Nosso trabalho no quarto de “Papa” estava terminado.
Mas os corpos ainda precisavam ser levados até a pira funerária. Decidimos que isso deveria ser feito com pompa, que seria melhor esperar até terminar a cerimônia em honra dos Cem Mártires da Democracia.
A última coisa que fizemos foi colocar von Koenigswald de pé para descontaminar o chão onde ele estava deitado. Depois escondemos o corpo, de pé, no armário de “Papa”.
Não tenho muita certeza do motivo pelo qual o escondemos. Acho que deve ter sido para simplificar a situação.
Quanto à história de como Frank, Newt e Angela dividiram entre si o suprimento mundial de gelo-nove na véspera de Natal… ela começou a definhar quando os irmãos chegaram aos detalhes do crime em si. Os Hoenikker não se lembravam de alguém ter dito algo que justificasse a atitude que haviam tomado, de se apoderar do gelo-nove. Falaram sobre como era o gelo-nove, lembrando das expansões de cérebro do velho, mas não falaram sobre o aspecto moral da situação.
– Quem fez a divisão? – perguntei.
Os três Hoenikker haviam apagado tão completamente as lembranças do incidente que até mesmo esse detalhe decisivo foi difícil para eles.
– Não foi Newt – disse Angela, por fim. – Tenho certeza disso.
– Fui eu ou você – meditou Frank, muito pensativo.
– Você pegou os três potes na prateleira da cozinha – disse Angela. – Só no dia seguinte conseguimos as três garrafinhas térmicas.
– Isso mesmo – Frank concordou. – E depois você pegou um picador de gelo e quebrou em pedaços o gelo-nove que estava na caçarola.
– Exatamente – disse Angela. – Foi o que eu fiz. E então alguém trouxe as pinças que estavam no banheiro.
Newt levantou a mãozinha:
– Eu.
Angela e Frank ficavam impressionados, lembrando da iniciativa demonstrada pelo pequeno Newt.
– Fui eu quem pegou as lascas e as colocou nos vidros de comida – Newt narrou o episódio. Ele não se preocupou em esconder o orgulho que sentia com essa atitude.
– O que vocês fizeram com o cachorro? – perguntei, hesitante.
– Nós o colocamos no forno – Frank disse. – Era a única coisa a fazer no momento.
“História!”, escreve Bokonon. “Leia a história e chore!”