Gwendolyn estava no parapeito superior do castelo, naquele frio dia de outono, o vento soprava o seu cabelo para trás e ela olhava para o campo brilhante. As fazendas diante dela estavam cheias de trabalhadores ocupados com a colheita do outono, dezenas de mulheres colhiam os frutos em cestas. Tudo ao seu redor estava mudando, todas as folhas se vestiam com uma miríade de tons roxos, verdes, laranjas e amarelos. Os dois sóis estavam mudando também, tal como sempre faziam no outono, agora eles derramavam um matiz amarelo e roxo sobre os campos. Era um dia magnífico e ao olhar para a vista à sua frente, parecia que tudo estava bem no mundo.
Pela primeira vez desde a morte de seu pai, ela tinha uma sensação de otimismo. Ela havia acordado antes do amanhecer e esperava ansiosa pelo badalar dos sinos que anunciavam o retorno da Legião. Ela esperou e observou o horizonte durante horas. Quando o dia clareou, ela pôde ver as multidões que já começavam a se formar nas ruas abaixo, preparando-se para os desfiles organizados para recebê-los de volta.
Gwen estava radiante de emoção. Aquele era o dia em que Thor voltaria para ela.
Ela tinha estado acordada a noite toda, contando os minutos até o amanhecer. Ela mal podia acreditar que o dia finalmente havia chegado. Naquele dia, Thor estava voltando. Tudo estaria bem no mundo de novo.
Além disso, ela sentia uma sensação de alegria, de realização, já que Kendrick não tinha sido executado. De alguma forma, seu encontro tinha tido efeito sobre sua mãe. Ela odiava saber que ele ainda estava mofando ali na masmorra e cada dia ela pensava em maneiras de tirá-lo dali, mas, pelo menos por enquanto, ela havia conseguido mantê-lo vivo.
Ela estava determinada a provar quem havia assassinado seu pai. No entanto, apesar de seus esforços durante os últimos cem dias, ela não tinha conseguido obter novas pistas. Godfrey também tinha chegado a um beco sem saída. Ambos estavam bloqueados em cada volta que davam. Gwendolyn sentia-se cada vez mais ameaçada sob o olhar atento de Gareth e sua multidão de espiões; ela se sentia menos segura no castelo à medida que os dias passavam. Ela estremeceu quando pensou na cicatriz que o capanga de Gareth tinha deixado em seu rosto; a cicatriz era leve, difícil de ver, exceto na luz solar direta, parecia mais um arranhão, mas mesmo assim, ela estava ali. Toda vez que ela se olhava no espelho, ela a via e recordava tudo. Ela sabia que tinha de fazer uma mudança em breve. Gareth estava se tornando mais desequilibrado a cada dia que passava e era impossível prever o que ele seria capaz de fazer.
Mas agora que Thor estava voltando, agora que a Legião estaria em casa, incluindo seu irmão mais novo Reece, ela já não se sentia tão sozinha com tudo isso. Um clima de mudança estava no ar, o status quo não permaneceria o mesmo. Ela sentia que seria apenas uma questão de tempo encontrar uma maneira de libertar seu irmão. E o mais importante, agora ela poderia estar com Thor permanentemente. Ela não tinha falado com sua mãe desde a última reunião fatídica e suspeitava que não falaria com ela novamente, pelo menos sua mãe já era não um obstáculo entre ela e Thor.
Gwen observava o horizonte. Ao longe, além do Canyon, ela podia vislumbrar o oceano e buscava qualquer sinal das velas dos barcos da Legião. Ela sabia que era otimista demais para ser capaz de identificá-las desde tão longe. Mesmo depois de desembarcar, os membros da Legião ainda teriam de fazer uma viagem de cerca de meio dia para chegar até a Corte. Mas ela simplesmente não podia deixar de observar. Os sinos dobravam ao seu redor. Ela estava usando suas melhores sedas brancas naquele dia. Uma parte dela queria que Thor a levasse para longe dali, para longe daquele castelo de manipulações, para um lugar onde eles pudessem estar seguros. Para que pudessem ter uma nova vida em algum lugar. Juntos. Ela não sabia como ou onde. Mas ela sabia que precisava começar de novo.
