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29 de abril, 07h05 PDT
Lee Vining, Califórnia
O que é mais uma cidade-fantasma aqui nas montanhas?
Jenna ia na parte de trás de um veículo militar com Nikko. O husky arfava ao seu lado, entusiasmado por estar em casa. Os dois homens que os escoltavam iam sentados à frente, o primeiro-marinheiro Schmitt novamente atrás do volante. O grupo chegara de helicóptero ao pequeno aeroporto de Lee Vining e atravessava agora a cidade evacuada em direção à estação dos guardas-florestais.
Habitualmente, a esta hora da manhã, a pequena cidade à beira do lago fervilhava com a presença de turistas vindos da cidade vizinha de Yosemite ou dos muitos motéis ao longo da autoestrada 395. Hoje, nada se movia na rua principal, à exceção de uma solitária planta estepicursora que rolava pela linha central amarela, empurrada pelos ventos cada vez mais fortes.
Enquanto o sol brilhava a leste, nuvens escuras carregavam os céus a oeste, amontoando-se sobre as montanhas da Sierra Nevada e ameaçando avançar sobre a baía a qualquer momento. A previsão meteorológica anunciava chuva e ventos fortes. Pensou naquelas terras desertas e mortíferas no topo das colinas e imaginou a água da chuva a escorrer por elas até chegar ao lago e até mais além.
No entanto, não era o gás VX que fazia todos observar o céu. O último relatório toxicológico mostrava que a potência daquele agente tóxico diminuíra rapidamente assim que entrara em contacto com o solo.
No que ela pensava era naquelas terras desertas e escuras… e no que lá estava a incubar.
Graças a Deus, já não está ninguém na cidade.
A evacuação de Lee Vining, com uma população de cerca de duzentas pessoas, sem contar com os turistas, não demorara muito. Jenna olhava fixamente para o letreiro amarelo do restaurante Nicely, anunciando um especial de pequeno-almoço que nunca seria servido. Um pouco mais à frente, o centro de informações e a livraria do Comité do Lago Mono ainda tinha a bandeira da América pendurada do lado de fora, embora estivesse trancado e com as persianas de metal completamente fechadas.
Será que alguém poderia um dia voltar para aqui?
Por fim, o veículo saiu da autoestrada para a rua do Centro Turístico. A estrada subia em direção à estação dos guardas-florestais, que ficava sobranceira ao lago Mono. Nem sequer se incomodaram a estacionar no parque de estacionamento e conduziram até à enorme entrada envidraçada. O edifício também servia de centro turístico, com placares informativos, duas galerias de arte e um pequeno auditório.
Uma figura familiar abriu a porta enquanto eles paravam o carro. Bill Howard levantou o braço para os cumprimentar. Estava vestido com calças de ganga, uma camisa castanha e um casaco dos guardas-florestais da mesma cor. Apesar de já ir a meio dos sessenta, mantinha o corpo firme e em boa condição física. O único indício da sua idade eram as rugas no canto dos olhos causadas pelo sol.
Jenna estava muito feliz por vê-lo, mas não era a única. Nikko saltou da carrinha e correu até Bill. O cão saltou para dar um abraço de urso ao seu colega guarda-florestal. Era falta de disciplina, mas Nikko só se comportava desta forma com Bill, que, por sua vez, não se importava nada. Mas também, Bill tinha três cães.
Jenna abraçou Bill calorosamente.
— Que bom ver-te.
— Digo o mesmo, miúda. Parece que tiveste uns dias bastante excitantes.
Excitantes era dizer pouco.
Drake desceu do veículo e juntou-se a eles.
— Senhor, recebeu a informação que o diretor Crowe enviou?
Bill endireitou as costas, mostrando-se profissional.
— Recebi, sim, e já recolhi todas as imagens das câmaras de trânsito e das câmaras web. Sigam-me.
Atravessaram o centro turístico e entraram na estação dos guardas-florestais propriamente dita. O gabinete das traseiras era pequeno, com espaço para apenas algumas secretárias, uma fila de computadores e um grande quadro branco ao fundo. Jenna viu uma longa lista de veículos registada no quadro, juntamente com as matrículas, trinta e duas no total.
Nas últimas dezasseis horas, Painter Crowe conseguira pôr uma lista inteira de pessoal a trabalhar na estação de investigação na montanha. Também reunira informação sobre todas as suas viaturas e quaisquer veículos de aluguer utilizados. Demorara um período exasperante de tempo para o fazer devido ao nível de segurança e às múltiplas agências governamentais envolvidas… mas o maior atraso devia-se ao simples facto de o dia anterior ter sido domingo.
