A História é a consciência progressiva da Liberdade (Hegel).
A Lei nº 10.352/01 em vigor a partir de 27.03.2002, modernizando o Código de Processo Civil de 1973, deu nova sistemática ao recurso de agravo de instrumento, dispondo, no art. 527 que “recebido o agravo de instrumento no tribunal, e distribuído incontinenti, o relator: IV – poderá requisitar informações ao juiz da causa, que as prestará no prazo de 10 (dez) dias...”
Observe-se que não é inflexível o prazo fixado pela lei – 10 dias – para o juiz prestar as informações, acaso requisitadas, porque poderá ser diminuído pelo relator, por razões ditadas sob o império das circunstâncias, mormente quando houver necessidade de apreciação de pedido de sustação dos efeitos da decisão, e tenha o relator declarado que tal apreciação será feita com as informações do juiz da causa.
Mais útil seria se a lei deixasse o prazo em aberto, como fez no caso do habeas corpus, embora tivesse aqui o legislador seguido o critério temporal da Lei nº 12.016/2009, regente do processo do mandado de segurança, certamente sensibilizado pelo fato de que a nova sistemática do agravo o coloca como o substituto natural e inexorável do mandado de segurança que impugna atos judiciais.
Por outro lado, a extensão do território submetido à jurisdição do tribunal, em Estados como o Amazonas, ou mesmo no caso do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, que compreende diversas Unidades Federativas, aconselharia que o relator fixasse, em cada caso, o prazo concedido ao juiz da causa para prestar as informações; entramos aí no tema das comunicações processuais, que nem sempre tem merecido atenção suficiente neste país de dimensões continentais.
Embora possa o agravo de instrumento ser protocolado no tribunal, postado no correio sob registro com aviso de recebimento ou mediante outra modalidade prevista na lei local (art. 525, § 2º), em São Paulo admite-se a entrega ao protocolado integrado, assim como, no Rio de Janeiro, o Tribunal de Justiça, através da Resolução Conjunta nº 1/97, assinada pelo Presidente e pelo Corregedor-Geral da Justiça (Diário Oficial de 31 de janeiro de 1997), permitiu que o agravo seja protocolizado nas próprias Comarcas no órgão local do sistema integrado de comunicação processual, e daí remetido imediatamente, inclusive através de malotes, ao tribunal a que é dirigido.
Está bem próximo o dia em que os regimentos internos dos tribunais, consoante o disposto no art. 96, I, “a”, da Constituição, determinarão a utilização de meios eletrônicos não só para a protocolização de recursos e ações autônomas de impugnação como para a requisição das informações ao juiz da causa, desde que, evidentemente, existam linhas telefônicas com as respectivas máquinas em cada extremidade...
Como decorre da expressiva dicção legal – poderá o relator requisitar informações ao juiz da causa – infelizmente tal requisição tem se tornado a regra, constante da maioria dos despachos iniciais nos agravos de instrumento.
A despeito da universal tendência de dinamização da atividade jurisdicional, da qual a nova sistemática do agravo de instrumento constitui salutar resultado, muitos relatores, ao receber o instrumento para despacho, metódica e inutilmente desde logo requisitam as informações ao juiz da causa, protelando assim a apreciação do pedido de suspensão do despacho agravado ou a apreciação do pedido liminar de substituição da providência denegada pelo ato impugnado na instância originária.
A necessidade da requisição das informações ao juiz da causa deve ser perquirida pelo relator em cada caso, não sendo razoáveis as posturas rotineiras de sempre exigi-las ou, no extremo oposto, nunca exigi-las.
Descabe a requisição, quando se coloca em risco a presteza que se exige em todas as decisões judiciais, como corolário lógico do direito fundamental de acesso à jurisdição, ou quando a vinda das informações desde logo se afigura desnecessária em face dos elementos contidos no instrumento do agravo.
Nem sempre tem a decisão interlocutória o caráter de irreversibilidade que muitos pretendem lhe emprestar como justificativa da necessidade de suspender os efeitos da decisão agravada ou, por outro lado, de fazer substituir por ato da instância superior a providência rejeitada na instância recorrida.
Recorde-se que objeto do agravo é a decisão interlocutória (art. 522), sendo esta o ato pelo qual o juiz, no curso do processo, resolve questão incidente (art. 162, § 2º).