“Gwendolyn?” Ela ouviu uma voz dizer.
Ela virou-se, sacudida de seus pensamentos e para sua surpresa, viu um homem parado ali, a poucos metros de distância. Ele havia chegado sorrateiramente até ela, e pior ainda, ele era um homem a quem ela desprezava. Ele não era um homem, era um garoto.
Alton. A própria face da falsidade, da aristocracia, de tudo de errado que havia naquele lugar. Ele ficou lá, olhando, tão arrogante, tão pedante, vestido com suas roupas ridículas usando um lenço, mesmo no outono, ela o desprezou mais do que nunca. Ele era tudo o que ela odiava em um homem. Gwen ainda estava furiosa com ele por ele tê-la enganado, por ter lhe dito todas aquelas mentiras sobre Thor, mentiras que quase os separaram. Ele a tinha posto em ridículo. Ela jurou nunca mais pôr os olhos nele de novo, para começar, ela nem sequer gostava dele.
Até o momento ela tinha sido bem sucedida. Meses se passaram desde que ela o tinha visto pela última vez. Ela não podia acreditar que ele tinha tido a ousadia de dar as caras agora, de estar ali. Ela se perguntou como ele havia chegado até aquela parte alta do castelo, como ele tinha passado pelos guardas. Ele deve ter usado seu argumento estúpido de que ele era da realeza e os guardas deviam ter acreditado. Ele podia ser muito convincente, mesmo quando mentia.
“O que você está fazendo aqui?” Ela perguntou com autoridade na voz.
Ele deu um passo para mais perto dela, para muito perto dela. Havia apenas alguns centímetros entre eles e ela sentiu o seu corpo ficar tenso.
Ele sorriu ignorando sua hostilidade.
“Eu vim aqui para dar-lhe uma segunda chance.” Disse ele.
Ela riu em voz alta de suas palavras absurdas.
“A mim? Uma segunda chance?” Ela perguntou incrédula. “Como se eu por acaso, realmente desejasse uma segunda chance. E quem é você para estar dando chances a alguém? Em todo caso, seria você quem precisaria ter uma segunda chance. Mas como eu disse, você não tem nenhuma chance. Você não significa nada para mim. Nunca significou. Você parece nunca aceitar isso. Você vive em um mundo de ilusão.”
Ele continuou transpirando sua arrogância.
“Eu entendo que quando os sentimentos de uma mulher por um homem são tão fortes, ela pode, por vezes, viver em negação, então eu perdoo suas palavras precipitadas. Você sabe desde que éramos crianças, que você e eu estamos feitos um para o outro. Você pode tentar resistir a isso, mas você sabe tão bem quanto eu que nada vai nos separar.”
Ela riu.
“Separar-nos?” Ela burlou-se. “Você realmente está louco. Nós nunca estivemos juntos. Nós nunca vamos ficar juntos. Portanto, não há nada a separar. Exceto suas mentiras. Como se atreve a mentir para mim sobre Thor.” Ela gritou levantando cada vez mais a voz, indignada.
Alton apenas deu de ombros.
“Detalhes bobos.” Ele disse. “Ele é apenas um plebeu. Quem se importa com ele?”
“Eu me importo… e muito. Você espalhou mentiras sobre ele e me fez de idiota.”
“Se eu tomei a liberdade de enfeitar os fatos, isso não faz diferença. Se ele não for culpado de um vício, com certeza ele será de outro. O fato é que ele é um cidadão comum e inferior a você e você sabe muito bem que eu estou certo. Ele nunca será bom o suficiente para você.
“Eu, por outro lado, estou pronto para aceitá-la como minha esposa. Eu vim a você para confirmar que deseja que eu faça os preparativos do casamento antes que eu comece a fazê-los. Afinal, os casamentos são caros. Minha família é quem vai pagar por tudo isso.”
Gwen olhava para ele, incrédula. Ela nunca tinha conhecido alguém tão fora de contato com a realidade, tão pomposo. Ela não podia acreditar que ele realmente parecesse sincero. Isso a deixava doente.
