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Quinze anos antes, Jason Gardner estivera na gala da Fundação Raleigh, no Cipriani, na qualidade de analista em ascensão num dos maiores bancos de investimento do mundo. Tendo em conta o passado do ex-namorado de Casey, Laurie esperava encontrá-lo atualmente como gestor de um fundo de investimento milionário. Em vez disso, quando chegou à morada que aparecia no seu perfil no LinkedIn, Laurie deparou-se com um pequeno gabinete, num edifício poeirento, com vista para o Holland Tunnel. A firma chamava-se Gardner Equity. Mas, a julgar pelo mobiliário barato, ela desconfiava que ele pouco familiarizado estaria com a autêntica equity.
A rececionista que se encontrava na entrada estava a ler uma revista cor-de-rosa e a mascar pastilha elástica. Quando Laurie lhe disse que estava à procura do senhor Gardner, a mulher inclinou a cabeça na direção da única pessoa, para além dela própria, que se encontrava no gabinete.
— Jason, está aqui a senhora Moran.
O currículo de Jason não fora o único a sofrer um revés nos últimos quinze anos. O homem que se ergueu da secretária situada no canto ao fundo da sala tinha apenas quarenta e dois anos, mas apresentava rugas vincadas no rosto e os olhos raiados de sangue. Ele não se parecia em nada com o homem jovem e atraente cuja fotografia surgia na contracapa do seu livro escandaloso, Os Meus Dias com a Casey Louca. Laurie desconfiou que as drogas e o álcool que as ex-mulheres dele tinham referido continuavam a deixar a sua marca.
— Posso ajudá-la nalguma coisa? — perguntou ele.
— Tenho algumas perguntas para lhe fazer acerca da Casey Carter.
O rosto dele envelheceu subitamente mais uma década.
— Vi nas notícias que ela saiu da prisão. Custa a crer como os quinze anos passaram a voar. — O olhar de Jason estava fixado num ponto distante, como se ele contemplasse os anos a passarem.
— Não me parece que tenha sido assim tão rápido para a Casey — disse Laurie.
— Não, suponho que não.
Laurie não tinha tido a oportunidade de ler o livro de Jason na íntegra, mas tinha lido o suficiente na diagonal para perceber que ele pregara uma valente rasteira à ex-namorada. O livro descrevia uma jovem ambiciosa e sedenta de poder que pusera de parte, definitivamente, o namorado com quem acabara e retomara a relação mais do que uma vez, a partir do momento em que a sua atenção se focara em Hunter Raleigh.
Tirou o seu exemplar da pasta.
— Algumas pessoas são capazes de ter ficado surpreendidas quando decidiu escrever isto. Pelo que ouvi dizer, estava muito apaixonado pela Casey.
— Eu amava-a — disse ele, num tom triste. — Isso é verdade. Ela era extrovertida, enérgica, divertida. Não faço ideia de como ela será agora, mas naquela época? Estar ao pé da Casey fazia-me sentir mais vivo. Mas por vezes uma personalidade assim tem o seu preço. A linha que separa a espontaneidade do caos é ténue. Nalguns aspetos, a Casey era uma bomba destruidora.
— Como assim?
Ele encolheu os ombros.
— É difícil de explicar. Parecia que ela sentia as coisas todas com demasiada intensidade. Como o interesse que tinha pela arte. Ela não era capaz de se limitar a apreciar um quadro, isso tinha de levá-la às lágrimas. Se ouvisse um comentário negativo no emprego, ficava a pensar no assunto durante o resto da noite, a perguntar-se o que tinha feito mal. E assim era em relação a mim. Quando nos conhecemos na faculdade, parecíamos almas gémeas. Quando ela veio viver para Nova Iorque, tive a esperança de que fosse por minha causa, mas obviamente ela preocupava-se muito mais com o emprego na Sotheby’s. Depois inscreveu-se em cadeiras para fazer o mestrado e começou a falar dos seus planos para abrir uma galeria sua. Entretanto, questionava-me porque é que eu não trabalhava mais. Porque é que alguém que não eu tinha sido promovido? Como se eu não fosse suficientemente bom para ela. Quando acabou comigo, disse-me que precisava de tempo. Eu pensei que fosse mais uma das nossas pausas. Mas duas semanas depois vi uma fotografia dela com o Hunter Raleigh nas páginas das colunas sociais. Ela partiu-me o coração. Eu tornei-me distraído. Os problemas que estava a ter no trabalho cresceram como uma bola de neve. Como pode ver, não acabei propriamente no Taj Mahal.
Ele parecia culpar Casey pela sua queda. Não seria um exagero pensar que também culpava Hunter.
— No entanto, foi-me dito que tentou reconquistá-la, mesmo depois de o noivado dela ter sido anunciado.
— Tem boas fontes. Foi só uma vez, e por causa de uma grande quantidade de uísque. Disse-lhe que um snobe como o Hunter iria sugar toda a vida que havia nela. Mal podia imaginar que aquilo que ia acontecer era o oposto.
— Acha que ela o matou? — Tanto quanto Laurie sabia, o livro de Jason nunca oferecia uma opinião direta em relação à culpa de Casey.
— Admito que ter-lhe chamado Casey Louca no livro foi um pouco injusto. Para ser franco, foi insistência da Arden Publishing. Mas a Casey era teimosa como uma mula e tinha um feitio a condizer. Quando estávamos juntos, ela ficava toda irritada se eu falasse com outra mulher. Nem imagino o que ela faria ao Hunter se ele tentasse deixá-la como ela me deixou a mim.
Depois de Laurie ter saído, Jason esperou até ouvir o elevador do corredor arrancar e a seguir sugeriu a Jennifer — a mais recente de uma longa lista de secretárias incompetentes dispostas a trabalhar em troca do que ele podia pagar — que fizesse uma curta pausa. Quando ela saiu, ele marcou um número para o qual não ligava há anos. O seu agente atendeu e pô-lo em espera por um momento. O homem que acabou por atender outra vez o telefonema não parecia contente com aquele contacto.
— Uma produtora de televisão contactou-me e fez-me perguntas acerca da Casey — explicou Jason. — É para um programa chamado Sob Suspeita. Querem entrevistar-me. Que achas?
— Assina os papéis. Participa no programa. És capaz de vender mais livros.
— Ela não me vai fazer ficar bem na fotografia.
— Diz-me alguma coisa que eu não saiba já. Assina lá os papéis.
Quando desligou o telefone, Jason sentiu-se maldisposto. Tinha dito a verdade a Laurie Moran. Ele amava mesmo a Casey. Mas, então, a mulher que ele amava fora presa por homicídio e ele não pôde fazer nada por ela. Ele só podia ajudar-se a si mesmo e foi isso que fez. E agora odiava-se por isso. Abriu a primeira gaveta da sua secretária, tomou um de entre os muitos analgésicos que ali tinha armazenados e tentou não pensar em Casey.