Três

— ENTÃO, O QUÊ, O UPCHUCK VEM trepando contigo desde que você tinha 12 anos? — Eric quebrou um grissini.

— Só nos conhecemos quando eu tinha 17 — Willy cruzou os braços diante da massa borrachuda que Eric terminaria por ela.

— Então já tinha passado da idade determinada por lei. Muito íntegro da parte dele.

— De tal modo que chega a ser irritante, se é que você quer saber.

— De qualquer forma, como você acabou ficando com ele?

— Max foi a consequência inesperada da determinação que meu pai tinha de que eu não me tornasse profissional. Max e eu estávamos tirando férias para compensar o vazio do mundo.

* * *

AO SE TORNAR A amadora número três dos juniores de Nova Jersey aos 16 anos, Willy havia esgotado boa parte das competições locais, mas não obtivera financiamento nem folga do colégio para participar de torneios longe de casa. Já que o Aberto dos Estados Unidos seria ali perto, em Flushing Meadow, em 1986, Willy esperava deixar de lado a vida de boleira para fazer uma última tentativa de ganhar o título de júnior, ainda que isso significasse avançar com dificuldade através das rodadas de qualificação. Naturalmente, foi no mesmo verão que seu pai decidiu levar a família numa viagem de carro pelo país, para a qual Willy foi sumariamente arrastada.

Ultrajada por lhe ter sido negado o National Tennis Center, ela passou as longas e calorentas viagens encurvada no banco traseiro, calada. Willy boicotou principalmente Gert, que fizera uma cena desmedida em torno do fato de que se dispusera a embarcar na viagem mesmo estando no segundo ano de faculdade e insistira para que Willy fosse, como dizia Gert, mádura.

Willy não foi mádura. Deixou a família presa numa lojinha de suvenires do monte Rushmore para dar uma corrida de dez quilômetros. Seu único interesse era achar um hotelzinho com quadra e completar todas as visitas abomináveis aos pontos turísticos do dia antes que escurecesse e ficasse tarde demais para conseguir um parceiro de jogo. Assim como os colegas da aula de tênis da escola, nem Gert nem o pai jogavam mais com ela.

Chuck Novinsky era pão-duro, mas o número limitado de vagas nos hotéis de Nevada o levou a um lugarzinho de luxo. Ao menos o Oasis iria aplacar a filha caçula, já que possuía três quadras de tênis.

O resort também empregava um profissional que morava no local, um antigo tenista que chegou à posição seiscentos e alguma coisa no ranking e que caçava turistas ricos que desejavam perder as calorias do sorvete que comeram de tarde. Embora Ed Sanders procurasse esquecer as amarguras com o rum, ele se empertigava ao caminhar por aquelas três quadras de piso rápido como se fizesse uma segunda mesura no Foro Italico. Como Willy comentaria mais tarde com Max Upchurch: “Em terra de cego quem tem um olho é um babaca.”

Willy ignorou o enxame de malas velhas e pirralhos do saguão e foi direto procurar Sanders. Ele estava praticando o serviço; todos os seus topspins enfurecidos aterrissaram 60 centímetros dentro da área de saque.

— Ei, senhor — Willy se aproximou da linha de fundo onde ele estava. — Vamos jogar?

— Eu cobro 60 dólares por hora, meu bem. Melhor ver com o seu pai antes. — O sorriso do grandalhão foi de graça.

O Oasis já estava levando o pai à falência. Com o custo adicional dos conselhos imprestáveis de um charlatão, o pai teria um acesso de fúria.

— Vou te fazer uma proposta — Willy declarou, jogando a raquete Wilson de uma mão para a outra. — Se você ganhar, eu te pago o dobro. Se eu ganhar, você me paga.

— Está bem, gatinha. Vamos começar.

Naquela época nem uma nuvem de hesitação fizera sombra à certeza ensolarada de Willy de que ela era capaz de cobrir toda a quadra. De vez em quando supunha que, caso tivesse mantido a sensação adolescente de superioridade, a essa altura já poderia estar entre as dez melhores. Era espantoso como a autoestima cega poderia fazer alguém chegar longe, ainda que seja possível argumentar que a fanfarronice era infundada. Pois Willy cometera, quando adolescente, o erro comum de confundir mero potencial com excelência.

— Eu não era tão boa quanto imaginava — contou a Eric. — Mesmo assim, jogar contra Ed Sanders era como tirar doce da boca de um adulto.

