O sol se levanta atrás de mim, transformando o céu num alaranjado claro. Ainda faz frio e eu puxo as mangas do moletom de Sam sobre as mãos para aquecer meus dedos. Uma sombra silenciosa recai sobre a escadaria e se espalha pela areia perto de mim; dou um salto.
— Frankie? Faz tempo que está aqui?
— Cheguei agora — ela diz, os braços nus cruzados sobre a camiseta de algodão, seus olhos avermelhados. — Acordei a noite passada e você não estava. Já que você não voltou pela manhã, fiquei com medo.
Ajeito-me no degrau para que ela se sente a meu lado. Ela respira fundo, dando início a uma sequência de soluços.
— Desculpe, Anna. Sinto muito. Vim aqui na noite passada para ver se o diário apareceu na praia, mas nada. Nunca quis que isso acontecesse desse jeito.
Aquilo me atinge e eu quero me afastar. Deixar tudo para trás. Esquecer.
Mas Frankie e eu estamos na mesma. Eu lhe devo uma explicação tanto quanto ela me deve.
— Por que você leu, Frankie? Por que você pegou meu diário e leu?
Ela me contou que, quando guardava a câmera, na festa, viu um diário saindo de minha mochila. Ela estava bêbada e queria ver se eu havia escrito alguma coisa sobre Sam.
— Nunca imaginei encontrar coisas sobre... bem, sobre o que eu encontrei.
— Frankie, eu sei que deveria ter lhe contado sobre o Matt. Mas ele mesmo queria lhe contar, e eu prometi que não diria nada. Ele queria ter certeza de que você aceitaria a notícia. Achava melhor esperar até vocês ficarem sozinhos por um tempo, na Califórnia. Foi só por isso que eu não lhe contei. Depois, na noite em que você viajou para a Califórnia, tudo aconteceu tão rápido... Eu não queria decepcioná-lo. Não queria quebrar minha promessa. Não queria que você se machucasse mais. Queria estar aqui e...
— Não importa, Anna — ela interrompe. — Matt era meu irmão. E eu deveria ser sua melhor amiga. Dói saber que você me escondeu um segredo desses. Você deveria ter me contado.
Olho para a praia à medida que o sol nos atinge. Os atletas já estão nas pistas, seguindo seus caminhos de sempre, ao lado da areia mais endurecida perto da água. Duas mulheres passam por nós lado a lado, sérias, intensas e sem fôlego.
Sei que deveria ter contado para Frankie. Queria ter contado para ela. E eu... Matt... nós... teríamos contado, mas... Quando prometi a Matt que não diria nada, não sabia que seria por toda a eternidade. Se eu soubesse que ele morreria antes de confessar tudo para sua irmãzinha, teria acrescentado uma cláusula a nosso acordo.
— Desculpe, Frank. Eu deveria ter contado a você. Mas...
— Um mês inteiro — continua Frankie. — E não foi só isso, mas todo o tempo anterior, o tempo em que você o amou. Você nunca me contou que tinha sentimentos por ele. É como se todas as vezes em que saímos juntos ele não fosse apenas seu amigo, afinal ele sempre representou algo mais para você. Foi sempre uma mentira.
Uma mentira? Isso me atinge como uma marreta, liberando toda a mágoa, tristeza e confusão que mantive dentro de mim pelos últimos quatorze meses. Levanto-me sem falar nada e vou em direção ao mar, incapaz de me segurar.
— Como você pôde nos deixar assim? — grito para o céu, as lágrimas escorrendo pela minha boca. Só outra menina bêbada, devem pensar os passantes. — Diga a ela! — grito. — Diga a ela que você me fez prometer! Diga que a culpa é sua! Diga que foi uma mentira sua também! Diga a ela que você me amava!
Diga a ela que você me amava.
Olho para o oceano, até o Japão, esperando por uma resposta.
Chuá, chuá, chuá...
Nada.
— Anna, desculpe. — Frankie fica perto da água aos prantos, puxando as mangas do moletom de Sam contra meu pulso. Seus olhos estão pesados, envelhecidos, a sobrancelha partida e apática. — Por favor, Anna. Não... — ela diz, enxugando os olhos com a mão livre. E, com a mesma rapidez que surgiu, a disputa dentro de mim desaparece.
— Como você pôde dizer que tudo foi uma mentira? — pergunto, suspirando um pouco além do normal. — Matt era meu melhor amigo. Eu sempre o amei. “Precisamos cuidar dela”. Essa foi a última frase que ele me disse. Depois ele morreu. O que eu deveria fazer, Frank? Diga.
