ENGOLIR

O movimento da deglutição é o mais instintivo reflexo a uma notícia surpreendente pelo imprevisto ou inverossimilhança. Sugere tentativa de assimilação difícil, custosamente escorregando pela garganta no rumo do estômago, aceitando o anormal como substância comum. “Esta não engulo!”, recusando o inauditismo da informação. Os Presidentes, Epitácio Pessoa constatando a rebelião do Forte de Copacabana (5 de julho de 1922), Artur Bernardes conhecendo a revolução de São Paulo (5 de julho de 1924), Getúlio Vargas, avisado da insurreição paulista de 9 de julho de 1932, engoliram em seco, maquinalmente, numa reação aerofágica. O gesto espasmódico seria uma eliminação da presença inopinada e desagradável, perturbando a digestão normal do cotidiano. “Foi duro engolir!”, diziam os paulistas referindo­-se à instabilidade administrativa estadual pela sucessiva substituição dos Interventores Federais. O vocabulário popular atesta a variedade da aplicação nos idiomas neolatinos. O ato fisiológico, indispensável na manutenção vital, determinou a semelhança da imagem alusiva à recepção dos acontecimentos, incorporando o evento à massa circulante na memória, repetindo, inconscientemente, a mecânica da mandíbula e da glote.