do patrimônio genético, fica condicionada à observância nas normas fixadas pela MP 2.186-16/20001, devendo o requerente informar a origem do material genético e do conhecimento tradicional associado, quando for o caso.

Outrossim, reconheceu-se a titularidade do conhecimento tradicional associado à comunidade ou mesmo a um único indivíduo, desde que apenas este o detenha.

Como consectário dessa titularidade, foram conferidos direitos às comunidades, como ter indicada a origem do acesso ao conhecimento tradicional em todas as publicações, utilizações, explorações e divulgações, assim como impedir terceiros não autorizados de utilizá-la ou divulgá-la.

As comunidades também terão o direito de perceber benefícios pela exploração econômica por terceiros, direta ou indiretamente, de conhecimento tradicional associado, cujos direitos são de sua titularidade.

Com propriedade, o acesso a componente do patrimônio genético existente em condições in situ (no lugar) no território nacional, na plataforma continental e na zona econômica exclusiva, e ao conhecimento tradicional associado far-se-á mediante a coleta de amostra e de informação, respectivamente, e somente será autorizado a instituição nacional, pública ou privada, que exerça atividades de pesquisa e desenvolvimento nas áreas biológicas e afins, mediante prévia autorização, a ser concedida pelo Conselho de Gestão.

Foram instituídas duas espécies de autorização:

Autorização de Acesso e de Remessa – documento que permite, sob condições específicas, o acesso a amostra de componente do patrimônio genético e sua remessa à instituição destinatária e o acesso a conhecimento tradicional associado;

Autorização Especial de Acesso e de Remessa – documento que permite, sob condições específicas, o acesso a amostra de componente do patrimônio genético e sua remessa à instituição destinatária e o acesso a conhecimento tradicional associado, com prazo de duração de até dois anos, renovável por iguais períodos.

A concessão da Autorização de Acesso e de Remessa pressupõe:

• Anuência prévia da comunidade indígena, ouvida a FUNAI, se o acesso se localizar em terra indígena;

• Concordância prévia do órgão competente, quando se tratar de área protegida, a exemplo das unidades de conservação;

• Anuência prévia do titular da área privada, se nela ocorrer;

• Concordância prévia do Conselho de Defesa Nacional, quando o acesso se der em área indispensável à segurança nacional, ou da autoridade marítima, quando o acesso se der em águas jurisdicionais brasileiras, na plataforma continental e na zona econômica exclusiva.

Entretanto, em caso de relevante interesse público, assim caracterizado pelo Conselho de Gestão, o ingresso em área pública ou privada para acesso a amostra de componente do patrimônio genético dispensará anuência prévia dos seus titulares, garantida a estes parte dos benefícios.

A pesquisa do patrimônio genético ocorrerá preferencialmente em território brasileiro, sendo a participação de pessoa jurídica estrangeira em expedição para coleta de amostra de componente do patrimônio genético in situ e para acesso de conhecimento tradicional associado somente autorizada quando em conjunto com instituição pública nacional, ficando a coordenação das atividades obrigatoriamente a cargo desta última e desde que todas as instituições envolvidas exerçam atividades de pesquisa e desenvolvimento nas áreas biológicas e afins.

Vale ressaltar que a conservação ex situ3 de amostra de componente do patrimônio genético deve ser realizada no território nacional, podendo, suplementarmente, a critério do Conselho de Gestão, ser realizada no exterior.

Na hipótese de perspectiva de utilização de comercial de produto ou processo resultante da utilização de componente do patrimônio genético, será necessária a prévia assinatura de Contrato de Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de Benefícios, assim considerado o instrumento jurídico multilateral, que qualifica as partes, o objeto e as condições de acesso e de remessa de componente do patrimônio genético e de conhecimento tradicional associado, bem como as condições para repartição de benefícios, ressaltando que se a União for parte, o seu regime jurídico será de direito público.

A celebração do referido contrato deverá respeitar as regras postas nos artigos 27 e 28, da MP 2.186-16/2001, sob pena de nulidade, não gerando efeitos no mundo jurídico em caso de infringência.

Deveras, o artigo 24, da MP 2.186-16/2001, assegura às partes contratantes a repartição justa e equitativa dos benefícios resultantes da exploração econômica de produto ou processo desenvolvido a partir de amostra de componente do patrimônio genético e de conhecimento tradicional associado, obtidos por instituição nacional ou instituição sediada no exterior, podendo ser materializados em divisão de lucros, royalties, acesso e transferências de tecnologias, licenciamento (livre de ônus) de produtos ou serviços ou capacitação de recursos humanos.

Restou determinado ainda que a instituição que receber amostra de componente do patrimônio genético ou conhecimento tradicional associado facilitará o acesso à tecnologia e transferência de tecnologia para a conservação e utilização desse patrimônio ou desse conhecimento à instituição nacional responsável pelo acesso e remessa da amostra e da informação sobre o conhecimento, ou instituição por ela indicada.

A exploração clandestina de produto ou processo desenvolvido a partir de amostra de componente do patrimônio genético ou de conhecimento tradicional associado sujeitará o infrator ao pagamento de indenização correspondente a, no mínimo, 20% do faturamento bruto obtido na comercialização de produto ou de royalties4 obtidos de terceiros pelo infrator, em decorrência de licenciamento de produto ou processo ou do uso da tecnologia, protegidos ou não por propriedade intelectual, sem prejuízo das sanções administrativas e penais cabíveis.

Por fim, as ações ou omissões que violem as normas fixadas pela MP 2.186-16/2001 foram consideradas infrações administrativas ao patrimônio genético, estando sujeitas às penalidades instituídas pelo artigo 30, da citada norma, dentre elas a apreensão das amostras de componentes do patrimônio genético e dos instrumentos utilizados na coleta ou no processamento ou dos produtos obtidos a partir de informação sobre conhecimento tradicional associado, assim como dos produtos derivados de amostra de componente do patrimônio genético ou do conhecimento tradicional associado.

Ainda há previsão de multa de R$ 200,00 a R$ 100.000,00, para as pessoas físicas, e de R$ 10.000,00 a R$ 50.000.000,00, para as pessoas jurídicas.

19.2. BIOSSEGURANÇA

Em regulamentação constitucional foi promulgada a Lei 11.105/2005 (Lei de Biossegurança – LB), revogando a Lei 8.974/1995 e a Medida Provisória 2.191/2001.

Nos moldes do seu artigo 1.º, a LB “estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização sobre a construção, o cultivo, a produção, a manipulação, o transporte, a transferência, a importação, a exportação, o armazenamento, a pesquisa, a comercialização, o consumo, a liberação no meio ambiente e o descarte de organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados, tendo como diretrizes o estímulo ao avanço científico na área de biossegurança e biotecnologia, a proteção à vida e à saúde humana, animal e vegetal, e a observância do princípio da precaução para a proteção do meio ambiente”.

A LB não se aplica quando a modificação genética for obtida por mutagênese; formação e utilização de células somáticas de hibridoma animal; fusão celular, inclusive a de protoplasma, de células vegetais, que possa ser produzida mediante métodos tradicionais de cultivo e autoclonagem de organismos não patogênicos que se processe de maneira natural, desde que não implique a utilização de OGM como receptor ou doador.