Geralmente a decisão interlocutória não se reveste da possibilidade de preclusão pro judicato, podendo, ou melhor, devendo o magistrado, em ambas as instâncias, alterá-la, se e quando necessário, ainda que a parte não tenha apresentado recurso, como se vê nos seguintes e cediços exemplos:
a) a tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada a qualquer tempo, em decisão fundamentada (art. 273, § 4º);
b) as questões preliminares têm caráter oficial (art. 301, § 4º), podendo ser reconhecidas a qualquer tempo, inclusive pela instância revisora e, em certos casos, até em ação de impugnação da sentença (como, por exemplo, aquela referida no art. 485); e
c) as questões probatórias submetem-se ao princípio geral do art. 130 do Código de Processo Civil, devendo o juiz determinar as provas necessárias à instrução do processo.
Theotonio Negrão arrola hipóteses agraváveis1 e que aqui são colacionadas para demonstrar a regra geral da reversibilidade das interlocutórias, embora, em certos casos, com a possibilidade da repetição de certos atos processuais, dano quase sempre proporcionalmente menor a suspensão do processo originário ou da concessão in limine da providência negada pelo despacho agravado:
a) decisão sobre a suspensão ou a anulação do processo;
b) rejeição liminar da reconvenção ou de ação declaratória incidental;
c) exclusão de litisconsorte e de litisdenunciado;
d) exclusão ou inclusão de herdeiro no inventário;
e) fixação da remuneração de perito;
f) deferimento ou indeferimento de intervenção de terceiro;
g) decisão sobre a incompetência;
h) deferimento ou indeferimento de prova;
i) decisão sobre conexão de causas;
j) rejeição do aditamento da petição inicial;
k) apreciação de requerimento sobre prazo processual;
l) rejeição da nulidade de ato processual;
m) decisão sobre o valor da causa;
n) denegação de homologação de transação;
o) rejeição da alegação de prescrição ou decadência;
p) apreciação do pedido de exibição de documentos;
q) decretação da deserção ou de sua relevação;
r) decisão sobre incidente da execução; e
s) decisão que, em processo findo, causa lesão à parte ou a terceiro.
As decisões interlocutórias devem ser fundamentadas, como exige a Constituição, tanto no art. 93, IX, como em decorrência do devido processo de lei, agora erigido expressamente como garantia fundamental.
Decisão interlocutória imotivada, ou inadequadamente motivada, não vai ter o vício sanado pelo fato da motivação ulterior, posta nas informações do agravo de instrumento, porque a ordem jurídica exige a contemporaneidade da motivação como necessária para a integridade processual.
Por outro lado, o juiz que nas informações do agravo corrige a fundamentação do ato agravado ou lhe dá novo substrato, implicitamente reconhece a nulidade insanável da decisão; a postura correta, em tais casos, inclusive para não surpreender as partes, é o magistrado, verificando o vício do ato impugnado, proferir nova decisão, motivando e ratificando a anterior, ou, desde logo, tornando-a insubsistente – nunca é dar a fundamentação no ofício em que presta as informações.
Descabe a fundamentação do ato agravado ser dada no momento posterior, ou seja, no ofício em que o juiz presta as informações.
Reafirme-se, em decorrência, descaber requisição ao juiz da causa de informações que viessem a motivar ou completar a motivação de decisão interlocutória, que deve vir sempre com fundamentação suficiente e adequada, ainda que de forma concisa.
O inciso IV do art. 527 diz que o relator poderá requisitar informações ao juiz da causa e, no inciso V, que o relator intimará (ou melhor, mandará intimar) o agravado para que responda o recurso.
Ambos os núcleos do tipo (poderá e intimará) não excluem a sua apreensão hermenêutica da forma mais útil para o deslinde do recurso. Seria contrário ao espírito garantidor da Constituição em matéria processual, implementada esta inclusive pela recente reforma das leis processuais, sob a égide dos princípios da simplicidade, economicidade e efetividade, que se protele o julgamento do recurso pela desnecessária requisição de informações.
A celeridade do processo é direito fundamental da parte.
O novo regime do agravo buscou justamente simplificar e dinamizar procedimento que antes demandava tempo excessivo e que acabava por servir de instrumento procrastinatório na distribuição da Justiça.
Também não se justifica a requisição de informações ao juiz para que se complemente a formação do instrumento de agravo, salvo na excepcional hipótese em que se encontra o agravante impossibilitado de exibir a peça.
A formação do instrumento de agravo é ônus do agravante, como se extrai do disposto no art. 525, mencionando as peças obrigatórias e as peças facultativas.
