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30 de abril, 06h02 PDT
Sierra Nevada, Califórnia

Aguenta-te, Josh…

Lisa estava sentada num banco desconfortável na unidade de isolamento de pacientes. Segurava a mão do irmão, desejando poder tirar as luvas e tocar-lhe verdadeiramente. Apesar de ele se encontrar mesmo ali, Lisa sentia um abismo entre eles. E não era apenas a barreira do fato de polietileno que os separava. O coma induzido roubara-lhe Josh: o seu riso rouco, a sua disposição brincalhona, o seu jeito envergonhado na presença de uma rapariga bonita, a sua expressão concentrada quando se pendurava de um penhasco preso por uma corda.

Desaparecera tudo.

Josh fora ligado ao ventilador há alguns minutos devido ao agravamento do seu estado. Cada inalação era demasiado brusca, demasiado regular. De um dos lados, os monitores crepitavam, zuniam e apitavam suavemente. Era tudo o que restava da vida energética e plena do seu irmão.

O rádio dentro do seu fato deu um estalido, o que a fez endireitar-se no banco. Preparou-se para receber mais más notícias. Em seguida, uma voz familiar e calorosa encheu a sua cabeça. Apertou com mais força a mão de Josh, como se tentasse encorajar o irmão a continuar a lutar, que Painter o salvaria.

— Lisa — disse Painter —, como te estás a aguentar?

Como achas que me estou a aguentar?

De repente, as lágrimas inundaram-lhe os olhos e correram pelas suas faces. Não tinha como as limpar. Engoliu umas quantas vezes para as disfarçar na sua voz.

— A… a situação por aqui não está boa — disse ela, com dificuldade em manter a compostura. — As coisas pioram a cada hora que passa. Não sei se ouviste, mas o Lindahl mandou enviar um dispositivo nuclear para as montanhas. Está a caminho e deve chegar esta tarde.

— E não há forma de o impedir?

— Não. Ao nascer do sol, uma equipa de agrimensores mapeou as áreas contaminadas ou, pelo menos, aquelas áreas que revelavam uma destruição efetiva. A situação é pior do que o que os relatórios da noite passada indicavam. O organismo ainda se está a espalhar e aproxima-se do que Lindahl chama massa crítica, o ponto em que até a opção nuclear pode não funcionar. Os cientistas nucleares ainda estão a calcular a carga e os níveis de radiação necessários para alcançar o nível de letalidade mais elevado.

Lisa colocou na voz a maior urgência que conseguia, tendo em conta o estado de exaustão em que se encontrava.

— Precisamos de respostas para travar este monstro nuclear. Ou, pelo menos, alguma esperança de solução.

Lisa olhou fixamente para o rosto de Josh, para a sua tez pálida.

Por favor.

— Somos capazes de ter uma boa pista — admitiu Painter, apesar de parecer hesitante, claramente preocupado. Fez-lhe um breve resumo do que acontecera no Brasil.

Lisa deu por si concentrada no final da história.

— Alguém raptou a Jenna…

Largou a mão de Josh e virou-se para o complexo de laboratórios de biossegurança nível 4 do outro lado do hangar. Nikko não se encontrava melhor que Josh. O cão estava a receber transfusões de plasma e plaquetas, cada vez mais moribundo a cada hora que passava. Na verdade, o pobre husky já estaria morto se não fossem os esforços hercúleos do doutor Edmund Dent. O virologista estava usar todos os recursos médicos existentes para ajudar Nikko e Josh. E, embora Edmund não tivesse conseguido reduzir a carga viral nos seus pacientes, os seus tratamentos paliativos pareciam abrandar o progresso dos sintomas clínicos.

Painter ofereceu um vislumbre de esperança.

— Estamos a caminho das instalações em Boa Vista administradas pela Universidade Federal de Roraima e associadas ao Projeto Genográfico. Há muitos anos que recolhem informação genética de todas as tribos indígenas brasileiras, utilizando marcadores autossómicos a fim de calcular padrões migratórios e subgrupos dentro das várias tribos. Compilaram uma base de dados extensa. A partir de uma amostra de sangue do homem que capturámos, somos capazes de conseguir descobrir a que tribo pertence.

