Lucy desceu a Oxford Street, parando ocasionalmente para olhar as vitrines das lojas. Ela iria se encontrar com Alice próximo ao Palladium Theatre, e de lá iriam a um restaurante.
Ela estava ansiosa por ver sua amiga novamente. Desde que Alice mudou para o norte da Inglaterra, elas não conseguiam se ver com muita frequência, então certamente teriam muito sobre o que conversar.
Lucy olhou para o seu relógio, já estava ficando tarde. Ela estava perdendo muito tempo babando sobre as vitrines das lojas. Ela apertou os passos, mas, ao virar a esquina na Agyle Street, ela colidiu com alguém no seu caminho.
— Desculp... — Lucy não terminou a frase quando viu seu ex-marido olhando para ela.
— Então nos encontramos de novo — Ben agarrou seu braço, — o que você tem aprontado? — Ele demandou.
— Tire suas mãos de mim — Lucy gritou, retomando sua compostura —, não é da sua conta o que eu tenho feito.
Ben ainda segurava seu braço. — Não é? Lembro-me de ter te pago um dinheiro quando nos divorciamos. Gostaria de saber como você gastou.
— Você não me deu mais do que eu deveria receber! — Lucy puxou seu braço das garras dele. — Você me tratou como lixo quando éramos casados. Acho que você ainda saiu numa boa — ela tentou parecer mais confidente do que realmente se sentia. — Estou pagando pelos estudos do Terry, se você quer saber. Você nunca se importou com ele!
Ben a empurrou para frente da porta de uma loja. — Você se acha esperta, não acha? Mas eu sei tudo sobre você e suas preciosas amigas começando essa agência de encontro — ele fungou, — já começou a ganhar dinheiro?
— O que isso tem a ver com você? — Lucy tentou se livrar dele, mas seu corpo largo bloqueava seu caminho. Ele ganhou mais peso desde a última vez que o viu. Ela também reparou que ele estava malvestido. O casaco sujo que usava já viu dias melhores, isso não era bem do feitio de Ben. Ele sempre insistia que suas roupas fossem lavadas e passadas com perfeição. Ela se lembrava das consequências se não fossem. — Estamos divorciados, eu cuido da minha própria vida agora. — Lucy olhou atrás dela, com esperança de escapar para dentro da loja, mas o lugar estava escuro. A loja já estava fechada.
Ben aproximou seu rosto ao dela. — Achei que um pouco desse dinheiro pudesse vir em minha direção. Não tenho mais um trabalho, graças a mulheres como você. — Ele limpou o nariz com a manga da sua camisa. — Elas disseram que eu as estava molestando, mas a verdade é que elas estavam implorando por isso.
Lucy ficou em silêncio. O bafo dele cheirava a álcool. Estava pior do que ela lembrava. — Saia do meu caminho! — Ela tentou passar por ele, mas ele era muito forte e a jogou contra a porta da loja novamente. Ela bateu a cabeça com força no batente e, por alguns minutos, achou que fosse cair no chão. Mas, de alguma forma, ela conseguiu se manter de pé. Ela sabia que uma vez no chão, não haveria chance alguma dela conseguir se levantar.
— Não faça isso. Já fomos casados uma vez. Temos que cuidar um do outro.
— E quando foi que você cuidou de mim? — Lucy gritou. Ela olhou por sobre os ombros dele, na esperança que alguém pudesse ajudá-la. Mas todo mundo continuava passando, ninguém queria se envolver. — Você me batia. O que te faz pensar que eu cuidaria de você?
— Cadastre-me na sua agência. Encontre-me uma mulher, uma mulher rica. Você poderia fazer isso para mim.
— Nunca! — Lucy rugiu. Ela estava tentando com toda força mostrá-lo que não estava com medo dele, mas no fundo ela estava aterrorizada.
Seu rosto se contorceu e seus olhos ficaram selvagens. Ele levantou a mão para bater nela. — Como ousa me responder, sua vadia!
Lucy fechou os olhos e esperou pelo inevitável. Isso já aconteceu tantas vezes antes que ela já sabia como era. Primeiro ele a bateria até que ela caísse no chão e depois ele começaria a chutá-la. Mas, para sua surpresa, nada aconteceu.
— Mas que diabos? — Ben soltou.
Lucy abriu os olhos e viu uma mulher agarrando o braço dele. — Saia daí, Lucy!
Lucy não precisou ouvir duas vezes. Ela correu da porta e agarrou o outro braço de Ben. — Graças a Deus você apareceu, Alice. Achei que ele iria me matar dessa vez.
— Soltem-me, suas vadias, — Ben gritou enquanto tentava se livrar.
Nesse momento dois policiais que estavam na estação de metrô Oxford Circus correram em direção ao barulho. — O que está acontecendo aqui? — Um deles perguntou enquanto se aproximava.
— Esse homem estava abordando minha amiga, — disse Alice, ainda lutando com o braço de Ben. — Ele a imobilizou contra aquela porta.
