A queda do governo
As muitas decepções e desastres da breve campanha da Noruega causaram profunda perturbação no país, e as correntes de paixão cresceram até mesmo no peito de alguns dos que tinham sido mais indolentes e obtusos nos anos anteriores à guerra. A oposição pediu um debate sobre a situação da guerra, que foi marcado para 7 de maio. A câmara estava repleta de membros muito irritados e angustiados. A declaração de abertura de Mr. Chamberlain não deteve a maré hostil. Interrompido em tom zombeteiro, ele foi relembrado de seu discurso de 4 de abril, quando, em contexto inteiramente diverso, tivera a imprudência de dizer: “Hitler perdeu o bonde.” Ele definiu minha nova posição e minha relação com os chefes de estado-maior e, em resposta a Mr. Herbert Morrison, deixou claro que eu não tivera esses poderes durante as operações norueguesas. Um orador após o outro, de ambos os lados da casa, atacou o governo e especialmente seu chefe, com acrimônia e veemência incomuns, recebendo o apoio de um aplauso crescente que vinha de todas as bancadas. Sir Roger Keyes, num ardoroso desejo de ganhar destaque nessa nova guerra, criticou duramente o estado-maior naval por seu fracasso na tentativa de tomar Trondheim. “Quando vi”, disse ele, “como as coisas estavam indo mal, nem por um momento deixei de importunar o almirantado e o Gabinete de Guerra para que me deixassem assumir toda a responsabilidade e liderar o ataque.” Envergando seu uniforme de almirante de esquadra, respaldou as queixas da oposição com detalhes técnicos e com sua autoridade profissional, de um modo muito de acordo com o clima da câmara. Das bancadas de trás do governo, Mr. Amery citou, entre sonoros vivas, as imperiosas palavras de Cromwell ao Longo Parlamento: “Aqui vos tendes sentado por demasiado tempo para o bem que tenhais feito. Parti, é o que vos digo, e vamos acabar com isso. Em nome de Deus, ide!” Eram palavras terríveis, partindo de um amigo e colega de muitos anos, de um companheiro de Birmingham e de um membro destacado e experiente do Conselho Privado.
No segundo dia, 8 de maio, embora prosseguisse em torno de uma moção de recesso, o debate assumiu características de um voto de censura e Sir Herbert Morrison, em nome da oposição, declarou que sua bancada pediria uma votação. O primeiro-ministro pôs-se outra vez de pé, aceitou o desafio e, num momento infeliz, apelou para seus amigos para que ficassem ao seu lado. Tinha o direito de fazê-lo, já que esses amigos haviam respaldado sua ação ou inação e, por conseguinte, haviam partilhado de sua responsabilidade nos “anos que os gafanhotos comeram”, antes da guerra. Mas, nesse momento, lá estavam eles em seus bancos, desconcertados e silentes, e alguns se aliaram às manifestações de hostilidade. Nesse dia, assistiu-se à última intervenção decisiva de Mr. Lloyd George na Câmara dos Comuns. Num discurso de não mais de vinte minutos, ele desferiu um golpe profundo e contundente no chefe do governo. Esforçou-se em me isentar de culpa: “Não considero que o primeiro Lord seja inteiramente responsável por tudo que aconteceu na Noruega.” Aparteei imediatamente: “Assumo completa responsabilidade por tudo o que foi feito pelo almirantado e aceito toda a minha parte da carga.” Depois de me advertir a não me deixar converter num abrigo antiaéreo para evitar que os estilhaços atingissem meus colegas, Mr. Lloyd George caiu sobre Mr. Chamberlain. “Não se trata de quem são os amigos do primeiro-ministro. A questão é muito maior. Ele pediu sacrifício. A nação está disposta a todo o sacrifício, desde que tenha uma liderança, desde que o governo mostre claramente o que pretende, e desde que confie em que aqueles que a lideram estão trabalhando bem.” E concluiu: “Afirmo solenemente que o primeiro-ministro deve dar o exemplo de sacrifício, pois nada pode contribuir mais para a vitória nesta guerra do que ele mesmo sacrificar as insígnias do cargo.”