“Eu não sei de quantas maneiras eu posso lhe dizer, Alton: eu não tenho amor por você. Eu nem sequer tenho qualquer afeto por você. Na verdade, eu tenho o maior ódio. E eu sempre terei. Então eu sugiro que você me deixe agora. Eu nunca me casaria com você. Eu nunca seria nem mesmo sua amiga. Além disso, eu tenho outros planos.”
Alton sorriu implacável.
“Se com isso você quer se referir ao seu suposto casamento com Thor, é bom que você pense duas vezes.” Disse ele, confiante, com um sorriso malicioso em seus lábios.
Gwen sentiu seu sangue esfriar.
“De que você está falando?” Ela disse entre dentes.
Alton ficou ali, sorrindo, divertindo-se com o momento.
“Seu amorzinho, Thor, não está retornando. Eu tenho informação de boa fonte que ele foi morto na Ilha da Neblina. Em um acidente fatal, eu receio. Assim, você pode parar de suspirar por seu retorno para casa. Isso não vai acontecer.”
Gwen viu a confiança no rosto dele e sentiu seu coração falhar. Será que ele estava dizendo a verdade? Se assim fosse, ela queria matá-lo com suas próprias mãos.
Alton deu um passo à frente, olhando nos olhos dela.
“Então como você vê, Gwendolyn, finalmente o destino está de nosso lado. Pare de resistir. Aceite minha mão agora e declaremos o assunto oficial. Vamos parar de lutar contra o que já sabemos que é verdadeiro.”
Alton estendeu a mão, seu sorriso se alargava enquanto olhava para ela. Mas ela também podia ver gotas de suor formando-se na testa dele.
“Ainda não tem resposta?” Perguntou ele. “Então, permita-me acrescentar mais um ponto.” Acrescentou ele, enquanto mantinha sua mão lá, tremendo. “Eu soube de boa fonte que sua família planeja casar você em breve, como fizeram com sua irmã mais velha. Afinal, eles não podem dar-se ao luxo de ter uma MacGil solteira por aí. Você pode escolher a minha mão em casamento agora, ou do contrário, permitir que a casem com um estranho. E devo acrescentar que poderia ser um estranho brutal, um selvagem de algum canto do Anel. Você estaria muito melhor com alguém como eu, alguém que você conhece.”
“Você está mentindo.” Gwen praticamente cuspiu as palavras, sentindo todo seu corpo tremer. ”Eu não posso ser obrigada a casar-me. Nem por minha família. Nem por ninguém.”
“Não podem obrigá-la, não é? Mas a sua irmã foi obrigada.”
“Isso foi quando meu pai estava vivo. Quando ele era o rei.”
“E não temos um rei agora?” Ele perguntou, com um sorriso irônico. “A lei do Rei é a lei do Rei.”
O coração de Gwen estava em disparada enquanto ela ponderava suas palavras. Gareth? Seu irmão? Casá-la? Ele poderia ser tão doente, tão cruel? Será que ele ainda tinha o direito de fazê-lo? Afinal, ele podia até ser o rei, mas ele não era o pai dela.
Ela não queria ponderar mais nada daquilo, estava revoltada com Alton e não tinha ideia de em que acreditar. Ela deu um passo para mais perto dele e mostrou-lhe sua expressão mais dura.
“Deixe-me explicar isso para você da melhor forma possível.” Ela enunciou lentamente, com a voz tão fria quanto o aço. “Se você chegar perto de mim de novo, eu farei com que a Guarda Real, os guardas reais da verdadeira família real, aprisionem você. Eles vão jogá-lo no calabouço e você nunca vai sair de lá de novo. Posso garantir-lhe isso. Agora saia da minha presença de uma vez por todas.”
Alton ficou ali, olhando e, lentamente, seu sorriso desmoronou, seu semblante ficou caído. Então seu rosto começou a tremer e Gwen viu como a expressão de seu rosto mudava, ele estava fervendo de raiva.
“Não esqueça.” Disse ele. “Você mesma buscou tudo isso.”
Ela nunca o tinha visto falar com tanta raiva antes. Então ele girou sobre os calcanhares, deixou o parapeito e desceu as escadas pisando firme, bufando de raiva.
Ela ficou ali sozinha, tremendo por dentro, ouvindo os passos dele desaparecerem, por um tempo muito longo. Ela rezou para que nunca mais tivesse de vê-lo novamente.
