Sua Eminência era um bispo criollo de família endinheirada, nascido em Veta Grande, Zacatecas, um homem culto e aficionado por história, filho de seu século, o das luzes, assim como Balmis. Um filantropo preocupado com o bem-estar dos fiéis, especialmente dos mais pobres, os quais defendeu durante os anos que exerceu a advocacia, sem jamais lhes cobrar nada, e aos quais destinava agora parte substancial do dízimo que arrecadava. Um homem que conquistara a simpatia de todos, fossem ricos ou pobres. Um homem que fez algo inaudito, desapegando-se dos imóveis que herdara, dividindo parte deles entre os mais necessitados e se rodeando dos objetos que mais apreciava: livros, quadros e esculturas de madeira talhada. Sua biblioteca impressionou Balmis não só pelos mais de cinco mil volumes que continha, mas porque refletia sua atitude ilustrada, já que, além dos livros do padre Feijoo, de Campomanes e Jovellanos, que tentavam aproveitar o Iluminismo como ferramenta para mudanças políticas e sociais da Espanha e de seus domínios, incluía títulos de Rousseau, Voltaire e Montesquieu, autores proibidos pela Inquisição. Inteligente, aberto e afável, ofereceu a Balmis o apoio econômico e logístico necessário para estabelecer uma junta central e uma clínica, além de seu entusiasmo para difundir a vacina pela província. Resultado: em um mês, dez mil pessoas foram vacinadas, e nos três meses seguintes, antes do término de 1804, a grande maioria dos habitantes de Puebla estava imunizada.
Em suas andanças pelos povoados dos arredores, os expedicionários distribuíram cadernetas impressas pelo bispo e instruíram os responsáveis pela vacinação. Além disso, Balmis fez uma importante descoberta no vizinho vale de Atlixco, onde encontrou vacas infectadas pelo vírus da varíola bovina. Era uma grande notícia saber que na Nova Espanha existia uma fonte nativa da vacina. Imediatamente, contou isso em carta ao ministro Caballero.
Isabel sonhava em morar em Puebla. Gostava da casa antiga e ampla que lhes destinara o bispo, em cuja fachada trepavam madressilvas e jasmins. Perdia-se no labirinto de ruas e jardins, desfrutava do clima bom, da grandeza do horizonte e dos sabores das comidas. A recepção efusiva dos locais havia tocado sua alma, sobretudo depois do que haviam passado na Cidade do México. Ali, todos a conheciam porque o bispo elogiara seu trabalho nas missas. O prelado imaginava muito bem o quão difícil devia ter sido a travessia com tantos garotos vacinados. Admirava Isabel por tê-los alimentado e mantido vivos, por tê-los asseado, vestido, alegrado, consolado e mimado... De modo que ela era cumprimentada carinhosamente quando, vestida como as mexicanas em um traje composto de saia e uma capa com pano e xale, saía para comprar pastéis de Santa Clara ou doce de leite com nozes e pinhão no mercado do Zócalo. Nunca havia se sentido querida daquela maneira. Era uma sensação embriagante para uma pobre “desencaminhada”.
No âmbito privado, o prelado se interessou por ela, e quando Isabel solicitou uma audiência, ele a concedeu imediatamente. Isabel, envolta pela manta que servia também para esconder suas mãos, ásperas e calejadas, atravessou o claustro do palácio episcopal, um edifício imenso de dois andares com fachada de pedra lavrada. Estava com um índio diácono que a guiou até o segundo andar e pediu que se sentasse em uma sala de espera. Isabel esquadrinhou os móveis delicados e os tapetes, que lembravam a residência de dom Jerónimo em La Coruña. Em um ato de reflexo, tirou com o dedo um pouco de pó que havia sobre um pratinho de cobre gravado. Quando o prelado entrou, teve a impressão de que não caminhava como um homem normal; com sua longa sotaina, parecia deslizar. Ao se ajoelhar para beijar o anel dele, Isabel tremia. Ela, uma pobre camponesa galega, sentia-se intimidada e, ao mesmo tempo, orgulhosa de viver aquela situação. Quando ergueu o olhar e fixou-o nos traços finos e elegantes do bispo, em seus dedos compridos, em seus olhos cinza monteados de manchas cor de mel, pensou que jamais vira homem tão bem-apessoado. “Deus deu a Puebla um bispo perfeito”, pensou. Ele, consciente de sua primazia, deu-lhe confiança fazendo diversas perguntas sobre sua vida na aldeia, seus pais, seu filho “adotivo”, sobre a Galícia e as vicissitudes da expedição. Acostumada à atitude altiva dos curas galegos, ela ficou desconcertada com a familiaridade, a simplicidade e a amabilidade que aquele bispo demonstrava com as pessoas humildes.
— Que idade a senhora tem? — perguntou-lhe.
— Vinte e nove anos... Já sou uma solteirona — respondeu Isabel, forçando um pouco o sorriso.
— Tão jovem e tanto caminho percorrido — disse o bispo. — É admirável. Não é casada?
Isabel engoliu a saliva.
— Não, não tenho marido, adotei um garoto.
Ao mentir, sentiu o rosto corar. Mas se adiantou:
— O que preciso, Eminência, e é por isso que vos queria ver, é que meu filho Benito estude. Para que não seja folgado.
Nesse momento, lembrou-se de seu pai, Jacobo, e da sensação que deve ter sentido quando pediu ao cura da aldeia que encontrasse para ela um serviço de criada. Por um filho, se é capaz de tudo, até do atrevimento de solicitar uma audiência com o bispo.
— Há o Colégio Carolino; na verdade, são três antigos colégios que se fundiram, é uma instituição de prestígio.
— Mas eu não... não ganho o suficiente para pagá-lo...
— Não se preocupe, senhora. O dízimo me permite distribuir algumas bolsas. Pode contar com uma para seu filho.
Ele disse rápido assim, conciso assim, claro assim, provavelmente sem ter a consciência de que, ao fazê-lo, provocou na jovem um terremoto interior. O que a Coroa não havia arranjado para nenhum dos garotos da expedição, ela arranjava para seu filho. E talvez também para Cándido.
— A senhora, tem planos para quando terminar a expedição?
A pergunta a pegou de surpresa. Ela balbuciou:
— Não, não, cuidar de meu filho até que possa se virar por conta própria.
— Se a senhora achar conveniente, pode tentar uma vaga no convento de Santa Clara.
Não só as freiras professas moravam nos conventos, mas também damas que buscavam abrigo neles por não terem encontrado marido, terem sido enganadas por um pretendente, serem pouco favorecidas pela beleza ou simplesmente por não encontrarem apoio no mundo. Algumas dessas damas tinham criadas e freiras à disposição e usavam ricas joias e ornamentos. Outras, mais modestas, viam os anos se passarem na segurança do claustro.
— Eu preferiria trabalhar em um hospital.
— Sem dúvidas, a senhora tem uma experiência incalculável com o cuidado de enfermos. Seria uma honra para nós se permanecesse em Puebla. E se a senhora pensa nisso, deve saber que encontrará neste bispado a ajuda necessária.
O bispo lhe oferecia uma oportunidade única. Oferecia-lhe uma vida. Para ela e para o filho. Se já pressentia que havia encontrado em Puebla de los Ángeles seu lugar no mundo, após falar com dom Ricardo, esse sentimento se transformou em certeza.