Contribuição para o estudo das “ceratopogoninas” hematófagas encontradas no Brasil

Primeira memória. Parte geral*

Sumário: Introdução. O gênero Ceratopogon de Meigen e sua definição. A família Chironomidae segundo a concepção de diversos autores. Definições das Chironomidae, da subfamília Ceratopogoninae e de diversos gêneros e subgêneros, segundo Kieffer. Generalidades sobre as Ceratopogoninae . Morfologia, anatomia e biologia. Mosquitos-do-mangue e seus hábitos. Pesquisas de pupas e de suas peles em liberdade na água do mar. Cultura. Existência de pedogênese. Métodos diversos de captura. Captura por meio de focos luminosos: seus resultados. Vantagens e desvantagens. Observações sobre a periodicidade dos mosquitos-do-mangue e seus resultados. Influência das variações de tempo. Da existência de Ceratopogoninae sugadoras de sangue no interior do Brasil. Os hábitos hematófagos nas Ceratopogoninae. Captura no momento em que sugam, conservação, preparação e exame das Ceratopogoninae. Profilaxia dos mosquitos-do-mangue.

Introdução: Conhecemos mosquitos hematófagos entre os Culicidae e Simulidae (que já foram extensamente estudados), as Psychodidae do gênero Phlebotomus e as Chironomidae . As últimas são representadas no Brasil por uma série de espécies muito pequenas, mas, nem por isso, bastante incômodas em certos lugares. Isto se pode afirmar, principalmente, em relação às espécies do litoral conhecidas por maruim ou muruim1 e mosquitinhos-do-mangue . O primeiro nome é de origem índia, sendo de novo encontrado na expressão maringouin, usada por autores franceses; 2o último se repete no nome inglês mangrove fly, derivado do fato que são observadas, de preferência, no mangue.

As espécies encontradas no interior, de preferência em matas úmidas, são conhecidas em muitos lugares por mosquitos-pólvora porque, tanto pelo tamanho, como pela cor, elas lembram grãos de pólvora. As expressões inglesas e alemães sandfly, Sandfliege3 originalmente se referem a estas ceratopogoninas, sendo, por falta de discriminação, também usadas para outros pequenos hematófagos dos gênros Simulium e Phlebotomus. As espécies européias do interior também levam os nomes midges (inglês) e Gnitzen (alemão, lembrando a palavra inglesa gnat ) mas, geralmente, não são bastante conhecidas para merecer nome especial. Parece que em Cuba, como também em outros lugares onde se fala espanhol, a designação jenjen é usada para as espécies hematófagas; nos Estados Unidos, segundo Williston (1908) também se usa a expressão corrente: punkies.

Como já declarei, há anos, estes mosquitinhos pertencem ao gênero Ceratopogon,4 como foi concebido em 1803 por seu autor Meigen (1803).5 Winnertz (1852) na sua monografia clássica do gênero, na qual enumera 77 espécies, pertencentes pela maior parte ao mesmo território, também o compreendeu assim. O gênero Culicoides Latreille (1809) não foi aceito por Meigen, que o julgou imperfeitamente definido; foi seguido nisso por Winnertz (1852), Schiner (1862) e muitos outros dipterólogos. Kieffer (1906), porém, o reabilitou na sua monografia das Chironomidae . Seguindo o seu exemplo, será preciso colocar a maior parte das nossas espécies hematófagas no gênero Culicoides Latreille.

Em seguida darei em primeiro lugar uma tradução da definição que Meigen (1803) fez do seu gênero Ceratopogon, que equivale às Ceratopogoninae de Kieffer, subfamília das Chironomidae.

As Chironomidae por seu lado pertencem aos nematóceros, subordem dos dípteros. Estes (segundo Schiner) são insetos com metamorfose completa, possuindo uma tromba suctória, duas asas (às vezes rudimentares ou ausentes), halteres e tarsos de cinco artículos. Os nematóceros têm antenas alongadas com seis ou (geralmente) mais segmentos e palpos com três a seis artículos. As Chironomidae têm antenas do tamanho do escudo ou maiores, com artículos distintos, munidas de pêlos, mais desenvolvidos no macho do que na fêmea; ocelos faltam; o escudo não tem sutura transversal; as asas, de poucas nervuras, não tem franja de escamas.

