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<p>Notas dipterológicas<a class="hlink" id="c14-ftn1a" href="#c14-ftn1"><sup>*</sup></a></p>
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<div class="section">
<div class="title">
<p>I. <i>Habitat</i> e tempo de aparecimento das <i>Diatomineura longipennis</i> Ricardo</p>
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<p>Debaixo do nome citado no título, Miss Ricardo descreveu uma <i>Pangonina</i> ainda não denominada; esta lembra, na sua aparência, as espécies do gênero <i>Diclisa </i>Schiner, mas não pode neste ser colocada por causa da disposição diferente das nervuras das asas. Conquanto difira consideravelmente, no seu hábito total, das outras espécies indígenas de <i>Diatomineura</i>, será preferível conservá-la neste gênero até que a constatação de outras espécies parecidas indique a necessidade do estabelecimento de novo gênero.</p>
<p>O exemplar descrito do British Museum provém do estado do Espírito Santo; dois exemplares de minha coleção eram de procedência desconhecida. Não se conhecendo outros, podia-se julgar que se tratava de espécie rara, mas a experiência mostra que outras <i>Pangonina </i>em tempo e lugar apropriado se acham quase sempre em número maior, às vezes muito grande. Esta espécie também não faz exceção, com resultado seguinte:</p>
<p>No princípio de julho de 1909, este Instituto recebeu do Dr. Gurgel do Amaraluma pequena remessa de tabanídeos, apanhados no fim de julho em Alfenas (sul de Minas). Ao lado de alguns exemplares de <i>Erephopsis sorbens </i>Wied. (espécie comum encontrada também no inverno em pequeno número) esta só continha <i>D. longipennis</i>. Durante o mês de julho, obteve outras remessas, chegando o número de exemplares da mesma espécie a mais de trinta. Disto se pode concluir que esta mutuca é bastante freqüente naquela zona.</p>
<p>O que chama especialmente a atenção é o tempo em que se observou, coincidindo com a maior intensidade do nosso inverno, que costuma trazer uma diminuição considerável de insetos. é verdade que a <i>Diatomineura tabanipennis </i>MacQ. já se observa neste mês, mas isto se dá geralmente no litoral mais quente, enquanto a <i>Neopangonia pusilla </i>Lutz é encontrada em São Paulo apenas no princípio da estação fria. De mais, nesta zona, durante o inverno, só se encontram poucos exemplares de <i>E. sorbens </i>e das espécies mais comuns de <i>Tabanus </i>e <i>Chrysops </i>que todos se tornam mais freqüentes na primavera. é verdade que Alfenas está situada mais para o norte, na altura do sul do Espírito Santo, mas tem também elevação considerável, de modo que o aparecimento freqüente da <i>D. longipennis </i>representa, sem dúvida, uma particularidade da espécie, como fica provado também pela composição das várias remessas. Em vários lugares, agosto é considerado o mês da mutuca, não obstante só trazer poucas espécies, ao passo que a maioria delas só aparece de novembro para fevereiro. Até agora, julguei que esta noção se referia principalmente a <i>E. sorbens</i>, que chama a atenção pelo seu tamanho, grossura, tromba muito comprida e zunido forte, mas agora julgo possível que se refira também, em parte, à <i>D. longipennis</i>, que, procurada nesta estação, será talvez encontrada, também, em outros lugares com alguma freqüência.</p>
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<div class="section">
<div class="title">
<p>II. Existência de exemplares melanóticos de <i>Sarcophaga </i>e <i>Stomoxys</i></p>
</div>
<p>Ao passo que no gênero <i>Sarcophaga </i>as moscas apresentem o abdome tesselado, no gênero vizinho <i>Pkrissopoda </i>tem este a cor metálica ou preta uniforme. Por isso, podia-se considerar a existência, em certos exemplares, de um abdome sem desenho tesselado e completamente preto como caráter de gênero ou de espécie, como também o fiz outrora com uma <i>Sarcophaga </i>que hoje não tenho à mão. Resulta de observações posteriores que este modo de pensar não é necessariamente correto; pelo contrário, trata-se, pelo menos em certos casos, de variedades melanóticas.</p>
<p>Parece-me que tais variedades se encontram também no gênero <i>Stomoxys, </i>representado entre nós apenas pela espécie cosmopolita e, sem dúvida, introduzida <i>Stomoxys calcitrans</i>. é verdade que Wiedemann descreve mais duas espécies do Brasil e outras da América do Sul; mas as suas observações sobre a existência de outras espécies legítimas de <i>Stomoxys </i>nestes territórios não acharam nova confirmação e eu não podia ter deixado de encontrar entre nós estas moscas, se atacavam homens e cavalos. De outro lado, obtive dois exemplares apanhados juntamente com a forma normal, dos quais um é muito escuro e outro tem o abdome de cor preta intensa, sem vestígio de manchas. Esta coloração não se explica satisfatoriamente pela absorção de sangue e não corresponde à espécie descrita.</p>
<p>Tendo apanhado, há pouco, uma grande <i>Sarcophaga </i>do sexo feminino, de tórax escuro e abdome completamente preto, procurei usá-la para a criação. Esta se pode obter com facilidade pela expressão do abdome que na maioria das fêmeas contém larvas vivas. Dispõem-se sobre um pedaço de carne crua as larvas que o penetram; depois de coberto com serragem, este é conservado num vaso de culturas. Nestas condições, todas as larvas se desenvolvem rapidamente e a metamorfose se consuma depressa e com resultado certo. Assim sucedeu também nesta experiência, seguindo-se à estadia larval de uma semana outra de ninfa com duração de cerca de 15 dias. Ao fim destes, obtive oito moscas normais, sendo quatro machos e quatro fêmeas; mostravam o abdome normalmente tesselado, sem vestígio de melanismos e foram determinadas como <i>Sarcophaga tesselata </i>Wied. Assim, fica provado que a cor da mosca era anormal; não podia ser explicada pelo alimento ingerido, nem por algum processo mórbido ou infeccioso e, por isso, deve ser considerada como melanismo. O mesmo se há de ter dado nos casos acima referidos de outros exemplares de <i>Sarcophaga </i>e <i>Stomoxys</i>.</p>