Quem diria que a segurança nacional estava tão dependente do dia da semana?
Bill Howard acenou na direção de uma fila de três computadores.
— Coloquei câmaras desde aqui até Mono City e, na eventualidade de o vosso alvo escapar por estas sem ser visto, consegui obter as imagens das câmaras web em Passo Tioga em direção a Yosemite e na autoestrada 395.
— Isso deve cobrir toda a área a sul do lago — explicou Jenna a Drake.
O sargento artilheiro acenou com a cabeça, satisfeito.
— O Crowe pôs o departamento do xerife em Bridgeport a fiscalizar as estradas a norte daqui. Se alguém daquela base é um sabotador e fugiu de lá, devemos ser capazes de cruzar a informação do veículo com a dos carros que passam por uma ou mais destas câmaras.
Jenna pensou nos portões abertos que conduziam à estação de investigação. Seria um esforço hercúleo verificar cada carro e compará-lo com a informação da lista, mas tinha de ser feito. Era a melhor pista que tinham. Isto é, se a sua teoria do sabotador estivesse certa.
Talvez alguém se tenha simplesmente esquecido de fechar o portão.
Só havia uma maneira de saber.
— Vamos pôr mãos à obra — disse Jenna.
Apesar de a tarefa ser extremamente aborrecida, Jenna não se queixava. Havia quem estivesse bem pior.
07h32
— Como é que ele está? — perguntou Painter à enfermeira.
A mulher, uma jovem fuzileiro que pertencia ao pessoal médico do MWTC, retirou as luvas descartáveis enquanto saía da sala isolada da ala de quarentena. Parecia exausta após terminar o turno da noite, seguido de um processo de descontaminação que demorava uma hora.
Virou-se e olhou pela janela de vidro para a sala de recuperação improvisada. A unidade de isolamento de pacientes do laboratório de biossegurança nível 4 ocupava um canto do amplo hangar. As instalações de isolamento tinham sido trazidas por via aérea pelo Instituto de Investigação Médica de Doenças Infeciosas do Exército dos Estados Unidos (USAMRIID) de Fort Detrick e rapidamente instaladas no local.
Tinha uma única cama e um paciente.
Josh encontrava-se deitado, ligado por tubos e fios a uma enorme quantidade de equipamentos médicos. A sua pele estava pálida, a sua respiração débil. A sua perna esquerda — o que restava dela — encontrava-se suspensa no ar. Um cobertor fino escondia a ponta do coto.
Duas outras figuras moviam-se no interior, um médico e uma enfermeira, ambos protegidos por fatos de biossegurança, ligados à parede por tubos de oxigénio.
— Ele está o melhor que poderia estar, tendo em conta as circunstâncias — respondeu a enfermeira, retirando a touca cirúrgica e revelando o cabelo castanho-avermelhado pela altura dos ombros. Era uma mulher bonita, mas a preocupação carregava-lhe as feições. — Segundo o médico, é capaz de precisar de mais cirurgia.
Painter fechou os olhos para respirar fundo. Lembrou-se do golpe do machado, da fuga desenfreada das montanhas, da frustração do tempo perdido a mover Josh em segurança para aqui. A cirurgia teria de ser realizada sob o mesmo nível de isolamento, com cirurgiões a tentarem arduamente reparar o ferimento grave com luvas volumosas. Lisa tinha o mesmo tipo de sangue do irmão e doou duas unidades — mais do que deveria ter doado —, chorando a maior parte do tempo.
Ele sabia o quanto fora difícil para Lisa tomar aquela decisão no terreno. De início, mantivera a compostura, consciente de que, naquela altura, Josh precisava de um médico, não de uma irmã. No entanto, assim que tinham chegado aqui, depois de Josh ter sido levado para a sala de operações, Lisa foi-se abaixo, quase desmaiando de tanto desespero e preocupação.
Painter tentara convencê-la a tomar um sedativo, a dormir, mas ela recusara.
Somente uma coisa a mantinha sã, a fazia continuar.
Painter olhou fixamente para o lado oposto do hangar, para outro aglomerado de estruturas com paredes brancas. Era o laboratório de biossegurança nível 4, instalado pela equipa do CCPD. Lisa passara a noite toda com esse grupo. A perda da perna não era a única preocupação.
