A culpa por não contar a Frankie sobre Matt e mim é avassaladora, mas é menor do que a violação que sinto por ela ter lido meus pensamentos mais secretos, particulares e tê-los destruído. Ela invadiu meu coração bem protegido, roubando a única conexão restante que eu tinha com Matt, transformando-a numa monstruosidade. Para piorar as coisas, durante todo o tempo que ela passou me educando sobre primeiras vezes e se exibindo como a Rainha do Amor, ela também estava carregando um pesado e esquisito albatroz; ela não tinha mais experiência do que eu.
Não consigo nem mesmo olhar para ela.
Da parte de Frankie, ela também não consegue me olhar. Depois que derramamos nossas lágrimas silenciosas na praia, ela volta para a casa de Eddie sozinha.
Dissemos a Red e Jayne que voltaríamos antes do almoço. Se voltássemos antes do café da manhã, ensopadas e de olhos inchados, eles saberiam que algo estava errado. Tínhamos de esperar ali.
Subo as escadas até o jardim, pernas e coração pressionados por tristeza e cansaço. Algumas pessoas estão nas espreguiçadeiras na beira da piscina, desmaiadas, ignorando as batalhas anteriores entre Frankie e mim. Na entrada dos fundos, tropeço numa pilha de caras cujas roupas reconheço do fã-clube da cerveja-pongue. Caminho até a cozinha antes de me apoiar numa parede suja. O cheiro do vômito de alguém se anuncia orgulhosamente, se estendendo e tentando me sufocar. Há caixas abertas de pizza, e migalhas enchem a cozinha, a porta que virou mesa revirada está lá, e uma camada de areia misturada a uma de cerveja recobre todas as superfícies à vista.
Nunca senti o cheiro de um corpo em decomposição, mas imagino que aquele odor chegue perto.
O lugar está silencioso, exceto pela dissonância de roncos e o zumbido dos alto-falantes sem música. Várias das pessoas da noite anterior se encontram distribuídas pelo piso da sala de estar, fedendo, de ressaca e manchadas de maquiagem e cerveja.
Encontro o caminho de volta pelo corredor, abrindo três portas antes de achar o armário onde deixei minha mochila ao lado da de Frankie. A mochila dela desapareceu, mas a minha ainda está ali. Abro-a devagar, esperando que as últimas horas tenham sido apenas uma ilusão criada por uma euforia movida a Sam.
O bolso da frente está vazio. Os bolsos do meio estão cheios de tudo o que eu trouxe na noite anterior, exceto a única coisa que me importava.
Com minha mochila, tranco-me no banheiro que descobri na noite anterior. Por sorte, não havia ninguém desmaiado na banheira, por isso tomo um banho quente e rápido, usando os produtos que estão no banheiro.
Depois do banho, visto a bermuda e a camiseta rosa que trouxe para dormir, guardando as roupas ensopadas no bolso do meio. Ao limpar o vapor do espelho, meu rosto ganha foco e se parece, para minha surpresa e decepção, bem como eu me lembrava dele. Além da ressaca emocional completa, com olhos inchados e a expressão cansada, é a mesma cara de sempre, a mesma da noite anterior — nada de novo ou melhorado.
De volta à área principal da casa, verifico o perímetro para ver se Frankie está nas proximidades e encontro um lugar no chão, perto da sala de estar. Do outro lado, Eddie está desmaiado numa poltrona de couro, usando um sutiã preto estufado com guardanapos sobre sua camiseta verde.
Ouço o mar e os roncos a meu redor. Fecho os olhos e respiro mais devagar, mas o sono me seduz. Há duas horas imaginava este momento de forma bem diferente — deitada no chão perto de Frankie, rindo ao contar minha noite para ela, planejando nossas atividades para os últimos dias do M.V.T.T.
Em vez disso, o pensamento aperta meu peito e me atinge com setas negras e raivosas.
Minha mente se alterna entre lembranças dos lábios de Sam contra os meus e a intolerável tristeza de ter sido traída por alguém que eu amava e em quem confiei durante toda a minha vida.
Acho que ouço alguém gritando na porta e me pergunto logo por onde anda Frankie. Antes de ignorar minha imaginação, ouço o chamado uma segunda e terceira vezes.
