ANDREY
Logo que saiu do gabinete de Anyutin, onde o coronel e Katyshev continuavam a lamentar a moral contemporânea, Andrey percebeu que não conseguiria pensar ou empreender quaisquer esforços investigativos até ver Masha. Precisava de abraçar Masha Karavay, de a pressionar contra o seu corpo, não a soltando até encontrarem o assassino ou até este parar de matar. Abraçá-la-ia durante todo esse tempo ou talvez a abraçasse para sempre. A eternidade nos braços de Masha não lhe parecia uma perspetiva má. Andrey não confiava realmente em Innokenty, mas, mesmo assim, sentia-se melhor por saber que estava com ele e não sozinha. Quando ligou e ouviu a sua voz inexpressiva do outro lado da linha, pronunciando apenas três palavras («estou em casa»), Andrey não parou para fazer perguntas.
«Só preciso de me lembrar de passar pela loja», pensou, enquanto estacionava diante do prédio de Masha. Tinha o frigorífico vazio, outra vez. Mas faria isso mais tarde, com ela a seu lado.
Enquanto Andrey subia as escadas, ouviu vozes. Um homem a falar baixo e uma mulher ligeiramente histérica. Pareciam vir do outro lado de uma porta fechada. A princípio, não conseguiu perceber as palavras. Mas, quanto mais subia, mais distinto o diálogo se tornava. Reconheceu a voz de Innokenty. E as primeiras palavras que percebeu fizeram-no parar.
– Masha, por favor! – dizia Innokenty. – Perdoa-me, por favor! Parece-me que não faço mais nada além de pedir desculpa e admitir coisas que fiz mal. Que achas? Que sou doido e te tenho perseguido durante estes anos todos? Não te parece que não será nada disso? Não há... – Innokenty parou por um segundo. – Não vês outros motivos, além da possibilidade de ser um louco homicida, para ter... Masha, não percebes? Eu...
– Mentiste-me! – interrompeu-o Masha, com o pânico percetível no tom agudo da voz.
Andrey não conseguia esperar mais e avançou.
– Escondeste-me tanta coisa! – gritou Masha. – Já não confio em ti. Não confio em ninguém!
Andrey chegou ao patamar e viu Innokenty com a testa encostada à porta do apartamento de Masha. Virou-se para Andrey, com olhos perdidos e sem o verem realmente.
– Masha! – chamou Andrey. – Sou eu. Abre a porta. – Andrey deu um passo em frente e Innokenty afastou-se com ombros trémulos. – Por favor, Masha – disse Andrey.
A porta entreabriu-se e ali estava ela com lágrimas nos olhos.
– Onde estiveste? – Deu um passo para Andrey. – Porque demoraste tanto tempo a chegar aqui?
Andrey abraçou-a como tinha sonhado fazer durante o dia inteiro e sentiu-lhe a face quente e húmida pressionada contra o pescoço. Pôs-lhe a mão na nuca e moveu os lábios para o cabelo sedoso que lhe cobria o alto do pescoço. Sussurrou de modo tão apaziguador quanto conseguiu:
– Pronto. Chhh. Pronto. Vai ficar tudo bem. Vamos para a minha casa. Vamos dar de comer ao Marilyn. E também vamos comer. Vamos para a cama descansar, está bem?
E Masha limitou-se a apertá-lo com mais força, soluçando durante algum tempo antes de a sua respiração voltar gradualmente ao normal. A seguir, virou-se para ele e, quando Andrey viu os seus olhos tristes e húmidos, pensou que nunca os tinha visto com um verde tão penetrante.
– Queres trazer alguma coisa contigo?
– Será o terceiro saco que faço este fim de semana – disse. – Não. Não quero nada. Deixa-me só ir buscar a mala.
Sem lhe largar a mão, Masha procurou a mala no cabide, apagou a luz e fechou a porta depois de sair. Desta vez, nem sequer se deu ao trabalho de a trancar.
Só nesse momento se lembraram de Innokenty. Olharam em redor, preocupados, mas não havia sinal dele.
– Vem – disse Masha, puxando Andrey pela mão. – Vamos. O Marilyn Monroe deve estar faminto.