— Há algum indício de contaminação? — perguntou Painter à enfermeira.
Ela abanou ligeiramente a cabeça, encolhendo os ombros.
— Estamos a fazer análises regulares ao sangue, a monitorizar a temperatura e a manter-nos alerta para alguma resposta do sistema imunitário. A cada meia hora, verificamos o corpo dele à procura de alguma lesão que venha do interior. É tudo o que podemos fazer. Ainda não sabemos o que temos de procurar, nem com o que estamos a lidar.
A enfermeira olhou na direção de um complexo maior de laboratórios de biossegurança nível 4 do outro lado do hangar.
Todos estavam à espera de mais informação.
Há vinte minutos, Painter recebera informações de uma equipa estacionada na zona de impacto. A destruição, o que quer que ela fosse, continuava a espalhar-se sem limites, consumindo vários hectares no período de algumas horas.
Mas que raio estava a causar aquilo?
Agradeceu à enfermeira e dirigiu-se para o melhor lugar para descobrir uma resposta para esta pergunta.
Ao longo das últimas vinte e quatro horas, Washington enviara pessoal por avião, mobilizando especialistas de várias disciplinas: epidemiologistas, virologistas, bacteriologistas, geneticistas, bioengenheiros, qualquer pessoa que pudesse ajudar. Toda a região fora isolada num raio de oitenta quilómetros da zona de impacto. As equipas de jornalismo lutavam pela cobertura da história nos limites do perímetro de segurança, montando acampamentos na zona.
Estava a ficar de loucos por ali.
À distância, o ribombar de um trovão ecoou pelas montanhas, fazendo estremecer o telhado de metal do hangar.
Até a Mãe Natureza parecia determinada a piorar a situação.
Painter andou mais depressa em direção ao complexo dos laboratórios.
Precisamos de uma oportunidade… nem que seja uma bem pequena.
07h56
— Vejam isto — gritou Jenna do seu computador.
Drake fez deslizar a sua cadeira para o terminal de Jenna, trazendo consigo o aroma intenso da sua masculinidade. Bill esticou as costas para aliviar uma dor na parte inferior das costas e juntou-se a eles. Até Nikko levantou a cabeça do chão, onde estava a roer um brinquedo que Jenna mantinha debaixo da secretária para o distrair enquanto trabalhava.
No monitor, Jenna tinha a imagem parada de um Toyota Camry branco. Esta provinha de uma câmara meteorológica na autoestrada 395, a sul da cidade. Infelizmente, a qualidade da imagem era má.
Apontou para o quadro branco ao fundo da sala, que incluía um Camry branco na lista de carros suspeitos.
— Não consigo perceber a matrícula, mas o condutor ia muito rápido — disse Jenna.
Carregou no botão do play e o veículo em questão percorreu a grande velocidade o troço da autoestrada.
— Cento e vinte ou cento e trinta quilómetros por hora — estimou Bill.
— A marca e o modelo do carro são bastante vulgares — comentou Drake, cético. — Podia ser apenas alguém a regressar a casa.
— Sim, mas observe quando se cruza com outro carro que circula na faixa contrária.
Jenna recuou a imagem e passou-a em câmara lenta, imagem a imagem. Numa delas, o Toyota cruzou-se com um monovolume que circulava na faixa contrária. Os faróis dianteiros do monovolume bateram no para-brisas no ângulo certo de forma a iluminar por completo o condutor do Toyota. Mais uma vez, a resolução da imagem não permitia uma identificação muito clara.
Drake semicerrou os olhos e disse:
— Louro-escuro, talvez, cabelo pelos ombros a comprido. Ainda não passa de um vulto.
— Sim, mas repare no que ela tem vestido.
Bill assobiou.
— Ou ela está vestida com um fato completo branco ou aquilo é uma bata de laboratório — disse Bill.
Jenna virou-se para o quadro branco.
— Qual é o investigador que consta na lista que conduz um Camry branco?
Drake fez deslizar a cadeira e pegou no seu tablet que se encontrava em cima da secretária. Pesquisou até encontrar o ficheiro de um funcionário governamental que correspondesse.
— Diz aqui que pertence a Amy Serpry, bióloga de Boston, uma contratação recente. Há cinco meses.
— E tem fotografia?