A disposição legal não exclui o poder do relator de exigir do agravante a exibição de outras peças que se afigurem como necessárias para a apreciação da questão.
Inatendendo o agravante à determinação do relator para a exibição das peças necessárias à formação do instrumento, o que resta é a rejeição do recurso, o que deve ser pronunciada na oportunidade a que se refere o disposto no art. 557 da lei processual.
Quando foi editado o Código de Processo Civil, em 1973, ainda não estavam disseminadas as máquinas de reprografia dos documentos, razão pela qual o legislador não teve alternativa senão em atribuir ao cartório a formação do instrumento do agravo, a partir das peças obrigatórias (indicadas pela lei, em regra geral) e de outras peças (indicadas pelas partes, de acordo com o caso concreto).
À época, consistia a transcrição das peças processuais – por cópia manuscrita ou datilografada – um verdadeiro suplício que hoje dos servidores da Justiça não mais cabe exigir.
O ônus do recorrente de formar o instrumento de agravo muitas vezes é esquecido não só por relatores como até mesmo por juízes da causa; aqueles não raras vezes requisitam cópias do processo ao juiz, e estes esquecem do seu dever de neutralidade e, ao prestar informações, claramente no intuito de demonstrar que o agravante não tem razão, acrescem folhas e mais folhas de documentos, demonstrando que se sentem agastados com o agravo interposto contra a sua decisão, não contra a sua pessoa...
Em agravo que, por sua abrangência, conferia competência funcional à instância superior para a cognição quase completa da causa, já aconteceu a este magistrado, funcionando na instância originária e buscando atender à exigência do relator de que fossem prestadas minuciosas informações, determinar, à guisa de informações, a remessa de alentados autos; contudo, os autos retornaram rapidamente, com a ordem de que as informações deveriam vir por escrito do juiz...
Compelido a prestar informações, não deve o juiz da causa desviar-se da sua linha de imparcialidade, abstendo-se de evidenciar posturas incompatíveis com a sua função.
Tal orientação deve ser seguida não só nas informações em sede de agravo, como em mandado de segurança e habeas corpus.
Neste sentido, rememore-se, como fonte de orientação, que em julho de 1992 o Corregedor-Geral da Justiça do Rio Grande do Sul recomendou aos juízes que, quando solicitados a prestar informações em ações autônomas de impugnação a seus atos, procedessem:
1 – com a máxima prioridade e celeridade (em caso de agravo – adite-se – ainda em prazo inferior aos dez dias referidos no art. 527, I,2 quando o relator declarar que apreciará o pedido liminar com a vinda das informações);
2 – com a maior imparcialidade, relatando objetivamente a situação fático-jurídica, salientando o tópico alusivo ao fundamento do fato invocado;
3 – omitindo qualquer consideração de caráter jurídico dispensável;
4 – abstendo-se de sustentar ponto de vista a justificar o procedimento informante na condução do processo;
5 – anexando cópias do processo, quando expressamente requisitadas ou quando necessárias ao bom esclarecimento dos fatos e circunstâncias mencionadas nas informações (adite-se que, no caso de agravo, em face do ônus do recorrente de formar adequadamente o instrumento, basta ao magistrado aludir nas informações à existência da peça, se importante para o julgamento do recurso);
6 – enviando a informação direta e imediatamente à autoridade requisitante (em alguns tribunais, há normas administrativas permitindo que se faça através de fax a comunicação entre os órgãos); e
7 – verificando não ser a autoridade coatora (no caso de agravo, não ser o juiz da causa), desde logo encaminhando a requisição àquele que o seja efetivamente, comunicando-se ao tribunal.
Ao prestar informações no agravo de instrumento, deve o juiz restringir-se, tanto quanto possa, ao thema decidendum, buscando não adiantar o seu entendimento sobre questões que não foram objeto da decisão agravada ou que devam ser decididas em momento processual ulterior.
É importante que o juiz faça constar nas informações se o agravante juntou a cópia da petição, o comprovante de sua interposição e a relação dos documentos que instruíram o recurso, como determina o disposto no art. 526.
Não importa, neste trabalho, qual a consequência do descumprimento, pela agravante, do ônus referido no art. 526, embora o signatário incline-se pela postura de Cândido Rangel Dinamarco de que o retardamento ou o descumprimento do preceito não inviabiliza o recurso, mas somente possível retratação do juiz da causa; em sentido contrário, Carreira Alvim entende que a omissão do agravante acarretará a inadmissibilidade do recurso.