Quando a conta chegou no Boot of the Med e Willy se abaixou para pegar a carteira, Eric ergueu a mão. Ao que parecia, ele pagaria contas por gentileza, mas não por obrigação.

— Na metade dessa partida vapt-vupt-valeu-e-tchau — retomou ela no carro —, apareceu um rosto atrás do alambrado. Que nem você. Olhos pequenos e brilhantes, os dedos enganchados nos buracos da cerca. Eu fiz um espetáculo para o cara. Eu estava com tanta raiva. O torneio eliminatório dos juniores estava começando no Queens, e ali estava eu, olhando o deserto do Arizona passar pela janela do carro.

“Eu não tinha ideia de quem era o cara. Quando ele viu o Sanders me pagando os 60 dólares, ele me perguntou se eu estava cansada. Então eu pus os 60 em jogo outra vez, imaginei que eu fosse sair dali com o dobro. Nada disso. Dessa vez eu levei uma surra. Estava jogando contra Maximilian Upchurch. Ele me pôs no meu lugar, o que na época era a única forma de chamar minha atenção.

“Max pegou os 60 dólares para me ensinar uma lição. Depois me pagou um refrigerante e fez um interrogatório sobre meu treinamento. Foi um enorme alívio encontrar alguém que se importasse com isso. Meus pais e meus professores estavam me pressionando a aprender o teorema de Pitágoras; eu nunca tinha tido uma conversa séria a respeito do meu forehand. Eu me senti o patinho feio que finalmente conhecia um cisne.”

Willy estacionou o carro da escola no Sweetspot. Caminhando devagar, ela instintivamente se dirigiu às quadras.

— Nos encontramos no piano-bar naquela noite — tagarelou. — Max e eu estávamos no mesmo barco. A mulher dele tinha se recusado a passar mais um verão sendo arrastada de torneio em torneio, comprando pipoca para os clientes dele. Ela queria férias de verdade, onde nada tivesse relação com tênis. Para salvar o casamento, ele concordou.

— Minha mulher não tem interesse algum por tênis — ele havia explicado a ela. — Ou melhor, retiro o que eu disse. Ela odeia tênis. O que eu imagino que seja uma forma de interesse.

Willy tocou na questão sagrada.

— Como alguém casa com um treinador de tênis e detesta o esporte?

Max dera um sorriso triste.

— Você é nova demais para entender, mas faz todo o sentido. Ora, é quase inevitável — ele se deleitava com a ingenuidade dela. Max lhe falava de qualquer assunto, como se estivesse fazendo confidências a um cachorro.

— Mas seria de se imaginar que ficar contra o tênis é a mesma coisa que ficar contra você.

— Dã — ele respondera.

Parecia que o casamento dos Upchurch não estava se fortalecendo nas paisagens edificantes da região que escolheram, já que, todas as noites, Max devorava o jantar e voltava correndo ao hotel a fim de procurar Ivan Lendl nos canais de tevê a cabo. Para adiar programas do tipo comer no Taco Heaven e ver os bordados de contas dos navajos, ele fazia hora nas quadras públicas para descobrir talentos locais. Mas o fato de ele ter transformado as “férias do tênis” numa tentativa de descobrir novos juniores foi a gota d’água. Ao fim da hospedagem do casal no Oasis, Max estava livre para seguir o Chrysler dos Novinsky até Yellowstone, já que a mulher pegara o avião de volta a Hartford para pedir o divórcio.

— Então, quando você voltou a Nova Jersey — Eric cutucou enquanto Willy o conduzia pelas quadras do Sweetspot —, Max fez a proposta.

— De ser meu treinador, idiota.

Estacionado na entrada da casa da família em Montclair, Max ofereceu um contrato a Willy: ele a treinaria pro bono em troca de vinte por cento dos lucros que ela obtivesse em seus primeiros cinco anos de carreira profissional.

— Você é bonita — ele dissera com cinismo, encostado em seu Saab Turbo. — O dinheiro vem dos patrocinadores. Seu rosto venderia — Max a examinara dos pés a cabeça com um olhar clínico, como se ela fosse uma cabeça de gado. Por vários meses depois disso, ela ficaria mais temperamental do que lhe era natural, nem que fosse só para ser reconhecida como uma garota.

— Max me ofereceu uma bolsa integral no Sweetspot no meu último ano na escola — Willy abriu o portão do alambrado com um chute. — Mas meu pai nem quis ouvir.