Drake bateu no ecrã, estudou a imagem e depois virou o tablet para eles, dizendo:
— Loura, cabelo num rabo de cavalo. Mesmo apanhado, parece-me bastante comprido. — O fuzileiro sorriu para Jenna, o que provocou nela uma sensação bastante agradável. — Acho que é agora que dizemos jackpot.
Jenna queria ter mais certezas e continuou:
— O que sabemos sobre ela?
Painter providenciara tudo o que conseguira sobre cada investigador: registos, avaliações, verificações de antecedentes, até mesmo todos os artigos publicados com os seus nomes.
Drake deu uma vista de olhos nos aspetos mais importantes da sua biografia.
— Ela é de França, tornou-se cidadã americana há sete anos, fez doutoramentos nas universidades de Oxford e Northwestern.
Não admira que o doutor Hess a tivesse contratado. Além do currículo, pelo que a sua fotografia dava a entender, era muito bonita, uma qualidade que provavelmente nunca atrapalharia a contratação por parte do clube dos rapazes que é a comunidade científica.
Drake continuou a ler em silêncio, claramente à procura de alguma coisa que se destacasse.
— Ouçam isto — disse Drake, por fim. — Ela foi uma das figuras mais importantes num movimento que defendia o livre acesso à informação científica. O movimento era a favor de uma maior transparência. Ela até escreveu um artigo de opinião de apoio a um virologista holandês, que publicou na Internet truques genéticos para tornar o vírus H5N1, a gripe das aves, mais contagioso e mortífero.
— Ela não se importou que isso fosse publicado? — perguntou Bill.
Drake leu mais um pouco e respondeu:
— Não era contra.
Jenna respirou fundo e disse:
— Devíamos contar tudo isto ao departamento do xerife e ao diretor Crowe. Aquele Camry é um modelo de 2009. É provável que esteja equipado com um GPS.
— E com o número de identificação do veículo — disse Bill —, devemos conseguir localizá-lo.
— Vale a pena tentar — concordou Jenna.
Drake levantou-se e fez sinal para que ela o seguisse.
— Entretanto, devíamos voltar para o helicóptero e estar preparados para avançar na eventualidade de a conseguirem localizar.
Jenna sentiu-se orgulhosa por estar incluída… não que ela aceitasse que fosse de outra forma.
— Vão. — Bill pegou no telefone. — Vou pôr tudo em movimento e alerto-vos assim que souber alguma coisa.
Com Nikko a segui-los de perto, Jenna e Drake saíram apressadamente do gabinete e atravessaram o centro turístico até às portas da frente. Assim que ela saiu, alguns pingos de chuva fria bateram-lhe no rosto.
Observou o céu e não gostou do que viu.
Uns quantos relâmpagos iluminaram os contornos das nuvens negras.
Drake franziu o sobrolho, num reflexo da expressão de Jenna.
— Estamos a ficar sem tempo.
Ele tinha razão.
Jenna apressou-se em direção ao veículo que os esperava.
É melhor que alguém encontre algumas respostas… e rapidamente.
08h04
Lisa estudou o rato na gaiola, observando-o a remexer o ninho, a empurrar as aparas de madeira com o focinho rosado. Ela tinha empatia pela pequena criatura, sentindo-se igualmente encurralada e ameaçada.
Os sujeitos da experiência encontravam-se numa gaiola dividida em duas secções, separadas por um filtro HEPA espesso. Do lado oposto, estava um monte preto de pó… o que restava de uma das plantas mortas.
Escreveu uma nota no computador, um autêntico desafio com as luvas grossas do fato NBQ postas.
CINCO HORAS E NÃO HÁ SINAL DE TRANSMISSÃO
Já tinham realizado uma série de experiências com vários tamanhos de poros e espessura de filtros, tentando avaliar o tamanho do agente infecioso. Até agora, este era o único rato que continuava sem mostrar sinais de contaminação. Os outros estavam todos doentes ou a morrer devido à falência de vários órgãos.
Lisa tentava desesperadamente não pensar no irmão, fechado numa unidade de isolamento do outro lado do hangar.
Há algumas horas, Lisa realizara uma necrotomia, juntamente com um dos histopatologistas, a um dos ratos na fase inicial da infeção. Os pulmões e o coração eram os órgãos mais gravemente afetados, com petéquias nos alvéolos e rabdomiólise das fibras musculares cardíacas. O coração estava, literalmente, a derreter. As lesões iniciais a manifestarem-se de forma tão dramáticas no peito sugeriam que era transmitido pelo ar.