Eis a definição de Meigen traduzida textualmente do alemão:

Ceratopogon. Mosquito de barba

(Estampa 2, Fig. 13-18)

Antenas como porretas, filiformes, com 13 artículos; os oito inferiores esféricos no macho, com barba do lado externo, as seguintes cilíndricas alongadas.

Palpos salientes, curvados, com quatro artículos desiguais, não há ocelos.

Asas paralelas e planas acima do abdome.

(Texto em latim: “Antennae porrectae, filiformes, 13 articulatae: articulis octo inferioribus globosis (maris extrorsum barbatis), sequentibus cylindraceis, elongatis. Palpi porrecti, incurvi, quadriarticulati: articulis inaequalibus.

Ocelli nulli.

Alae parallelae incubentes.”)

A cabeça destes mosquitos é achatada adiante; os olhos reticulados em forma de lua; não há ocelos. – Antenas porretas, mais compridas do que a cabeça, nascente dum disco grosso, com 13 artículos: os oito segmentos basais esféricos ou ovóides, no macho munidos de pêlos compridos, formando um feixe ou pincel, dirigido obliquamente para fora (Fig. 13); os últimos cinco segmentos alongados, cilíndricos. Na fêmea os artículos têm a mesma forma, mas os pêlos curtos (Fig. 14). A boca tem uma tromba um tanto saliente com lábio inferior carnoso chanfrado apicalmente; lábio inferior curto, córneo, plano, rijo, pontudo que cobre a língua também córnea e pontuda; os palpos situados dos dois lados do lábio são curvados, cilíndricos, peludos, com quatro segmentos, sendo o primeiro curto, o segundo três vezes mais comprido, os dois últimos mais curtos (Fig. 15-16). Tórax ovóide ou quase esférico deprimido atrás no dorso; escutelo estreito; metanoto muito curto, escondido debaixo do escutelo. Abdome cilíndrico, às vezes um pouco comprimido no macho, com oito anéis. Asas lanceoladas ou fortemente arredondadas no ápice, com pêlos microscópicos; em estado de repouso são paralelos e colocados horizontalmente sobre o abdome (Fig. 17-18). Halteres descobertos. Pernas, quase iguais em comprimento, as articulações basais aproximadas sem intervalo saliente, como nos dois gêneros anteriores.

Estes insetos são encontrados em arbustos e cercas verdes, em flores, principalmente em matas baixas e úmidas. Na primavera, várias espécies são encontradas nos rebentos novos de salgueiros. As do primeiro grupo dão picadas que, em relação ao seu tamanho, são muito dolorosas e procuram às vezes em grande número a pele exposta. Latreille separa estas com o nome de Culicoides em gênero separado, mas eu não acho os seus caracteres bastante distintos. O seu vôo consiste de pequenos saltos em ziguezague estreito. Não se sabe nada dos seus primeiros estádios.

O nome do gênero é derivado de Keras (chifre) e Pogon (barba).

MacQuart (1838) introduziu em 1837 a designação Chironomides sem mencionar os Ceratopogon, mas incluindo o gênero Corethra, hoje geralmente colocado com as Culicidae ou outra família separada.

Schiner (1862) inclui Corethra nas Culicidae e cita as Chironomidae como família separada, correspondendo às definições abaixo citadas de Kieffer (1906); Clauss, porém, faz para estas e Corethra uma família de Culiciformes.6 Osten- Sacken (1878) todavia segue a classificação de Schiner.

