14 |
Arrastei-me para a sala para transmitir a Dan as boas-novas.
“Então fica só um jogo de Xbox”, ele disse, sem desgrudar os olhos da televisão.
“O quê? Nem pensar! Não vou comprar nenhum jogo para você.” Quase ri. Que audácia a dele!
Dan deu de ombros.
“Então digo para mamãe e papai que você recebeu um menino aqui.”
Cerrei os olhos.
“Eles não acreditariam.”
“Por que eu mentiria?”
Quando meu irmão caçula se tornou um babaca ardiloso? Fui para o sofá ao lado dele. Era o pior dia de todos os tempos.
“Diga o que quiser, eu não ligo”, disse, suspirando.
“E quem é esse Joe?”, perguntou Dan, pausando o jogo.
Exalei irritada.
“Um cara que eu conheci na Espanha.”
Dan fez uma careta.
“Aquele magrelo metido?” Assenti. “Você está transando com ele?” Dan riu. “Deve ser tipo Balu transando com Mogli.”
Contraí a boca, enojada.
“Em primeiro lugar, isso é doentio. Em segundo lugar, pare de dizer ‘transar’. E em terceiro lugar, eu não sou gorda...”
“Não muito.”
Ignorei-o. Algum dos amigos idiotas dele devia ter ensinado que chamar a irmã mais velha de gorda era um jeito ótimo de encher o saco dela. Bem, comigo não funcionaria. Eu já tinha inseguranças o suficiente. Dan teria que se esforçar mais. Esfreguei os olhos. Não podia acreditar que não encontraria Joe. de novo.
“Ah, saudades do Joe?”, entoou Dan.
Dei um tapa nele.
“Cala a boca, babaca.”
“Ai! Vou contar para a mamãe.” Ele esfregou a cabeça.
“Diga o que quiser”, repeti. Que tristeza. Suspirei fundo. “Um dia você vai entender, se o improvável acontecer e você virar um cara atraente.”
“Já beijei três meninas, se você quer saber”, ele disse, bufando. “De língua. E uma delas deixou que eu pegasse no peito dela.”
Que nojo.
“Espero que ela tenha tomado um banho depois”, eu disse, exaurida. Isso não estava me ajudando a melhorar, mas qualquer coisa era melhor do que ficar me lamuriando no quarto. Eu não aguentava mais aquele lugar. Sentei em silêncio enquanto a musiquinha idiota e os barulhos de armas e explosões do jogo preenchiam o recinto. Então meu telefone tocou outra vez. Joe.
Levantei e saí dali. Dan estava tão concentrado em matar alemães que nem percebeu. Atendi.
“Oi.”
“Tive uma ideia. Por que você não vem no fim de semana? Vou trabalhar no sábado à noite, mas você pode se distrair por algumas horas, né?”
“Claro”, respondi rapidamente. A montanha-russa de emoções que era a minha vida de repente me levava lá para o alto outra vez. “Para mim é melhor mesmo. Pego o trem no sábado de manhã, como da última vez.”
“Ótimo. Maravilha. Até lá então.”
“Até lá. Mando uma mensagem do trem.” Mas ele já tinha desligado.
Refleti por um instante sobre como meninos são péssimos ao telefone, mas meus pensamentos rapidamente se voltaram para o fim de semana. Dois dias de preparação significavam que haveria tempo para raspar as pernas e escolher com calma o que vestir — talvez eu até pudesse encomendar lingerie nova pela internet. Era até bom que Joe não tivesse ido me visitar. Não fora minha própria mãe que sugerira que eu fosse a Londres no fim de semana? Sorri para minha foto brega, de macacão, aos cinco anos de idade, que ficava na parede da escada havia séculos. Já era hora de a minha sorte mudar.
Reencontrar Joe foi tão incrível quanto eu tinha imaginado. Foi como se jamais tivéssemos nos separado. Ele não me encontrou na estação dessa vez. Eu pedi que não fosse. Não queria que me achasse uma menina provinciana que tinha medo de Londres. (Não que ele fosse do gueto. Era de algum lugar de que eu nunca tinha ouvido falar, mas, também, eu morava em Surrey. Não era exatamente uma selva urbana.) Peguei o metrô até a casa dele sem problemas, e aproximadamente noventa e quatro segundos após minha chegada já estávamos rolando nus no chão do quarto. Foi incrível: sexo suado, voraz e barulhento. Senti-me total e completamente livre. Como se tivesse me libertado de mim. Não era mais Sarah: virginal, feminista, ingênua e gentil. Eu era uma combinação de sentimentos, ruídos, pele sobre pele. Não me importava de estar com o rosto rubro e contorcido, porque Joe também estava. Tudo se resumia a nós dois. Meus amigos, meus pais, meu irmão... eram uma parte da minha vida sobre a qual eu podia pensar de forma indulgente. Era bom tê-los, mas eles eram um bônus. Tudo se resumia a nós dois: eu e Joe.
Isso tudo passou pela minha cabeça enquanto estávamos deitados no chão do quarto de Joe, cobertos por uma colcha. Ele fez cócegas na minha testa com a ponta do dedo.
“No que está pensando?”
Não era minha pergunta favorita. Nunca dava uma resposta sincera, porque normalmente estava pensando em algo estúpido como “Será que minhas pernas ficariam parecendo pinos de boliche em calças harém?”, ou “E se meus sonhos forem a realidade, e a vida real for o sonho?”.
