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Como se estivesse conservando toda a minha energia para aquele instante, comecei a agir. Tomei banho, vesti minha roupa favorita — um jeans e um casaco — e sequei o cabelo. Coloquei uma troca de roupa em uma bolsa, escovei dois dias de sujeira dos dentes, fiz bochecho com flúor e estava pronta para ir.
Sentei diante de um post-it por um instante, balançando a caneta, imaginando o que diria para meus pais, até que pensei “Dane-se” e escrevi: “Fui para Londres. Ligo mais tarde. Bjs”. A honestidade é a melhor política, dizem. De qualquer forma, ambos tinham reunião depois do trabalho. Quando vissem o bilhete, eu já estaria no trem.
Já estava quase escuro quando cheguei à estação, e a adrenalina tinha quase desaparecido. A ideia estava começando a parecer ridícula, mas me forcei a comprar uma passagem. Não sabia de que outro jeito encontraria Joe. E eu só conseguiria colocá-lo contra a parede e fazê-lo tomar jeito se estivesse diante dele.
Achei um assento no trem e abri meu livro, decidida. Duas meninas que reconhecia vagamente da escola — do primeiro ano, acredito — passaram por mim. Uma delas estava dizendo: “Dá para acreditar?”.
A outra balançou a cabeça. Fiquei vermelha, como uma idiota. Elas não podiam estar falando de mim. Nem me conheciam.
Repousei o livro aberto no colo e utilizei a janela como espelho para olhar para um casal do outro lado do corredor. Não eram muito mais velhos do que eu. Ela estava com as pernas sobre as dele e a cabeça apoiada em seu ombro. Ele murmurou alguma coisa, e ela riu e esticou o braço para fazer um carinho em seu rosto. Ela usava um anel. Um círculo sólido com um diamante — ou o que quer que fosse — em cima. Exatamente o tipo de anel que eu escolheria. Pensei como seria estar no lugar dela. Ter alguém que te ama tanto que quer que todo mundo saiba que vai ficar com você a vida inteira. Literalmente não conseguia imaginar. Só sabia que odiava aquela mulher. Não que estivesse querendo casar — isso seria tolice. Só queria que gostassem de mim.
Cerrei os olhos enquanto a mulher rodava distraidamente o anel no dedo e sorria. Vaca esnobe. Como se pudesse ouvir meus pensamentos, olhou para a própria janela e fez um estranho contato visual comigo através do reflexo. Ela me encarou por um breve segundo, depois desviou o olhar de forma relapsa. Nada para ver. Mudei o foco de modo que não ficasse mais olhando para a mulher, mas para a escuridão e as sombras do lado de fora. O trem balançou suavemente no trilho ao acelerar em direção a Londres, emitindo ruídos abafados como se eu estivesse escutando embaixo d’água. Tinha uma leve desconfiança de que estava me tornando invisível.
O trem chegou à estação Victoria pouco depois das oito. O lugar estava cheio de viajantes a caminho de casa para o fim de semana. Imaginei janelas iluminadas dando boas-vindas, uma garrafa de vinho no gelo, talvez um tapete de lã no chão. Casais acordando juntos pela manhã, lendo o jornal de sábado na cama, transando...
Ter dezessete anos e ainda estar na escola de repente pareceu tão sufocante que mal pude respirar. Grade escolar, provas, ver televisão nas noites de sexta com Daniel e meus pais... Um tédio mortal. Eu queria ser como Mimi. Não uma vaca dos infernos, claro, mas uma universitária, longe de casa, livre para ser quem quisesse. Fiquei imaginando se o jeito dela tinha sido uma escolha consciente. Se ela se olhava no espelho toda noite antes de dormir e dizia: “Sou confiante, produzida e tenho cabelos sedosos como os de Kate Middleton. Todos querem ser meus amigos”.
Mimi devia ser assim sem esforço, pensei, de maneira sombria.
Tentei tirá-la da cabeça. O problema não era ela, era Joe. Corri pela escada rolante para a plataforma sentido norte do metrô. Estava lotada, e o painel digital tinha apagado. Fiquei esperando. Não conseguia entender como as pessoas não caíam nos trilhos, de tanta gente que havia ali. Um anúncio informou que, por causa de uma falha de sinal na estação Seven Sisters, a linha Victoria estava com enormes atrasos. Ótimo. Eu só precisava chegar a Oxford Circus — de lá podia pegar a linha Bakerloo até Kensal Green, onde Joe morava. Subi a escada rolante correndo para o térreo para procurar um mapa de ônibus. Eu precisava pegar o setenta e três, que passou exatamente quando cheguei ao ponto. O ônibus estava lotado, mas alguém se levantou quando eu estava passando e sentei, agradecida. Sorte dupla, o que interpretei como um bom sinal.