Kieffer (1906) deu nos Genera insectorum de P. Wytsman uma monografia das Chironomidae que resume a literatura do assunto até aos tempos mais recentes e que seguirei nas partes principais. Para os nossos fins permite dispensar quase totalmente o resto da literatura, que é muito esparsa e muitas vezes difícil de obter; exemplifica, assim, a utilidade da publicação de Wytsman, donde transcrevo para aqui as definições das Chironomidae e da subfamília Ceratopogoninae:

Fam. chironomidae

Caractères généraux. Insectes de petite taille, de ½ à 14 millimètres. Bouche peu longue, rarement aussi longue que la tête. Antennes de quatre à quinze articles, souvent de quatorze chez le mâle et de sept articles allongés (auf le ler) chez la femelle, souvent encore de quatorze à quinze articles dans les deus sexes; pilosité ordinairement verticillée chez la femelle, celle du mâle très longue et formant panache ou plumet, rarement conformée comme chez la femelle; article basal ordinairement très gros, en sphère déprimée, plus gros chez le mâle que chez la femelle. Yeux le plus souvent réniformes, découpés en arc au côté interne, et entourant plus ou moins la base des antennes; ocelles nuls chez toutes les espèces. – Thorax fortement voûté, souvent prolongé au-dessus de la tête; prothorax en forme d’étroit collier; mésothorax sans suture transversale; scutellum;et metanotum petits. Ailes toujours plus étroites chez le mâle que chez la femelle, parfois raccourcies ou nulles; nervure costale cessant à l’extrémité du cubitus ou la dépassant à peine, sauf chez la sous-famille des Stenoxeninae, fondée su une seule espèce; nervure auxiliaire (pl. 1, fig. 1, m) peu marquée; 1re nervure longitudinale ou sous-costale (pl. 1, fig. 1,1) grosse et aboutissant au bord antérieur; 2 me nervure (pl. 1, fig. 1,2) peu marquée ou nulle: 3me nervure ou cubitus (pl. 1, fig. 1,3) grosse, sortant de la ire, rarement de la base alaire (pl. 1, fig. 5), aboutissant au bord antérieur, rarement à la pointe de l’aile, parfois réunie à la Ire par une transversale (pl. 1, fig. 11, a) ou confluente avec elle en entier (pl. 1, fig. 4) ou en partie (pl. 1, fig. 16); 4me nervure ou discoidale (pl. 1, fig. 1,4) sortant de la base de l’aile, grosse jusqu’à l’endroit ou elle est réunie à la 3me par une transversale qui fait rarement défaut, simple (pl. 1, fig. 1,4) ou bifurquée (pl. 1, fig. 6); 5me nervure ou posticale (pl. 1, fig. 1,5) ordinairement bifurquée, sortant de la base de l’aile, parfois réunie à la 4me par une transversale (pl. 1, fig. 11, d); 6me et 7me incomplètes ou nulles (pl. 1, fig. 1,6 et 7). Entre la 3me et la 4me se voit parfois la trace d’une fausse nervure bifurquée, à base oblitérée (pl. 1, fig. 16). Surface alaire tantôt glabre, et alors tantôt entièrement nue, ou bien paraissant ponctuée, à ponctuation formée par de minimes soies dressées étant considérée sous un fort grossissement. Balanciers formés par une massue pédicellée, sans écaille. Hanches sans écaille. Hanches non fortement allongées; tibias terminés par un éperon court, parfois peu distinct. Abdomen long et grêle.

Nymphe libre, tantôt nageant dans l’eau, tantôt flottant sans mouvement, tantôt reposant sur le sol, les écorces, etc.

Larve de treize segments, y compris la tête, eucéphale, amphipneustique; tête dirigée par en bas; mandibules bien développées, se mouvant obliquement par en bas; dessous du ler segment thoracique et extrémité du segment anal, munis d’un ou de deux pseudopodes manquent chez les Ceratopogoninae, sauf le genre Ceratopogon .

Oeufs allongés, amincis aux deux bouts.

Subfam. ceratopogoninae

Thorax non prolongé au-dessus de la tête; antennes de 14, rarement de 13 articles, dans les deux sexss; le dernier jamais plus long que les deux précédents reunis, les 5 derniers plus allongès ou autrement conformés que les précédents ; celles du mâle portant ordinairement un faisceau de longs poils au tiers basal; nervure discoidale bifurquée, sauf chez Brachypogon ; pattes relativement robustes sauf chez Macropeza .