Gwen voltou-se para o parapeito, caminhou até a borda e olhou por ela. Será que algo do que Alton tinha dito era verdade? Ela rezou para que não fosse. Esse era o problema com Alton, ele tinha uma maneira de implantar os piores pensamentos em sua cabeça, pensamentos que ela não podia afastar.
Ela fechou os olhos e tentou afastá-lo da memória. Ele era uma criatura horrível, a personificação de tudo o que ela odiava naquele lugar, o epítome de tudo o que ela sentia que estava errado com o mundo.
Ela abriu os olhos, olhou para corte do Rei e tentou fazer com que tudo desaparecesse. Ela tentou voltar para o lugar onde tinha estado antes que Alton aparecesse para poder pensar em Thor e em sua chegada a casa naquele dia, em estar de volta em seus braços. Ver Alton tinha servido para algo, simplesmente a ajudou a perceber o quanto ela amava Thor. Thor era o oposto de Alton em todos os sentidos: ele era um guerreiro orgulhoso nobre, com um coração puro. Ele era mais real do que Alton jamais seria.
Isso a fez perceber o quanto ela queria estar com Thor, como ela faria qualquer coisa para estar apenas com ele, os dois sozinhos muito longe daquele lugar. Ela sentia-se mais determinada do que nunca a não permitir que nada se interpusesse entre eles.
Mas enquanto Gwen estava ali, ela tentava, sem sucesso, recuperar sua paz para formar a imagem do rosto de Thor; visualizar a forma de seu queixo, a cor de seus olhos, a curva de seus lábios, a raiva queimava em suas veias. Sua paz tinha sido arruinada. Ela não conseguia mais pensar claramente e ela queria pensar claramente antes que Thor chegasse.
Gwen girou nos calcanhares e atravessou o parapeito, deixando o telhado, entrando na escada em espiral e começando a descê-la. Ela precisava de uma mudança de ares. Ela iria entrar nos jardins reais e fazer uma longa caminhada no meio das flores. Isso iria arejar sua cabeça, tal como sempre ocorria.
Enquanto descia a velha escada que ela conhecia desde criança, lance após lance, ela sentiu que algo andava errado. Era como um calafrio, uma energia fria, como se uma nuvem tivesse passado subitamente sobre ela.
Então ela viu, com o canto do olho, um movimento, escuridão. Um borrão. Tudo aconteceu tão rapidamente.
E então ela sentiu algo.
Gwen foi empurrada por trás por mãos grossas que a agarraram pela cintura, derrubando-a no chão.
Ela chocou duramente com os degraus de pedra ao cair rolando pela escada, lance após lance.
O mundo girava, era um apenas borrão enquanto Gwen batia contra a pedra arranhando os joelhos, cotovelos e antebraços. Ela instintivamente cobria a cabeça enquanto rolava, tal como seus instrutores lhe ensinaram quando ela era criança, protegendo sua cabeça contra o pior do impacto.
Depois de vários degraus, ela já não sabia quantos, Gwen rolou sobre um descanso em um dos corredores que levavam para fora da escada. Ela ficou lá em posição fetal, respirando com dificuldade, tentando recuperar o fôlego, sem ar.
Não havia tempo para descansar. Ela ouviu passos descendo rápido, muito rápido, passos fortes, pesados. Gwen sabia que seu atacante, quem quer que fosse, estava em seus calcanhares. Ela forçou seu corpo a levantar-se, a ficar de pé e o esforço tomou cada grama de energia que ela tinha.
De alguma forma, ela conseguiu apoiar-se em suas mãos e joelhos, justo quando seu atacante ficou visível. Era o capanga de Gareth novamente. Desta vez, ele usava apenas uma única luva de couro, seus dedos enluvados estavam metidos em uma soqueira.
Gwen levou a mão até a cintura rapidamente e puxou a arma que Godfrey lhe dera. Ela puxou a bainha de madeira, revelando o punhal e avançou para o homem. Ela foi rápida mais rápida do que ela imaginava que poderia ser e apontou o punhal direto para o coração de seu atacante.
