Bramble achava que a manhã estava a correr bem. Percebia que Hurley não estava a fazer aquilo com afinco. Detestava Rapp tanto quanto ele, ou mais ainda. A última ronda de perguntas tinha sido um pouco mais intensa, mas ele calculava que tivesse de impressionar as pessoas do outro lado do espelho. Aquela cabra da Irene Kennedy devia estar a picá-lo. A boa notícia era que não ficaria por ali muito mais tempo. Com a grande asneira de Rapp, ia haver remodelações na casa, e Irene seria a primeira a ser posta na rua.
Stansfield, o fóssil, também já estava de saída, e Hurley também não ia para novo. Mais dez anos e Bramble haveria de estar à frente daquilo tudo, e então poderia começar mesmo a encher os bolsos. Aquele trabalho era uma licença para roubar. Chegou a cadeira para trás e virou-a para a grande janela de observação. Pressentia a desmancha-prazeres do outro lado do vidro a atezanar Stan e qualquer outro que não achasse que o seu rapaz-maravilha era o segundo advento.
Ouviu a porta abrir-se e, sem se virar, disse:
— Stan, vamos parar de desperdiçar o tempo um do outro. Quanto mais tempo estivermos aqui às turras, mais difícil vai ser apanhar aquele sacana.
— Sacana? — repetiu Rapp.
Bramble pôs-se de pé num salto, atirando a cadeira para trás.
— Mas que porra é tu estás aqui a fazer? — Viu a arma na mão de Rapp e disse-lhe: — Baixa-me essa merda imediatamente.
— Apanha a cadeira e senta-te.
— Vai-te foder. Não recebo ordens tuas. Como é que entraste aqui?
— Não vou dizer-te outra vez. Pega na cadeira e senta-te.
A boca de Bramble estava a formar as suas palavras preferidas quando uma bala lhe atingiu o joelho bom. Devia ter-lhe estilhaçado a rótula, pois a perna dobrou-se por completo e ele caiu ao chão. Agarrado à perna, Bramble desatou a gritar.
Rapp pôs-se por cima dele e apontou-lhe a arma à cara.
— Cala-te, Victor. Toda a gente sabe o que aconteceu ontem à noite. Testemunhas viram o que tu fizeste. És um canalha fingido de merda.
— Eu não fiz nada. Foste tu.
Rapp apontou a arma ao pé esquerdo de Bramble e disparou de novo. Esperou uns segundos para que os gritos parassem e depois disse-lhe:
— Isto funciona assim: vou continuar a enfiar-te balázios até que nos digas aquilo que já sabemos.
— Se já sabem, então para que é que me estás a perguntar?
— Não és lá muito esperto, pois não? Precisamos de confirmação. Tens andado a passar informação às pessoas erradas. Falaste-lhes do Tarek. Descreveste os meus métodos. Ajudaste-os a armarem-me uma cilada.
— Vai-te foder!
— Resposta errada. — Disparou de novo, atingindo-lhe o pé direito. Quando Victor finalmente parou de gritar, Rapp disse-lhe: — O Stansfield deu-me luz verde para te matar. A única forma de salvares o couro é dizendo-nos com quem estavas a colaborar.
— Não sei de que porra estás a falar.
— Então queres outra bala. Desta vez deixo-lhe escolher. Mão direita ou mão esquerda?
Victor levou as duas mãos ao peito.
— Queres que eu te mate? — perguntou Rapp.
— Vai-te foder.
— Tens mesmo de tentar arranjar algumas respostas diferentes. — Mirou-o de uma ponta à outra e disse: — Então e se forem os cotovelos? Só pode doer como o caraças. Montes de ossos e nervos. Qual queres... o esquerdo ou o direito?
Victor retorceu-se no chão, a tentar afastar-se mais, mas o sangue que lhe jorrava do pé deixava o chão escorregadio.
— Não dispares mais. Não fiz nada de mal.
— Fizeste muitas merdas mal, Victor, e se queres viver, é melhor começares a dizer a verdade. Bom, a quem é que passavas informação?
— Ao Stan.
Rapp abanou a cabeça.
— Isso é patético, Victor. O Stan sabe tudo. Tem de ser outra pessoa. Alguém fora do grupo. Preciso de um nome. Vamos, desembucha.
— Não sei de que é que estás a falar.
— Desta vez vou contar até cinco e depois disparo. — Rapp começou a contar.
— Não sei de que é que estás a falar.
— Quatro... cinco. — Escolheu o cotovelo esquerdo e apertou o gatilho.
Victor encolheu-se de dor e gritou durante quase meio minuto. Rapp esperou pacientemente e depois perguntou:
— Quem foi, Victor? Quem é o tipo?
Victor já estava a balbuciar. Pareceu-lhe ouvir um nome, mas não percebeu o que era. Baixou-se e encostou-lhe o silenciador à virilha.
— Não percebi o nome. Vais ter de o dizer mais alto.
Victor contorcia-se de dor. Saía-lhe ranho do nariz. Balbuciou mais qualquer coisa.
Rapp fez pressão com a arma.
— Vou contar até cinco outra vez. Lembras-te de como foi da última? Um... dois... três... quatro.
— Paul Cooke! — gritou Victor.
Rapp levantou-se, olhou para o espelho e assentiu com a cabeça. Olhou de novo para ele e disse-lhe:
— Se dependesse de mim, Victor, enfiava-te uma bala na cabeça agora mesmo.
Rapp virou-se para a porta e Victor começou a rir-se. Devagar e baixinho ao início, e depois mais depressa e mais alto.
Rapp parou e virou-se para o encarar.
— Qual é a graça, Victor?
Ele controlou o riso e disse:
— Eu sabia que não tinhas tomates para este trabalho.
Rapp olhou para ele, considerou as opções ao seu dispor e ergueu a arma. Disparou dois tiros contra os genitais de Victor e disse-lhe:
— Bem, assim somos dois.
Bateu três vezes à porta e, pouco depois, Hurley abriu-a.
— Como é que correu?
— Ele indicou o Cooke, portanto acho que temos de tratar de mais uma ratazana.
— Isso é certo. — Olhou para trás de Rapp e viu todo o sangue. — Que porra é que lhe fizeste?
— Dei-lhe uma data de oportunidades para dizer a verdade. Ele demorou um bocado a perceber que era do seu interesse parar de me mentir.
— O que é que eu vou fazer com ele?
Rapp encolheu os ombros.
— Prometi ao doutor que não o matava, portanto, a decisão é sua.
Passou por Hurley e seguiu pelo corredor até à sala de observação. A porta abriu-se antes de ele chegar e o Dr. Lewis avançou para o corredor.
Com uma expressão ansiosa, perguntou-lhe:
— Como se sente?
Rapp parou, considerou a pergunta por um segundo e respondeu:
— À maneira, doutor. Nunca estive melhor. E o doutor?