Entre as Ceratopogoninae Kieffer não distingue menos de 19 gêneros; alguns destes são, todavia, de valor duvidoso ou devem ser considerados sinônimos de gêneros anteriores, abraçando outros apenas um pequeno número de espécies não representadas entre nós. As nossas espécies hematófagas pertencem quase exclusivamente ao gênero Culicoides, mas mencionarei também os gêneros Ceratopogon, Forcipomyia e Palpomyia, por causa das suas particularidades biológicas ou porque incluem espécies de identificação fácil, observadas em Manguinhos. A descrição das espécies novas ficará reservada para a parte especial; aqui citarei, apenas, o necessário para uma caracterização geral. Prossigo na citação dos dados de Kieffer que importam para as nossas espécies:

Genus ceratopogon Meigen

Caractères généraux. – Tête aplatie en avant, prolongée en une bouche longue; yeux réniformes et glabres; palpes de 4 articles, fixés à un prolongement qui ressemble à un article basal. Antennes de 14 articles dans les deux sexes; ler article gros, en sphère déprimée; les 8 à 10 articles suivants globuleux ou avoidaux, munis, chez le mâle, de longs poils formant un panache, chez la femelle, de verticilles de poils ou courts; les 3 à 5 derniers articles plus allongés, avec une pilosité courte, et avec un verticille de poils. Thorax fortement convexe mais non prolongé au-dessus de la tête. Ailes horizontales au repos, ciliées et velues, c’est-à-dire avec des poils longs et appliqués, au moins sur une partie de leur surface; cubitus aboutissant souvent avant le milieu du bord antérieur de l’aile, réuni à la sous-costale par une transversale ou bien confluente avec elle sur une partie de sa longueur ou en entier; discoidale bifurquée, réunie au cubitus par une transversale; posticale bifurquée; 2e nervure nulle; entre le cubitus et la discoidale se voit parfois un vestige d’une nervure bifurquée et libre à sa base; 6me et 7me nervures indistinctes ou incomplètes. Pattes robustes’ relativemente peu longues, rapprochées à leur insertion; fémurs inermes, non fortement épaissis; métatarse plus long que le 2me article ou égal à lui (sous-genre Forcipamyia); crochets, velu sur le dessous. Abdomen de huit segments; pince du mâle à articles basaux sans appendices, les terminaux longs et graduellement amincis en pointe, rarement faiblement trilobés à l’extrémité. Insectes de petite taille (1 à 3mm).

Biologie – Nymphe engagée par l’extrémité de l’abdomen dans la dépouille de la larve; thorax avec 4,6 ou 8 soies très longues, simples, plumeuses ou spinuleuses; segments abdominaux avec une rangée de soies semblables mais beaucoup plus courtes, parfois chaque segment avec une spinule au milieu de la partie dorsale; stigmates thoraciques plus ou moins proéminents.