Mas ele foi ainda mais rápido do que ela. Ele golpeou-lhe o pulso e o pequeno punhal saiu voando, caindo no chão de pedra e derrapando através dele.
Gwen virou-se e observou o punhal voar, sentindo que todas as suas esperanças voavam junto com ele. Agora, ela estava indefesa.
O capanga de Gareth colocou a soqueira em seu punho e a balançou direto para seu rosto. Tudo aconteceu muito rápido para que ela pudesse reagir. Ela viu a soqueira, seus aros de metal, descendo direto para sua face e sabia que em apenas um momento eles iriam perfurar seu rosto e deixá-la terrivelmente desfigurada, com cicatrizes permanentes. Ela fechou os olhos e se preparou para a iminente dor que mudaria sua vida.
De repente, houve um ruído e para surpresa de Gwendolyn, o golpe do atacante parou em pleno ar, a poucos centímetros do rosto dela. Era o barulho de metal chocando contra metal. Ela olhou para ver um homem de pé ao lado dela, um homem grande, corcunda, segurando um bastão curto de metal. Ele estava a centímetros do seu rosto e seu bastão havia bloqueado o golpe do punho do homem.
Steffen. Ele a salvou do golpe. Mas o que ele estava fazendo ali?
Steffen segurava seu bastão ali com a mão trêmula, detendo o punho do atacante e impedindo que Gwen fosse ferida. Em seguida, ele se inclinou para a frente e golpeou fortemente o homem, bem no rosto, com o bastão. O golpe quebrou-lhe o nariz e o derrubou, de costas, no frio chão de pedra
O jagunço de Gareth ficou estirado ali no chão enquanto Steffen segurava seu bastão, de pé ao lado ele, vigiando-o.
Steffen virou-se por um momento e olhou para Gwen com preocupação em seus olhos.
“Vossa Alteza se sente bem?” Ele perguntou.
“Cuidado!” Gwen gritou.
Steffen virou-se, mas já era tarde demais. Ele tinha tirado os olhos do capanga de Gareth por um momento muito longo; o assassino traiçoeiro estendeu a mão e derrubou Steffen, chutando-o detrás do joelho e derrubando-o, de costas, no chão.
O bastão de metal bateu na pedra e rolou pelo corredor, quando o homem pulou em cima de Steffen e prendeu-o. Ele estendeu a mão, pegou o punhal de Gwen do chão, levantou-o bem alto e com um movimento rápido, desceu-o em direção à garganta de Steffen.
“Conheça seu criador, você, seu monstruoso desperdício da criação.” O homem rosnou.
Mas, quando ele desceu o punhal, ouviu-se um gemido horrível e não foi o gemido de Steffen. Aquele foi o gemido do capanga de Gareth.
Gwen estava ali, com as mãos tremendo, mal acreditando no que ela havia acabado de fazer. Ela nem sequer tinha pensado. Ela simplesmente tinha reagido e agora ela olhava para a cena como uma expectadora externa, como se ela estivesse desconectada de si mesma. Quando o bastão de ferro caiu no chão, ela agarrou-o e golpeou o jagunço de Gareth na têmpora, justo antes que ele esfaqueasse Steffen. Ela bateu no atacante com tanta força, que ele tombou totalmente flácido no chão. Foi um golpe fatal, um golpe perfeito.
Ele ficou estirado ali no chão, o sangue escorria de sua cabeça, seus olhos estavam congelados. Ele estava morto.
Gwen olhou para o bastão de ferro em suas mãos, tão pesado, o ferro tão frio, de repente ele caiu e bateu na pedra com um tinido. Ela sentiu vontade de chorar. Steffen tinha salvado sua vida. E ela tinha salvado a dele.
“Minha senhora?” Disse uma voz.
Ela olhou para cima e viu Steffen ali de pé, ao seu lado, olhando para ela com preocupação.
“Meu objetivo era salvar sua vida.” Disse ele. “Mas Vossa Alteza salvou a minha. Eu estou em grande dívida com Vossa Alteza.”
Ele curvou-se ligeiramente em reconhecimento.
“Eu devo-lhe a minha vida.” Disse ela. “Se não fosse por você, eu estaria morta. O que você está fazendo aqui?”
