Uma semana depois.
Ingrid estava impaciente, pois os novos soldados que mandara o dragão recrutar, ainda não haviam chegado. Não gostava sequer de imaginar a possibilidade de Adriana chegar primeiro com o exército do Leste (que era a alternativa mais provável) ou do Norte (que era a alternativa que aqueles homens haviam difundido em sua mente).
Estava tão pensativa em relação a isso que se assustou quando ouviu um barulho estrondoso vindo do lado de fora da sacada de seu novo quarto. Ela correu para ver do que se tratava todo aquele barulho.
Era uma marcha organizada. A feiticeira chega na sacada e sorri. Um enorme exército estava parado de frente para ela. Parecia não ter fim, era tão vasto quanto o palácio.
O emblema que tinha na armadura negra que eles usavam era uma águia. Aquele era o símbolo do Reino Oeste. Esse reino ficava após a Floresta Sombria. Lá se encontravam as pessoas mais perigosas dos cinco reinos.
Ingrid sorri em contentamento. Agora entendia o motivo de seu dragão ter demorado tanto para resolver as coisas. Ele não estava à procura de criminosos para lutar em seu nome. Estava à procura da elite.
***
Alessa terminava de ajeitar a fivela de seu cinto e abotoar sua camisa branca. Nada de vestidos para aqueles tempos.
Seu irmão, Paulo, abriu a porta de seu quarto e encontrou-a colocando em sua bainha a espada com que ela treinara durante toda aquela semana. Ele não estava gostando nada daquilo. Mesmo após sete dias, ela ainda estava com a ideia maluca de ir para o Leste.
— Você vai mesmo fazer isso? – ele pergunta, sem o mínimo de vontade de saber a resposta.
— Eu não tenho muitas opções. É melhor eu ir logo do que ficar aqui esperando o pior acontecer – ela fala sem olhar para ele, ainda ocupada em organizar as coisas que iria levar. – Mas você já sabia que essa hora chegaria. Caso contrário, não teria me ajudado com o meu treinamento.
— E você não sabe o quanto eu me arrependo de ter feito isso – ele murmura.
Alessa fecha sua bolsa com um só nó e encara o irmão com uma fúria intensa que fez com que ele desse um passo para trás, por precaução.
— Você querendo ou não, eu já estou indo.
Ela anda em direção à porta, onde o irmão estava encostado. Quando ela fica lado a lado com ele, ele pega em seu braço com força. Ela olha para o lado, já pronta para brigar, quando percebe que o olhar do irmão havia mudado.
— Não permitirei que você vá sozinha para a boca do inimigo. Espero que não morramos por sua culpa – ele sorri com confiança. – Eu vou com você.
***
— Não sei mais por quanto tempo eu vou aguentar essa tortura – Marcos fala para Julia, enquanto descansa depois de um treino exaustivo. Ele estava sentado no chão, enquanto Julia estava em um divã. – Drika não acorda, ainda não sei onde está a espada vingadora, ainda não sei controlar essa parte do Ian que existe dentro de mim...
— Não seja tão apressado com as coisas – Julia repreende. – Se você não tiver paciência, não vai conseguir raciocinar direito. E, além do mais...
— Eu não permiti que você desista ainda, Marcos Lockhood. – Uma outra voz se fez presente no salão de treinamentos e Marcos olhou para trás.
Era Drika quem estava lá. Vestida em uma camisola branca, com seu tigre Lorenzo ao seu lado. Seu rosto ainda estava pálido, por tanto sofrimento interior, mas seu corpo parecia bastante firme.
Ela sorri calmamente e vai em direção a Marcos, que ainda não tivera reação alguma. Ela se ajoelha e abraça o amigo.
— A senhora Julia disse que nesses últimos dias você tem passado por um extensivo treinamento. Nunca pensei que você teria que fazer esse tipo de coisa algum dia. Ela me contou algumas coisas a respeito de Lorenzo ser um espírito de gelo.
— Foi apenas isso que ela contou para você? – ele pergunta, temendo que Julia tenha falado sobre o passado dos dois em outra vida.
Drika ficou confusa e afastou-se de Marcos para olhar para ele nos olhos.
— Tem mais alguma coisa que eu não saiba?
— É melhor deixarmos as conversinhas paralelas para depois e focarmos no que devemos fazer agora – Julia muda o rumo do assunto. – Já que Drika enfim despertou e você está treinado o suficiente, tenho que apresentar alguém muito importante para vocês e para essa guerra.
***
Julia leva Drika e Marcos para uma câmara, que ela abriu com uma chave que estava pendurada em seu colar. Os três entram no local.