</div>
<div class="section">
<div class="title">
<p>III. Espécies de <i>Sarcophaga </i>de São Paulo</p>
</div>
<p>Por vários anos colecionei, em São Paulo, espécies de <i>Sarcophaga</i>, seja no ar aberto, usando, às vezes, para este fim carne crua e animais mortos, seja revistando diariamente janelas bem colocadas, onde entre muitas outras moscas, costumavam aparecer os dois sexos de muitas espécies de <i>Sarcophaga</i>. Obtive também material de Petrópolis do Sr. J. G. Foetterle, e do Rio de Janeiro, onde colecionei ultimamente, achando, em geral, as mesmas espécies. A determinação feita por mim e em parte por um dipterologista conhecido não satisfez cabalmente. As razões que dificultam a determinação das espécies numerosas e bastante parecidas entre si, comparando-as com as descrições existentes, já se acham expostas na <i>Fauna austríaca </i>de Schiner, que procurou usar para a chave das espécies por ele descritas caracteres anatômicos, como a disposição das cerdas e espinhos encontrados nas nervuras das asas. O mesmo sistema foi adotado por Van der Wulp na <i>Biologia Centrali-Americana</i>. Infelizmente, as espécies numerosas das quais ele dá os caracteres anatômicos procedem do México, muitas vezes de lugares bastante elevados e parece que são quase todas diferentes das nossas. Também a definição pelos caracteres anatômicos nem sempre é fácil; precisa-se de material bom e bastante abundante dos dois sexos, obtendo-se este mais facilmente pela criação da qual me servi em alguns casos. Assim, aprende-se a apreciar o significado da coloração e do desenho, sempre necessários para uma determinação rápida, e das suas variações, e a distinguir o tamanho normal dos exemplares freqüentes de grandeza exagerada ou muito reduzida.</p>
<p>Wiedemann descreveu numerosas espécies de <i>Sarcophaga </i>procedentes do Brasil e em parte mesmo de São Paulo, não se conhecendo exatamente a proveniência das outras. MacQuart acrescentou algumas espécies, nem todas novas; também Schiner publicou, do material da viagem do <i>Novara, </i>algumas descrições, parecendo-me que se não descobriram outras espécies depois dele. Resulta da comparação com a minha coleção que existem espécies indeterminadas, mas não convém descrevê-las antes de ter bem estudado as que já foram descritas.</p>
<p>Sobre a distribuição das várias espécies – circunstância de utilidade para a determinação –, há pouca coisa de conhecido; ao lado de espécies muito espalhadas como a <i>S. chrysostoma </i>e a <i>S. georgina</i>, parece haver outras de <i>habitat </i>mais restrito. A introdução de formas novas afigura-se bastante fácil em vista dos seus hábitos e da sua evolução rápida. Algumas espécies parecem aproximar-se das <i>Tachinae </i>no seu modo de viver, porque se observam às vezes larvas maduras, saindo de insetos mortos e não se pode acreditar, como Schiner, que estas foram sempre depositadas depois da morte do inseto.</p>
<p>Depois de revista a minha coleção creio ter reconhecido, com bastante certeza, as espécies seguintes de Wiedemann: <i>S. georgina, dimidiata, comta, phoenicurus (= rufipalpis </i>MacQ.<i>) obsoleta, calida, lambens, teminalis </i>e <i>modesta</i>. A sua <i>tesselata </i>combina bem com uma espécie bastante freqüente entre nós, sendo, porém, as dimensões desta bastante maiores; outra espécie indígena pode ser referida à <i>S. plinthopyga</i>, descrita por Wiedemann da ilha de Saint Thomas. Outras duas correspondem às <i>S. quadrivittata </i>MacQ. e <i>xanthophora </i>Schiner. Além destas, tenho muitos sarcofagídeos pertencentes a, pelo menos, quatro espécies aparentemente novas. Convém também notar que a coloração vermelha citada por Wiedemann como característica da <i>S. comta </i>só se encontra excepcionalmente nos exemplares apanhados entre nós.</p>
<div class="image">
<p><img src="images/335.png" alt="" /></p>
<p>Paper by Adolpho Lutz in collaboration with Arthur Neiva, published in <i>Memórias do Instituto Oswaldo Cruz </i>(v.III, fasc. II, p.295-300, 1911), in Portuguese and German (two columns). At the end of the paper, it is stated that it was completed in July 1911 at Manguinhos, the name of the ranch where the Oswaldo Cruz Institute was built and the name by which the institution has popularly been known ever since. It is the third paper written in collaboration with Neiva; in 1909, the year after Lutz transfer from the Bacteriological Institute of São Paulo to Manguinhos, he and Neiva had published two papers on <i>Tabanidae </i>in the inaugural edition of <i>Memórias </i>(republished in <i>Entomologia – Tabanídeos</i>, book II of the present volume [II] of <i>Complete Works of Adolpho Lutz</i>).</p>
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<div class="footer">
<p id="c14-ftn1"><a class="hlink" href="#c14-ftn1a"><sup>*</sup></a> Trabalho publicado nas <i>Memórias do Instituto Oswaldo Cruz, </i>1910, v.2, n.1, p.3-8. [N.E.]</p>
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