— Upchurch o deixava nervoso.

— As preocupações dele se mostraram injustificáveis. Ao contrário das sórdidas suposições que você está fazendo, Max nunca encostou um dedo em mim. E eu estava morrendo de vontade que ele encostasse. Eu sempre ficava deitada na cama, de noite, fantasiando que eu ganharia um torneio importante e o Max sairia correndo da arquibancada e me levantaria no ar…

— Como eu fiz.

— Como você fez — confirmou ela, acanhada. — Mas em nenhuma vez ganhei mais que um tapinha no ombro e um gole de Gatorade — mesmo agora, sua voz era melancólica. — De qualquer forma, tive permissão para tomar o ônibus para Connecticut nos fins de semana se eu prometesse fazer uma faculdade. Mais tarde eu tentei quebrar o acordo, mas Max ficou do lado do meu pai. Max disse que não estava preparando uma imbecil. Depois fiquei me perguntando para o que ele estava me preparando. Ele não pressionava os outros alunos para que fossem para a faculdade.

— Mas até agora eu não entendi por que não estou conversando com a segunda senhora Upchurch. Este é o plano habitual.

— Ele estava esperando. Queria que eu tomasse uma decisão sensata, como adulta. Esse foi o erro dele.

As quadras desertas estavam iluminadas somente pela lua, e Willy desabou no chão daquela que, sem nenhum motivo lógico, era a sua preferida. Espalmou as mãos, absorvendo o calor do piso.

— Naquela primavera, a tensão já tinha se tornado insuportável — ela prosseguiu, encostando-se à cerca. — Ele parava do lado de fora do vestiário feminino e repetia alguma dica de tênis que eu já tinha ouvido milhões de vezes, só para continuar a conversa. Ou fazíamos hora nos arredores do meu dormitório antes de eu ir para a cama e tínhamos de ficar um pouco distantes porque se chegássemos mais perto um do outro teríamos de fazer alguma coisa — ela deu de ombros. — Então, finalmente fizemos alguma coisa.

“Mas não durou muito tempo — continuou, em voz baixa. — Semanas. Ah, não vou fingir que as primeiras noites não foram um sonho que virou realidade. Mas durante o treino nada era igual. Começamos a discutir. Eu me recusava a aceitar os conselhos dele; não gostava que me desse ordens. Tenho certeza de que ele já tinha mandado eu ‘mexer minha bunda gorda’, mas de repente isso me ofendia, e eu ia embora pisando forte, zangada. Então, em uma manhã de maio… Ainda fazia frio, eu acho. Eram 8h30. Tarde para mim. Fui me levantar e ele esticou o braço e murmurou: ‘Está frio. Volta para a cama.’ Este foi o fim.”

— Não entendi.

— Não estava frio. Não tanto assim. E que importância tinha se estivesse 5 graus negativos? Era hora de treinar, e ele não estava mais nem aí para isso. Comecei a questionar tudo: por que ele me escolheu em Nevada, se ele me achava mesmo talentosa ou se só gostava das minhas pernas. Ao considerar o passado, os raros elogios que ele me fizera pareciam cantadas. Estava convencida de que os outros jogadores estavam rindo de mim pelas minhas costas. Por muitos anos eu pensei que Max era a única coisa que eu queria. Mas eu queria uma outra coisa ainda mais.

Willy se deitou na quadra, o calor do chão empapando sua calça jeans e a blusa de algodão. Eric se curvou sobre ela e expirou.

— Você está me avisando que é melhor eu não ficar do lado errado de sua raquete?

Mas, imprensada entre Eric e a quadra sete, Willy teve pela primeira vez a intuição de que talvez fosse possível ter um homem de um lado e o tênis do outro.

— Vou te dar uma dica — murmurou ela. — Eu prefiro jogar tênis a fazer sexo.

— Eu prefiro jogar tênis — disse ele, puxando a blusa dela para fora do jeans e deslizando a mão por seu tórax — e depois fazer sexo. — Ele era formado em matemática, um homem calculista; tirou uma embalagem de papel laminado do bolso.

— Aqui?

Eric a colocou em cima dele.

