Quando comecei a achar que Nash estava se livrando de seu estado de aflição e perturbação, a pior coisa que se podia imaginar lhe conteceu. Rachel começou a namorar oficialmente outro cara. E este cara é Edwin.
— Espera aí, Edwin, aquele jogador de futebol monumental? — pergunto, quando Nash me fala da novidade.
— O primeiro e único — Nash resmunga.
— Isso está absurdamente errado.
— Como se eu não soubesse...
Pego uma carta, antes que ela saia voando. Nash me ensinou a jogar Set, um jogo de lógica com cartas, que é o máximo. Temos passado bastante tempo juntos desde que Rachel terminou com Nash, seja jogando, seja fazendo relatórios para o laboratório. Hoje começa oficialmente a primavera, o que geralmente significa que o inverno ainda não se lembra de que o clima já deveria estar mais quente. Ainda assim, faz um calor esquisito lá fora, e o dia está bastante ensolarado. Então, resolvemos jogar Set lá fora, no píer.
— Como é que você descobriu? — pergunto.
— Darius me contou quando o encontrei no Shake Shack.
— Darius? Que interesse ele tem nisso tudo?
— Éramos amigos, até que ele começou a agir de modo esquisito comigo, esqueceu?
Tinha esquecido completamente disso. Nash está competindo na Olimpíada de Matemática e Darius estava na mesma equipe, até que resolveu desistir. Ouvi dizer que ele tentou voltar ao grupo quando saiu de sua fase rebelde, mas o técnico não permitiu que retornasse. Nash e Darius eram bons amigos. Sei bem como essas coisas podem mudar rapidamente.
— É tão estúpido! — reclama Nash. — O que é que eles têm em comum? A Rachel é inteligente demais pra este homem de Neandertal entender o que ela diz.
— Esse namoro não vai dar certo, de jeito nenhum.
— Como é que ela consegue gostar dele? Achei que fosse uma garota de classe.
— É tão triste isso.
— Está tirando onda de mim?
— Não! É triste mesmo. Ela não percebeu a sorte que tinha de ter você.
Nash olha para mim. Esta é uma daquelas situações em que gostaria de retirar o que acabei de dizer. Isso porque o episódio em que ele tentou me beijar ainda paira no ar. Sei que ele gostava de mim e isso está no ar. E, uma vez que estas coisas pairem por aí, você não pode mais voltar atrás.
— Tenho uma ideia — digo. — Vamos jogar “O que você preferia”?
— Agora?
— Por que não? Ou você quer continuar a jogar Set?
Nash atira um pedaço de galho no rio. Ficamos o observando rodopiar. Aperto os olhos para enxergar, por causa da luz do sol que brilha na superfície da água.
— Ou pode se sentir miserável e ficar de mau humor para sempre.
Nash dá um suspiro.
— OK, você começa.
— OK. Você preferia... hum, deixa eu ver... você preferia estar apaixonado por uma pessoa a vida inteira ou ter vários relacionamentos diferentes?
— Isso, por acaso, é pra que eu me sinta melhor?
— Desculpe, posso pensar em outra coisa. OK...
— Não, espera, eu respondo! Eu preferia ter relacionamentos com dezenas de namoradas, de modo que pudesse abandoná-las quando bem entendesse e nunca tivesse que passar por este sofrimento de novo.
— Você não está falando sério.
— Como é que você sabe?
— Porque eu te conheço! Você não é assim.
— Ah, é? E como é que eu sou?
— Você é fiel. Nunca magoaria ninguém. E mesmo que magoasse, isso não faria você se sentir melhor. Você se sentiria péssimo!
Nash sorri.
— É, você me conhece.
— Sua vez agora.
— Você preferia poder mandar no mundo inteiro durante um dia ou poder fazer o que quisesse durante um mês?
— Será que as pessoas realmente vão me dar ouvidos enquanto eu estiver mandando no mundo?
— Vão. Você vai poder fazer as leis que quiser.
— Vou poder fazer com que a paz no mundo vire uma lei?
— Sim.
— Combinado.
A brisa joga meu cabelo para trás. À nossa volta, o rio inteiro está brilhando. Quem dera o “agora” pudesse sempre ser assim.
— Sua vez — diz Nash.
— OK... você preferia ter toda sua coleção de sinos roubada ou ser reprovado em todas as matérias de um trimestre?
— Cara... — Nash pensa a respeito. — Eu prefiro perder os sinos.
— Ah, então tá. Você abriria mão de todos os seus sinos só pra não comprometer sua média de notas no trimestre?
— Eu teria que fazer isso, sim.
— Isso parece coisa de gente sonsa.
— Sonso? Gíria velha, hein?
— Meu estilo é vintage.
— É verdade. Esta é uma das suas melhores qualidades. — Um fluxo de energia circula entre a gente, e tenho a sensação de que não estou sozinha no mundo.
Sentamos no píer durante um tempão. O céu começa a perder a cor, tornando-se laranja. Ficamos assistindo ao céu refletido na água, mudando de forma, mas continuando a ser céu.