Introdução

Trata-se o procedimento extrajudicial de usucapião de importante novidade que veio recentemente introduzida no ordenamento jurídico brasileiro, com acerto, em nosso entender, possibilitando, em casos de ausência de litígio, o reconhecimento da aquisição de direitos reais imobiliários diretamente no Registro Imobiliário, sem a necessidade de processo judicial, tornando, assim, o caminho mais célere, menos custoso (não apenas pecuniariamente falando, mas também psicologicamente), e auxiliando a redução da carga desumana de processos submetidos ao Poder Judiciário.

O § 5º do art. 214 da LRP, inserido pela Lei n. 10.931/2004, e o art. 1.242, parágrafo único, do Código Civil já haviam dado um primeiro passo ao elevar o patamar de importância do registro no Registro de Imóveis, o primeiro, evitando o seu cancelamento por vício de procedimento quando presentes os requisitos da usucapião, e, o segundo, elevando registro, ele próprio, a requisito de certa espécie de usucapião, a qual analisaremos oportunamente. Adiante-se, todavia, que não se trata de hipóteses de usucapião tabular, como atecnicamente se tem afirmado.

Posteriormente, surgiu o procedimento de usucapião extrajudicial, ou administrativa, com a Lei n. 11.977/2009, que o manteve, entretanto, circunscrito a situações de regularização fundiária de interesse social, como se verá.

Finalmente, em 2015, o mais vultuoso passo: o procedimento de usucapião extrajudicial ordinário, que aplica-se à aquisição de qualquer direito usucapível, por qualquer forma de usucapião.

Dito procedimento extrajudicial ordinário, instituído pelo art. 1.071 do novo CPC, que acresceu o art. 216-A à Lei de Registros Públicos, trata-se de importante novidade inserida no ordenamento jurídico e que, se não é perfeita, e precisa, em nossa opinião, de ajustes legislativos, como se verá, tem o mérito de avolumar um movimento que já havia antes sido iniciado em solo brasileiro e em terras alienígenas, bem como de colocar na ordem do dia uma discussão extremamente importante, que muitas vezes é tratada ideologicamente, mas que precisa ser discutida séria e tecnicamente, qual seja, a da extrajudicialização de uma série de matérias que permanecem na seara judicial mais por um costume arraigado do que propriamente por uma necessidade técnica, atrapalhando, assim, Juízes – que carregam uma sobrecarga desumana de trabalho, imensa e desnecessária – e partes – que padecem das mazelas acarretadas pela sobrecarga de trabalho dos Magistrados –, quando há profissionais do Direito selecionados em dificílimos certames públicos, dotados de adequadas características para atender a tal demanda: os Registradores e os Notários.

O art. 1.071 do novo Código de Processo Civil, que entrará em vigor em 18-3-2016, insere o art. 216-A da LRP, no qual cria o procedimento comum de usucapião extrajudicial, inexistente até então no Direito brasileiro.

Apesar de ser uma importante inovação, não há aí a invenção da roda. Já havia a usucapião extrajudicial em outros ordenamentos jurídicos, e mesmo no ordenamento jurídico brasileiro, conforme se viu.

Mas o fato é que o novel art. 216-A criou um importante instituto que dá nova dimensão à usucapião extrajudicial, o que faz com que passe a ser possível e necessário um estudo técnico e sistemático sobre o tema, o que se pretende fazer neste livro.

Este trabalho tem por escopo analisar a usucapião extrajudicial registral, nas suas formas possíveis, verificando tanto a já existente no ordenamento jurídico antes do NCPC quanto a por este instituída, bem como fazendo uma análise de direito comparado a fim de verificar as experiências estrangeiras prévias às nossas.

Pretende-se fazer uma análise, embora superficial, das espécies materiais de usucapião, com seus requisitos de juridicidade, pois o procedimento extrajudicial é, segundo majoritário entendimento, apenas declaratório de requisitos previamente implementados, os quais precisam ser conhecidos e discutidos, até mesmo para que se possa perceber a complexidade da análise jurídica que deverá ser levada a cabo pelo Oficial de Registro de Imóveis, a fim de bem entender os caminhos possíveis da decisão qualificadora registral.

Instituto novo que é, será concretizado ao longo do tempo pela doutrina e pela jurisprudência, de maneira que o presente livro não pretende, por óbvio, sepultar discussões, mas sim iniciá-las, pondo na mesa questões técnicas relativas ao instituto objetivado, ao qual se pretende dar também um tratamento técnico, embora inicial.

Trata-se de novidade a respeito da qual há muitas dúvidas e pontos a esclarecer e pacificar, de modo que um entendimento preciso da questão somente poderá ser obtido com o tempo, conforme for se assentando o entendimento jurisprudencial.

Por fim, neste introito, é importante salientar que, embora o CPC atual ainda esteja em vigor, já vamos cuidar da matéria como se em vigor estivesse o NCPC, a fim de analisar qual será em nossa visão o tratamento da matéria quando entrar este efetivamente em vigor, e passar, assim, a ser aplicado o procedimento extrajudicial comum de usucapião.