A LB define a atividade de pesquisa “a realizada em laboratório, regime de contenção ou campo, como parte do processo de obtenção de OGM e seus derivados ou de avaliação da biossegurança de OGM e seus derivados, o que engloba, no âmbito experimental, a construção, o cultivo, a manipulação, o transporte, a transferência, a importação, a exportação, o armazenamento, a liberação no meio ambiente e o descarte de OGM e seus derivados”, na forma do § 1.º do artigo 1.º.

Por sua vez, por residualidade, “considera-se atividade de uso comercial de OGM e seus derivados a que não se enquadra como atividade de pesquisa, e que trata do cultivo, da produção, da manipulação, do transporte, da transferência, da comercialização, da importação, da exportação, do armazenamento, do consumo, da liberação e do descarte de OGM e seus derivados para fins comerciais” (§ 2.º, do artigo 1.º, da LB).

Em regulamentação, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio editou a Resolução Normativa 05/2008, que trata da liberação comercial de Organismos Geneticamente Modificados – OGM e seus derivados.

19.2.1. A pesquisa com células-tronco embrionárias e o direito fundamental à vida

O artigo 5.º da LB permite, para fins de terapia e pesquisa, a utilização de células-tronco embrionárias (células que têm a capacidade de transformar em células de qualquer tecido) obtidas de embriões humanos produzidos in vitro e não utilizáveis, quer porque inviáveis, quer porquanto congelados há mais de três anos, sendo necessário, em qualquer caso, o consentimento dos genitores, vedada a comercialização do material.

Por outro lado, vedou-se a clonagem humana, apenas permitindo-se a clonagem para fins terapêuticos, ou seja, com a finalidade de produção de células-tronco embrionárias para utilização terapêutica.

Esse permissivo legal é altamente polêmico, pois para alguns viola o direito fundamental à vida, que não tem o seu termo inicial definido expressamente na legislação brasileira. Sabe-se apenas que legalmente a morte ocorre com a cessação da atividade cerebral, nos moldes do artigo 3.º, da Lei 9.434/1997.

E a vida, quando se inicia? Há vários entendimentos a respeito, mas entre eles podem-se citar como principais: a fecundação, a nidação (aderência do embrião fecundado na parede do útero), o início de atividade cerebral ou quando o feto já pode existir sem a mãe. Este tema é tão relevante quanto polêmico, pois envolve toda a sociedade, inclusive os religiosos, tendo implicações diretas no âmbito criminal, a exemplo da tipificação do delito de aborto.

Deveras, como a pesquisa autorizada legalmente para fins terapêuticos se dá com embriões fecundados, caso se entenda que já há vida humana com a fecundação, haveria, portanto, atentado contra esse direito fundamental tão caro à humanidade.

Em 2008, apesar de expressamente não indicar quando começa a vida, o que foi acertado, ao julgar a ADI 3.510, o STF declarou a validade do permissivo legal que autoriza a pesquisa com células-tronco embrionárias. Colaciona-se passagem do informativo:

“ADI e Lei da Biossegurança – 6 – Em conclusão, o Tribunal, por maioria, julgou improcedente pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Procurador-Geral da República contra o artigo 5.º da Lei federal 11.105/2005 (Lei da Biossegurança), que permite, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não usados no respectivo procedimento, e estabelece condições para essa utilização – v. Informativo 497. Prevaleceu o voto do Min. Carlos Britto, relator. Nos termos do seu voto, salientou, inicialmente, que o artigo impugnado seria um bem concatenado bloco normativo que, sob condições de incidência explícitas, cumulativas e razoáveis, contribuiria para o desenvolvimento de linhas de pesquisa científica das supostas propriedades terapêuticas de células extraídas de embrião humano in vitro. Esclareceu que as células-tronco embrionárias, pluripotentes, ou seja, capazes de originar todos os tecidos de um indivíduo adulto, constituiriam, por isso, tipologia celular que ofereceria melhores possibilidades de recuperação da saúde de pessoas físicas ou naturais em situações de anomalias ou graves incômodos genéticos. Asseverou que as pessoas físicas ou naturais seriam apenas as que sobrevivem ao parto, dotadas do atributo a que o artigo 2.º do Código Civil denomina personalidade civil, assentando que a Constituição Federal, quando se refere à ‘dignidade da pessoa humana’ (artigo 1.º, III), aos ‘direitos da pessoa humana’ (artigo 34, VII, ‘b’), ao ‘livre exercício dos direitos... individuais’ (artigo 85, III) e aos ‘direitos e garantias individuais’ (artigo 60, § 4.º, IV), estaria falando de direitos e garantias do indivíduo-pessoa. Assim, numa primeira síntese, a Carta Magna não faria de todo e qualquer estádio da vida humana um autonomizado bem jurídico, mas da vida que já é própria de uma concreta pessoa, porque nativiva, e que a inviolabilidade de que trata seu artigo 5.º diria respeito exclusivamente a um indivíduo já personalizado.

ADI e Lei da Biossegurança – 7 – O relator reconheceu, por outro lado, que o princípio da dignidade da pessoa humana admitiria transbordamento e que, no plano da legislação infraconstitucional, essa transcendência alcançaria a proteção de tudo que se revelasse como o próprio início e continuidade de um processo que desaguasse no indivíduo-pessoa, citando, no ponto, dispositivos da Lei 10.406/2002 (Código Civil), da Lei 9.434/1997, e do Decreto-lei 2.848/1940 (Código Penal), que tratam, respectivamente, dos direitos do nascituro, da vedação à gestante de dispor de tecidos, órgãos ou partes de seu corpo vivo e do ato de não oferecer risco à saúde do feto, e da criminalização do aborto, ressaltando, que o bem jurídico a tutelar contra o aborto seria um organismo ou entidade pré-natal sempre no interior do corpo feminino. Aduziu que a lei em questão se referiria, por sua vez, a embriões derivados de uma fertilização artificial, obtida fora da relação sexual, e que o emprego das células-tronco embrionárias para os fins a que ela se destina não implicaria aborto. Afirmou que haveria base constitucional para um casal de adultos recorrer a técnicas de reprodução assistida que incluísse a fertilização in vitro, que os artigos 226 e seguintes da Constituição Federal disporiam que o homem e a mulher são as células formadoras da família e que, nesse conjunto normativo, estabelecer-se-ia a figura do planejamento familiar, fruto da livre decisão do casal e fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável (artigo 226, § 7.º), inexistindo, entretanto, o dever jurídico desse casal de aproveitar todos os embriões eventualmente formados e que se revelassem geneticamente viáveis, porque não imposto por lei (CF, artigo 5.º, II) e incompatível com o próprio planejamento familiar.