Na condição de ministros, todos nos mantivemos unidos. Os ministros da Guerra e da Aviação já haviam discursado. Eu me oferecera para encerrar o debate, o que não era mais do que meu dever, não apenas por lealdade ao chefe sob cujo comando exercia minhas funções, mas também em virtude do papel excepcionalmente destacado que eu desempenhara no uso de nossas parcas forças em nossa frustrada tentativa de socorrer a Noruega. Fiz o que pude para retomar o controle da câmara para o governo, enfrentando interrupções contínuas, que vinham sobretudo da bancada da oposição trabalhista. Fiz isso de bom grado, ao rememorar os erros e o pacifismo deles nos anos anteriores, relembrando como, apenas quatro meses antes de a guerra estourar, eles haviam votado maciçamente contra o recrutamento. Em minha opinião, eu e alguns amigos que haviam trabalhado comigo tínhamos o direito de fazer essas censuras, mas eles, não. Quando me interrompiam, eu revidava e os desafiava e, por várias vezes, o fragor foi tamanho que eu não conseguia me fazer ouvir. O tempo todo, porém, ficou claro que a raiva deles não se voltava contra mim, mas contra o primeiro-ministro, a quem eu estava defendendo com o máximo de minha capacidade e sem levar em conta outras considerações. Quando me sentei, às 11, a Casa fez a divisão.1 O governo obteve maioria de 81 votos, porém mais de trinta conservadores votaram com as oposições trabalhista e liberal e outros sessenta se abstiveram. Não restou dúvida: de fato, embora não na forma, o debate e o voto foram uma violenta manifestação de desconfiança em Mr. Chamberlain e em seu governo.
Encerrado o debate, ele pediu-me que fosse à sua sala. Percebi de imediato que levara muito a sério o sentimento da câmara a seu respeito. Ele achava que não poderia continuar. Deveria haver um governo de coalizão nacional. Um partido sozinho não poderia arcar com aquele fardo. Alguém deveria compor um governo em que entrassem todos os partidos, ou não seria possível continuar. Estimulado pelo antagonismo dos debates e seguro do meu histórico em relação às questões em jogo, eu estava fortemente disposto a lutar. “O debate foi ruim, mas o senhor tem uma boa maioria. Não se deixe abater. Estamos melhor na questão da Noruega do que foi possível transmitir à câmara. Reforce o governo com gente de todas as áreas e vamos em frente até que nossa maioria nos abandone.” Foi esse o sentido de minha fala. Mas Chamberlain não se deixou convencer nem consolar e eu me despedi dele por volta da meia-noite, sentindo que ele persistiria na decisão de se sacrificar, se não houvesse outra forma, em vez de tentar levar a guerra adiante com um governo unipartidário.
Não lembro exatamente como as coisas aconteceram durante a manhã de 9 de maio, mas houve o seguinte. Sir Kingsley Wood era muito íntimo do primeiro-ministro, como colega e amigo. Os dois trabalharam juntos por muito tempo, em completa confiança. Por intermédio dele, fiquei sabendo que Mr. Chamberlain havia-se decidido pela formação de um governo de coalizão nacional e, se não pudesse chefiá-lo, cederia o lugar a qualquer um de sua confiança que fosse capaz de fazê-lo. Assim, pela tarde, dei-me conta de que eu bem poderia ser chamado a liderar. A perspectiva não me entusiasmou nem me alarmou. Achei que seria de longe o melhor plano. Deixei que as coisas seguissem seu curso. À tarde, o primeiro-ministro convocou-me a Downing Street, onde encontrei Lord Halifax e, depois de uma conversa sobre a situação em geral, fomos informados de que Mr. Attlee e Mr. Greenwood chegariam em poucos minutos para uma conferência.
Quando chegaram, sentamo-nos os três ministros de um lado da mesa, e os líderes da oposição, do outro. Mr. Chamberlain declarou a suprema necessidade de um governo de coalizão nacional e procurou verificar se o partido trabalhista serviria com ele. A convenção do partido estava reunida em Bournemouth. A conversa foi extremamente polida, mas ficou claro que os líderes trabalhistas não se comprometeriam sem consultar o partido e, sem muito disfarce, denotaram achar que a resposta seria desfavorável. Em seguida, retiraram-se. Fazia uma tarde clara e ensolarada. Lord Halifax e eu sentamo-nos por algum tempo num banco do jardim do n° 10 e falamos de generalidades. Voltei então para o almirantado e estive muito ocupado durante o resto da tarde e grande parte da noite.
