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No momento em que Sterling abre a porta de sua casa, sinto que tudo vai ficar bem. Ela parece aliviada em me ver.

Ela diz:

— Ei!

— Desculpa! — digo. — Me desculpa, mesmo!

Então ela me abraça, e entramos neste turbilhão emocional em que choramos juntas, pedindo desculpas uma à outra e buscando lenços de papel. Estou tão feliz que tudo isso acabou! Subimos ao quarto dela e é como se nunca tivéssemos brigado. Como se tudo tivesse voltado ao normal.

— Senti muito sua falta! — ela diz.

— Eu também.

— É que... depois que você passou a sair com Derek, eu comecei a ter a sensação de que nunca mais encontrava você. Fiquei com raiva dos furos que você vivia me dando.

É claro que ela tem razão. Fui uma idiota.

— Mas sabe o que era irritante? É que eu conseguia entender você. Tipo, não é bem entender, mas... como se eu estivesse em seu lugar. Podia me ver, total, agindo da mesma maneira — ela diz.

— Mas isso não é desculpa. Eu não deveria ter passado tanto tempo ao lado dele.

— Não, é claro que você tinha que fazer isso. Mas eu me senti excluída.

— Eu sei. Me desculpa!

— E eu me senti, tipo... eu estava feliz por você, mas também tinha ciúme. Então, vivia um conflito enorme e não sabia como lidar com ele.

— Sem problema.

— A sensação era que você estava entrando numa vida totalmente nova e me deixando para trás.

— Mas você tem dezenas de amigos!

— Você é a única amiga a quem dou importância — diz Sterling. — Eu não me relaciono com meus outros amigos do jeito que me relaciono com você. Você é minha melhor amiga!

Antes de vir até aqui, eu tinha medo de duas coisas. A primeira, que Sterling não quisesse fazer as pazes comigo. E também que ela achasse que eu vim até aqui só porque terminei com Derek. Tenho de ter certeza de que ficou claro para ela o porquê de eu estar aqui.

— Só pra você saber — digo —, não estou aqui só porque terminei com Derek.

— Eu sei. Eu ouvi as histórias... hum, acho que vi vocês dois do lado de fora da escola naquele dia. No dia que vocês terminaram, não foi?

— Foi. — Eu me lembro de Sterling parada perto da porta, nos observando. Sempre me perguntei o que é que ela pensava a respeito, se sabia ou não que aquilo era o fim.

— Foi... por causa de Sierra?

— É.

— Que saco!

— Um saco mesmo. Mas prefiro estar com alguém que quer mesmo estar comigo. Na boa, é ruim a gente ter terminado, mas era muito pior estar ao lado dele sabendo que ele preferia estar com ela.

— Você merece muito mais do que ele.

Sei que ela tem razão. Estou tão cansada de esperar! Quando é que esta espera vai acabar e quando é que a vida vai começar?

— Odeio me sentir solitária! — digo.

— Você?

— Eu o quê?

— Você, solitária?

— É.

— E por que é que você estaria se sentindo solitária? Você tem bons amigos, uma família verdadeira...

— Nada disso tem importância.

— É tão estranho — diz Sterling. — Eu daria qualquer coisa pra ter a vida que você tem!

— A minha vida?

— Você tem todas estas coisas incríveis que mal consegue enxergar. Tem coisas que sei que nunca vou ter.

— É isso que eu sinto em relação à sua vida.

— Sério?

— Total. Você não precisa lidar com a relação entre os pais. Você não tem irmãos ou irmãs. Está sozinha e pode fazer o que quiser.

— É por isso mesmo que é tão solitário!

Lembro-me de “Clarity”. É a minha música favorita de John Mayer. A letra fala da sensação de acordar no melhor dia de sua vida, quando toda a sua ansiedade desapareceu, pois você não se preocupa mais com as coisas que não consegue controlar. O problema é que a letra da música também diz que o sentimento bom não pode durar. Será que ele tem razão? Será que os sentimentos bons sempre têm que desaparecer?

