39
Laurie tocou à campainha do escritório de Janice Marwood. Como ninguém atendeu, abriu a porta e entrou. «Isto é um escritório», pensou. Numa primeira olhadela, percebeu que aquele espaço tinha provavelmente sido uma casa de família no início do século XX. À sua esquerda, aquilo que em tempos fora uma sala de estar era agora uma receção, com várias cadeiras e uma mesa com revistas.
O que ali não havia era sinal de vida, não se via vivalma.
— Olá? — gritou Laurie, enquanto se detinha na área da receção. Ouviu passos ao fundo do corredor, a virem na sua direção.
Uma mulher apareceu vinda da parte de trás da casa, com um frasco de manteiga de amendoim numa mão e uma colher na outra.
— Estou aqui… oh.
«Oh», pensou Laurie. Apresentou-se, apesar de desconfiar seriamente, pela reação da outra mulher, que ela sabia exatamente quem era.
— Telefonei-lhe algumas vezes por causa da Casey Carter.
Marwood engoliu o pedaço de manteiga de amendoim que tinha na boca e libertou as mãos para um aperto de mão rápido.
— Desculpe, ando atarefada a gerir milhares de casos. Mas juro que ia telefonar-lhe hoje, desse por onde desse.
Laurie não acreditou nela.
— Recebeu a autorização para levantar o sigilo profissional que lhe enviámos por fax? Eu preciso muito de falar consigo. Começamos a produção dentro de dois dias.
Enviar por fax, naquele caso, significava que tinha sido enviado por fax, por email e por correio registado. Telefonar algumas vezes equivalia a mensagens deixadas no telefone dela todos os dias. E, ainda assim, Laurie não tinha tido notícias da advogada que defendera Casey em tribunal.
— O tribunal não permite que se faça filmagens no interior, mas temos autorização para filmar à frente do edifício. Ou então temos todo o gosto em filmar aqui, se lhe der mais jeito. Acima de tudo, gostava de ouvir o que pensa. Passaram-se quinze anos e a Casey nunca vacilou na proclamação da sua inocência.
Janice mexeu a mandíbula, como se ainda estivesse a comer.
— Pois, em relação a isso. A Casey está no seu direito de abdicar do sigilo cliente-advogado, mas eu investiguei se seria obrigada a participar num programa de televisão contra a minha vontade. E a resposta é não.
Laurie tinha imaginado inúmeros cenários diferentes que poderiam desenrolar-se quando ela chegasse ao escritório de Janice, mas este não era um deles.
— Tem uma dívida de lealdade para com a sua cliente. Ela passou uma boa parte da vida na prisão e agora está desesperada para limpar o nome. É suposto a senhora ser a defensora dela. Lamento, mas não vejo aqui nenhum conflito.
— A minha função é… era… lutar por ela no julgamento. E no recurso. Mas o processo acabou. Eu não sou uma estrela de um programa de reality television. A minha função não é aparecer na televisão.
— A Casey assinou os papéis.
— Tudo bem, mas ela não me pode obrigar a falar, da mesma maneira que não me pode dizer onde é que eu vou jantar esta noite. Fui buscar os ficheiros dela à arrecadação. Ela tem todo o direito a estes materiais. E está à vontade para me telefonar a pedir os conselhos de que precisar. Mas, em relação ao seu programa, eu não vou participar.
Mais uma vez, Laurie deu por si a desejar ter Alex ao seu lado. Ela tinha assumido que a advogada de Casey iria pelo menos simular estar interessada em assumir a defesa da sua antiga cliente. Mas Marwood estava a resistir e ela não tinha autoridade para a contrariar. Antes de ela se aperceber do que se estava a passar, a advogada estava a conduzi-la através de um átrio, até uma sala onde havia uma mesa de reuniões, em cima da qual estavam duas caixas de cartão que diziam «C Carter».
— O que ia acontecer com tudo isto se eu não tivesse vindo até aqui hoje? — perguntou Laurie.
— Tal como disse, ia ligar-lhe. A FedEx vinha buscar as caixas de manhã.
Mais uma vez, Laurie não acreditou numa palavra do que ela dizia.
— Durante o julgamento, alguém andou a perseguir a Casey com comentários negativos. Pesquisou isso?
— Tudo o que eu tenho está nesses caixotes.
— A filha de um dos jurados até lhe falou de um comentário que alegava que a Casey tinha confessado. Ele contou isso ao juiz. Porque é que não pediu uma anulação do julgamento?
A advogada empurrou uma das caixas na direção de Laurie.
— Com o devido respeito, minha senhora, não tenho de lhe dar satisfações sobre a minha estratégia no julgamento. Precisa de ajuda para transportar as caixas? Porque isso é tudo o que tenho para lhe oferecer.
Alex tinha classificado Janice Marwood com um «Satisfaz menos», mas Laurie queria dar-lhe um «Mau», com um «M» grande.
Quando saiu para a rua com as caixas do processo a reboque, viu o pai, dentro do automóvel alugado, a tamborilar os dedos no volante. Desconfiava que ele estava a ouvir a estação de música dos anos sessenta, a sua estação de rádio por satélite preferida.
Quando a viu, acionou a abertura do porta-bagagens e saiu do veículo para a ajudar.
— Parece que isso correu bem — disse ele, enquanto pegava numa das caixas.
— De maneira nenhuma — respondeu ela. Não tinha provas, mas interrogou-se se o pai de Hunter não teria chegado à própria advogada de Casey.