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Rompeu a manhã de 10 de maio e com ela vieram notícias aterradoras. As pastas de telegramas chegavam sem parar do almirantado, do Ministério da Guerra e do Foreign Office. Os alemães haviam desferido o tão esperado golpe. A Holanda e a Bélgica foram invadidas. Suas fronteiras tinham sido cruzadas em numerosos pontos. O movimento geral do exército alemão de invasão dos Países Baixos e da França havia começado.
Por volta das dez horas, Sir Kingsley Wood veio ver-me, logo depois de deixar o primeiro-ministro. Disse-me que Mr. Chamberlain inclinava-se a pensar que a grande batalha que desabava sobre nós tornava necessário que ele permanecesse em seu posto. Kingsley Wood informou ter-lhe dito que, ao contrário, a nova crise obrigava ainda mais a que tivéssemos um governo de coalizão, única forma de enfrentá-la, e acrescentou que Mr. Chamberlain havia aceito essa opinião. Às 11 horas, fui novamente chamado a Downing Street pelo primeiro-ministro. Ali, mais uma vez, encontrei Lord Halifax. Sentamo-nos à mesa em frente a Mr. Chamberlain. Ele nos disse ter concluído estar fora de seu alcance formar um governo de coalizão nacional. A resposta recebida dos líderes trabalhistas não deixara dúvida a respeito. A questão, portanto, era saber quem ele deveria recomendar que o rei convocasse, uma vez aceita sua própria renúncia. Sua postura foi impassível, serena e, aparentemente, muito isenta no aspecto pessoal do assunto. Fitou-nos a ambos do outro lado da mesa.
Tive muitas conversas importantes em minha vida pública e esta foi, certamente, a mais importante. Em geral, eu falava muito, mas, nessa ocasião, permaneci em silêncio. Evidentemente, Mr. Chamberlain pensava na cena tumultuada de duas noites antes, na Câmara dos Comuns, quando pareci envolver-me numa controvérsia tão acalorada com o partido trabalhista. Embora isso houvesse ocorrido em seu respaldo e defesa, ele achava que poderia ser um obstáculo a que os trabalhistas aceitassem meu nome naquela conjuntura. Não me lembro das palavras exatas que ele usou, mas a implicação foi essa. Seu biógrafo, Mr. Feiling, afirma em termos decisivos que ele preferia Lord Halifax. Como fiquei em silêncio, seguiu-se uma pausa muito longa. Certamente pareceu mais longa do que os dois minutos que se observam nas comemorações do Dia do Armistício. E então, por fim, Halifax falou. Disse considerar que sua posição como par do reino, fora da Câmara dos Comuns, tornaria difícil para ele cumprir os deveres de primeiro-ministro numa guerra como aquela. Ele seria responsável por tudo, mas sem o poder de conduzir a assembleia de cuja confiança dependia a vida de qualquer governo. Halifax falou alguns minutos nesse sentido e, quando terminou, estava claro que o dever recairia sobre mim — na verdade, já caíra. Então falei pela primeira vez. Disse que não faria nenhum contato com qualquer dos partidos da oposição até receber do rei a incumbência de formar um governo. Com isso se encerrou a momentosa conversa e voltamos a nosso tom afável e informal de homens que haviam trabalhado juntos durante anos e cujas vidas, dentro e fora do governo, tinham se passado no caráter amistoso da política inglesa. Voltei então para o almirantado, onde, como se pode imaginar, muito me esperava.
