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No dia seguinte, fico na expectativa de que Sterling me ligue pedindo desculpas. Mas isso não acontece. Ela não liga, não envia mensagens, torpedos, nada. Desde nossa volta às aulas, Sterling tem andado o tempo todo com algumas garotas do Clube de Francês. São as mesmas de quem tirávamos sarro, dizendo o quanto elas eram esnobes. Acho que Sterling já se esqueceu disso tudo. Ou então não dá importância a essas coisas. Quando passo por ela no corredor, ela vira o rosto. Está furiosa. Sinto-me péssima com isso, mas o que foi que eu fiz? Foi porque arrumei um namorado? Como se ela não quisesse que Chris fosse o namorado dela!

Ah, e mais uma coisa: Sterling tingiu novamente o cabelo, de volta para o castanho.

Tento esquecer isso e me concentrar em outros amigos meus, do mesmo modo que Sterling está fazendo. Hoje, por exemplo, Derek e eu vamos nos encontrar com Evan e Julia depois da aula. A gente já começava a se perguntar quando esse encontro finalmente iria acontecer. Só saímos juntos uma vez, e o encontro foi meio sacal, já que não tenho nada em comum com nenhum dos dois. Nunca temos muito assunto para conversar. Às vezes é uma dificuldade enorme pensar em algo a dizer quando Julia está por perto.

Mas ela é boa no boliche. Então, depois da aula, nós quatro vamos ao Cosmic Bowling, onde eles apagam as luzes, deixando acesas só as luzes das pistas. Lá eles têm bolas que brilham no escuro, usam luz negra, e os sapatos de quem joga têm listras brancas. Há até luz estroboscópica e gelo seco.

Acho que a gente precisava apenas de algum tipo de atividade, mais do que propriamente fazer algo. Pois eu estou achando o máximo! Nosso jogo é de meninas contra rapazes, e nós estamos ganhando.

— Não valeu! — Evan grita.

— Sem essa! Foi dentro das regras, total.

— Você pisou além da linha.

— Não pisei!

— A-hã.

Mostro a língua para ele.

— Supermaduro da sua parte! — Evan provoca.

— Acho que ela pisou antes da linha.

— Meu herói! — falo com suavidade.

Ficamos ali, parados, com olhos arregalados e sorrisos cafonas.

Julia diz:

— Vocês preferem que a gente vá embora ou...

— Não, já acabamos — diz Derek, ainda com os olhos arregalados.

Mudam a música de fundo e as luzes piscam, acompanhando o ritmo dela.

— Ei, esta é a minha música! — Evan grita. Ele começa os passos de uma dancinha ridícula, que faz a gente cair na gargalhada.

Trouxe minha câmera comigo. Sempre que vou jogar boliche, digo: “Preciso trazer minha câmera na próxima vez”, e sempre acabo me esquecendo. Dessa vez, me lembrei.

Quando chega a vez de Derek jogar, centro o foco na direção dele.

— Pegou um ângulo bom? — ele pergunta e se inclina. — Que tal assim?

— Ótimo — diz Julia.

Evan fica olhando para ela.

— O que foi? — ela pergunta. — Não posso mais olhar?

— Não, não pode — diz Evan. — E por que teria que olhar quando você já tem um namorado?

Yes! — grita Derek. — Fiz um strike!

Uso um filme inteiro tirando fotos. Mal posso esperar para ver como elas vão sair, então as revelo assim que chego em casa. Elas ficam simplesmente o máximo! Tem uma do Derek que ficou meio desfocada, as luzes formando uma mancha roxa e azul por detrás dele. Adorei! Quando ela fica pronta, levo-a até meu quarto e a coloco como nova capa de meu fichário. O tempo voa enquanto decoro meu fichário ao redor da foto, sentada na cama.

Sandra entra no quarto pela porta de nosso banheiro.

— Você poderia bater antes — digo.

— Você poderia ser menos idiota — diz ela.

— Falando com você mesma, de novo?

— Até parece. — Sandra se senta em minha cama e olha para meu fichário. — Quem é esse?

— Dãããã...! Derek! — Viro o fichário de modo que ela possa ver. — Tá vendo?

— Ah! Está meio sem foco.

— Este é o espírito da coisa.

— Qual o sentido de colocar uma foto sem foco no fichário?

— É uma opção artística. Você estava querendo alguma coisa?

Sandra fica inquieta, do jeito que acontece quando está prestes a me perguntar alguma coisa importante, como quando me perguntou sobre como usar absorvente e assuntos relacionados a sexo. Não é que a gente não converse com a mamãe a esse respeito, mas é muito menos constrangedor quando falamos disso só nós duas.