— Qual é a importância disso?

— Lembra-te daquelas fotografias que a Jenna tirou dos homens que a atacaram na cidade-fantasma junto ao lago Mono?

— Sim.

— Ao que parece, os homens que nos atacaram aqui hoje são da mesma tribo nativa. Faz-me pensar se o Cutter Elwes não terá resolvido dar vida à obra Heart of Darkness na floresta tropical, integrando-se nessa mesma tribo e acabando por vergá-los à sua vontade. Se conseguirmos encontrar essa tribo, podemos descobrir não só Cutter Elwes… mas também a Jenna e o doutor Hess.

Uma onda de otimismo vibrante substituiu o seu desânimo. Respirou fundo, recompondo-se.

— Tens de encontrar alguma coisa — insistiu ela. — Algo que eu possa mostrar ao Lindahl e travar ou atrasar os seus planos.

— Vou dar o meu melhor.

— Eu sei que sim. Amo-te.

— E eu a ti, querida.

Lisa não ficou contente com a resposta reflexa de Painter.

— Diz que também me amas, para eu ouvir.

Painter riu-se, o que a fez sentir-se animada.

— Em frente aos rapazes, não.

Lisa imaginou Drake e os colegas à sua volta e deu por si a sorrir. Ouviu o mesmo sorriso na voz de Painter.

— Está bem — disse ele. — Também de amo.

Depois de se despedirem, Lisa sentiu-se revigorada, pronta para enfrentar qualquer coisa. O seu rádio voltou a fazer barulho. Tinha esperança de que fosse Painter, que se tivesse esquecido de dizer alguma coisa — tudo para ouvir novamente a sua voz — mas era Edmund Dent.

— Lisa, tens de voltar para o teu laboratório agora.

— Porquê? — disse ela, olhando nessa direção. — O Nikko piorou?

— Estava a trocar-lhe o saco de plasma e o Lindahl deixou o rádio a transmitir em alta-voz para toda a equipa ouvir. Ele tenciona deixar a equipa nuclear fazer experiências no Nikko. Querem descobrir os efeitos que a radiação terá no organismo quando é administrada em tecido vivo, a fim de calcular uma dosagem que seja suficientemente elevada para matar o vírus dentro do corpo.

— Estão a planear submeter o Nikko a radiação?

— Em dosagens cada vez maiores, enquanto recolhem biopsias do rim e do fígado, para descobrir quanta radiação é necessária para erradicar o vírus.

Todo o otimismo vibrante de há momentos transformou-se numa raiva implacável. Jenna arriscara a sua própria vida para os ajudar e eles tencionavam matar o seu cão, torturando-o, assim que ela virava as costas.

Por cima do meu cadáver.

Lisa apressou-se em direção à entrada da unidade de quarentena.

— É melhor despachares-te — avisou Edmund. — Acabei de ouvir outra ordem de Lindahl no rádio.

— O que foi agora?

— Ordenou à equipa de segurança de fuzileiros que te impedisse de entrar no teu laboratório se mostrasses qualquer sinal de resistência.

Aquele cretino…

Lisa abriu a porta com um puxão e iniciou o processo de descontaminação. Enquanto os jatos pulverizavam o exterior do seu fato, Lisa tinha dificuldade em encontrar uma solução, uma forma de salvar Nikko. Quando a luz verde piscou para avançar, autorizando-a a sair, Lisa tinha encontrado uma única possibilidade… um estratagema que envolveria grande risco pessoal.

Mas estava disposta a arriscar.

Pelo Nikko

Pela Jenna…

Devia-lhes isso, mas uma questão preocupava-a enquanto percorria o hangar mal iluminado em direção ao complexo de laboratórios de biossegurança nível 4.

Quanto tempo teria ainda Nikko? Quanto tempo teria qualquer um deles?

Apenas tinha certeza de uma coisa.

Alguém tinha de descobrir uma solução… e rapidamente.