A nova redação que se conferiu ao art. 526 do CPC, no seu parágrafo único, resolveu a dissenção doutrinária: o não cumprimento do disposto neste artigo, desde que arguido e provado pelo agravado, importa inadmissibilidade do recurso.
De qualquer forma, caso o relator esteja filiado à última corrente, poderá conferir prazo ao agravante para comprovar o cumprimento do disposto no art. 526; o que não tem cabimento é que as informações sejam solicitadas tão-somente para saber se tal ônus foi adimplido...
Conclui-se, por último, que as informações do juiz da causa, no agravo de instrumento, não podem ser transformadas em meio de protelar ou denegar o conhecimento do recurso, nem, muito menos, de instrumento de desrespeito à dignidade da própria Justiça, além do que, com a nova regra prevista no art. 522, do CPC, introduzida pela Lei nº 11.187/2005, passando a prever, em regra, o agravo retido foi diminuído consideravelmente o número de agravos de instrumento e, por consequência, o de informações.
“PODER JUDICIÁRIO
JUÍZO DE DIREITO DA 6ª VARA DE FAZENDA PÚBLICA
CARTÓRIO DA DÍVIDA ATIVA DO MUNICÍPIO
COMARCA DA CAPITAL
Av. Erasmo Braga, nº 115 - sala 102 - Corredor D
Ofício nº ____/99.
Rio de Janeiro, 9 de abril de 1999.
Senhor Desembargador Relator,
Acuso o recebimento do ofício ST/SJ/SCC-17/18 nº 462/99, onde V. Exa. solicita informações para instruir o Agravo de Instrumento nº 3.055/99, sendo agravante P. do Brasil Ltda. e agravados Coordenador da Coordenadoria do Imposto Sobre a Propriedade Territorial Urbana da Secretaria Municipal do Rio de Janeiro e outro.
Informo a V. Exa. que a agravante cumpriu o disposto no art. 526 do Código de Processo Civil e que mantive a decisão agravada, explicitando-a, conforme cópia em anexo.
Na oportunidade, renovo a Vossa Excelência protestos de elevada estima e distinta consideração.
MARIA CRISTINA BARROS GUTIÉRREZ
Juíza de Direito
Ao Exmo.
Sr. Dr.Desembargador Raul Celso Lins e Silva
MD. Desembargador Relator do Agravo de Instrumento nº 3.055/99.
17ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro
PODER JUDICIÁRIO
JUÍZO DE DIREITO DA 6ª VARA DE FAZENDA PÚBLICA
CARTÓRIO DA DÍVIDA ATIVA DO MUNICÍPIO
COMARCA DA CAPITAL
Processo nº: 1.08.000843 (99.001.036352-0)
Mandado de Segurança
Impetrante: P. do Brasil Ltda.
Impetrados: Coordenador da Coordenadoria do IPTU da Secretaria Municipal de Fazenda e Outro
Decisão
Mantenho a decisão agravada, explicitando-a:
Afirma a agravante que o Município vem adotando alíquotas progressivas na cobrança do IPTU, através das alterações introduzidas pela Lei 2.687, de 26.11.1998, o que seria conflitante com o entendimento remançoso do Supremo Tribunal Federal, vencido, tão somente, o Ministro Carlos Mário Veloso.
Ante a nova redação do art. 481, parágrafo único, do Código de Processo Civil, não faltará quem sustente a vinculação dos órgãos fracionários dos Tribunais àquela decisão da Suprema Corte. De toda a sorte, qualquer interpretação que se extraia do mencionado dispositivo não conduz à vinculação dos órgãos judiciais monocráticos, que, assim, se capacitam, nos limites da ordem jurídica, com suficiente autonomia para apreciar as causas em face dos relevantes valores em conflito.
Em sede de juízo cautelar, não há como se afastar, ainda que em cognição sumária, do juízo de delibação do mérito.
O tema foi exaurientemente tratado pelo Ministro Sepúlveda Pertence no célebre acórdão do Agravo Regimental à Suspensão de Segurança nº 846 (DJU 08.11.1996).
A plausibilidade para a concessão da liminar decorre da própria divergência jurisprudencial sobre o tema, especialmente do Supremo Tribunal Federal, como anteriormente apontado.
