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Às vezes, quando fico ansiosa, centro minha atenção em atividades como revelar fotos, tocar violino ou escrever na parede de meu quarto. Assim, consigo me acalmar.

Mas nem sempre.

Tipo hoje. É uma coisa atrás da outra. Até agora já tive que aguentar (não necessariamente nessa ordem cronológica) as seguintes atrocidades:

1. Meu despertador não tocou. Alguma coisa aconteceu com ele no meio da noite. Daí que, de manhã, precisei tomar banho às pressas, o que significa que não tive tempo de depilar as axilas. Isso me irritou mais do que deveria.

2. Esqueci meu relatório da aula de Literatura em casa. Este relatório valeria, tipo, metade da nota total. Isso não poderia ter acontecido com algum simples rascunho de tarefa para Estudos Globais? Não. Claro que não. Tem que acontecer com um relatório essencial de Literatura, um caso de vida ou morte.

3. Passei por um episódio constrangedor na aula de Geometria. Achei que sabia a resposta de uma questão hipercomplicada, e o sr. Wilson havia dito que, se alguém desse a resposta correta, ganharia pontos extras. Ninguém se dispôs a responder, pois era difícil demais. Então, levantei a mão e dei a resposta errada. Mas o pior não foi isso. O constrangedor foi quando eu tive um acesso de falsa autoconfiança por ter sido a única a tentar responder a questão hipercomplicada e, então, viajei total na resposta à questão seguinte, que era a mais fácil do mundo. Além de eu ter respondido errado, minha resposta era tão nada a ver que começaram a rir de mim.

4. Durante o almoço, sentei num pedaço de presunto.

5. Durante a prova de Química, acabou a tinta da minha caneta, e eu não tinha uma caneta reserva na bolsa. Não quis perguntar ao Nash se ele tinha uma para emprestar, pois eu teria que me virar, e isso passaria a impressão de que eu estava colando. Então, por meio de gestos, tentei perguntar à garota ao lado se ela tinha uma para emprestar. Foi quando a sra. Hunter me viu e achou que eu estava colando. Ela veio até minha carteira, e eu tentei dizer a ela que só estava pedindo uma caneta emprestada. Mas ela não me deu ouvidos. Disse: “Podemos falar sobre isso depois da aula”, e tomou minha prova.

 

Eu precisava ir até a sra. Hunter depois da aula e dizer o que tinha acontecido, mas, quando tocou o sinal, tudo o que eu queria era ir embora. Nem mesmo olhei na cara dela ao caminhar diretamente para a porta de saída. Claro que foi uma estupidez; agora ela provavelmente está achando que eu estava mesmo colando e que, por isso, fui embora tão rápido.

Mas deixa pra lá.

Sobrevivi, e agora estou na casa do Nash. Estou curtindo cada vez mais ficar aqui. Sinto-me muito à vontade, quase como se fosse uma extensão de minha casa. Temos uma rotina em que vou à casa dele todas as semanas para fazer nosso relatório do laboratório. Mas, hoje, até isso está longe de ser perfeito; está abafado demais aqui dentro.

— Posso abrir a janela só um tiquinho? — pergunto.

— OK — diz Nash.

— OK?

— Sim.

Droga! Ele deve estar mesmo sentindo pena de mim. Contei a ele sobre o dia horrível que tive. É tão fácil conversar com ele. Às vezes, é mais fácil conversar com Nash do que com Sterling. Bem, é claro que posso dizer o que quiser a Sterling, mas ela normalmente está preocupada com alguma coisa ou então está fazendo cinco outras coisas enquanto falo com ela. Já, com o Nash, posso falar que ele realmente está me ouvindo.

Nash abre a janela. O quarto fica muito melhor com a entrada do ar fresco. Fico me perguntando por que ele não faz isso sempre.

Também me pergunto por que sempre tem meias espalhadas pelo chão.

— Qual é a dificuldade que os caras têm com as meias?

— Você quer dizer: de elas ficarem espalhadas pelo quarto?

— É. Por que vocês têm dificuldade com isso?

— Não sei. — Nash dá uma olhada no chão, onde já vi duas meias perdidas. Não são nem do mesmo par. — Nunca pensei nisso.

— Mas seu cesto de roupas está bem ali — informo a ele, mostrando o closet com um gesto das mãos, caso ele ainda não saiba.

— A-hã. O chão está mais próximo.

— Uau.

— Nós somos meio que uma espécie completamente diferente, entende?

— Nunca imaginei que isso pudesse ser tão sério.

— Ah — diz ele —, isso é bem sério.

