BEIJO NA MÃO

Já no tempo de Homero, dez séculos antes de Cristo, beijar a mão era expressão carinhosa de homenagem íntima, não apenas ao Pai, ao Rei, ao Senhor, mas aos servos antigos e fiéis, numa espécie de integração na comunidade familiar. Ulisses beija as mãos do boeiro Eumeu e de Filotio, guardador de porcos no seu pequenino reino de Ítaca.43 Regimen emocional da Bênção devida aos mais velhos, ainda quando fui menino. Não encontro referência no Antigo Testamento. Muitos beijos, mas destinados ao rosto, desde o Êxodo, onde Jacó beijou Raquel e foi beijado pelo tio Labão (29, 11, 13), astutíssimos e patriarcais. Beijar a mão não deparei nas minhas jornadas pela Bíblia. Jacó era mil anos anterior a Homero. Pelo Oriente contemporâneo o beija­-mão vive vulgar numa demonstração respeitosa aos anciões, rabinos, santões, venerandos e sujos. On vous baisera la main, monsieur, si l’on veut profondement vous honorer, escreveu Jean Paul Roux visitando a Turquia em 1968. Proclama­-se a convicção de oscular a mão de orientação e defesa ao homenageante. Na Idade Média fora ritual o beisemain aos senhores feudais, levando­-se oferenda e, na ausência, osculando­-se o ferrolho da porta principal. A Mão conduz a generosidade retribuidora. Saudação natural aos progenitores, mestres, anel de Bispos. O Beija­-pé, exigência dos Soberanos persas e sultões muçulmanos, não gozou simpatia ocidental, exceto na emoção dos versículos 4­-12, capítulo 13 do Evangelho do Apóstolo João, na Quinta­-feira Santa. Etiqueta devida aos Papas suntuosos, que Montaigne descreveu em dezembro de 1580. Dissipou­-se no pontificado do segundo João XXIII (1958­-1963). Recebemos com a catequese católica e tradição portuguesa desde o século XVI. É um gesto agonizante. No Brasil monárquico, o Beija­-mão começou em março de 1808, com o Príncipe Regente D. João, o Rei­-Velho, e terminou em abril de 1872, com o Imperador D. Pedro II, de notável desprezo pela cerimônia, encanto do avô. Presentemente, os beijos nas faces são fórmulas comuns de cortesia. “Beijo na face / Pede­-se e dá­-se! versejou João de Deus. A origem é oriental, divulgado na Europa pelo uso em Roma. Ver Beijo.

43 Odisseia, 21, 225.