O dia está lindo lá fora, então convido:

— Vamos caminhar na praia?

— Ótimo! — Somos iguais em relação à praia. Só que, em vez de pedrinhas, ela gosta de colecionar cristais marinhos.

— Achei um! — Sterling apanha uma pedra azul e transparente da areia. Olha contra a luz. O raio de sol atravessa a pedra, dando um colorido azul à bochecha dela.

É incrível como as pequenas coisas são capazes de fazer uma pessoa tão feliz, num momento em que ela está tão triste. Estou tentando prestar mais atenção às pequenas coisas que considero importantes, no “agora”. Ter esses breves instantes de magia para me proteger me ajuda quando estou deprimida. São lembretes de que as coisas sempre podem melhorar.

Tento me lembrar disso no momento em que voltamos para casa. Isso porque Sterling começa a falar em ir a Nova York para encontrar Chris. No início, achei que ela estava de brincadeira, porque: primeiro, ele nem sequer mora aqui, então qual é o sentido de ir encontrá-lo?; segundo: por que ela ia querer fazer uma coisa tão idiota? Mas ela está falando sério. Pelo menos, parece sério.

— Não importa se minha mãe vai me deixar ir ou não — Sterling me diz, de perto do fogão. Está preparando macarrão com molho pesto. Esse desgaste emocional sempre nos deixa com fome. — Eu vou de qualquer jeito.

— Mas e se ela descobrir?

— E daí? O que ela pode fazer, me prender aqui? Ela nunca está em casa.

— Sim, e, mas, se...

— Esse seu papo começa a me dar dor de cabeça. Por que você não consegue ficar feliz por mim?

Já dá para dizer que não vou ser capaz de convencer Sterling a não encontrar Chris de jeito nenhum. Ela está determinada a fazer isso. E quando Sterling está determinada a fazer uma coisa, sai da frente. Se você estiver no caminho, ela vai passar por cima.

— Só me promete que você vai ter cuidado — digo.

— Ah... você está preocupada comigo. Que bonitinho!

— É sério!

— Sim, é muito sério. — Sterling faz uma expressão facial toda séria.

Fico observando-a cozinhar e tento pensar no que vou dizer na sequência. Só que não consigo pensar em coisa nenhuma, e agora ela começa um longo discurso sobre como certas pessoas não sabem como preparar um pesto decente.

— Não se coloca salsa neste molho! — ela diz, toda agitada. — Seria o mesmo que se dizer vegetariano e comer peixe ou frango. Desde quando peixe e frango não são mais animais?

— É, não faz sentido mesmo.

— Está simplesmente errado, isso sim. Não pode colocar salsa! É um insulto!

— Então, é só manjericão ou...

— Claro que não. Bem, é basicamente manjericão e azeite. Mas tem outros ingredientes que são essenciais. Coisas como pinoli e alho.

Como é que vou dizer a ela para não ir ao encontro de Chris de um modo que ela não fique zangada comigo? Não importa o que eu disser, ela vai se zangar. Então digo:

— Talvez eu possa ir junto com você... quando você for encontrá-lo...?

— Ah, verdade! Como se isso não fosse uma coisa ridícula.

— Por quê?

— Não se vai a um encontro com o namorado acompanhada da melhor amiga. Quem é que faz uma coisa desta?

— Aquelas que põem salsa no molho pesto...?

— Justamente.

— E se uma pessoa quiser fazer uma loucura tipo colocar salsa neste molho, você a avisaria, certo?

— Na mesma hora. Ou até mesmo antes.

— Você... tipo... perceberia que está errado e não deixaria quieto...

Sterling larga uma panela sobre a boca do fogão, fazendo um barulhão.

— Não é isso? — insisto.

Ela não me responde. Sabe o quê, exatamente, estou perguntando. E não vai se dar ao trabalho de me responder.