Por um momento, me pego imaginando como Nash seria se deixasse de ser tão estabanado e se fosse um pouco mais estiloso. E se mudasse de atitude. Deveria simplesmente relaxar e ser mais amistoso. OK, ele é legal comigo e sempre me ajuda no laboratório, mas vendo-o interagir com outras pessoas, percebo que ele certamente poderia aproveitar algumas dicas de sociabilidade.

Num canto, no chão do quarto, vejo várias peças e fios de computador espalhados.

— O que é isso tudo aqui? — pergunto.

— É para o Dorkbot.

— Você acaba de inventar isso?

— Não! É um grupo de robótica.

— Sério?

— É. Nós fazemos uns lances estranhos com eletricidade. E todo ano tem uma competição em que os melhores projetos são apresentados. Ano passado teve um cara que inventou um modo de tocar música como se fosse um video game.

— E como?

— Você precisaria estar lá pra ver. Ele tinha umas bolhas cheias de música... é difícil de explicar. Foi demais!

— Parece legal.

— E foi mesmo. Ei, se eu passar para a fase final desta vez, você poderia vir comigo!

— Isso é animal!

— Só não vá me chamar de animal lá, na hora H.

— Combinado. Então, qual é seu projeto?

— Ah, é cedo demais para saber. Ainda tem diferentes caminhos que eu posso escolher.

— Mal posso esperar para ver o que você está fazendo.

— Mesmo?

— Claro!

Continuamos fazendo nosso relatório, durante um tempo, ouvindo Arcade Fire e comendo twizzlers. Nash diz:

— Posso perguntar uma coisa?

— Fala. — Será que ele leu meus pensamentos sobre a necessidade urgente de ele melhorar o seu look?

— Na verdade, é meio que tipo... preciso de um conselho seu. Sobre uma coisa.

— OK. — Sim, você precisa, mesmo, de um corte de cabelo completamente novo e, sim, posso dizer exatamente o novo visual de que você precisa.

— É sobre... — Nash balança a perna sem parar. Não dá pra acreditar que ele está ansioso em relação a isso. Quero dizer, um conselho não é grande coisa. — Tem uma pessoa que eu acho que... estou gostando.

— Ah. — Esta era a última coisa que eu esperava que ele me contasse.

— Então, bem... Mas não sou, exatamente, um cara extrovertido.

Este é o eufemismo do século. Uma vez vi Nash conversando com uma menina que se senta a meu lado, na sala, sobre um assunto não relacionado à escola. E isso só aconteceu porque a perna da cadeira dela estava em cima da alça da mochila dele. Ele é sempre muito tímido, a não ser na situação em que está ajudando alguém. É por isso que ainda não consigo entender como ele juntou coragem para propor formar dupla comigo, para os relatórios do laboratório. Será que isso tem alguma relação ainda que distante com a escola? Nash não é do tipo ansioso.

— É, isso é visível — admito.

Ele assente com a cabeça.

— Então você quer que eu... te diga o que fazer?

— Ah... Eu simplesmente não sei o que faço.

— Ela sabe que você gosta dela?

— Não.

— Como é que você sabe? Talvez ela já tenha sentido a sua vibe.

— Acho que não.

— Quem é ela?

— Não posso dizer.

— Por que não?

— Simplesmente não posso.

— Então eu a conheço.

— Sem comentários.

Foi quando me toquei. Este era o modo que Nash tinha encontrado para dizer que gostava de mim? Ele é tímido demais para me dizer diretamente, então espera que eu perceba isso por meio de uma tentativa dessas, tão mal disfarçada?

— Então... você é tímido demais para dizer isso na frente dela, é isso? — pergunto.

— Acho que sim.

— Bem, existem outras maneiras de contar isso a ela, sem dizer isso.

— Você quer dizer... tipo, escrevendo uma carta?

— Exatamente.

— Isso não cheira a coisa de 8º ano?

— É por isso mesmo que funciona. É meigo, mas de um jeito meio retrô. Ela vai adorar.

— Sério?

— Com certeza. Quero dizer... depende do que você vai escrever.

— O que você sugere?

Eu é que não vou ajudá-lo a escrever uma carta de amor para mim mesma. Sem chance. Seria um tanto quanto estranho.

— Hum... bem, simplesmente seja honesto em relação ao que você sente. Diga a ela que você gosta dela, coisa e tal.

— Hum. — Nash pensa a respeito. — Acho que você não quer me ajudar a escrever.

— Acho que isso você tem de fazer sozinho.

Nash concorda com a cabeça, ainda pensativo.

— É, acho que você tem razão.

Voltamos à nossa tarefa de casa, mas agora não consigo me concentrar. E se ele estiver gostando de mim? O que eu vou fazer? Não vou conseguir sentir a mesma coisa por ele, de jeito nenhum. Ele não faz mesmo meu tipo. Não faço ideia de a quem ele possa fazer o tipo. Mas sei, com certeza, que não é o meu.