ADI e Lei da Biossegurança – 8 – Considerou, também, que, se à lei ordinária seria permitido fazer coincidir a morte encefálica com a cessação da vida de uma certa pessoa humana, a justificar a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo ainda fisicamente pulsante para fins de transplante, pesquisa e tratamento (Lei 9.434/1997), e se o embrião humano de que trata o artigo 5.º da Lei da Biossegurança é um ente absolutamente incapaz de qualquer resquício de vida encefálica, a afirmação de incompatibilidade do último diploma legal com a Constituição haveria de ser afastada. Por fim, acrescentou a esses fundamentos, a rechaçar a inconstitucionalidade do dispositivo em questão, o direito à saúde e à livre expressão da atividade científica. Frisou, no ponto, que o § 4.º do artigo 199 da CF (‘A lei disporá sobre as condições e os requisitos que facilitem a remoção de órgãos, tecidos e substâncias humanas para fins de transplante, pesquisa e tratamento, bem como a coleta, processamento e transfusão de sangue e seus derivados, sendo vedado todo tipo de comercialização’) faria parte, não por acaso, da seção normativa dedicada à saúde, direito de todos e dever do Estado (CF, artigo 196), que seria garantida por meio de ações e serviços qualificados como de relevância pública, com o que se teria o mais venturoso dos encontros entre esse direito à saúde e a própria Ciência (CF, artigo 5.º, IX). Vencidos, parcialmente, em diferentes extensões, os Ministros Menezes Direito, Ricardo Lewandowski, Eros Grau, Cezar Peluso e Gilmar Mendes, Presidente” (ADI 3.510/DF, rel. Min. Carlos Britto, 28 e 29.5.2008).

E a interrupção da gestação de um feto anencefálico (sem cérebro) constitui crime de aborto? Este tema foi debatido pelo STF no julgamento da ADPF 54.

Nos dias 11 e 12 de abril de 2012, a Suprema Corte decidiu que a interrupção de gravidez de feto com anencefalia não constitui crime, pronunciando a inconstitucionalidade da interpretação segundo a qual a interrupção da gravidez de feto anencéfalo seria conduta tipificada nos arts. 124, 126 e 128, I e II, do CP, não constituindo violação ao direito fundamental à vida.

19.2.2. A pesquisa com Organismos Geneticamente Modificados – OGM

Outrossim, a LB veda a pesquisa com organismos geneticamente modificados – OGM (entidade biológica que teve o seu material genético modificado por qualquer técnica de engenharia genética) e sua liberação comercial, salvo com prévia autorização do órgão competente, vedada a atuação de pessoas físicas de maneira autônoma.

Por seu turno, os patrocinadores das pesquisas devem exigir previamente o Certificado de Qualidade em Biossegurança previamente emitido pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, sob pena de se tornarem corresponsáveis pelo descumprimento legal, inclusive criminalmente, pois caracterizar-se-á, ao menos, dolo eventual.

Em tema de Biossegurança pesa muito o Princípio da Precaução, pois não é possível prever com certeza científica a repercussão dos OGM’s sobre a saúde humana e dos demais seres vivos. Nesse sentido, o artigo 40, da LB, determina que “os alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal que contenham ou sejam produzidos a partir de OGM ou derivados deverão conter informação nesse sentido em seus rótulos, conforme regulamento”.

19.2.3. CIBio

Toda entidade que utilizar técnicas e métodos de engenharia genética ou realizar pesquisas com OGM e seus derivados deverá instituir uma Comissão Interna de Biossegurança – CIBio, com função fiscalizatória, com as competências previstas no artigo 18 da LB.

19.2.4. CNBS

A LB criou o Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, órgão subordinado à Presidência da República, incumbido de formular e implementar a Política Nacional de Biossegurança – PNB, a quem compete, entre outras atribuições, decidir em última instância (a pedido da CTNBio ou por avocação) sobre a liberação para uso comercial de OGM e derivados.

Também é da competência do CNBS “analisar, a pedido da CTNBio, quanto aos aspectos da conveniência e oportunidade socioeconômicas e do interesse nacional, os pedidos de liberação para uso comercial de OGM e seus derivados” (artigo 8.º, II, da LB).

19.2.5. CTNBio

Outrossim, foi reestruturada a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, órgão integrante do Ministério da Ciência e Tecnologia, “instância colegiada multidisciplinar de caráter consultivo e deliberativo, para prestar apoio técnico e de assessoramento ao Governo Federal na formulação, atualização e implementação da PNB de OGM e seus derivados, bem como no estabelecimento de normas técnicas de segurança e de pareceres técnicos referentes à autorização para atividades que envolvam pesquisa e uso comercial de OGM e seus derivados, com base na avaliação de seu risco zoofitossanitário, à saúde humana e ao meio ambiente” (artigo 10 da LB).

Com fulcro no artigo 14, da LB, compete à CTNBio, entre outras atribuições:

• estabelecer normas para as pesquisas com OGM e derivados de OGM;

• autorizar, cadastrar e acompanhar as atividades de pesquisa com OGM ou derivado de OGM, nos termos da legislação em vigor;

• autorizar a importação de OGM e seus derivados para atividade de pesquisa;

• emitir Certificado de Qualidade em Biossegurança – CQB para o desenvolvimento de atividades com OGM e seus derivados em laboratório, instituição ou empresa e enviar cópia do processo aos órgãos de registro e fiscalização referidos no artigo 16 desta Lei;

• emitir decisão técnica, caso a caso, sobre a biossegurança de OGM e seus derivados no âmbito das atividades de pesquisa e de uso comercial de OGM e seus derivados, inclusive a classificação quanto ao grau de risco e nível de biossegurança exigido, bem como medidas de segurança exigidas e restrições ao uso;

• emitir resoluções, de natureza normativa, sobre as matérias de sua competência.

A CTNBio poderá realizar audiências públicas a fim de ouvir a comunidade, sendo que a sua decisão técnica é vinculante aos demais órgãos e entidades da Administração Pública, no que concerne aos aspectos de biossegurança de OGM e derivados, com decisões tomadas pela maioria absoluta dos seus membros, nos termos da Lei 11.460/2007, que inseriu o artigo 8.º-A na LB.

Outrossim, a CTNBio delibera, em última e definitiva instância, sobre os casos em que a atividade é potencial ou efetivamente causadora de degradação ambiental, bem como sobre a necessidade do licenciamento ambiental.

Ou seja, apesar de a CTNBio não promover o licenciamento ambiental, lhe caberá decidir se é necessário, o que se afigura um retrocesso ambiental, pois essa decisão deveria caber ao órgão licenciador.

19.2.6. SIB

O artigo 19, da LB, instituiu o Sistema de Informações em Biossegurança, no âmbito do Ministério da Ciência e Tecnologia, destinado a gerir informações decorrentes das atividades de análise, autorização, registro, monitoramento e acompanhamento das atividades que envolvam OGM e seus derivados.

19.2.7. Órgãos e entidades de registro e fiscalização

O artigo 16, da LB, determinou ser da competência de órgãos do Ministério da Saúde, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e do Ministério do Meio Ambiente, e da Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca da Presidência da República, de acordo com as suas áreas de atuação, a fiscalização das atividades de pesquisa de OGM e derivados, o seu registro e liberação comercial, entre outras atribuições.

19.2.8. Responsabilidade civil e administrativa

A LB trata da responsabilidade civil e administrativa no Capítulo VII, prevendo, inclusive, solidariedade entre todos aqueles que participaram do dano ambiental, independentemente da existência de culpa, prevendo como infração administrativa toda ação ou omissão que viole as normas previstas na LB e legislação correlata.