— Há anos eu quero fazer isso. Afinal, tênis é que nem sexo, não é? Acho que é por isso que você gosta. Investir contra a rede… a bola é apenas uma intermediária, uma mensageira do amor e do ódio em um só objeto. Esse antagonismo… vocês são rivais, mas precisam um do outro. Preste atenção na linguagem! Corpo, ponto doce e coração da raquete. Cabo e haste, atacar e fatiar, bater e penetrar… é pornográfico! — Eric arrastou a Levi’s dela pelas coxas. — Aproximação e defesa, quebrar o serviço, devolver a quebra de serviço, rebater, reconquistar a posição e iguais… é romântico. E nós dois conhecemos o barato libidinoso que dá quando a gente finalmente encontra o parceiro certo, e como um melhora o jogo do outro. Você nunca imaginou ser tão boa, e as pessoas nunca acharam que você era tão boa, e mais do que ligar para quem vai vencer, você não quer parar… Caramba, Wilhelm — ele havia lhe segurado as nádegas, uma em cada mão. — Sua bunda é quase tão maleável quanto um pneu da Goodyear.

Willy encarou o fato de que também sempre quisera fazer isso naquele lugar. Devia significar alguma coisa que ela e Max nunca tivessem pensado nisso antes, como se percebessem que a número sete e a cama dele eram incompatíveis. Quando ela se soltou de Eric para tirar o jeans, ficar nua ali lhe pareceu normal. Sempre se sentiu nua jogando tênis, todas as manchas em sua personalidade à mostra: cada arrogância injustificada ou timidez nascente, o mínimo de preguiça, falta de entusiasmo ou de desespero. O corpo, em comparação, era uma proteção.

Em um único movimento Eric se livrou de sua camiseta preta velha, e assim revelou o insuspeito traço artístico do torso, da mesma forma como a elegância astuciosa de uma curtinha inesperada se esconde até o instante em que o jogador avança para dar o golpe. Apesar de Willy ter se entregado a uns poucos casos com outros atletas da universidade, a imbecilidade de suas conversas havia jogado uma mortalha sobre suas anatomias, os corpos idealizados tão prosaicos e inanimados quanto os desenhos num livro de medicina. Com mais de um Adônis ela continuou tão pouco excitada que tornou a vestir sua blusa e arrastou-se até o próprio dormitório. Willy imaginara que era preciso haver algum defeito sofrível — barriga flácida, cicatriz de extração de apêndice — para ela ficar interessada. Mas, apesar de Eric não ter nenhum defeito digno de nota, o movimento intrigante dos seus ombros refletia o luar de um lado ao outro, assim como as faces de um globo espelhado, ou uma série de ideias complexas, interligadas.

Eric tirou a própria calça jeans, apoiando-se em uma perna e depois na outra. Parecia gostar que ela o observasse. Em geral, Willy achava o pau, tanto sob a forma de botão enrugado quanto na forma pulsante, apontada e estranhamente desconexa, ridículo. Mas o de Eric, a meio mastro, pendia sobre sua coxa naquele estado sem pressa e luxurioso de excitação que era o mais encantador em um homem.

Ao chutar as roupas para o canto e seguir lentamente em direção a ela, que estava encostada na rede, Eric não ficou se exibindo, encolhendo a barriga e inflando o peito, gestos que aprendera a associar à vaidade dos atletas que tiravam as roupas. Ao mesmo tempo, a confiança de seus passos largos e a ironia de seu sorriso demonstravam bastante vaidade. Mas aqueles corpos rijos e enxutos flexionavam os deltoides como se tentassem compensar outras deficiências. Peitorais triangulares eram tudo o que tinham a oferecer e, portanto, pareciam insignificantes, como canapés solitários numa travessa muito mexida. Eric Underwood, por outro lado, despia seu corpo como se ele fosse uma imprevisibilidade agradável, assim como receber de brinde o estofamento de couro ao comprar um carro.

Eric talvez considerasse o próprio físico algo trivial, mas Willy estava admirada com ele. Admiração em geral não era um sentimento predominante em sua vida, e carregava a sensação com certo incômodo. Examinou o corpo dele em busca de algum defeito que lhe tranquilizasse. Os pés eram compridos, mas aquele corpo delgado pedia pés grandes. De modo geral, Willy estava satisfeita com a própria aparência: era firme e graciosa. Mas à medida que Eric se aproximava à luz do luar, Willy ficava mais consciente do fato de que seus seios, embora pequenos, eram caídos o bastante para não passarem no teste do lápis. Repetiu para si mesma que estava em boa forma, que todas as mulheres tinham uma camada de gordura subcutânea; quando Eric pôs as mãos em sua cintura, Willy ouviu dentro de sua cabeça exatamente esta expressão: “gordura subcutânea”. O tronco dela era macio e suave, sem aquelas ondulações engenhosas, serenas, que refletiam no peito dele. Eric suspirou ao passar a mão pelos quadris dela, mas Willy achava seus culotes grandes demais e lhe invejou o traço reto, paralelo, que descia até as coxas.