Em se tratando de inconstitucionalidade de lei municipal, deve o aplicador da lei observar as seguintes diretrizes:
a) o controle da constitucionalidade das leis constitui fundamento do Estado Democrático de Direito. A inconstitucionalidade só se proclama acima de qualquer dúvida razoável (‘beyond all reasonable doubt’);
b) incide a regra da presunção de legitimidade dos atos estatais (art. 19, II, da CF/1988), até mesmo, em respeito ao princípio da separação dos Poderes da República, quando a jurisdição constitucional é exercida pelo órgão judiciário a quem a Constituição expressamente deferiu a sua guarda; no caso brasileiro, o Supremo Tribunal Federal;
c) o princípio da ‘interpretação conforme a Constituição’ consiste, precisamente, na opção do julgador pela validade da norma infraconstitucional se dela se possa extrair ao menos uma exegese que se mostre compatível com a Lei Maior;
d) a instituição do IPTU compete ao Município desde a Constituição de 1934, circunstância suficiente a indicar, desde logo, a plausibilidade de sua cobrança, mesmo porque, nos termos do pacto federativo ora em vigor, constitui a grande fonte de arrecadação dos recursos que custearão os relevantes serviços que ao ente local a Carta da República deferiu com exclusividade.
Na esteira de outros ordenamentos jurídicos das grandes cidades, a Lei municipal no 2.687/1998 definiu as alíquotas diferenciadas em razão da localização e da metragem do imóvel tributado pelo critério de maior incidência do tributo nas zonas que mais recebam os serviços públicos municipais.
Tal critério – dito progressivo – não excluiu, nem poderia fazê-lo, o poder tributante municipal.
O Supremo Tribunal Federal jamais disse, e nem poderia, que o IPTU – ao menos na sua vertente tradicional de critério linear independentemente da situação do prédio e dos serviços municipais prestados na respectiva zona – não deve ser exigido, quer por sua tradição histórica no direito pátrio, quer pelo que representa no antes apontado custeio.
Ocorreu, no caso, o fato gerador da obrigação tributária. A relação jurídica tributária existe, e isso, nem mesmo o impetrante nega. O lançamento é que teria sido inadequado, vale dizer, na linha posta pelo Supremo Tribunal Federal, a dita “progressividade” com alíquotas diferenciadas é que seria inconstitucional.
A Lei nº 2.687/1998, em seu art. 67, estabeleceu alíquotas diferenciadas na cobrança do IPTU. Inconstitucional, assim, na interpretação da Suprema Corte, seria apenas aquilo que exceder a alíquota mínima, vale dizer, 0,15% para os imóveis residenciais e 0,65% para os não residenciais.
Trata-se, no caso, da aplicação do princípio da Proporcionalidade também denominado princípio da Proibição ou da Redução do excesso (De Otto y Pardo, Ignacio, ‘La garantía del contenido essencial del artículo 53.1 de la Constitución Espanõla’, en Derechos Fundamentales y Constitución, Martin Retortillo, Lorenzo y De Otto y Pardo, Ignacio, Editorial Civitas S.A., Madrid, Espanã, 1988, p. 106).
Reduz-se apenas o excesso inconstitucional.
Aliás, o princípio da redução do excesso tem sede constitucional no art. 17 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) e nas legislações infraconstitucionais, como, v.g., o art. 924 do Código Civil in verbis:
‘Art. 924. Quando se cumprir em parte a obrigação, poderá o juiz reduzir proporcionalmente a pena estipulada para o caso de mora, ou de inadimplemento’.
Inúmeros exemplos podem ser encontrados nos diversos ramos do Direito, inclusive, no Direito Penal, na legítima defesa, no furto de pequeno valor com o princípio da bagatela, na sentença ultra petita com a redução do ato jurídico etc.
Ante tais considerações, mantenho a decisão agravada que, inobstante entendimento em contrário desta magistrada, curvou-se à orientação do Supremo Tribunal Federal, a reputar inconstitucional o critério ‘progressivo’, isto é, no caso, as alíquotas superiores a 0,15% para imóveis residenciais e 0,65% para os não residenciais.
Oficie-se, com cópia da presente ao eminente Relator.
Rio de Janeiro, 16 de abril de 1999.
MARIA CRISTINA BARROS GUTIÉRREZ
Juíza de Direito”
1 Theotonio Negrão, CPC e legislação processual civil em vigor, 27ª ed., São Paulo, Ed. Saraiva, notas ao art. 522.
2 Destaca-se que, em razões das sucessivas Reformas, hoje a referência é o inciso IV.