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Laurie não devia ter ficado surpreendida ao ver Ryan Nichols sentado no sofá do gabinete de Brett quando chegou para a reunião. Ele parecia sentir-se mais confortável a cada dia que passava. Talvez na semana seguinte tivesse uma cama e uma mesa de cabeceira ao canto da divisão. Ela ainda não acreditava que Brett tinha contratado o sobrinho do seu melhor amigo para ocupar aquele lugar.
— Ryan, como é que está a conseguir gerir o seu horário para ter tempo para o programa? O Brett deve ter comentado que perdemos o nosso apresentador anterior, o Alex Buckley, por não conseguir conjugar as exigências da prática profissional dele como advogado com as nossas necessidades de produção.
— O Brett não lhe disse? Vou fazer uma pausa como advogado. Tenho um contrato de exclusividade a tempo inteiro com os estúdios Fisher Blake. Para além de apresentar o Sob Suspeita, vou aparecer noutros noticiários, vou dar aconselhamento jurídico em programas de entretenimento quando as celebridades tiverem problemas em tribunal, esse género de coisas. Se resultar, sou capaz de produzir um programa da minha autoria.
Ele disse aquilo como se conceber um programa de televisão fosse um passatempo. «Se começar a brincar com areia, até sou capaz de construir o meu próprio castelo.»
Brett fez-lhe sinal para ela se sentar ao lado de Ryan.
— Laurie, tenho de admitir que fui duro consigo por estar a pôr os princípios jornalísticos acima das audiências, mas desta vez você acertou em cheio. A Bela Adormecida está de volta às primeiras páginas e, pelo que percebi, ela não falou com mais ninguém além de si.
— Não falou com mais jornalistas. Só falou com a família.
— Tem a certeza? — perguntou ele. — É que eu já perdi a conta às vezes que fomos queimados por fontes que nos diziam que nós éramos os únicos.
— Tenho a certeza absoluta, Brett. Aliás, a Casey saiu agora mesmo do meu gabinete com a prima dela e deu-me a sua palavra de que estava connosco, caso decidíssemos falar do caso dela.
— A palavra dela — retorquiu Ryan, com ceticismo. O olhar incomodado que os dois homens trocaram era indesmentível. — Ela assinou algum acordo?
— Na verdade, Ryan, está a assiná-lo neste preciso momento. Quer que lhe mostre uma cópia? Um dos grandes desafios do nosso formato é conseguir que os participantes confiem em nós o suficiente para colaborarem connosco. Eu começo a construir essa confiança logo de início. Conseguir que ela assine aquele documento tem um grande significado para mim.
— Não seja tão emotiva — disse Brett. — Eu sei que tem essa coisa da ligação com os participantes. Que descobriu a respeito da fotografia que desapareceu?
Ela pô-los a par da sua conversa, ao final da tarde da sexta-feira anterior, com Elaine Jenson, que se recordava claramente de ter visto a moldura na mesa de cabeceira de Hunter antes de ele ter saído para a gala.
Brett pareceu-lhe satisfeito, mas Ryan interrompeu-a.
— Isso não significa nada. A polícia só respondeu à chamada para o cento e doze depois da meia-noite. Tanto quanto sabemos, a moldura partiu-se na sequência de uma discussão e a Casey conseguiu apanhar os pedaços antes de chamar a polícia. E agora está a usá-la para desviar as atenções.
Era o mesmo contra-argumento que Grace tinha apresentado.
— Nesse caso, porque é que a Casey não o usou quando o julgamento começou a correr mal? — perguntou Laurie retoricamente. — Porque não se trata de uma forma de desviar as atenções. Quando a Casey me contactou, disse-me que, na época do julgamento, nem sequer se apercebera de que a moldura tinha desaparecido.
Quando viu Brett olhar para Ryan, Laurie temeu o pior, mas ele afirmou:
— Concordo com a Laurie. Pode justificar-se o desaparecimento de uma fotografia, mas isso já vai ser um mistério suficiente para prender os espectadores. Trata-se de provas novas. Assim como a trapalhada financeira com o amigo, na fundação. São esses aspetos que vão impedir que o programa seja uma repetição de um julgamento com quinze anos e isso é o que importa. Mas atenção, Laurie, a Mindy Sampson está a publicar no blogue dela cada passo que a Casey dá, vinte e quatro horas por dia. A Casey está na ordem do dia, mas os ciclos de notícias morrem depressa. Não tarda muito ela terá passado à história, por isso, temos de filmar depressa.
A cada novo episódio do Sob Suspeita, as expectativas de Brett em relação às audiências subiam, na mesma proporção que os seus prazos temporais reduziam. Ao contrário dos casos anteriores de Laurie, este já tinha ido a tribunal e ela tinha os registos do julgamento para trabalhar, o que lhe dava algum avanço.
— Começo a produção logo que isso seja exequível — respondeu ela.
— Onde é que entra aqui a família Raleigh? — perguntou Brett. — Custa imaginar o programa sem eles.
Laurie tinha orgulho em ter conseguido assegurar a participação das famílias das vítimas em todos os episódios anteriores.
— Não sei. Deixei mensagens ao pai do Hunter, mas ainda não obtive resposta. O facto de a assistente pessoal dele, Mary Jane, fazer parte da lista de suspeitos alternativos da Casey não ajuda. Mas tenho uma reunião agendada com o Andrew, o irmão dele, esta tarde.
— Muito bem. Consiga a participação de alguém da família e podemos avançar.
Quando estava a sair do gabinete de Brett, Laurie ouviu Ryan dizer:
— Eu já montei o julgamento de uma mega fraude com uma semana de antecedência. Devemos ser capazes de fazer isto.
Ela começava a perguntar-se quando é que a outra metade daquele «nós» principiaria a merecer o que ganhava.