Um estudo monográfico, em alentado livro, dos fundamentos e técnicas da sentença cível, obra inédita em nossa bibliografia jurídica, há de pronto merecer espaço nas bibliotecas em geral e atenção de todos que militam nas lides forenses.
Convidou-me Nagib Slaibi Filho a prefaciar obra sua de tal envergadura, o que faço sensibilizado pela honrosa escolha. Malgrado não fosse o personagem talhado a tal mister, orgulho-me de ter, como julgador de primeiro grau, proferido cerca de quinze mil sentenças cíveis.
A análise do presente livro se iniciará evocando-se as sempre notáveis lições de Carnelutti, verbis: “Come faccia il giudice a decidere, questo è il problema, che la scienza del diritto dovrebbe risolvere. L’iter della soluzione è certamente quello che procede dalla decisione singolare alla decisione collegiale; bisogna cominciare a sapere como decide il giudice singolo per arrivare, poi, a capire come decidono più giudici insieme” (Tratado del processo civile – diritto e processo, 1958, p. 212).
Assim, em princípio, a sentença monocrática (ou de 1º grau de jurisdição), tal como ocorre no direito italiano, se identifica com a sentença colegiada (de 2º grau), esta entre nós denominada de acórdão (vocábulo derivado da terceira pessoa do plural do presente do indicativo do verbo acordar – acordam).
Na dimensão do trabalho exercido por um só magistrado, a sentença encerra um juízo de razão unívoco, impessoal, indelegável e imodificável (salvo, no último caso, para correção de erro material).
A possibilidade do error in judicando de um só juiz é, na lógica do razoável, bem maior do que a de um colegiado de juízes experientes onde todos, saudável e reciprocamente, convergem para a rebusca do ideal de justiça, a vingar o velho ditado “a união faz a força”, até mesmo nos votos divergentes.
Melhor e mais justa será a sentença monocrática, quanto mais diligente e atento for o magistrado pelo peso da responsabilidade de julgar o próximo, pelo temor de errar, a par e passo com seu destemor em decidir, sua inquebrantável imparcialidade, elegante sensibilidade, incansável ideal de perfeição e da paz social.
Nenhum juiz tem o direito de errar, ser displicente, radical, insensível ao drama do conflito de interesses, omisso, pusilânime ou esmorecido por suas deficiências.
Como manifestação desse ser humano a rigor falível, mas que não pode falhar, a sentença tem sido analisada, em sua natureza, como um ato de vontade ou um ato de inteligência. De um modo ou de outro, o direito nela se concretiza por meio do pedido meramente declaratório, constitutivo, condenatório, mandamental ou executivo, as duas últimas classes valorizadas na doutrina de Goldschmidt, Lopes da Costa e Pontes de Miranda, dentre outros.
É evidente representar a sentença os exatos lindes do pedido e da resposta (sententia debet esse conformis libello), decidir os fatos controvertidos e não os incontroversos (ubi partes sunt concordes nihil ad judicio) e se conformar ao alegado e provado (judex debet judicare secundum allegata et probata), devendo ser interpretada restritivamente (sententia est strictijuris et stricto modo intelligi debet), sendo essenciais a seu estudo a natureza jurídica, os requisitos, as espécies, os efeitos, as qualidades intrínsecas e os provimentos de ofício.
Proferida a sentença, functus est officium judicis.
Historicamente, só era sentença a definitiva de mérito. Mas em nosso Código de Processo Civil, visando à simplificação recursal, tomou o caráter de decisão terminativa do processo com ou sem julgamento do mérito. Quando o mérito for decidido, não haverá procedência ou improcedência da ação, e sim do pedido ou da pretensão, não sendo raro esse equívoco em inúmeras sentenças.
Todos esses assuntos e os demais relativos à sentença foram desenvolvidos e didaticamente cuidados no presente livro – sempre seguidos de ricos exemplos, sendo seu autor consagrado professor de direito constitucional e processual, doutrinador com várias obras publicadas. Magistrado há nove anos, antes tendo sido promotor de justiça, cargos conquistados em brilhantes concursos, está agora a merecer a inclusão de seu nome no honorífico rol dos notáveis processualistas pátrios.
Já de muito se fazia ausente em nossas letras jurídicas um estudo completo, epistemológico e pragmático, da sentença. Seu êxito editorial e cultural é, por tudo acima, de óbvio prognóstico.
Desembargador João Carlos Pestana de Aguiar Silva