55
Paula Carter estava na sua cama, no hotel, a saltar de canal para canal com o comando, para passar o tempo. Na secretária ao seu lado, a sobrinha, Angela, teclava furiosamente no portátil.
— Era desnecessário teres-nos alugado um quarto de hotel, Angela. Mas foste muito atenciosa.
— Não foi nada. Imaginei que a Casey não se quisesse enfiar no comboio quando as filmagens acabassem. Para além disso, a Ladyform tem desconto para os funcionários neste hotel.
— Fiquei tão aliviada quando a Casey me telefonou ontem à noite a dizer que afinal eles já não precisavam de nós! E percebo que ela tenha ido sozinha, mas porque é que ainda não nos telefonou? Ela já deve ter terminado. Como é que te consegues concentrar?
— Não tenho escolha — respondeu Angela, que continuou a teclar. — Temos o desfile de outono neste fim de semana. Estou a fazer tudo o que posso à distância, mas eu e a Charlotte temos de ir ao armazém verificar o design dos cenários.
Paula desligou a televisão.
— Angela, acho que nunca te disse o orgulho que sinto em ti. Que orgulho a Robin sentiria, ao ver onde tu chegaste em termos profissionais! De uma simples modelo a uma carreira de sucesso.
— Uma simples modelo? — perguntou Angela, tirando os olhos do ecrã do computador. — Eu trabalhei mais como modelo do que alguma vez o fiz na Ladyform.
— Eu não quis dizer isso, Angela. Tu sempre foste tão bonita e claro que ainda és deslumbrante. Mas esse nunca foi o teu real valor. A aparência desaparece. O talento, não. Eu sou sincera. Quando vocês as duas eram pequenas, eu estava sempre a comparar-vos. A Robin dizia sempre que tu eras linda. E eu lamento dizê-lo, mas pensava sempre: «A minha Casey vai destacar-se, no futuro.» Sei que isto parece horrível dito agora, mas as irmãs são competitivas, até mesmo em relação aos filhos. Nunca imaginei que tu virias a ser uma gestora e que a Casey acabaria…
Ela não conseguiu terminar aquela frase.
Angela fechou o portátil, sentou-se ao lado de Paula na cama e abraçou-a.
— Obrigada, tia Paula. Isso é muito importante para mim, saber que tens orgulho em mim. Tenho a certeza de que a Casey há de encontrar o futuro dela. — Os olhos de Angela encheram-se de lágrimas. Ela limpou uma lágrima e riu-se, para aligeirar o ambiente.
— Bom, agora sou eu que estou em stresse. Já devíamos ter tido notícias da Casey.
Paula ia pegar no telemóvel quando ouviram o bipe do cartão do hotel a abrir a porta. Casey tinha os olhos vermelhos e a maquilhagem esborratada.
— Oh, não. O que correu mal? — perguntou Angela.
— Tudo! — gritou Casey. — Está tudo mal! Eles montaram-me uma emboscada. A amiga da Charlotte, a Laurie, fingiu que acreditava em mim, mas depois atiçou o cão de fila dela, o advogado, contra mim. Ele adulterou os factos todos. Se ao menos me tivessem avisado, eu tinha preparado melhor as respostas. Eu podia ter explicado tudo.
Paula arrependeu-se imediatamente de não se ter oposto de forma mais veemente a que Casey participasse no programa.
— Talvez não seja assim tão mau — disse ela, a medo.
— Mãe, foi horrível. Eu vou parecer horrível. O meu propósito era limpar o meu nome, mas vou ficar a parecer ainda mais culpada do que antes. Eu vi que eles não iam acreditar em mim. Sim, o Hunter e eu discutíamos, mas isso é normal entre os casais. Nós resolvíamos sempre tudo. Eu não devia ter escondido nada, mas queria garantir que ela aceitava o caso.
Paula olhou para Angela, para saber o que fazer, mas ela parecia igualmente confusa.
— Querida, eu não tenho a certeza se te estamos a perceber.
— Quando entreguei o meu processo à Laurie, deixei uma coisa de fora. Deixei muitas coisas de fora. Fui estúpida. Devia ter percebido que eles iam descobrir.
— O que omitiste tu, em concreto? — perguntou Angela, nervosa.
— Fiz a minha advogada de defesa parecer pior do que ela foi na realidade. Mas o problema principal foi uma folha do inventário da polícia que falava em estilhaços de vidro partido no lixo.
— Como podia isso ser importante? — escarneceu Paula.
— Porque eles acham que era a moldura de cristal que tinha desaparecido da mesa de cabeceira. Eles acham que fui eu que a parti no meio de uma discussão com o Hunter e que foi por isso que retirei a folha dos ficheiros que lhes entreguei.
— E eles têm razão? — As palavras deixaram a boca de Paula antes de ela as conseguir conter.
Os olhos da filha dela inundaram-se de dor.
— Claro que não. Era só uma jarra partida. Não lhes entreguei a folha porque não queria que a Laurie pensasse que era a moldura perdida.
— Então eles estão apenas a especular — disse Angela. — Sinceramente, não estou a ver qual é o problema.
Paula não pôde deixar de reparar que Angela parecia mais impaciente do que era habitual. Atribuiu essa disposição ao facto de a sobrinha ter de ir trabalhar dali a pouco.
— O problema é que fui eu que parti a jarra. Uns dias antes da gala, quando vi a fotografia do Hunter com a Gabrielle. Fiquei tão chateada que bati com o jornal em cima da mesa. Isso fez com que a jarra tombasse e se despedaçasse em pedacinhos.
Paula sentiu um nó apertar-se no seu estômago.
— E tu disseste-lhes isso hoje, à frente das câmaras? Essa foi a teoria da acusação em relação ao teu motivo. — Paula levou as mãos ao rosto. — Oh, Casey.
— Eu sei, mãe. Por favor, não comeces. Aquela moldura era a única coisa que eu tinha a meu favor para provar que estava mais alguém na casa, naquela noite. E agora a minha tentativa de lhes ocultar os vidros partidos virou-se contra mim. Já para não falar do facto de eles terem achado que eu estava a tentar manipulá-los ao sugerir que não deviam usar já o pormenor da moldura. Eu nem sequer estabeleci a ligação. E agora vou parecer horrível.
Paula perguntou-se se a filha alguma vez seria sincera com ela, ou consigo própria, em relação ao que tinha acontecido naquela noite fatídica. Independentemente disso, Paula ia fazer aquilo que sempre fizera, que era amar a filha e fazer tudo o que conseguisse para protegê-la. Casey sempre tinha dito que Hunter a amava incondicionalmente, mas parecia nunca se ter apercebido que os pais a amavam dessa mesma maneira.
E porque sempre tinha feito tudo ao seu alcance para proteger a filha, Paula disse a Casey para ir à casa de banho lavar o rosto, para retirar a maquilhagem. Quando a filha saiu, começou a vestir o casaco.
— Onde é que vais? — perguntou Angela.
— Vou falar com a Laurie Moran, de mãe para mãe. Tem de haver uma maneira de impedir que este programa se realize e deixar a Casey viver a vida dela em paz.