O outro policial pegou seu bloco de anotação. — Tubo bem, nome? — Ele perguntou, olhando para Ben.
— Essas mulheres estavam me incomodando! — Ben puxou seu braço das garras de Lucy. — Estava na minha quando ela começou me pedir dinheiro.
— Bastardo mentiroso! — Lucy gritou na direção dele. Ela voltou-se para o policial. — Ele é meu ex-marido, Ben Anderson — ela explicou como eles se esbarraram na esquina. — Ben estava tentando me intimidar porque eu não queria dar nenhum dinheiro para ele.
— Entendo, — disse o policial, balançando com a cabeça. — E você? Você ouviu tudo que estava acontecendo? — Ele perguntou Alice.
— Cheguei bem no momento e o ouvi chamá-la de vadia, depois levantar a mão para bater nela. Foi quando eu o agarrei e tentei empurrá-lo — Alice olhou para Ben. — Ele é um homem que não presta e deveria ser preso.
— Cabe à justiça decidir, senhorita, — respondeu o outro policial calmamente. — Vou chamar um carro para levá-los para a delegacia. Vocês podem resolver tudo lá.
— Mas Alice e eu vamos a um restaurante, — Lucy argumentou. — Não nos vemos há muito tempo. Nossa noite será arruinada. Deus sabe quanto tempo teremos que passar na delegacia.
— Se você preferir não prestar queixas, podemos deixar como está, — o policial disse, fechando o bloco de anotações.
Ben sorriu para Lucy triunfantemente. — Acredito que não vamos prestar queixas, então. Você não conseguiria assinar os papéis, não é?
— Entretanto, — acrescentou o policial, cutucando Ben no peito com o dedo indicador, — isso não quer dizer que você pode sair por aí intimidando mulheres nas ruas. Já tenho seu nome. Portanto, se você se envolver em mais alguma confusão, eu vou me lembrar de você. Está me entendendo?
Ben arrastou os pés. — Sim, — murmurou. Ele franziu as sobrancelhas para Lucy antes de ir em direção à Oxford Street como um rato que era.
Após deixar os policiais, Alice e Lucy foram direto para o restaurante. Lucy ainda estava tremendo quando se sentou. — Quando o divórcio saiu, achei que ficaria livre daquele monstro para sempre.
Alice sugeriu que ambas precisavam de uma bebida forte para acalmar os nervos. — Ele tem te seguido? — Ela perguntou depois de fazer o pedido de dois gins com tônicas grandes.
— Não, eu acho que não. — Lucy pausou e pensou mais um pouco. Será que ele a estava seguindo? Se ele estivesse, então ele saberia onde ela estava morando. Seu estômago revirou quando ela imaginou que ele pudesse estar vigiando cada passo seu. Mas seu lado mais racional tomou conta. Se ele soubesse onde ela estava morando, ele a teria achado muito tempo atrás. Ele provavelmente teria invadido seu flat. — Não, tenho certeza que não. Acredito que foi totalmente por acaso que esbarramos um no outro. Ainda assim, ele sabia que eu estava envolvida com a Divorciados.biz. — Ela deu de ombro. — Mas acredito que ele possa ter ouvido sobre isso por aí. Fiquei aliviada quando você apareceu, ninguém parou para me ajudar.
— Bem, você me conhece. Sempre acabo ajudando os necessitados. — Alice sorriu. — Mas, de verdade, você precisa tomar cuidado. Se você o vir perto do seu flat, chame a polícia imediatamente.
Apesar do começo de noite ruim, Lucy se divertiu em encontrar sua velha amiga. Elas tinham tanto sobre o que conversar. Alice não mudou nada. Ela ainda tinha a mesma personalidade animada que tinha quando trabalharam juntas anos atrás. Também parecia que ela havia mantido seu amor por roupas maravilhosas. Hoje ela estava usando um vestido de coquetel azul, combinando com os sapatos. Ela também estava carregando a bolsa mais maravilhosa da mesma cor. Talvez ela tivesse tudo sob medida. Ela tinha um ótimo trabalho em Newcastle.
— A sua agência seria boa para mim? — Alice interrompeu os pensamentos de Lucy. — Não sei muita coisa sobre agências de encontros. Sempre imaginei que elas fossem algum tipo de viveiro de luxúria.
— Suponho que algumas delas sejam, mas queremos que a nossa seja algo especial. — Lucy pausou. — Aquela praga do meu ex-marido queria que eu o inscrevesse de graça e o encontrasse uma mulher rica. — Ela olhou para a mesa.
— Esqueça aquele homem — Alice podia ver que só de pensar naquele homem horrível estava perturbando Lucy.
— Quando olho para trás, não sei o que vi nele. Mas, ele deve ter tido alguma coisa em seu favor, caso contrário, nunca teria me casado com ele.
