O gesto desapareceu mas a frase ficou nas locuções populares, significando o conselho de conformar-se com a realidade, alegrar-se por não estar envolvido em complicações e distúrbios. Tenho-a também ouvido de portugueses. Não se refere às guloseimas, como o lamber o dedo. Seria uma fórmula de exorcismo vulgar no século XVI. Isabel Dávila, denunciando ao Santo Ofício em novembro de 1591 na Cidade do Salvador, informava: “Vio mais a dita Mecia Roiz, que tem por costume, quando ouve dizer a alguma pessoa que outra mulher teve roim parto, lamber com a boca as unhas dos dedos de entrambas as mãos, e isto lhe vio fazer por muitas vezes, e perguntando-lhe a razão por que o fazia, não respondeo nada”.286 Já não repetem o ato mas a alusão permanece na tradição oral brasileira. Ligar-se-ia ao gesto de beijar a unha do polegar, finalizando o “Padre-Nosso” em Roma, esconjuro habitual nas matronas cristãs, de possível herança antiquíssima, pois era usual na aristocracia romana do século XVI.
286 Denunciações da Bahia, São Paulo, 1925