Os ministros holandeses estavam em minha sala. Desfigurados, abatidos e com horror nos olhos, tinham acabado de voar de Amsterdã. Seu país fora atacado sem o menor pretexto ou aviso. A avalanche de fogo e aço havia rolado pelas fronteiras e, quando houve resistência e os guardas holandeses de fronteira abriram fogo, caiu do ar um ataque esmagador. O país inteiro achava-se em estado de desvairada confusão. O esquema defensivo preparado havia tempos fora posto em operação: os diques tinham sido abertos, e a água se espalhara por toda parte. Mas os alemães já haviam cruzado as linhas mais externas e agora desciam pelas margens do Reno e passavam as defesas internas de Gravelines. Estavam ameaçando a estrada sobre a barragem que circundava o Zuider Zee. Seria possível fazermos alguma coisa para impedir isso? Por sorte, tínhamos uma flotilha não longe dali que recebeu ordens imediatas de varrer a estrada a tiros e cobrar o mais alto preço possível do enxame de invasores. A rainha ainda estava na Holanda, mas não parecia possível permanecer por muito tempo.
Em consequência dessas discussões, grande número de ordens foi despachado pelo almirantado a todos os navios nas imediações, tendo-se estabelecido um estreito contato com a Real Marinha Holandesa. Mesmo tendo em mente a recente tomada da Noruega e da Dinamarca, os ministros holandeses pareciam incapazes de entender como a grande nação alemã, que até a noite anterior só professara amizade, podia, subitamente, ter feito aquela investida assustadora e brutal. Nesses e noutros assuntos, passaram-se uma ou duas horas. Uma enxurrada de telegramas chegava de todas as fronteiras afetadas pelo maciço avanço dos exércitos alemães. O velho Plano Schlieffen, atualizado com sua extensão holandesa, parecia já estar em plena execução. Em 1914, a envolvente ala direita da invasão alemã tinha varrido a Bélgica, mas evitara entrar na Holanda. Naquela época, sabia-se muito bem que, se a guerra tivesse sido adiada por três ou quatro anos, o grupo de exércitos extra estaria disponível e os terminais ferroviários e as linhas de comunicação teriam sido adaptados para um movimento através da Holanda. Desta vez, o famoso movimento fora lançado com todas essas facilidades e com todas as características de surpresa e traição. Mas outros acontecimentos nos aguardavam. O impacto decisivo do inimigo não seria um movimento de flanco, mas um rompimento frontal na frente principal. Isso, nenhum de nós ou dos franceses em posições de comando havia previsto. No começo daquele ano, numa entrevista, eu havia advertido esses países neutros sobre o destino que os esperava e que se evidenciava pelo dispositivo das tropas e pela evolução das estradas e ferrovias, bem como pelos planos alemães capturados. Minhas palavras foram muito malrecebidas.
No estrondo devastador dessa vasta batalha, as conversas serenas que tivéramos em Downing Street sumiram ou recuaram para um canto da mente. Mas lembro-me de ter sido informado de que Mr. Chamberlain fora ou estava indo ver o rei, o que, naturalmente, era de se esperar. Depois, chegou uma mensagem convocando-me ao palácio às 18 horas. Bastam dois minutos para ir do almirantado ao palácio pelo Mall. Embora eu suponha que os jornais vespertinos viessem repletos das notícias aterradoras que chegavam do continente, nada aparecera sobre a crise ministerial. O público não tivera tempo de absorver o que acontecia no exterior ou no país e não havia multidão perto dos portões do palácio.
Fui levado imediatamente ao rei. Sua Majestade recebeu-me com extrema gentileza e indicou-me uma cadeira. Fitou-me alguns instantes com olhar perscrutador e brincalhão, depois disse: “Suponho que o senhor não saiba por que o chamei.” No mesmo tom espirituoso dele, eu respondi: “Senhor, não faço a menor ideia.” Ele riu e disse: “Quero pedir-lhe que forme um governo.” Disse-lhe que certamente o faria.