Estávamos balançando e sacudindo havia alguns minutos quando a mulher ao meu lado disse: “Com licença”. Ela era idosa, tinha cabelos prateados bem curtos e olhos azuis. Usava um casaco verde (que eu adoraria usar, se Ash já não fosse a menina do grupo que veste casacos de vampiro). Ela espiou por cima dos óculos de meia-lua e sorriu. A mulher não se encaixava em nenhuma descrição de estupradora assassina, então me senti suficientemente segura para responder, mesmo em um ônibus londrino. Sorri educadamente, como a boa menina que sou.
“Sim?”
“Espero que não se incomode com a pergunta, mas você estuda no Woodside High?”
Olhei espantada para ela.
“Estudo... Como você sabe?”
Ela apontou para o broche escolar que eu tinha colocado na mochila, tentando montar um visual retrô irônico (pelo menos era assim na revista que me deu a ideia).
“Fui professora lá! Meu Deus, faz quinze anos.”
“Sério? Uau! Aposto que muita coisa mudou desde então”, eu disse, de um jeito tolo.
Ela assentiu com muito entusiasmo.
“Ah, imagino que sim.” A mulher colocou a mão no meu braço. “Que coincidência maravilhosa encontrar você!” Sorriu para mim, e eu retribuí. O que mais poderia fazer?
“Meu nome é Kate”, ela disse, e estendeu a mão. Apertei e revelei meu nome. “Então, o que te traz a Londres, Sarah?”, perguntou, cruzando os braços no colo como se estivesse se preparando para uma conversa. Não me incomodei. Tinha gostado dela.
“Vou visitar meu namorado.” Experimentei a palavra. Soava estranha e um pouco falsa, mas eu poderia me acostumar a ela. “Ele faz faculdade aqui.”
“Ah. Ele também estudou em Woodside?”
Balancei a cabeça.
“Nós nos conhecemos nas férias, na verdade.”
A mulher se inclinou para trás, na direção da janela, como se estivesse me examinando sob uma nova ótica.
“Uau! Um amor de verão que durou. Muito bem!”
Dei um sorriso fraco.
“Obrigada.”
“Então, conte, Greta Parsons ainda ensina história?”
Balancei a cabeça, e ela continuou desenrolando uma lista de professores. Alguns continuavam na escola, mas a maioria não. Teria sido uma forma agradável de passar o tempo, se eu não tivesse ficado pensando no comentário sobre o amor de verão.
Em Oxford Circus saltei do ônibus, com quase todo mundo, e me juntei à multidão que descia pelas escadas do metrô. Não havia problemas com a linha Bakerloo, fiquei aliviada ao constatar, e logo consegui sentar. Mas à medida que o metrô se aproximava de Kensal Green o nó no meu estômago apertou ainda mais. Não era como se eu estivesse fazendo uma surpresa a Joe — eu tinha mandado uma mensagem avisando. Mas mesmo assim estava nervosa. Tinha muita coisa em jogo. Fechei os olhos e o imaginei abrindo a porta, com aquele sorriso torto e mal-intencionado no rosto, puxando-me silenciosamente para o quarto, onde eu mal teria tempo de tirar o casaco antes de ser arrastada para a cama. Ele passaria os dedos na minha boca e beijaria suavemente minhas pálpebras, em seguida retiraria devagar minhas roupas antes de fazermos amor. Depois me seguraria em seus braços e diria que me ama.
Pensamento positivo. Se você quer muito alguma coisa, acaba acontecendo. Até parece.
Abri os olhos. Não espere milagres, disse a mim mesma. Se ele ficar feliz em ver você e aceitar conversar já está ótimo. É tudo o que você pode pedir.
Não sabia por que estava tão preocupada. Ele podia ser péssimo em ligar, mas sempre tinha ficado feliz em me ver. O problema era esse: nós éramos o tipo de casal que precisava estar sempre junto.
Enquanto caminhava da estação até a casa dele, já me sentia melhor. Eu estava lá. Daria um passo de cada vez. Ao dobrar a esquina, percebi que ele poderia não estar em casa. Supus que Rav e Ben pudessem abrir a porta e me deixar esperar no quarto dele, mas e se todos tivessem saído juntos? Quanto tempo eu teria que esperar do lado de fora até desistir e voltar para Brighton? E se tivessem saído de balada? Poderiam não voltar até duas ou três da manhã. Mas ao me aproximar da casa vi que a luz do quarto de Joe estava acesa. Fiquei fora do alcance visual da janela por um instante para me acalmar. Em seguida atravessei a rua confiante e toquei a campainha.