19.2.9. Regras de transição

Estão contidas no capítulo IX, da LB, regras de transição, prevendo que “os OGM que tenham obtido decisão técnica da CTNBio favorável a sua liberação comercial até a entrada em vigor desta Lei poderão ser registrados e comercializados, salvo manifestação contrária do CNBS, no prazo de 60 (sessenta) dias, a contar da data da publicação desta Lei”.

Outrossim, a CTNBio e os órgãos de controle e fiscalização deverão rever as suas deliberações normativas em até 120 dias da vigência da LB, permanecendo em vigor os Certificados de Qualidade em Biossegurança, comunicados e decisões técnicas já emitidos pela CTNBio, assim como os atos normativos emitidos com amparo na Lei 8.974/1995, desde que não contrariem dispositivos da LB.

19.2.10. Licenciamento ambiental

Por seu turno, o CONAMA editou a Resolução 305/2002, que dispõe sobre Licenciamento Ambiental, Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto no Meio Ambiente de atividades e empreendimentos com Organismos Geneticamente Modificados e seus derivados, que se encontra em vigor no que não contrariar a LB, pois foi editada anteriormente, tendo como fundamento de validade, na época, a Lei 8.974/1995.

Conforme já falado, a competência para deliberar sobre a necessidade do licenciamento ambiental será da CTNBio, inclusive da exigência ou não de EIA-RIMA.

Entende-se que esse licenciamento será sempre de competência do IBAMA, pois se trata de atividade que poderá gerar danos ambientais regionais ou nacionais, conquanto a Resolução 305/2002 CONAMA apenas preveja expressamente a atribuição da autarquia federal nos casos de licenciamento para liberação comercial de OGM.

Nos casos de licenciamento de OGM para pesquisa em campo e em áreas com restrição, o ato do CONAMA apenas se referiu genericamente a “órgão ambiental competente”, sem especificá-lo.

19.3. A SITUAÇÃO BRASILEIRA

Por fim, frise-se que o Brasil vem fazendo corretamente o dever de casa em termos de biodiversidade. Abaixo, transcreve-se notícia extraída do sítio do Ministério do Meio Ambiente:

“Brasil avança no estabelecimento de metas nacionais de biodiversidade para 2010

16.05.2008 – Daniela Mendes

O Brasil chega à 9ª Conferência das Partes (COP-9) da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) da ONU, que inicia nesta segunda-feira (19), em Bonn, na Alemanha, como um dos poucos países que fez um exercício interno para estabelecer metas nacionais de biodiversidade para 2010. De acordo com o diretor do Departamento de Conservação da Biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente, Bráulio Dias, ‘alguns países fizeram, mas o Brasil foi o único a fazer de uma forma abrangente, olhando todas as peças da convenção, todos os temas tratados por ela’.

As metas internas brasileiras foram estabelecidas pela Resolução 3, de 2006, da Comissão Nacional de Biodiversidade (Conabio), editada poucos meses após a realização da COP-8, em Curitiba. Desmatamento, espécies exóticas invasoras, aquecimento global, remanescentes dos biomas, espécies da fauna e da flora ameaçadas de extinção, recursos genéticos e manejo sustentável estão entre os temas prioritários, segundo a resolução.

Bráulio Dias destacou ainda que a atualização das áreas prioritárias de conservação da biodiversidade é outro avanço importante do Brasil dentro das metas estabelecidas pela CDB. ‘Poucos países têm um instrumento como esse. A maioria dos países, das pessoas, tem dificuldade de incorporar a biodiversidade na sua tomada de decisão’, disse. Para ele, esse instrumento auxilia muito o país no momento de planejar suas políticas públicas, permitindo que o governo consiga definir com maior propriedade onde pode, por exemplo, construir uma estrada. ‘No passado, biodiversidade só entrava na discussão no final do processo. Agora a gente passa a ter instrumentos para influenciar na política’, acredita.

Segundo Bráulio, outro instrumento muito importante foi o mapeamento da cobertura vegetal dos biomas concluído no ano passado. ‘O Brasil só tinha um mapeamento, cobrindo o país inteiro, dos anos 1970. De lá pra cá alguns Estados fizeram, mas a gente não tinha uma visão completa, do território todo, em todos os biomas, à exceção da Amazônia. Esse instrumento dá uma visão do conjunto de todos os biomas e isso passa a ser mais um instrumento para se influenciar na elaboração das políticas, explicou. As pessoas ficam preocupadas com o desmatamento da Amazônia porque temos dados. Esperamos que com esse mapeamento seja possível dar mais atenção para os outros biomas’, disse Bráulio Dias.

Ele adiantou que o MMA está fechando parceria com o IBAMA para aplicar uma metodologia de monitoramento da vegetação semelhante à do Prodes, usado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), para os demais biomas com prioridade para o Cerrado e a Mata Atlântica. Essa é uma parceria que estamos fechando agora, juntamente com o PNUD. Nós já temos um projeto, o IBAMA tem uma proposta detalhada e nós estamos fechando agora o instrumento financeiro para contratar todo o trabalho, disse.

Sobre a CDB – Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) da ONU se constitui em um acordo atualmente ratificado por 186 países, que contempla três objetivos: 1) Conservação, 2) Uso sustentável e 3) Repartição equitativa dos benefícios derivados do acesso aos recursos genéticos. A CDB define biodiversidade como a “variabilidade entre organismos vivos de todas as origens, incluindo entre eles, terrestres, marinhos e outros ecossistemas aquáticos e complexos ecológicos dos quais eles fazem parte; incluindo ainda a diversidade dentro da espécie, entre espécies e ecossistemas”.

19.4. QUESTÕES DE CONCURSOS PÚBLICOS COMENTADAS

1.  (TRF 5.ª Região 2013 – Juiz Federal – CESPE) A respeito de atividades que envolvam OGMs e seus derivados, assinale a opção correta à luz da Lei n.º 11.105/2005.

A) As entidades financiadoras ou patrocinadoras das atividades que envolvam OGM e seus derivados devem exigir a apresentação do certificado de qualidade em biossegurança, sob pena de se tornarem corresponsáveis pelos eventuais efeitos decorrentes da atividade.

Correta. De acordo com o artigo 2.º, § 4.º, da Lei 11.105/2005, as organizações públicas e privadas, nacionais, estrangeiras ou internacionais, financiadoras ou patrocinadoras de atividades ou de projetos que envolvam OGM e seus derivados devem exigir a apresentação de Certificado de Qualidade em Biossegurança, emitido pela CTNBio, sob pena de se tornarem corresponsáveis pelos eventuais efeitos decorrentes do descumprimento desta Lei ou de sua regulamentação.

B) A realização de atividades que envolvam OGM e seus derivados depende de autorização expedida por órgão estadual competente em matéria ambiental.

Errada. A autorização é dada por órgão federal (CTNBio, órgão integrante do Ministério de Ciência e Tecnologia), na forma do artigo 2.º, § 3.º, da Lei 11.105/2005.

C) É permitido o registro, o patenteamento e o licenciamento de tecnologias genéticas de restrição de uso.

Errada. É vedada a utilização, a comercialização, o registro, o patenteamento e o licenciamento de tecnologias genéticas de restrição do uso, a teor do artigo 6.º, inciso VII, da Lei 11.105/2005.

D) Para fins de pesquisa e terapia, é proibida a utilização de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro.