Larve – Corps de 13 segments, y compris la tête; segments rétrécis aux deux bouts, lisses ou couverts en tout ou en partie de verrues spiniformes ou verrues étoilées; tête chitineuse; mandibules dentelées, se mouvant obliquement par en bas; lèvre supérieure et inférieure assez semblables à celles des Sciarines; yeux nuls; antennes tantôt simples et sétiforemes, tantôt articulées et composées de 2 à 4 articles; dessous du ler segment thoracique avec deux pseudopodes plus ou moins soudés entre eux, lisses ou couverts de verrues spiniformes, terminés par plusieurs crochets simples ou bifides, souvent entremêlés de quelques appendices filiformes et beaucoup plus longs; segment anal terminé par deux pseudopodes dirigés obliquement en arrière, souvent très courts et soudés, armés de crochets, et audessous d’eux avec quatre lobes hyalins. Ces larves sont remarquables entre toutes celles des Chironomidae par les appendices ou les soies longues et diversements conformées qu’on voit sur le dessus de leur corps; le dessus de leur tête offre 10 soies; les 11 segments suivants ont une rangée transversale de 8 papilles dorsales et, de chaque côté, de 2 papilles latérales; 1 er segment anal avec 2 rangées de 4 papilles; ces papilles, tantôt simples et libres, tantôt plus ou moins vésiculeuses et confluentes, toujours terminées par une soie, tantôt simple, tantôt spinuleuse, tantôt filiforme avec l’extrémité renflèe en globule ou en fer de lance, etc. Les soies du dessous du corps sont disposées de la façon suivante: tête avec une rangée transversale de 4 ou 6 soies; les 3 segments thoraciques avec 2 courtes soies sternales au milieu, et de chaque côté, plus rapprochées du bord postérieur, 2 courtes soies pleurales; les 8 segments abdominaux avec 4 soies ventrales antérieures, et en arrière, de chaque côté, deux soies ventrales postérieures rapprochées l’une de l’autre; segment anal avec soies antérieures et 6 soies postérieures situées derrière le milieu. On distingue 2 trachées latero-dorsales, réunies à chaque segment, par une anastomose presque droite et transversale; au premier segment thoracique, chacune émet en dehors un rameau plus faible aboutissant à un stigmate à peine proéminent; ces stigmates manquent aux 2 segments suivants; les 8 segments abdominaux avec des stigmates peu distincts.

Moeurs – Ces larves vivent sous les écorces des arbres, sur des plantes plus ou moins décomposées, dans la résine des conifères, dans les plaies humides sur les troncs des arbres, dans les fourmillières, ou même dans du fumier décomposé; rarement aussi sous les pierres humides.

TABLEAU DES SOUS-GENRES (1)

(1)Les deux sous-genres ne sont pas nettement séparés; chez le mâle de C. boleti le métatarse est égal au deuxième article, tandis que, chez la femelle, il est plus long que le deuxième article; chez plusieurs autres espèces, le métatarse est plus court que le deuxième article chez le mâle et l’égale ou dépasse chez la femelle.

1. Subgenus CERATOPOGON Meigen.

Caractères généraux – Métatarse postérieur plus long que l’article suivant; article terminal de la pince du mâle grêle et graduellement aminci en pointe.

Distribution géographique des espèces. – Les 78 espèces qui sont à rapporter à cesous-genre, reviennent à l’Europe, l’Amérique et l’Australie.

2. Subgenus FORCIPOMYIA Megerle.

Caractères généraux – Métatarse postérieur plus court que l’article suivant; ou bien l’égalant chez la femelle et plus court chez le mâle.

Distribution géographique des espèces. – Ce sous-genre comprend 17 espèces d’Europe, d’Amérique et d’Australie.

3. Subgenus ATRICHOPOGON Kieffer.

Caractères généraux – Ailes à surface glabre; cubitus aboutissant entre le millieu et l’extrémité de l’aile, confluente avec la première nervure longitudinale ou réunie à elle par une transversale; bifurcation de la quatrième située un peu après la transversale. Pattes inermes; métatarse postérieur plus long que l’article suivant; tous les crochets tarsaux simples, ègaux; empodium grand et obovalaire. Quant au reste, semblable au genre Ceratopogon .

Distribution géographique des espèces.- Ce sous-genre ne comprend quem trois espèces d’Amérique.

1 Genus culicoides Latreille

Caractères généraux – Ailes à surface velue en entier ou en partie, au moins chez la femelle; cubitus réuni à la première nervure par une transversale, ou bien confondu avec elle en entier ou en partie; quatrième bifurquée tantôt dès la base (Dufourt et hippocastani), tantôt vers le milieu. Fémurs inermes; métatarse postérieur plus long que l’article suivant; crochets tarsaux simples, égaux, avec une ou plusieurs soies sur le dessous; empodium peu distinct, n’atteignant pas la moitié de la longueur des crochets. Flagellum, avec les huit premiers articles globuleux ou ovoidaux, les trois à cinq derniers allongés. Quant au reste, semblable au genre Ceratopogon .

