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Quando Ramon abriu a porta do apartamento de Alex, Laurie viu na sua expressão que ele sabia que alguma coisa se passava. Habitualmente, ele recebia-a com uma piada mordaz e a oferta de uma bebida, mas nessa noite limitou-se a dizer-lhe que Alex viria já de seguida, deixando-a sozinha na sala de estar.

Quando Alex apareceu, vindo do corredor que levava ao seu quarto, tinha o cabelo húmido e ainda vinha a ajeitar o colarinho da camisa.

— Laurie, desculpa ter-te feito esperar. Quando ligaste, estava no ginásio. Vim a correr para casa, mas é óbvio que tu foste mais rápida. Posso servir-te alguma coisa?

Ela queria muito um copo de Cabernet, mas isso ficava para depois.

— Estou aqui por causa do programa. A julgar pela forma como o Ramon me recebeu, presumo que tenhas percebido que não se tratava de uma visita puramente pessoal.

— Não tinha a certeza.

Talvez ele não tivesse a certeza, mas devia estar à espera daquele momento, de uma maneira ou de outra. Afinal de contas, era ele quem costumava dizer a Laurie que ela era melhor do que qualquer investigador com quem já tivesse trabalhado.

— Da última vez que falámos, avisaste-me para eu ter cuidado com este caso, porque estava a lidar com pessoas muito poderosas. Estavas a falar do James Raleigh, não estavas?

— Não precisas que eu te diga que um general de alta patente cujo nome tinha, a dada altura, sido frequentemente mencionado como candidato presidencial é uma pessoa poderosa.

— Não, mas precisava que me dissesses que tinhas algum tipo de envolvimento com ele.

Ele agarrou-a, mas ela afastou-o.

— Laurie, preciso que tu te lembres que tenho um trabalho que já existia muito antes de te ter conhecido, a ti ou ao teu programa. Por favor, não esperes que te diga mais do que isto.

— Estou farta de que fales em código, Alex. Tens falado comigo como um advogado desde a primeira vez que mencionei a Casey Carter.

— Isso é porque eu sou advogado.

— E, por causa disso, estás sujeito ao sigilo advogado-cliente. Mas o teu cliente não é o James Raleigh. O teu cliente é, ou foi, o Mark Templeton. No entanto, tu conheceste o James Raleigh primeiro. Conheceste-o num piquenique quando andavas na faculdade de Direito. E depois disso tornaste-te num dos melhores advogados de defesa criminal da cidade. E, de alguma maneira, foi essa ligação com o general Raleigh que te levou a representar o Mark Templeton quando surgiram dúvidas sobre a maneira como ele estava a gerir as finanças da Fundação Raleigh.

— Isso não é justo, Laurie. Eu não posso confirmar nem desmentir se conheço o Mark Templeton.

— Estás a brincar comigo?

— Eu não tenho escolha, Laurie, mas tu tens. Podes escolher acreditar em mim. Tu conheces-me e sabes que eu gosto de ti e do teu trabalho. E juro-te que podes e deves deixar o Mark Templeton de fora da tua história. Estás a ir atrás da pessoa errada, neste caso.

— Então é assim? É suposto eu acreditar na tua palavra e seguir em frente?

— Sim.

Ele fazia com que tudo aquilo parecesse fácil.

Laurie sentia-se completamente impotente. Desde que estava a trabalhar neste caso que sentia intensamente a ausência de Alex e não era só pelo facto de Ryan Nichols ser um chato. Havia alguma coisa em Alex que a deixava à vontade. Quando falavam, as ideias fluíam como água. Seguir os seus instintos tornava-se fácil, pelo menos no que dizia respeito ao trabalho. E agora ele dizia-lhe que ignorasse os factos, com base simplesmente na sua palavra, quando os instintos dela lhe gritavam o oposto.

Ele abraçou-a, de novo, mas desta vez ela deixou-se arrastar para os braços dele. Ele afagou-lhe o cabelo.

— Desculpa se não te posso dizer mais nada, mas confia em mim, por favor. Porque é que não confias em mim?

Ela recuou para poder olhá-lo nos olhos quando respondesse à sua pergunta.

— Porque eu acho que me tens andado a mentir.

— Laurie, eu nunca te menti e nunca te irei mentir. Se aquilo que me estás a perguntar é se o Mark Templeton esteve envolvido no homicídio do Hunter Raleigh, garanto-te que ele está inocente.

— Tu ainda estás a trabalhar com o teu cliente, não estás? Alex, eu estou a falar de nós. Eu estive aqui, na tua casa, com a minha família, logo a seguir a ter conhecido a Casey Carter. Já nessa altura tu parecias estar a tentar desviar-me do caso. Porque não me disseste, nessa altura, que conhecias algumas das principais pessoas envolvidas? Tens-me obrigado a arrancar-te cada pedaço de informação como se te estivesse a contrainterrogar.

— Eu não te menti. Só não te contei tudo.

Ela abanou a cabeça. Não podia acreditar que o homem que ela sabia que amava estava ali, à sua frente, a defender a diferença entre uma mentira e uma omissão da verdade total.

— Por favor, Laurie. Revê a conversa que nós os dois tivemos depois de teres conhecido a Casey. Tu nunca falaste do Mark Templeton, do pai do Hunter, nem da fundação. Era um caso de homicídio com quinze anos e não um caso acerca do que viria a passar-se anos depois, na fundação. E sempre se pensou que o homicídio do Hunter apenas estivesse relacionado com a relação que ele mantinha com a Casey, da qual não sei rigorosamente nada. Por isso, mesmo se soubesse alguma coisa acerca da fundação, porque teria falado nisso, especialmente quando estava proibido de o fazer?

— Neste momento pareces um advogado da pior espécie…

— E tu estás a tratar-me como um dos suspeitos do teu programa.

Okay, já percebi, nunca me vais contar a verdade. Mas diz-me isto. Tu tens o dever de ser leal aos teus clientes, mesmo que eles sejam culpados?

Ele sentou-se no sofá e resignou-se a entrar numa nova fase da discussão.

— Claro.

— E esse dever é para sempre. Acho que me disseste uma vez que vai para além da morte. — Ele não precisava de lhe responder. Ambos sabiam onde ela queria chegar. — Então isso quer dizer que, se um dos teus clientes, alguém como, hipoteticamente, o Mark Templeton, estivesse apavorado com a hipótese de um programa como o meu poder revelar algo horrível… como, por exemplo, que ele tinha matado o amigo para ocultar o desvio de fundos… boicotar o programa faria parte das tuas funções.

— Sim, sim, senhora Moran. Apanhou-me. É melhor inquiridora do que eu. Ganhou. Está feliz?

Não, ela não estava nada feliz.

— Tu disseste que não tinhas escolha, Alex. Bom, eu também não tenho. Imediatamente antes de ter sido morto, o Hunter estava à procura de um contabilista forense para fazer uma auditoria às contas da fundação. Isso dava um motivo ao Templeton. E a mulher e os filhos estavam a dormir quando ele chegou da gala naquela noite, por isso, ele não tem álibi. Fala com o teu cliente. Ele pode falar connosco diante das câmaras ou então pode lidar com as repercussões do que nós decidirmos dizer acerca dele na sua ausência. Tencionamos terminar as filmagens dentro de dois dias.