O rei não fizera qualquer estipulação sobre o governo ser de coalizão nacional e considerei que minha comissão não dependia desse aspecto em termos formais. Contudo, em vista do que acontecera e das condições que tinham levado à renúncia de Mr. Chamberlain, um governo de caráter nacional era inerente à situação. Se eu constatasse ser impossível chegar a um acordo com os partidos de oposição, não estaria constitucionalmente impedido de tentar formar o governo mais forte possível, com todos os que se dispusessem a lutar pelo país na hora de perigo, desde que esse governo pudesse ter maioria na Câmara dos Comuns. Disse ao rei que chamaria imediatamente os líderes dos partidos Trabalhista e Liberal, que pretendia criar um Gabinete de Guerra composto de cinco ou seis ministros, e que esperava dar-lhe pelo menos cinco nomes antes da meia-noite. Com isso, pedi permissão e voltei para o almirantado.
Entre 19 horas e vinte horas, a meu pedido, Mr. Attlee veio ver-me. Trouxe consigo Mr. Greenwood. Informei-o da autorização que recebera para formar um governo e perguntei se o Partido Trabalhista participaria. Mr. Attlee respondeu que sim. Propus que eles tivessem bem mais de um terço dos cargos, com dois lugares no Gabinete de Guerra de cinco, talvez seis, e pedi a Mr. Attlee que me desse uma lista de nomes, para podermos discutir ministérios. Citei Mr. Ernest Bevin, Mr. Alexander, Mr. Morrison e Mr. Dalton como homens cujos serviços eram imediatamente necessários em altos cargos. Naturalmente, eu conhecia Attlee e Greenwood de longa data na Câmara dos Comuns. Durante os dez anos anteriores à eclosão da guerra, em minha posição mais ou menos independente, eu tivera muito mais choques com os governos conservadores e de coalizão do que com a oposição trabalhista e liberal. Tivemos uma conversa agradável por uns minutos e eles se foram, a fim de relatar os acontecimentos por telefone aos seus amigos e correligionários em Bournemouth, com os quais, é claro, haviam estado no mais estreito contato durante as 48 horas anteriores.
Convidei Mr. Chamberlain a liderar a Câmara dos Comuns como Lord Presidente do Conselho e ele respondeu, por telefone, que aceitava.2 Declarou que falaria no rádio às 21 horas daquela noite participando que havia renunciado e instando a todos que apoiassem e ajudassem seu sucessor. E o fez em termos magnânimos. Pedi a Lord Halifax que entrasse no Gabinete de Guerra, permanecendo ministro do Exterior. Por volta das 22 horas, enviei ao rei uma lista com cinco nomes, como havia prometido. A nomeação dos ministros das três forças era de urgência vital. Já decidira quem seriam. Mr. Eden iria para o Ministério da Guerra, Mr. Alexander viria para o almirantado, e Sir Archibald Sinclair, líder do Partido Liberal, seria o ministro da Aviação. Ao mesmo tempo, assumi o cargo de ministro da Defesa, sem tentar definir, no entanto, seu escopo e seus poderes.
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Assim, pois, na noite de 10 de maio, no começo dessa portentosa batalha, assumi o poder principal do estado, que exerci, a partir de então, em medida cada vez maior, por cinco anos e três meses de guerra mundial. Ao final desse período, quando todos os nossos inimigos haviam declarado sua rendição incondicional, ou estavam prestes a fazê-lo, fui prontamente dispensado pelo eleitorado inglês de qualquer gestão adicional de seus negócios.
Durante aqueles últimos e tumultuados dias de crise política, meu pulso não se havia acelerado em momento algum. Tudo aceitei conforme veio. Mas não posso esconder do leitor deste relato veraz que, ao me deitar, por volta das três horas da manhã, tive consciência de um profundo sentimento de alívio. Finalmente, eu tinha a autoridade para dirigir a cena inteira. Foi como se caminhasse com o destino e toda minha vida pregressa tivesse sido apenas o preparo para essa hora e essa provação. Dez anos no ostracismo político haviam me libertado dos costumeiros antagonismos partidários. Minhas advertências nos seis anos anteriores tinham sido tão numerosas e detalhadas, e confirmavam-se agora tão terrivelmente, que ninguém me podia contradizer. Eu não poderia ser censurado por travar a guerra nem por estar despreparado para ela. Acreditava ter um sólido conhecimento daquilo tudo e tinha certeza de não fracassar. Portanto, apesar de impaciente pelo amanhecer, dormi profundamente e não precisei de sonhos animadores. Fatos são melhores que sonhos.