— Imagine que um cara está sempre provocando você — diz Sandra. — Isso significa que ele gosta ou que odeia você?

— Quem é que está provocando você?

— A pergunta é só uma hipótese.

— Sei.

— Então? Isso significa o quê?

— Bom, depende de como ele a provoca. De maneira hipotética.

— Vamos supor que ele se senta atrás de você, na sala de aula. Tipo, na aula de Ciências. E que ele fica o tempo todo cutucando. E, quando você se vira, finge que não fez nada. Ele está simplesmente sendo irritante ou isso quer dizer que ele gosta de mim — digo, da pessoa...?

Será que a minha vida alguma vez já foi simples assim? Quando meu maior problema era saber se um garoto imaturo gostava ou não de mim?

— Eu diria que ele gosta de você. Quero dizer, dessa pessoa. Da pessoa hipotética. — Estou fazendo um esforço enorme para não rir. — Isso porque, se ele não gosta, por que estaria prestando tanta atenção nesta pessoa?

— Foi isso mesmo que eu imaginei.

— Não que eu seja uma especialista no assunto, ou coisa assim.

— Você entende dessas coisas. Você tem namorado.

Derek ficou tão gato nesta foto! A falta de foco, de algum modo, faz que ele pareça ainda mais lindo.

Sandra diz:

— OK. Então... digamos que, em tese, essa pessoa talvez esteja gostando do cara que está provocando ela. O que ela deve fazer?

— Hum... que tal não fazer nada, já que ainda não tem idade suficiente para namorar...?

— Eu já tenho!

— Quem disse isso?

— Papai.

— Você já perguntou ao papai se ele deixa você namorar?

— Ainda não, mas vou perguntar.

— Quando? Quero estar por perto quando isso acontecer.

— Quando eu tiver certeza de que ele gosta de mim.

— Ele tem nome ou vamos continuar fingindo que não é um cara de verdade?

— Por enquanto. Você já tem todas as informações de que precisa — Sandra me fala num tom ríspido. E sai rapidamente na direção de seu quarto, com um ar de superioridade.

Pego meu fichário e dou um beijo no Derek desfocado. A gente se divertiu tanto hoje. A sensação que tive foi a mesma de quando começamos a sair, época em que tudo era perfeito e não tínhamos problema nenhum. Não é porque ele está na mesma turma do Anuário com Sierra que está acontecendo alguma coisa de sério entre os dois. Talvez ela goste dele, mas o amor é uma via de duas mãos.

Ouço um sinal da caixa de entrada.

dorkbot10013: ocupada?

f-stop: não muito.

dorkbot10013: vc fez seu trabalho de literatura?

f-stop: ugh! não. e vc?

dorkbot10013: terminei o meu anteontem.

f-stop: como é q vc consegue ser tão MALA?

dorkbot10013: hum, vamos ver... que tipo de mala?

f-stop: ha ha

dorkbot10013: o q vc vai fazer sábado à noite?

f-stop: já tenho compromisso.

dorkbot10013: de que tipo?

f-stop: com o Derek.

dorkbot10013: o q aconteceu com suas noites de sábado com a Sterling?

f-stop: a gente não está se falando.

dorkbot10013: pq não?

f-stop: é uma história complicada. basicamente, pq ela está com ódio de mim.

dorkbot10013: cruel.

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dorkbot10013: o q foi q vc fez?

f-stop: nada! pq vc já concluiu automaticamente q a culpa é minha?

dorkbot10013: então, pq ela de repente ficou com ódio de vc?

f-stop: eu te disse. é complicado.

dorkbot10013: mas você já tem programa p/ o sábado.

f-stop: já.

dorkbot10013: então não dá pra te convidar...

f-stop: convidar pra q?

dorkbot10013: pra vir comigo assistir às finais do dorkbot.

f-stop: *engasgo* fala sério!

dorkbot10013: vai ser no sábado, às 20h.

f-stop: já estou lá!

dorkbot10013: mas e o Derek?

f-stop: ele vai entender.

dorkbot10013: tem certeza?

f-stop: só me diz onde eu te encontro.

dorkbot10013: eu vou te buscar.

f-stop: oooh! como num encontro!

dorkbot10013: (sem resposta)

f-stop: é brincadeira.

dorkbot10013: ah! só agora eu percebi.

f-stop: dá pra sentir seu tom de sarcasmo pela tela.

dorkbot10013: ótimo. sinal de q ele está funcionando.

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dorkbot10013: ei! boa sorte com o trabalho pra escola.

f-stop: eu te odeio.

dorkbot10013: o sentimento é recíproco.