Errada. Desde que haja a autorização dos genitores, com base no artigo 5.º, da Lei 11.105/2005, é permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento, desde que sejam embriões inviáveis; ou sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na data da publicação desta Lei, ou que, já congelados na data da publicação da citada norma, depois de completarem 3 (três) anos, contados a partir da data de congelamento.

E) As atividades relacionadas à pesquisa científica podem ser desenvolvidas por pessoas físicas, desde que estas mantenham vínculo empregatício, ou de qualquer outra natureza, com pessoas jurídicas.

Errada. As atividades e os projetos que envolvam OGM e derivados são vedados a pessoas físicas em atuação autônoma e independente, ainda que mantenham vínculo empregatício ou qualquer outro com pessoas jurídicas, na forma do artigo 2.º, §2.º, da Lei 11.105/2005.

2.  (AGU 2012 – Advogado da União – CESPE) Será responsabilizado administrativamente aquele que utilizar em pesquisas científicas células-tronco embrionárias obtidas a partir de embriões humanos viáveis produzidos por fertilização in vitro.

Correto. Nos termos do art. 21 da Lei 11.105/2005, “considera-se infração administrativa toda ação ou omissão que viole as normas previstas nesta Lei e demais disposições legais pertinentes”. Logo, como a Lei de Biossegurança (art. 5º) veda o uso de embriões viáveis in vitro em pesquisas com células tronco, conclui-se que a conduta é uma infração administrativa.

3.  (TRF 5.ª REGIÃO 2011 – Juiz Federal – CESPE) Considerando a disciplina legal sobre diversidade biológica e proteção do conhecimento tradicional associado, assinale a opção correta.

A) Em decorrência do princípio da livre-iniciativa, a legislação brasileira não admite o estabelecimento de restrições ao regime de propriedade intelectual sobre microrganismos, permitindo apenas a regulamentação dos meios para se assegurar o livre acesso aos recursos da diversidade biológica do país.

É falso. Existe restrição legal da propriedade intelectual decorrente do patrimônio genético. Nos termos do artigo 31 da MP 2.186-16/2001, “a concessão de direito de propriedade industrial pelos órgãos competentes, sobre processo ou produto obtido a partir de amostra de componente do patrimônio genético, fica condicionada à observância desta legislação, devendo o requerente informar a origem do material genético e do conhecimento tradicional associado, quando for o caso”.

B) Considera-se conhecimento tradicional associado toda amostra de componente do patrimônio genético cuja aplicação industrial ou de outra natureza se preste a fins de pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico ou bioprospecção.

É falso. Essa não é a definição legal do conhecimento tradicional associado ao patrimônio genético. De acordo com o artigo 7.º, II, da MP 2.186-16/2001, o conhecimento tradicional associado é a “informação ou prática individual ou coletiva de comunidade indígena ou de comunidade local, com valor real ou potencial, associada ao patrimônio genético”.

C) As comunidades indígenas e as comunidades locais que criam, desenvolvem, detêm ou conservam conhecimento tradicional associado ao patrimônio genético têm o direito de ter indicada a origem do acesso ao conhecimento tradicional em todas as publicações, utilizações, explorações e divulgações, sendo a elas vedada a percepção de benefícios resultantes da exploração econômica do conhecimento de sua titularidade.

É falso. A primeira parte do enunciado é verdadeira, sendo direito dos índios e comunidades locais a indicação da origem do acesso ao conhecimento tradicional em todas as publicações, utilizações, explorações e divulgações, na forma do artigo 9.º, I, da MP 2.186-16/2001.

Contudo, a segunda parte é errada, pois os índios e demais comunidades deverão participar dos benefícios da exploração econômica do seu conhecimento tradicional associado. Nos termos do artigo 9.º, III, da referida medida provisória, à comunidade indígena e à comunidade local que criam, desenvolvem, detêm ou conservam conhecimento tradicional associado ao patrimônio genético, é garantido o direito de perceber benefícios pela exploração econômica por terceiros, direta ou indiretamente, de conhecimento tradicional associado, cujos direitos são de sua titularidade.

D) O patrimônio genético existente no país submete-se ao poder de polícia da União; logo, o uso, a comercialização e o aproveitamento desse patrimônio para quaisquer fins sujeitam-se à fiscalização, às restrições e à repartição de benefícios estabelecidas em legislação federal.

É verdadeiro. Na forma do artigo 2.º, da MP 2.186-16/2001, “o acesso ao patrimônio genético existente no País somente será feito mediante autorização da União e terá o seu uso, comercialização e aproveitamento para quaisquer fins submetidos à fiscalização, restrições e repartição de benefícios nos termos e nas condições estabelecidos nesta Medida Provisória e no seu regulamento”.

E) O acesso a amostra de componente do patrimônio genético brasileiro e ao conhecimento tradicional associado só pode ocorrer mediante acompanhamento do Conselho de Gestão do Patrimônio Genético, órgão do Ministério do Meio Ambiente, vedadas a utilização comercial de ambos e a remessa de amostra para o exterior.

É falso. É possível a utilização comercial de amostra do patrimônio genético e a sua remessa ao exterior, desde que autorizados pela União ou pelo órgão credenciado (vide artigos 14, I, “c”; 15, V, “b”; 16, § 4.º e 18, todos da MP 2.186-16/2001).

4.  (TRF 5.ª REGIÃO 2011 – Juiz Federal – CESPE) Acerca da engenharia genética e de sua relação com o ambiente, assinale a opção correta.

A) A lei que estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam OGM e seus derivados prevê o estabelecimento de sanções administrativas, mas não criminais, contra as ações ou omissões que as violem.

É falso. A Lei de Biossegurança (Lei 11.105/2005) prevê seis delitos no seu Capítulo VIII.

B) Atividades e projetos que envolvam OGMs e seus derivados somente podem ser desenvolvidos por pessoas físicas ou entidades de direito público ou privado que se dediquem à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico e à produção industrial.

É falso. Nos termos do artigo 2.º da LB, as atividades e projetos que envolvam OGM e seus derivados, relacionados ao ensino com manipulação de organismos vivos, à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico e à produção industrial ficam restritos ao âmbito de entidades de direito público ou privado, sendo vedada às pessoas físicas uma atuação autônoma e independente.

C) Estão sujeitos a controle legal a construção, o cultivo, a produção, a manipulação, o transporte, a transferência, a importação, a exportação, o armazenamento, a pesquisa, a comercialização, o consumo, a liberação no ambiente e o descarte de OGM e seus derivados.

É verdadeiro. Nos moldes do artigo 1.º da LB, “esta Lei estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização sobre a construção, o cultivo, a produção, a manipulação, o transporte, a transferência, a importação, a exportação, o armazenamento, a pesquisa, a comercialização, o consumo, a liberação no meio ambiente e o descarte de organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados, tendo como diretrizes o estímulo ao avanço científico na área de biossegurança e biotecnologia, a proteção à vida e à saúde humana, animal e vegetal, e a observância do princípio da precaução para a proteção do meio ambiente”.

D) A comercialização de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento só é possível mediante a obtenção de certificado de qualidade em biossegurança, emitido pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, atendidas as condições estabelecidas na legislação pertinente.