Steffen olhou para o chão e em seguida, voltou-se para ela. Desta vez, ele não evitava o olhar de Gwen. Desta vez, ele olhava diretamente para ela. Ele já não estava inquieto, não estava mais evasivo. Agora ele parecia uma pessoa diferente.
“Eu estava procurando Vossa Alteza para me desculpar.” Disse ele. “Eu estava mentindo para Vossa Alteza e para o seu irmão. Eu vim aqui para dizer a verdade sobre o seu pai. Disseram-me que eu poderia encontrá-la aqui e eu vim procurá-la. Eu me deparei com o seu encontro com esse homem. Eu dou graças a Deus por ter vindo até aqui!”
Gwen olhou para Steffen com um novo e total sentido de gratidão e admiração. Ela também sentia uma curiosidade ardente por saber mais.
Ela estava prestes a perguntar a ele, mas desta vez, Steffen não precisava de nenhum estímulo para falar.
“De fato, naquela noite alguém jogou uma arma pela rampa.” Disse ele. “Era um punhal. Eu o encontrei e o guardei comigo. Não é todos os dias que algo assim cai. Ele foi jogado na fossa, então eu não vi mal nenhum ficar com ele.”
Ele pigarreou.
“Mas, o destino quis que meu mestre me batesse muito naquela noite. Ele me batia todas as noites, desde o momento em que comecei a trabalhar lá, por trinta anos. Ele era um homem horrível cruel. Eu aguentava seus castigos todas as noites. Mas, naquela noite, o castigo foi demais para mim. Vossa Alteza vê essas marcas de chicotadas em minhas costas?”
Ele virou-se, levantou a camisa e Gwen se encolheu com a visão: ele estava coberto de cicatrizes laceradas.
Steffen deu a volta.
“Eu não aguentei mais, e aquele punhal, ele estava em minhas mãos. Sem pensar, eu tomei a minha vingança. Eu me defendi.”
Ele declarou para ela tentando defender-se.
“Minha senhora, Eu não sou um assassino. Vossa Alteza deve acreditar em mim.”
O coração dela se comoveu com ele.
“Eu acredito em você.” Ela disse tomando suas mãos.
Ele olhou para cima com os olhos cheios de lágrimas de gratidão.
“Acredita mesmo?” Ele perguntou parecendo um garotinho.
Ela acenou novamente com a cabeça.
“Eu não lhe disse nada antes…” Ele acrescentou. “… Porque temi que me mandassem preso pela morte de meu amo. Mas Vossa alteza deve entender que foi em defesa própria. Vossa Alteza uma vez me prometeu que se eu lhe dissesse tudo o que eu sabia, eu não iria para a prisão.”
“E eu mantenho minha promessa.” Gwen disse com seriedade. “Você não vai para a prisão. Mas você tem de me ajudar a encontrar o proprietário do punhal. Eu preciso colocar o assassino do meu pai atrás das grades.”
Steffen enfiou a mão na sua cintura e tirou dali, um objeto enrolado em um pano. Ele estendeu a mão e o entregou para ela, colocando-o na palma da sua mão.
Lentamente, ela desenrolou o pano, revelando a arma que ele tinha encontrado. Gwen sentia o peso dela na palma da mão e seu coração batia descompassado. Ela sentiu um calafrio. Ela estava segurando a arma usada para assassinar o seu pai. Ela queria jogá-la fora, queria ficar tão longe dela quanto fosse possível.
Mas, ao mesmo tempo, ela estava paralisada. Ela viu as manchas sobre o punhal, viu o cabo. Ela girou-o bem devagar em todas as direções.
“Eu não vejo nenhuma marca nele, minha senhora.” Disse Steffen. “Nada que indique quem é o seu proprietário.”
Mas, a diferença de Steffen, Gwen tinha sido criada ao redor de armas reais toda a sua vida. Ela sabia onde olhar e o que procurar. Ela virou o punhal de cabeça para baixo e olhou para a parte de baixo do punho para poder ver se, por um acaso, o punhal pertencia a um membro da família real.
Quando ela o fez, seu coração parou. Ali estavam as iniciais: GAM.
Gareth Andrew MacGil.
Era o punhal de seu irmão.