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A secretária de Brett, Dana Licameli, dirigiu um sorriso solidário a Laurie, ao mesmo tempo que lhe acenava para que entrasse no que parecia ser o caminho para a forca.

— Cuidado — advertiu-a. — Eu não o via neste estado desde que a filha voltou da Europa com o nariz furado.

Brett girou imediatamente na sua cadeira para ficar de frente para ela.

— Depois de uma ausência tão prolongada do escritório estava à espera de que voltasse bronzeada e a cheirar a rum e a protetor solar. — Olhou para o relógio. — Quase três horas no 21 Club? Quem nos dera a todos! E não culpe a sua equipa. Eles fizeram o melhor que puderam para lhe dar cobertura, mas eu pedi à Dana para espreitar o computador do seu assistente.

Laurie abriu a boca para falar, mas não saiu nada. Odiava a ideia de ter sujeitado Grace e Jerry aos abusos de Brett na sua ausência. Se ela lhe dissesse o que lhe estava realmente a passar pela cabeça, ficavam os três sem emprego. Encontrou por fim palavras que conseguiu obrigar-se a murmurar.

— Peço desculpa, Brett. Como é evidente, esqueci-me de que tínhamos uma reunião marcada para esta tarde.

A resposta seca dela pareceu acalmá-lo. Ele até esboçou um sorriso. Aos sessenta e um anos, pelas contas mais recentes dela, Brett continuava a ser um homem muito atraente. Com a sua farta cabeleira prateada e luzidia e um maxilar proeminente, tinha a aparência de um dos muitos pivôs que contratara ao longo dos anos para apresentarem os noticiários.

— Não seja assim tão sensível. Sabe bem que não tínhamos marcado reunião nenhuma. Mas tem andado a evitar-me e ambos sabemos porquê.

— Não tenho andado a evitá-lo — disse Laurie, prendendo uma longa madeixa de cabelo castanho-claro atrás da orelha. Ela tinha estado apenas à espera da malfadada assinatura da viúva do Texas, para poder confirmar a Brett que estavam oficialmente prontos para começar a trabalhar. — Estava realmente convencida de que tínhamos tudo decidido com o caso do professor de Medicina. A viúva andava a empatar, mas eu estava certa de que ela ia decidir-se.

— Está a dizer-me que isso não aconteceu? Disse-me que ela só andava demasiado ocupada com os pirralhos e que não conseguia ir aos correios.

Laurie tinha a certeza de que não tinha chamado pirralhos aos filhos de Lydia. Mas respondeu calmamente:

— Ao que parece, ela mudou de ideias, ou então andou a enganar-me este tempo todo.

— Aposto que ela está com medo de avançar — afirmou Brett. — Se calhar é culpada.

Um dos aspetos mais difíceis do trabalho de Laurie era convencer os principais envolvidos a participarem no programa. Habitualmente, ela era tão simpática e educada que as pessoas tinham dificuldade em dizer-lhe que não. Mas, por vezes, precisava de recorrer a táticas mais duras. Nem sempre sentia orgulho nas manobras que tinha de empregar, mas uma única peça do puzzle em falta fazia com que toda a produção se desmoronasse.

— Eu acho a mesma coisa. Ela consultou dois advogados e tem demasiado a perder.

— Bom, na minha perspetiva, isso faz dela culpada.

— Por acaso, eu concordo com isso — afirmou Laurie. — Mas ela estava decidida. E um programa sobre o homicídio por resolver do marido dela não teria o mesmo impacto se ela não aparecesse.

— Você está mesmo a tentar estragar-me o dia, não está? — O tom de Brett tinha-se tornado mais sarcástico.

— Não de uma forma intencional. Mas a minha ausência, como lhe chamou, valeu-me uma pista nova. Acabo de reunir com a Casey Carter.

— A Casey Louca? Ouvi falar dela nas notícias ontem à noite. Ela estava com um dos conjuntos que comprou no centro comercial?

— Não perguntei. Estava demasiado ocupada a ouvir as alegações de inocência dela. E ela apresentou-me cinco suspeitos diferentes. Podia ser ótimo para o Sob Suspeita. As histórias de condenações por engano estão na moda.