É falso. É proibida a comercialização de células-tronco embrionárias, nos termos do artigo 5.º, § 3.º, da LB, conduta que inclusive constitui um delito.

E) Em qualquer hipótese, são vedadas a liberação, a destruição ou o descarte, no ambiente, de OGM ou seus derivados.

É falso. Se houver autorização da CTNBio, é possível a liberação de OGM no meio ambiente, na forma do artigo 6.º, VI, da LB, sendo possível também a destruição ou descarte no meio ambiente de OGM e seus derivados de acordo com as normas estabelecidas pela CTNBio.

5.  (MMA 2011– Analista Ambiental III – CESPE) Considere que a exploração econômica de produto ou processo desenvolvido a partir de amostra de componente do patrimônio genético ou de conhecimento tradicional associado ocorra em desacordo com as disposições legais vigentes em solo pátrio. Nessa situação, o infrator sujeita-se, exclusivamente, às sanções administrativas pertinentes e as vantagens obtidas a partir do faturamento pela comercialização do produto, ou dos royalties obtidos de terceiros, quando decorrentes de licenciamento de processo protegido por propriedade intelectual, também sujeitarão o infrator às sanções penais cabíveis.

É falso. Não serão aplicáveis apenas sanções penais e administrativas, mas também o infrator deverá pagar uma indenização. Nesse sentido, dispõe o artigo 26, da MP 2.186-16/2001, que “a exploração econômica de produto ou processo desenvolvido a partir de amostra de componente do patrimônio genético ou de conhecimento tradicional associado, acessada em desacordo com as disposições desta Medida Provisória, sujeitará o infrator ao pagamento de indenização correspondente a, no mínimo, 20% do faturamento bruto obtido na comercialização de produto ou de royalties obtidos de terceiros pelo infrator, em decorrência de licenciamento de produto ou processo ou do uso da tecnologia, protegidos ou não por propriedade intelectual, sem prejuízo das sanções administrativas e penais cabíveis”.

6.  (MMA 2011– Analista Ambiental IIIl – CESPE) Os contratos de utilização do patrimônio genético e de repartição de benefícios, que devem ser registrados no Conselho de Gestão, só têm eficácia após a anuência desse Conselho.

É verdadeiro. Nos termos do artigo 29 da MP 2.186-16/2001, os Contratos de Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de Benefícios serão submetidos para registro no Conselho de Gestão e só terão eficácia após sua anuência.

7.  (TRF 5.ª REGIÃO 2009 – Juiz Federal – CESPE) Julgue os itens subsequentes, relativos à biodiversidade e à proteção jurídica do conhecimento tradicional associado.

I.   A Convenção sobre Diversidade Biológica, da qual o Brasil é signatário, reconhece o direito soberano de cada Estado de explorar seus recursos naturais segundo suas políticas ambientais, razão pela qual não admite a transferência de tecnologias que utilizem recursos genéticos entre as partes contratantes.

É falso. É legalmente prevista a citada transferência de tecnologias, na forma do artigo 1.º, da Convenção da Biodiversidade (ratificada pelo Brasil): “os objetivos desta Convenção, a serem cumpridos de acordo com as disposições pertinentes, são a conservação da diversidade biológica, a utilização sustentável de seus componentes e a repartição justa e equitativa dos benefícios derivados da utilização dos recursos genéticos, mediante, inclusive, o acesso adequado aos recursos genéticos e a transferência adequada de tecnologias pertinentes, levando em conta todos os direitos sobre tais recursos e tecnologias, e mediante financiamento adequado”. Logo, é um dos objetivos do citado tratado a transferência de tecnologias atinentes aos recursos genéticos.

II.  Incumbe ao poder público preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do país e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético.

É verdadeiro. Incumbe ao Poder Público “preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético” (artigo 225, § 1.º, II, da CRFB).

III. O Conselho de Gestão do Patrimônio Genético, formado por representantes de órgãos e entidades da administração pública federal com competência para acompanhar as atividades de acesso e de remessa de amostra de componente do patrimônio genético e do conhecimento tradicional associado, é órgão que possui caráter deliberativo, não lhe competindo estabelecer normas relativas à gestão do patrimônio genético.

É falso. O Conselho de Gestão do Patrimônio Genético foi instituído pela MP 2.186-16/2001, que regulamenta o inciso II do § 1.º e o § 4º do artigo 225 da Constituição, e os artigos 1.º, 8.º, alínea “j”, 10, alínea “c”, 15 e 16, alíneas 3 e 4 da Convenção sobre Diversidade Biológica, dispondo sobre o acesso ao patrimônio genético, a proteção e o acesso ao conhecimento tradicional associado, a repartição de benefícios e o acesso à tecnologia e transferência de tecnologia para sua conservação e utilização. Deveras, uma das competências do Conselho é estabelecer normas técnicas sobre a gestão do patrimônio genético (artigo 11, II, “a”, da MP 2.186-16/2001).

IV. O direito dos índios ao usufruto exclusivo das riquezas naturais e de todas as utilidades existentes nas terras que habitam compreende o direito à posse, ao uso e à percepção das riquezas naturais e de todas as utilidades existentes, bem como ao produto da exploração econômica de tais riquezas naturais e utilidades.

É verdadeiro. Nesse sentido, dispõe o § 2.º, do artigo 231, da CRFB, que “as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes”.

V.  São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras ocupadas pelos índios, permitida a exploração das riquezas naturais dos rios e dos lagos nelas existentes por pessoas físicas, mediante prévia e expressa autorização da Fundação Nacional do Índio.

É falso. “O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei”, conforme o § 3.º, do artigo 231, da CRFB.

Estão CERTOS apenas os itens

A) I e II.

B) I e V.

C) II e IV.

D) III e IV.

E) IV e V.

Pelo exposto, deve ser assinalado o item “C”.

8.  (TRF 1.ª REGIÃO 2006 – Juiz Federal) De acordo com a Lei 11.105/2005 (normas de segurança e fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados – OGM):

A) todos os OGM que anteriormente obtiveram decisão da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio favorável à sua liberação comercial passariam por nova avaliação do Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS;

É falso. Inexiste esta exigência na nova Lei de Biossegurança (Lei 11.105/2005).

B) todos os OGM que anteriormente obtiveram decisão técnica da CTNBio favorável a sua liberação comercial passariam por reavaliação da própria CTNBio, em sua nova composição;

É falso. Inexiste esta exigência na nova Lei de Biossegurança.

C) não há hipótese de reapreciação, por CNBS, de ato de liberação comercial de OGM praticado pela CTNBio, pois a decisão da CTNBio é definitiva e vinculante para todos os órgãos da Administração, ressalvando o controle judicial;

É falso. Inexiste esta previsão na nova Lei de Biossegurança.

D) ficou isenta de reapreciação administrativa decisão da CTNBio favorável à liberação comercial de OGM, salvo manifestação contraria do CNBS, no prazo de sessenta dias.

É verdadeiro. De acordo com o artigo 30, da Lei 11.105/2005, “os OGM que tenham obtido decisão técnica da CTNBio favorável a sua liberação comercial até a entrada em vigor desta Lei poderão ser registrados e comercializados, salvo manifestação contrária do CNBS, no prazo de 60 (sessenta) dias, a contar da data da publicação desta Lei”.