A embalagem de papel laminado na palma de sua mão direita arranhou quando ele lhe acariciou a lateral do corpo. Sob a sombra de cabelos escuros, os relevos dos antebraços dele eram realçados, enquanto os dela, alvejados pelo luar, pareciam lisos como os de uma boneca de papel. Ele desceu a mão esquerda do quadril até sua coxa, mexendo os dedos para cima e para dentro, e ela entrou em pânico por aquilo que ele poderia encontrar entre suas pernas que fosse capaz de competir com todo aquele quinto membro que se curvava contra sua barriga. Talvez, num estado suficiente de transe, fosse impossível conceber que um sexo tão fascinante pudesse ser atraído pelo seu.

— Oberdorf — disse ele, enigmático. Ela não reconheceu as sílabas, que pareciam uma fórmula mágica, um abre-te, sésamo das Mil e uma noites que deslocaria rochas de cavernas.

— O quê? — seu tom de voz era fraco e vago.

— Meu sobrenome é Oberdorf — anunciou ele. — “Underwood” é presunto apimentado.

Algo neste novo sobrenome a oprimia. Underwood era uma paixão cega superficial, facilmente manipulável que seguira seu encalço até Westbrook com base em uma refeição cubano-chinesa; um rapaz estranho que no devido momento poderia mostrar que era uma peste, mas que poderia lhe ser útil como forma de se isolar da ameaçadora decepção de Max Upchurch. O telefone de Underwood seria rabiscado num pedaço de papel, mais tarde jogado fora por acidente. Um Underwood lhe mandava flores que ela esquecia de regar. E Underwood era um jogador de tênis corajoso, mas desengonçado, e totalmente esquecível. Underwood não teria nenhuma chance no tênis profissional — mas com um nome destes, um Oberdorf poderia melhorar.

— Eric Oberdorf — ela disse baixinho. A descoberta de seu nome verdadeiro parecia satisfazer algo que ele esperava, e ele rasgou a embalagem.

Se camisinhas outrora indicavam consideração pela garota, este não era mais o caso; e ali estava Willy, se rendendo a um homem que conhecia tão pouco que não era capaz de saber se ele teria se importado em protegê-la de uma gravidez caso não estivesse, acima de tudo, protegendo a si mesmo de doenças. Nem saberia dizer se ele tinha carregado contraceptivos com a arrogância específica de esperar foder com ela ou se simplesmente ia para todos os cantos com a arrogância genérica de esperar foder alguém. Mas era tarde demais para pensar em quê estava se enfiando porque algo já se enfiava nela.

As costas de Willy imprensadas contra a rede; as cordas gemeram. Eric Oberdorf a levantou para apoiar as costas dela na fita, se agachou, se levantou e fechou os olhos. Consequentemente, Wilhemena Novinsky descobriu como era uma partida sem o intermédio de uma bola de tênis.

* * *

NA MANHÃ SEGUINTE, WILLY insistiu que Eric fosse embora. Ter trazido ali um homem em quem fingia estar interessada era uma cafonice; esfregar um homem em quem estava de fato interessada no nariz de Max era sadismo. Eric partiu, ela treinou com Max naquela tarde, na quadra número sete, com um sorriso irreprimível. Na sua cabeça, as cordas da rede mantinham a ondulação reveladora da pressão de suas costas, e ainda a ouvia ranger com seu prazer. Embora Willy tivesse tramado a interseção de seus caminhos, agora estava decidida a manter os dois homens o mais distantes possível.

— Você está batendo bem — Max acusou. — Acima do normal.

Willy implorou para ir embora um dia antes, sob a alegação de que precisava enviar documentos para um torneio satélite* em agosto, mas na verdade queria experimentar novamente o tênis sem bola.

* Torneios satélites eram torneios profissionais menores e de menos importância válidos pelo ranking mundial. Circuitos do ITF (International Tennis Federation) jogados em quatro semanas, contavam pontos para os rankings da ATP (Association of Tennis Professionals) e da WTA (Woman’s Tennis Association). Foram extintos depois da temporada de 2006. Esses torneios são agora chamados de “Challengers” e “Futures”. (N. do R.T.)