Ela cruza os braços e olha para a praia. As ondas atingem nossos pés, geladas e tristes. Meus dedos dos pés doem, mas é a realidade do aqui e agora, e eu preciso senti-la.
— Você não precisa me proteger, Anna. Estou bem. — Ela recua para tirar os dedos das ondas, tremendo em sua camiseta da banda HP rosa e branca, os joelhos se tocando para deter o frio, seus cabelos desgrenhados caindo sobre os olhos.
— Do que é que você está falando? — pergunto. — Sua vida está de pernas para o ar, Frankie. Você não disse uma só coisa verdadeira desde que o Matt morreu.
Frankie concorda, recusando-se a olhar para mim. Ela se curva na areia, envolvendo os joelhos com os braços e acariciando o bracelete, como fez no hospital quando Matt morreu.
Sento-me ao lado dela e enfio meus pés na areia, soprando minhas mãos para aquecer meus dedos.
— É verdade — diz Frankie, meneando a cabeça.
— Verdade.
— Quando Johan me levou para o campo de futebol, ele me contou sobre Maria e sobre como estava arrasado. No fim, tentei beijá-lo. Achava que era o que ele queria, mas Johan me afastou, dizendo que sentia muito, mas continuava apaixonado por ela. Fiquei com tanta vergonha que nem mesmo quis voltar para o baile. Quando entramos, todos estavam fazendo comentários e brincadeiras, presumindo apenas que nós transamos, até mesmo você. Era mais fácil aceitar isso do que dizer a verdade, que eu não era boa o suficiente para ele. Eu ia contar a você, mas a história cresceu de tal maneira que eu não consegui lidar com isso.
Depois de um tempo, ela continuou.
— Com Jake, nós nos divertimos muito a princípio, nas noites em que fugimos. Quase dormimos juntos algumas vezes, e eu achei que aconteceria cedo ou tarde. Então, naquela noite em que você me perguntou, foi mais fácil para mim dizer “sim”. Eu deveria ser a experiente, certo?
Dei de ombros, cavando túneis de areia com os dedos.
— Acho que sim.
— Depois, ele queria transar na festa, mas eu estava bêbada e não quis. Eu disse que podíamos fazer na noite seguinte. Mas, quando saí para ir para lá, ainda não queria. Não sei por quê, pois estávamos sozinhos na praia e ele é mesmo gostoso e tudo o mais. Só que... alguma coisa me impediu. Talvez seja o que você disse. As coisas fugindo do controle, você e eu brigando... Eu não conseguia pensar em nada mais. Mas era só isso. Ele não quis me ver depois disso.
Ela está chorando de novo, e meu coração se parte. Tudo está tão errado — não sei o que fazer para melhorar as coisas.
— Frankie, sinto muito. Nunca quis magoá-la. Matt e eu apenas...
— Não, Anna. Você não precisa dizer nada. — Ela balança a cabeça. — Li o diário. Você não precisa me dizer. Não importa mais. Matt está simplesmente... Ele está morto.
— Não há um segundo sem que eu pense nisso. Só estou tentando dizer que eu...
— Não posso — ela suspira, apertando minha mão. — Por favor, Anna. Não.
Não quero continuar magoando minha amiga, por isso estou tentando fazer o meu melhor.
Apenas engulo em seco.
Faço que sim e sorrio.
Um pé diante do outro.
Estou bem, obrigada por não perguntar.
Levantamo-nos e limpamos a areia de nossas pernas, concordando em tentar mudar. Em aceitar. Em seguir adiante. Em não falar mais nisso.
— Vamos entrar — ela propõe. — Eles vão acordar e nós ainda não começamos a fazer as malas.
Faço que sim, seguindo-a até a escadaria e depois até a casa.
Após arrumar as malas, limpar o quarto e tomar um café da manhã leve com tio Red e tia Jayne, faço um último passeio pelo mar — o guardião azul de meus segredos. Ele testemunhou tudo nessa viagem — a perda do albatroz, os segredos revelados, a história destruída, amores e amizades encontrados e arrasados —, mas permanece o mesmo. Tranquilizador. Imortal.
Chuá...
— Adeus — sussurro para várias coisas ao mesmo tempo. A água beija meus dedos à medida que os fantasmas de nossas memórias desaparecem da casa como digitais úmidas, as cortinas do quarto de Matt sobre a praia, fechadas contra o sol.