Fora por essa razão que começaram a fazer testes com uma série de filtros.
Lisa continuou a escrever no computador.
AVALIAÇÃO: AS PARTÍCULAS INFECIOSAS TÊM DE TER
MENOS DE 15 NANÓMETROS
Então, de certeza que não é uma bactéria.
Uma das mais pequenas espécies bacterianas conhecidas era a Mycoplasma genitalium, que podia medir entre 200 e 300 nanómetros.
— Tem de ser um vírus — murmurou ela.
Contudo, mesmo o vírus mais pequeno conhecido pelo homem era o Circovirus porcino, que media 17 nanómetros. A partícula transmissível neste caso era ainda mais pequena que isso. Não era de admirar que estivesse com dificuldades em obter uma imagem desta, para examinar a sua estrutura.
Há duas horas, um técnico do CCPD finalmente terminara de instalar e calibrar um microscópio eletrónico de varrimento no interior de um laboratório dentro do hangar. Com alguma sorte, em breve poderiam confrontar o adversário.
Lisa suspirou, querendo esfregar as têmporas para se livrar de uma forte dor de cabeça, mas, com o fato vestido, nem sequer conseguia afastar do rosto alguns cabelos que lhe faziam comichão no nariz. Já tentara soprá-los para o lado, antes de desistir. Sabia que a exaustão estava a levar a melhor, mas recusava-se a abandonar os laboratórios que estavam a conduzir vários passos da investigação.
O rádio fez barulho ao seu ouvido e, em seguida, o epidemiologista responsável, o doutor Grant Parson, falou:
— Todos os investigadores devem dirigir-se à sala de conferências central para uma reunião.
Lisa colocou uma palma de borracha por cima da jaula de plástico.
— Continua a aguentar-te, amiguinho.
Levantou-se, desprendeu a sua mangueira de oxigénio da parede e levou-a consigo pela área isolada que ia do laboratório de testes in vivo em animais para o resto do complexo. Cada laboratório estava separado dos outros, compartimentando a investigação e limitando a hipótese de disseminação da doença pelo complexo.
Chegou à sala central. A cada duas horas, os cientistas reuniam-se na sala para comparar notas e discutir o seu progresso. Para facilitar estas reuniões, fora instalada uma mesa comprida com monitores adicionais para ajudar a comunicar por teleconferência com investigadores espalhados pelos Estados Unidos. Uma janela por trás da mesa dava para o hangar escuro.
Lisa viu um rosto familiar atrás do vidro.
Levantou o braço para Painter e apontou para a orelha. Ele tinha um intercomunicador na orelha e sintonizou uma frequência privada.
— Como estás? — perguntou ele, apoiando a mão no vidro.
— Estamos a fazer progressos lentamente — respondeu ela, embora soubesse que ele estava a fazer uma pergunta pessoal e não a pedir um relatório dos progressos da investigação.
Lisa evitou responder e fez uma pergunta muito mais importante:
— Como está o Josh?
Ela recebia informações regulares do pessoal médico, mas queria ouvi-lo de Painter, de alguém que conhecia o seu irmão pessoalmente.
— Ainda se encontra sedado, mas está a aguentar-se. O Josh é forte… e é um lutador.
Painter estava certo. O seu irmão era capaz de mover montanhas, mas até ele era incapaz de lutar contra o que não se conseguia ver.
— A boa notícia é que parece que os cirurgiões conseguiram salvar a articulação do joelho — acrescentou Painter. — Deve ajudar bastante a sua recuperação e a fisioterapia a seguir.
Lisa rezou para que existisse um «a seguir»
— E, quanto a… há algum indício de infeção?
— Não. Parece estar tudo bem.
Lisa sentiu-se reconfortada pelas notícias. O contacto de Josh com o agente fora através de um corte na pele e não inalara nada. A falta de sintomas podia dever-se apenas a um período de incubação mais longo para esse modo de exposição.
Um receio continuava a incomodá-la.
Será que lhe cortámos a perna a tempo?
O doutor Parson falou atrás dela:
— Vamos dar início à reunião.
Lisa colocou a palma da mão enluvada por cima da mão de Painter encostada ao vidro.
— Cuida dele por mim.
Painter acenou com a cabeça.
Lisa virou-se para os outros investigadores. Alguns estavam sentados, outros de pé, todos com os fatos especiais de biossegurança nível 4. Ao longo dos quinze minutos seguintes, o responsável de cada laboratório falou dos seus progressos.