Estava escuro e muito frio lá dentro. A diferença de temperatura em relação ao lado de fora era muito grande.
A anciã fala algumas palavras misteriosas e um fogo azul aparece em cada tocha posicionada no local. Havia uma passarela e eles seguiram por ela.
Até que Drika e Marcos notam que havia uma coisa se mexendo no fim da passarela branca.
Drika arregala os olhos em um terror incontido.
— Não pode ser... é... é...
— Um dragão! – Marcos completa, também aterrorizado.
Um dragão branco com detalhes azuis estava deitado no chão frio e parecia não ter notado a presença de nenhum dos três. Era cego de um olho. Não estava acorrentado, ou coisa do tipo. Também não tinha asas, o que era uma peculiaridade.
— O que faz aqui, anciã? Você sabe muito bem que eu quero ficar sozinho. – O dragão fala em um tom de voz bastante grave, fazendo ecoar sua voz pela câmara.
— Seu momento de glória retornou, meu amigo. Seu Ian voltou para você.
O dragão olhou sério para Julia, seus olhos vermelhos cintilavam em direção a ela. Então ele notou a presença dos outros dois. E ficou encarando Marcos por um tempo.
Drika arregala os olhos parecendo ter reconhecido o dragão de algum lugar. Aquela sensação era nova para ela.
— Votyo! – Drika fala em alto e bom som. Parecia até outra pessoa falando, até mesmo sua fisionomia havia mudado. — Eu imaginei que tinha morrido. Faz mais de 200 anos que morreu, quer dizer, que acharam que tinha morrido.
— Lorena. Isso vale para você. Está com outra aparência, mas o espírito é o mesmo. – Votyo encara Drika. Seu coração parecia pesado. – Perdoe-me, eu devia tê-la salvado das garras de Chayo.
Votyo abaixa a cabeça querendo se aproximar de Drika. Ela vai mais para frente para tocá-la.
— Não se culpe, Votyo. Estamos aqui para consertar os erros do passado, meu amigo.
***
Alessa e Paulo prepararam seus cavalos e partiram. Elizabeth havia lhes dito que ficaria bem sozinha, e eles preferiram confiar nela.
Iriam procurar fazer aliança com o Reino Leste. Nem que isso lhes custasse a vida.
***
— Agora que vocês me deixaram a par da situação, vejo que o nosso problema é mais urgente do que eu pensava. Tenho que treinar Lorena o mais rápido possível. – Votyo suspira, todo saudoso. – Na sua última encarnação não pude fazer nada e Chayo a matou. Mas você voltou para enfim recomeçarmos tudo da forma correta.
Drika estava confusa demais para assimilar as palavras de Votyo. Julia tenta dar uma luz em seu caminho.
— Ele fala do espírito de gelo. Você aprenderá a controlá-lo. Se dominar os poderes dele, você vai conseguir se defender melhor do que o normal. Nós precisamos fazer isso logo, para irmos à guerra.
— Você me disse que o casamento do filho do Rei do Norte foi adiado por conta desse dragão misterioso, Julia. – Votyo recomeça a falar.
— Sim?
— O rei não deve ter levado todo o exército com ele, não é mesmo? Com certeza ele achava que nada de errado iria acontecer.
— Bem, de acordo com as minhas informações, ele levou apenas sua guarda pessoal. O exército ficou todo aqui, no Norte. Mas onde você quer chegar com essas perguntas?
— Nós precisaremos de todo contingente possível para atacar a feiticeira. Temos que convencê-los a trabalhar do nosso lado. E isso eu deixei em seu encargo.
— Você vai mesmo sair do templo depois de tantos anos...?
— Já passou da hora de eu deixar a minha amargura de lado e terminar o que comecei. Eu devo isso a eles – Votyo fala essa última frase olhando para Marcos e Drika.
***
— O exército do Oeste. Você realmente sabe me impressionar, Chayo – Ingrid elogiava seu dragão no primeiro jardim. – Mas como conseguiu convencer o rei a ceder seus soldados?
— Bem, em momentos de necessidade eu sempre tenho uma carta na manga. Sou um dragão de alta patente. Posso enganar os homens como eu quiser, simplesmente me passando por eles. E também, o rei não era tão esperto como você pensava. – Chayo olha para Ingrid, que ficou com a cara fechada. – Não olhe dessa forma para mim, eu só fiz a minha parte.
— E o que faremos com seu grande inimigo Votyo? Você sabe, ele já acordou, assim como você. – Ele havia apertado sua ferida, então ela faria o mesmo.
Os dentes do dragão ficaram expostos.
— Isto é um assunto – Chayo olha para a cicatriz que tinha no peito – que eu mesmo terei que resolver.