— Arrumação! Arrumação!
O anúncio precede algumas batidas e o som inequívoco das chaves na porta.
— Senhor e Senhora Donovan? Alguém em casa?
A porta se abre, dando lugar aos raios de sol que caem em peso no rosto de Eddie, mas ele não se incomoda. Eu me escondo mais, de modo que possa em segurança observar o drama de outra pessoa se desenrolar ao ser sugado por ele.
— O quê... meu Deus, menino! Alguém morreu aqui? — A arrumadeira abre a porta com seu aspirador de pó industrial e se aproxima do sofá onde Eddie enfim se remexe.
— Oi — ele boceja, um sobrevivente da tempestade, preso numa zona de guerra entre corpos, garrafas, pontas de cigarro, pedaços de roupa, bordas de pizza, copos plásticos, pedaços de uma escultura cara quebrada, e areia.
— Edward, onde estão seus pais? — ela pergunta, cruzando os braços gordos.
Eddie se senta devagar e analisa o estrago.
— Não se preocupe, Maggie — ele diz, com a voz grogue. — Você não precisa limpar isso. Vou cuidar de tudo.
— Ah, sei. Quando eles voltam?
— Amanhã, eu acho.
— Deve ter sido uma festa e tanto — ela comenta, segurando os seios com as mãos e acenando para a lingerie de Eddie.
— O quê...? — Eddie sente a renda contra seu corpo e balança a cabeça, com certeza sem se lembrar de como aquilo chegou ali.
— Certo. Então ligue se precisar de alguma coisa, Edward. — Ela chuta uma garrafa, pega o aspirador e bate a porta. A garrafa rola pelo chão e para contra uma caixa de pizza perto dos pés de Eddie.
— Merda — Ele se inclina na poltrona, segurando a cabeça no meio das mãos, sem fazer qualquer esforço para tirar o sutiã.
— Passando mal? — pergunto, saindo de meu ninho ao lado da sala.
— Não, só uma dor de cabeça.
— A arrumadeira não vai contar nada a seus pais?
— Talvez. Mas isso não importa, desde que eu limpe tudo. A mesma coisa todos os verões. Eles não têm tempo para se importar.
Viro-me para falar com Frankie. Está vendo? Há todo um mundo de pais que não se importam. Mas daí lembro que Frankie não está perto de mim e que, por sinal, eu a odeio.
Eu me ofereço para ajudar Eddie no esforço de limpeza, mas ele recusa.
— A Maggie vai voltar. É um joguinho nosso. Ela se finge de surpresa e preocupada, depois vai embora. Eu acordo e mando todo mundo embora. Depois ela volta e me ajuda a colocar as coisas de volta no lugar.
— Ela deve gostar de você.
— Na verdade, não. Ela gosta dos cem dólares que lhe dou mais tarde. — Eddie prepara um pouco de café e dá início à tarefa de acordar os mortos deitados pela casa, na piscina e no quintal. Pergunto se ele viu Frankie.
— Sim, ela está lá em cima. Vocês duas devem ter bebido muito na noite passada. Pareciam péssimas!
Forço um sorriso.
— Já me chamaram de coisa pior.— Há apenas algumas horas, na verdade.
Sirvo-me de uma xícara de café na cozinha e espero pela Princesa Perino. É provável que eu possa citar sete mil pessoas com as quais preferia andar pela praia nesta manhã, mas não podemos correr o risco de aparecer na casa separadas. Pelo que tio Red e tia Jayne sabem, nós nos divertimos passando a noite com Jackie e Samantha, rindo até de madrugada, fazendo guerra de travesseiros e respondendo a questionários da Cosmo em nossas camas antes de pegar no sono.
Uma hora mais tarde, Frankie desce as escalas toda maquiada para cobrir as provas da confusão. Para meu próprio bem, ela exagera dando adeus a Eddie e agradecendo a “festança”. Depois, sem virar a cabeça em minha direção, ela pendura a mochila no ombro e ruma para a porta dos fundos e para a praia, de nariz empinado, barriga enxuta, os ombros para trás, o peito para fora — uma fênix de cabelos castanhos surgindo das cinzas de uma amizade rompida.