Um edafologista, um cientista que estudava microrganismos, fungos e outras formas de vida escondidas no solo, foi o primeiro a falar. A ansiedade era evidente em cada palavra que dizia.
— Terminei uma análise completa aos solos da zona de impacto. Não é apenas a vegetação e a vida selvagem que está a ser exterminada. A uma profundidade de sessenta centímetros, encontrei amostras desprovidas de vida. Bactérias, esporos, insetos, minhocas. Todos mortos. O solo foi, basicamente, esterilizado.
Parson mostrou-se chocado e disse:
— Esse nível de patogenicidade… nunca se viu tal coisa.
Lisa pensou naquelas colinas negras, imaginando a mesma sombra a penetrar a grande profundidade no solo, sem deixar qualquer rasto de vida na sua passagem, enquanto se espalhava por toda a paisagem. Também ouvira relatos do tempo rigoroso que se abatia agora sobre a bacia do lago Mono. Era a receita para uma catástrofe ecológica de proporções incalculáveis.
Um bacteriologista falou a seguir.
— Por falar em patogenicidade, a nossa equipa passou as amostras infetadas por uma série de líquidos desinfetantes, com o objetivo de esterilizar as amostras do terreno. Experimentámos níveis extremos de alcalinidade e acidez. Soda cáustica, vários tipos de lixívia, e por aí em diante. No entanto, as amostras permaneceram infeciosas.
— E calor extremo? — perguntou Lisa, lembrando-se de que Painter achava que as colinas deviam ser queimadas para impedir que a destruição se espalhasse.
O investigador encolheu os ombros.
— Ao início, pensámos que tínhamos sido bem-sucedidos. Queimámos uma planta infetada até a reduzirmos a cinza… ao princípio, parecia ter resultado, mas depois de arrefecer continuou infeciosa. Acreditamos que o calor apenas coloca o micróbio num estado semelhante ao de um esporo ou quisto.
— Talvez seja necessário algo mais quente — disse Lisa.
— É possível. Mas qual será a medida certa de calor? Já discutimos um nível de calor nuclear. Mas, se as chamas de uma bomba atómica não matarem o agente, a explosão pode espalhá-lo e aerossolizá-lo por muitos quilómetros.
Essa não era, definitivamente, uma opção.
— Continuem a procurar — incentivou Parson.
— Ajudaria sabermos contra o que estamos a lutar — concluiu o bacteriologista, o que lhe valeu muitos acenos de cabeça por parte dos outros cientistas.
Lisa explicou as suas próprias descobertas, confirmando que era provável estarem a lidar com algo de natureza viral.
— Mas é excessivamente pequeno — disse ela —, mais pequeno do que qualquer vírus conhecido. Sabemos que o doutor Hess estava a fazer experiências com extremófilos de todo o mundo, organismos capazes de se desenvolver em ambientes ácidos ou alcalinos, até mesmo alguns que conseguiam sobreviver no calor da lava de vulcões.
Lisa olhou diretamente para o bacteriologista e continuou:
— E, para piorar ainda mais a situação, sabemos que o doutor Hess se estava a aventurar nos limiares da biologia sintética. O seu projeto, Neogénesis, procurava manipular geneticamente o ADN de extremófilos, numa tentativa de ajudar espécies em vias de extinção, de forma a torná-las mais fortes e resistentes a mudanças climáticas. Nesta demanda, quem sabe que monstro conseguiu criar?
O doutor Edmund Dent, um virologista do CCPD, levantou-se e interveio:
— Acredito que captámos um vislumbre desse monstro. Através do microscópio eletrónico recentemente instalado.
Todos os olhos se viraram para ele.
— No início, pensámos que fosse uma falha técnica. O que encontrámos parecia demasiado pequeno… inimaginavelmente pequeno… mas, se a avaliação que a doutora Cummings fez em relação ao tamanho da partícula estiver certa, então é provável que não seja um erro. — Dent olhou de relance para ela. — Se quiser juntar-se a nós…
— Claro. Acho que também devemos ter connosco um geneticista e um bioengenheiro. Apenas na eventualidade de…
Uma buzina soou muito alto, atraindo todos os olhares para a janela. Uma luz azul brilhava na escuridão, girando ao mesmo tempo que se ouvia uma sirene. Vinha da unidade de isolamento de pacientes.
Lisa levantou-se em pânico.