Ela lembrou dos dias que antecederam ao casamento. Ben sempre se passava como uma pessoa gentil. Foi tudo atuação? Ou ela estava tão louca por ele que não conseguia ver além da aparência e sorriso desarmante?
— Graças a Deus consegui manter Terry em segurança. Se Ben tivesse encostado um dedo nele...
— Mas ele não tocou, Lucy. — Alice colocou a mão sobre o braço da amiga. — Você cuidou disso. Só espero que Terry saiba do que você passou para mantê-lo em segurança.
— Ele já sabe. — Lucy pegou um lenço da sua bolsa. — Após o divórcio ele disse que ouviu seu pai e eu brigando uma noite, muito tempo atrás. Ele tentou voltar a dormir, mas depois me ouviu gritar de dor. Imagino que ele deve ter descido as escadas para ver o que estava acontecendo. Mas, quando viu seu pai me bater na cabeça, ele correu de volta para o seu quarto e se escondeu debaixo das cobertas — ela parou e limpou as lágrimas que caiam dos seus olhos. — Coitado, deve ter ficado aterrorizado. Ben é um intimidador. Isso é o suficiente para assustar qualquer um, imagine um garotinho. Depois disso, Terry fechou os ouvidos para tudo que ouvia no andar debaixo. Quem pode culpá-lo? — Lucy respirou fundo. — Você se lembra que ele ficou bastante retraído enquanto crescia.
Alice acenou que sim com a cabeça. — Sim, me lembro. Você estava bastante preocupada com ele.
— Pensei que ele estava ficando autista ou algo do tipo, — Lucy continuou. — Entretanto, ele parece ter se envolvido num casulo para tentar esquecer tudo que estava acontecendo em sua volta. Depois que ele foi para a universidade e eu me divorciei, Terry mudou completamente. Ele se tornou muito mais extrovertido. Acho que é porque ele sabia que nós dois enfim estávamos seguros.
— Você deveria ter deixado esse bruto anos atrás, — disse Alice. — Ah eu sei que você queria esperar até que Terry fosse mais velho, mas pelo amor de Deus, Lucy, Ben poderia ter matado você... e Terry.
— Eu percebo isso agora. Mas meus pais se divorciaram quando eu era bastante jovem. Acho que eles simplesmente deixaram de amar um ao outro. Mas eu via meu pai com frequência durante os anos e eu o amava. — Lucy limpou uma lágrima que caiu. — Eu me lembro de desejar que eles não tivessem se separado. Por que eu não poderia ser como todas as outras crianças e ter meus pais morando juntos? Eu sempre me sentia a estranha na escola. Pensei que estivesse fazendo a coisa certa pelo Terry. Não queria que ele se sentisse diferente das outras crianças. Mas...
— Vamos pedir outra bebida, — Alice cortou. Ela sentiu que deveriam mudar de tópico. — Vamos falar sobre sua nova agência e o que ela pode fazer por mim e por você. Você poderia encontrar o homem dos seus sonhos. Afinal, você tem todos aqueles homens deliciosos na ponta dos dedos. — Ela fez sinal para o garçom que estava próximo. — Vamos tomar um brandy com nosso café?
— Tenho certeza de que você não tem poucos amigos homens, — riu Lucy. — Com essa aparência e silhueta, você é linda. Metade de Newcastle deve estar atrás de você. Quanto a mim, não quero me apressar. Quero esperar minha hora.
— Mas nenhum deles faz meu tipo, querida. — Alice sorriu. — Não quero outro fracassado como Graham. Me cansei dos hábitos de jogatinas dele. Ele acabou com o dinheiro dele e depois foi atrás do meu. Enfim, acho que pode ser divertido entrar para a sua agência.
Ao final da noite, Alice concordou em se inscrever na Divorciados.biz. — Vou te passar um cheque agora e deixar que preencha o formulário para mim. Você sabe mais sobre mim que eu mesma.
Do lado de fora do restaurante, Lucy decidiu compartilhar um taxi com Alice. Ben poderia ainda estar na área e ela não estava a fim de esbarrar com ele novamente.
— Talvez eu volte a Londres mês que vem. Caso venha, eu te ligo para que possamos repetir a dose, — disse Alice quando chegaram no hotel dela.
Lucy sentou no taxi e observou Alice subir as escadas e desaparecer para dentro do hotel antes de pedir para o motorista seguir em frente. Por um momento ela desejou poder voltar o tempo para a época em que ela e Alice trabalharam juntas. Mas depois ela se lembrou que tinha acabado de se casar com Ben e de forma alguma ela o queria de volta em sua vida. Mesmo assim, tinha sido bom ver sua amiga e ela estava ansiosa para encontrá-la de novo. Se ao menos ela não tivesse encontrado com Ben. Ela nunca o havia visto tão mal. Ele estava realmente numa fria. Ótimo! Pelo menos ele estava tendo o que merecia. Mas Alice estava certa sobre uma coisa, ela iria precisar se manter vigilante de agora em diante. Ela certamente não iria querer esbarrar nele novamente.