Suspirei contente e me aconcheguei nele.
“Em nada, na verdade... Só em como isso é legal.” O que era a versão mais resumida da verdade.
Ele beijou minha cabeça.
“Você é fofa.”
Fechei os olhos. Ia ficar tudo bem com a gente. Como poderia não ficar?
Quando acordei estava escuro lá fora, e eu estava toda dolorida por ter ficado no chão. Arrastei-me até a cama, levando a colcha comigo. Parecia o lugar mais caloroso e aconchegante do mundo. Ouvi a descarga e Joe voltou para o quarto, vestido, com o cabelo molhado do banho. Ele se sentou na beira da cama e pegou minha mão. Ver a expressão no rosto dele me deu um frio no estômago.
“Desculpe, mas meu chefe me pediu para trabalhar o dia todo amanhã, e hoje à noite.” Ele apertou meus dedos. “Você sabe que não posso recusar.”
Sorri corajosamente. Não queria ser muito pegajosa.
“Tudo bem. Espero você voltar hoje à noite e vou embora amanhã quando sair para trabalhar.”
Ele passou a mão no meu pescoço e no meu peito.
“Para falar a verdade, seria melhor se você fosse hoje. Só volto bem depois da meia-noite e vou querer dormir.” Ele passou a mão por baixo da colcha para apertar meu peito e diminuiu a voz. “Você é má influência para mim.”
Eu sabia quando estava sendo consolada, mas não tinha raiva. Só me sentia triste. A lembrança da expressão de Mimi na festa surgiu como uma espécie de aviso para que eu mantivesse a calma. Talvez fosse assim que funcionassem algumas relações. A de Cass e Adam não era assim, mas quem queria ser como eles?
Passei a mão sob a cintura do jeans de Joe e beijei o ombro dele.
“Talvez mais uma antes de você sair?”
Ele afastou meu braço e se levantou, quase irritado.
“Tenho que ir.” Ele beijou minha cabeça. “Eu ligo, tá? Pode sair com calma. Tem pão para fazer torrada, acho.”
“Tá. Então tchau”, eu disse desolada para as costas dele, que já estava se retirando. Nem tive a chance de confrontá-lo sobre por que tinha revelado nossos segredos para Mimi, o que eu realmente pretendia ter feito. Fiquei olhando para o nada até ouvir o clique da porta da frente fechando, e, em seguida, nua e sozinha em uma casa vazia, naquela cidade de milhões de pessoas, chorei. Saí da cama, vesti a roupa sem tomar banho e fui embora. Só queria ficar longe dali, longe de Londres. Ainda estava choramingando quando caminhava da casa de Joe para a estação. Mantendo os olhos atentos a possíveis ladrões, dei uma olhada na agenda no celular. Ashley, Cass, Donna... Não queria conversar com nenhuma delas. Jack? Ele teria um ataque. Rich? Nem pensar, ele já tinha problemas demais. Meu dedo pairou sobre o nome de Ollie. Ele era engraçado e nunca julgava ninguém. Liguei e ele atendeu quase imediatamente.
“Sarita Cabrita, você não deveria estar fazendo coisas impublicáveis com Joe?”
Tentei rir, mas soou como choro.
“Tudo bem com você, linda?”
Ah, Ollie... Ele era tão fofo. Por que não podíamos gostar um do outro? Limpei a garganta e me forcei a parecer alegre, mas devo ter soado drogada e louca.
“Tudo bem. Estou saindo da casa de Joe e indo para a estação, na verdade.” Fez-se uma pausa. Por que eu tinha feito aquilo? Nunca tinha ligado para Ollie para conversar antes. Não era assim que funcionava com os meninos. Engoli em seco. “Então. Hum... Eu estava pensando... O que vai fazer amanhã?” Ouvi ruídos do outro lado da linha, seguidos pelo som de algo crocante. Ollie estava comendo salgadinhos. Maravilha.
“Nada de mais”, ele respondeu com a boca cheia de (provavelmente) batatinhas. “Dormir até tarde. Ver televisão... Por quê?”
Boa pergunta.
“Bem... hum... Eu estava pensando em juntar todo mundo para fazer alguma coisa. Antes de voltar para a escola. Esse tipo de coisa.” Boa, Sarah. Eloquente.
“Tá, conte comigo. Os outros vão?”
“Não sei. Liguei primeiro para você, na verdade.” Joguei a cabeça para trás e a sacudi desesperadamente sob as nuvens pesadas do fim do outono.
“Ah, Sarita, não sabia que você gostava tanto de mim.”
Funguei.
“É, você é legal. Mando uma mensagem quando souber o que vai rolar, tá?” Eu já tinha chegado à estação. O painel informava que um novo trem sairia em dois minutos. De repente estar naquele trem se tornou a coisa mais importante do mundo. Dei pulinhos no lugar, como se isso fosse apressar Ollie.
“Beleza”, ele disse. “Tem certeza de que você está bem, linda?”
Meus olhos se encheram de lágrimas. Maldito Ollie, sempre gentil.
“Tenho. Total. Até amanhã.” Guardei o telefone no bolso da mochila, limpei os olhos com a manga e corri pelas escadas para a plataforma. Pulei no trem quando as portas estavam se fechando, achei um assento vazio e fiquei nele. Joe àquela hora já estava no trabalho, sorrindo para estranhos, conversando com os colegas atrás do balcão. Eu queria tanto estar com ele que chegava a doer.