9.  (TRF 5.ª Região 2004 – Juiz Federal – CESPE) Se, em uma dada pesquisa desenvolvida no estado do Ceará, restar comprometida a diversidade ou o patrimônio genético do país, a União, o estado e o município terão competência comum para fiscalizar a entidade responsável.

É verdadeiro, pois a proteção ambiental é competência comum de todos os entes políticos (artigo 23, VI, da CRFB).

10. (PGE Amazonas 2004 – Procurador do Estado)

Em face da ausência de autorização por parte dos três ministérios com competência para liberar o plantio de sementes transgênicas, a Procuradora da República no Município de Rio Grande – RS propôs ação civil pública, em 22 de março de 2000, impugnando o comunicado da CTNBio que permitiu a realização do cultivo experimental do arroz transgênico LL, desenvolvido pela empresa Y. A ação proposta tinha por objeto a interdição do plantio de 0,8 ha desse arroz na unidade experimental da empresa, situada no Distrito do Taim, Rio Grande.

Nessa ação, o Ministério Público Federal questionou o parecer conclusivo favorável à empresa, afirmando em suas alegações que ela não poderia desenvolver qualquer atividade com o arroz transgênico, porque tal documento constituía mera peça técnica, que deveria estar acompanhada do pedido de autorização e de registro feito pelo interessado aos órgãos de fiscalização dos Ministérios da Saúde, da Agricultura e do Meio Ambiente e que não supriria a ausência de licenciamento ambiental, nos moldes preconizados pela Constituição Federal.

A ação civil pública reportou-se a precedentes do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, alegando que há situações de urgência e perigo que reclamam a pronta adoção de medidas quando envolvem risco à vida e à saúde humana, dos animais, das plantas e do meio ambiente.

O Ministério Público, em razão desses fatos e da possibilidade de danos imprevisíveis ao ambiente, requereu a antecipação liminar dos efeitos da tutela jurisdicional pretendida, para que a ré eliminasse o experimento totalmente, no prazo de vinte e quatro horas, antes do amadurecimento fisiológico das sementes de arroz transgênico e de arroz daninho, sob pena de que, em não o fazendo no prazo fixado, fosse determinado por aquele juízo que o IBAMA o fizesse, incontinenti, às expensas da empresa ré.

Em face do caso hipotético acima exposto, redija um texto dissertativo que responda, necessária e justificadamente, os seguintes questionamentos.

A) o parecer favorável da CTNBio supre a licença da autoridade ambiental?

Inicialmente, convém destacar que esta questão data de 2004, quando ainda não estava em vigor a nova Lei de Biossegurança (Lei 11.105/2005), e sim a Lei 8.974/1995, que hoje se encontra inteiramente revogada. Logo, crê-se que a resposta ao item “A” foi alterada com o advento do novo regramento, sendo ambos analisados abaixo, a começar pelo atual.

De acordo com o artigo 10, da Lei 11.105/2005 – Lei de Biossegurança, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio é órgão integrante do Ministério da Ciência e Tecnologia, instância colegiada multidisciplinar de caráter consultivo e deliberativo, para prestar apoio técnico e de assessoramento ao Governo Federal na formulação, atualização e implementação da Política Nacional de Biossegurança de OGM e seus derivados, bem como no estabelecimento de normas técnicas de segurança e de pareceres técnicos referentes à autorização para atividades que envolvam pesquisa e uso comercial de OGM e seus derivados, com base na avaliação de seu risco zoofitossanitário, à saúde humana e ao meio ambiente.

As suas competências vêm listadas no artigo 14, da Lei de Biossegurança, especialmente: “VIII – autorizar, cadastrar e acompanhar as atividades de pesquisa com OGM ou derivado de OGM, nos termos da legislação em vigor; (...) XII – emitir decisão técnica, caso a caso, sobre a biossegurança de OGM e seus derivados no âmbito das atividades de pesquisa e de uso comercial de OGM e seus derivados, inclusive a classificação quanto ao grau de risco e nível de biossegurança exigido, bem como medidas de segurança exigidas e restrições ao uso; (...) § 1.º Quanto aos aspectos de biossegurança do OGM e seus derivados, a decisão técnica da CTNBio vincula os demais órgãos e entidades da administração”.

Assim, compete à CTNBio autorizar as pesquisas com OGM ou derivados, sendo a sua decisão técnica vinculante dentro da Administração Pública federal, no que concerne aos aspectos da biossegurança.

No que tange ao licenciamento ambiental, pontifica o § 3.º, do artigo 16, da Lei de Biossegurança, que “a CTNBio delibera, em última e definitiva instância, sobre os casos em que a atividade é potencial ou efetivamente causadora de degradação ambiental, bem como sobre a necessidade do licenciamento ambiental”.

Ou seja, a CTNBio é quem dará a última palavra sobre a necessidade ou não de licenciamento ambiental, assim como de EIA-RIMA. Contudo, se positivo, deverão as licenças ambientais ser expedidas pelo IBAMA, autarquia federal competente para tanto, pois não é atribuição da CTNBio promover o licenciamento ambiental, vez que se cuida de competência não listada no artigo 14, da Lei 11.105/2005.

A legislação revogada (Lei 8.974/1995) previa a autorização da CTNBio como condição à pesquisa com OGM e derivados, tal qual a atual, mas não tratava do licenciamento ambiental, como o fez o § 3.º, do artigo 16, da Lei 11.105/2005.

O tema gerou polêmica à época, pois nasceu a seguinte discussão à luz da Lei 8.974/1995: a autorização da CTNBIO tem o condão de substituir o licenciamento ambiental? O TRF da 1.ª Região, no julgamento da AC 199834000276820, de 1.º.09.2004, 5.ª Turma, entendeu que sim, pois inexistia previsão acerca do licenciamento ambiental:

“(...) 18. O Congresso Nacional aprovou a Lei 8.974, de 05 de janeiro de 1995, cuja ementa diz que ela regulamenta o disposto nos incisos II e V do § 1.º do artigo 225 da CF/1988. A Lei estabeleceu normas ambientais especiais sobre biossegurança, distintas daquelas destinadas às questões ambientais gerais (Lei 6.938/1981). 19. A Lei 8.974/1995 não arrolou as obras e atividades, relacionadas com a biossegurança que, por apresentarem potencialmente significativa degradação do meio ambiente, devem ser precedidas de estudo de impacto ambiental. A questão ficou no âmbito de normas infralegais. Não há norma de lei ordinária detalhando que obras ou atividades são aptas a causarem significativa degradação ambiental, devendo tal especificação se dar em cada caso concreto pelo órgão competente. Essa competência é deferida, em termos gerais, ao CONAMA, pelo artigo 8.º, II, da Lei 6.938/1981, na redação dada pela Lei 8.028/1990, e pela Resolução 237, de 19 de dezembro de 1997, do próprio CONAMA. No que diz respeito aos projetos que envolvam biossegurança, tal competência é exclusiva da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, por força do disposto na Lei 8.974/1995, alterada pelas Medidas Provisórias 2.137/2000 e 2.191/2001, especificamente em face do seu artigo 8.º, inciso VI, sendo essa a lei que regulamenta o disposto nos incisos II, IV, e V do § 1.º do artigo 225 da Constituição Federal, no que pertine ao plantio e comercialização de organismos geneticamente modificados. 20. O Executivo não concordou com a colocação da CTNBio no organograma da Presidência da República e, em consequência, a Medida Provisória 962 introduziu o novo órgão na estrutura do Ministério da Ciência e Tecnologia (artigo 16, III). A MP 962 converteu-se na Lei 9.649, de 27 de maio de 1998. Após, a Medida Provisória 2.137/2000 ratificou a competência da CTNBio para identificar, segundo critério científico, as atividades decorrentes do uso de OGMs e derivados potencialmente causadores de significativa degradação do meio ambiente e da saúde. 21. Ad argumentandum, ainda que fosse inválido, por vício de competência legislativa, o ato administrativo que liberou a soja transgênica, o ato foi convalidado pela MP 2.137/2000 e pela MP 2.191/2001. 22. A lei especial afasta a aplicabilidade da lei geral que é aplicável para os casos gerais. As regras genéricas da lei genérica sobre meio ambiente foram afastadas pelas normas específicas de lei especial sobre OGMs. As normas da Lei 6.938/1981 são gerais em matéria ambiental e as normas da Lei 8.974/1995 são especiais, pois dizem respeito apenas a um dos aspectos do meio ambiente (a construção, a manipulação e a liberação de organismos geneticamente modificados). 23. No conflito aparente de normas, só uma pode prevalecer, pois não é possível que normas de igual hierarquia regulem diferentemente a mesma matéria e ambas incidam concomitantemente. A solução para o conflito aparente de normas está na Lei de Introdução ao Código Civil cuja regra é: as normas de lei especial se aplicam aos casos especiais que arrola (artigo 2.º da LICC – Decreto-lei 4.657, de 1942). A regência da Lei 6.938/1991 ficou afastada pela aplicação excepcionante das disposições da Lei 8.974/1995. A lista constante do Anexo I da Resolução 237/1997 do CONAMA, no ponto onde indica a ‘introdução de espécies exóticas e/ou geneticamente modificadas’ é ilegal, não podendo ser aplicada validamente, posto que a Lei 8.974/1995 é de janeiro de 1995 e não previu mais o licenciamento ambiental, mas sim autorizações pelos órgãos fiscalizadores dos Ministérios que indica. A Resolução, norma administrativa genérica, não pode contrariar a lei e um decreto. A Resolução 237, de 9 de dezembro de 1997, entrando em vigor posteriormente à lei mencionada neste ponto, infringe a Lei 8.974/1995, sendo assim ilegal (...)”.

 

B) em que moldes a Constituição Federal preconiza o licenciamento ambiental?

O artigo 225, da CRFB, não se refere literalmente ao licenciamento ambiental, mas decorre do dever constitucional estatal de controlar previamente a poluição (artigo 225, § 1.º, V). Contudo, trata-se de um instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente, decorrendo do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e dos Princípios da Prevenção e Precaução, pois é dever do Poder Público protegê-lo, por meio de um prévio controle estatal sobre condutas humanas aptas a impactar o meio ambiente, sendo corolário do poder de polícia ambiental.

Deveras, compete a todas as entidades políticas promover o licenciamento ambiental, pois a proteção ambiental é competência de todos os entes políticos (artigo 23, VI, da CRFB), cabendo à lei complementar regular o tema, quanto à cooperação entre eles.

O licenciamento ambiental é definido como o “procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso” (artigo 1.º, I, da Resolução CONAMA 237/1997).

No curso do licenciamento ambiental será exigido do empreendedor algum estudo ambiental, a exemplo do prévio e público EIA-RIMA, quando a atividade puder causar significativa degradação ao meio ambiente (artigo 225, § 1.º, IV, da CRFB).

 

C) no caso em questão, que princípio do direito ambiental dá suporte e fundamento à reclamação da adoção de medidas de pronto quando situações de urgência e perigo envolvem risco à vida e à saúde humana, dos animais, das plantas e do meio ambiente?

Trata-se de hipótese de aplicação do Princípio da Precaução. Deveras, se determinado empreendimento puder causar danos ambientais – contudo inexistir certeza científica quanto aos efetivos danos e à sua extensão, mas houver base científica razoável fundada em juízo de probabilidade não remoto da sua potencial ocorrência –, o empreendedor deverá ser compelido a adotar medidas de precaução para elidir ou reduzir os riscos ambientais para a população.

Este Princípio consta da Declaração do Rio, aprovada na ECO/1992: “Princípio 15. De modo a proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deve ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com suas capacidades. Quando houver ameaça de danos sérios ou irreversíveis, a ausência de absoluta certeza científica não deve ser utilizada como razão para postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para precaver a degradação ambiental”.

O Princípio da Precaução foi previsto expressamente em vários diplomas jurídicos no Brasil, a exemplo do artigo 1.º, da Lei 11.105/2005 (Lei de Biossegurança); do artigo 6.º, parágrafo único, da Lei 11.428/2006 (Lei do Bioma Mata Atlântica) e diplomas internacionais, como a Convenção sobre Mudança do Clima e a Convenção da Biodiversidade, ratificadas pelo Brasil. Recentemente, a Lei 12.187/2009 aprovou a Política Nacional sobre Mudança do Clima, consagrando expressamente o Princípio da Precaução do seu artigo 3.º.

Assim, a incerteza científica milita em favor do meio ambiente ou da saúde (in dubio pro natura ou salute). A precaução caracteriza-se pela ação antecipada diante do risco desconhecido. Enquanto a prevenção trabalha com o risco certo, a precaução vai além e se preocupa com o risco incerto. Prevenção se dá em relação ao perigo concreto, ao passo que a precaução envolve perigo abstrato ou potencial.

Nesse sentido, já decidiu o TRF da 4.ª Região, EIAC 200071010004456, de 12.07.2007: “Embargos infringentes. Estudo de Impacto Ambiental. Arroz geneticamente modificado. Os princípios da precaução e prevenção sugerem que o mero risco de dano ao meio ambiente é suficiente para que sejam tomadas todas as medidas necessárias a evitar a sua concretização. Isso decorre tanto da importância que o meio ambiente adquiriu no ordenamento constitucional inaugurado com a Constituição de 1988 quanto da irreversibilidade e gravidade dos danos em questão, e envolve inclusive a paralisação de empreendimentos que, pela sua magnitude, possam implicar em significativo dano ambiental, ainda que este não esteja minuciosamente comprovado pelos órgãos protetivos. O Estudo de Impacto Ambiental é uma exigência constitucional, não podendo ser dispensado, sobretudo em se tratando de experimentos com organismos geneticamente modificados, porquanto ainda não há consenso no que tange aos danos que possam causar ao meio ambiente”.

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1     Grupo humano, incluindo remanescentes de comunidades de quilombos, distinto por suas condições culturais, que se organiza, tradicionalmente, por gerações sucessivas e costumes próprios e que conserva suas instituições sociais e econômicas.

2     Disponível em: <http://www.mma.gov.br/sitio/index.php?ido=conteudo.monta&idEstrutura=222>.

3     Manutenção de amostra de componente do patrimônio genético fora de seu habitat natural, em coleções vivas ou mortas.

4     São valores pagos pela utilização de direito de propriedade.