— Mas só quando houve engano.

— Eu sei. Foi a nossa primeira reunião. Ainda tenho muito trabalho a fazer. Mas, pelo menos, ela está a falar comigo e não com outra pessoa qualquer.

— Sinceramente, neste caso não quero saber se a moça é ou não uma assassina. Só o nome dela já vai fazer disparar as audiências. — Laurie ficou à espera de que Brett a interrogasse exaustivamente a propósito de pormenores que ela ainda não conhecia. Mas, em vez de a pressionar para ela lhe fornecer informações sobre o caso, ele limitou-se a comentar: — Os estúdios Fisher Blake não sobreviveram estes anos todos por financiarem falsas partidas.

— Percebi — respondeu Laurie, tentando disfarçar o alívio que sentia. — Era só por causa de uma atualização do próximo caso que queria falar comigo?

— Claro que não. Temos de falar do assunto incómodo. Quer isso lhe agrade ou não, o Alex foi-se embora e está a precisar de um novo apresentador. — Brett estendeu a mão por cima da mesa e entregou-lhe uma folha de papel. — Para sorte sua, eu tenho o homem perfeito para o lugar.

Enquanto olhava fixamente para a folha de papel cor de marfim que tinha na mão, Laurie só conseguia pensar em Alex. De como soubera, desde a primeira vez que vira os seus olhos verde-azulados por trás dos óculos de armação preta, que ele era o apresentador perfeito para o Sob Suspeita. Em como ele tinha saltado para dentro do automóvel com ela, sem hesitar, quando o pai dela tinha dado entrada no hospital com palpitações. No seu primeiro jantar a dois no Marea. Em como ele tinha corrido instintivamente para ela e para Timmy quando o homem que tinha assassinado Greg tentara matá-los a eles também. Em todas as horas passadas a discutir teorias acerca dos casos acompanhados por uma garrafa de vinho. Na sensação dos seus lábios nos dela.

Apercebeu-se naquele momento de que Brett tinha razão. Ela andava a evitar o chefe e não era por estar à espera de um pedaço de papel de uma mulher qualquer do Texas. Da mesma maneira que tinha esperado que a viúva acabasse por ceder, deu-se conta de que uma parte de si esperara o mesmo de Alex — que, talvez, o trabalho no escritório dele acalmasse temporariamente; ou que, talvez, quando ela tivesse um caso em mãos, ele ficasse demasiado intrigado para conseguir resistir; ou podia ser que ele simplesmente sentisse saudades de trabalhar com ela.

Porém, agora, a ideia de que Alex ia abandonar o programa era real. Ela estava a olhar para um currículo de uma pessoa real, com um nome real: Ryan Nichols. Licenciado com distinção pela Universidade de Harvard, com um cargo no Supremo Tribunal, experiência em tribunal como advogado de acusação do estado. Só quando chegou à alínea da sua experiência em televisão é que ela associou o nome de Ryan ao rosto que tinha visto em todos os canais de televisão recentemente.

Imaginou uma gravação que ainda não existia. «Sob Suspeita, com a participação de Ryan Nichols.» «Não», pensou ela, «isto não soa bem. O nome devia ser Alex Buckley.»

O pensamento dela foi interrompido pela voz rouca de Brett.

— Eu sei, o Ryan é perfeito. Ele vem cá na sexta-feira, às quatro horas, para oficializar tudo. Pode agradecer-me depois.

Quando se virou para se ir embora, Laurie pensou que o nó que sentia no estômago não podia ser mais apertado. Até ter ouvido a voz de Brett mais uma vez, atrás de si.

— E nessa altura também falamos da Casey Louca. Mal posso esperar para ouvir os pormenores.

Ótimo. Ela tinha dois dias para montar uma apresentação pormenorizada acerca da alegação de Casey Carter em relação à sua condenação injusta. Apesar de não fazer ideia se a mulher era inocente ou se era uma assassina. Tinha de telefonar à Charlotte.