Biologie – Nymphe dépourvue d’appendices ou de soies spinuleuses, à peu près glabre, segments abdominaux avec une rangé transversale de minimes spinules fixées à une arête divisant le segment en deux parties; segment anal sans rangée de spinules, mais à bord prolongé en coupe et portant à son extrémité deux spinules sur le dessus et deux de chaque côté.

Larve en forme d’anguille et très agile, glabre, dépourvue d’appendices et différant de toutes les autres larves de Chironomides par l’absence de pseudopodes sur le dessous du ler segment thoracique. Corps de treize segments, y compris la tête. Celle-ci chitineuse; taches oculaires simples ou doubles, et situées de chaque côté de la tête; antennes remplacées par un poil placé en avant de la tache oculaire; ouverture buccale située sur le dessous de la tête; mandibules élargies à l’extrémité, armées de trois ou quatre dents externes, semouvant d’avant en arrière et indépendamment l’une de l’autre. Segments somatiques glabres; ler segment thoracique avec une fine soie de chaque côté sur la partie ventrale; segment anal ayant de chaque côté trois soies semblables, terminé par un bourrelet binodal, rétractile, hyalin et portant sur chacun des deux renflements plusieurs crochets chitineux et mobiles; huit appendices hyalins et étroitement lanceolés forment une couronne à l’extrémité du bourrelet et peuvent, comme ce dernier, être entièrement clos; les deux vaisseaux principaux sont bien distincts au moins dans les quatre premiers segments somatique; au segment anal, ils convergent et paraissent ne former qu’un tube unique aboutissant à la couronne des huit appendices lancéolês; dessus du segment anal sans faisceaux de poils.

Moeurs – Les larves connues jusqu’à présent, vivent dans le suc séveux et épaissi, qui s’écoule des plaies des troncs d’arbres. L’insecte parfait nous incommode par ses piqûres.

Distribution géographique des espèces – ce genre comprend 49 espèces appartenant à l’Europe, à l’Amérique et à l’Australie.

Genus palpomyia Megerle

Caractères généraux – Ne diffère du genre précédent (=Genus Ceratolophus, Kieffer) que par la conformation des pattes; tous les fémurs ou une partie des fémurs armés sur le dessous, d’une ou de plusieurs épines; fémurs non fortement épaissis; dessous du dernier article tarsal tantôt spinuleux, tantôt velu; crochets tarsaux de la femelle tantôt égaux et avec une dent au côté interne, tantôt égaux et simples, tantôt inégaux et simples.

Biologie – Les larves de ce genre vivent dans l’eau et ne se distinguent de celles du genre Bezzia que par les soies anales, qui sont seulement au nombre de huit et toutes d’égale longueur.

Nymphes flottant dans l’eau, à peu près immobiles et dans une position verticale.

TABLEAU DES SOUS-GENRES

Subgenus PALPOMYIA Megerle

Caractères généraux. – Article terminal des tarses velu sur le dessous. Quant au reste, comme plus haut (?).

Description géographique des espèces. – Les 48 espèces reviennent à l’Europe et à l’Amérique du Nord.

Posto que bastante bem estudada na Europa, a subfamília das Ceratopogoninae com poucas exceções7 ficou completamente descuidada nas outras regiões, o que aliás facilmente se compreende. Trata-se de formas numerosas, pela maior parte muito pequenas, necessitando preparação minuciosa, e cuja determinação é difícil, mesmo quando são bem conservadas. Também só têm importância prática, quando molestam pelas suas picadas. Estas espécies hematófagas são mais vezes citadas na literatura, porém uma boa descrição só pode ser dada por quem já tiver bastante conhecimento do assunto. Assim se explica que se conhece apenas uma pequena parte das espécies, sem dúvida numerosas em todos os países, onde não há falta absoluta de calor e umidade. Algumas das descrições existentes são prejudicadas pela ignorância dos caracteres mais importantes e alguns dos gêneros novos parecem ser de valor duvidoso.

Se já maior número dos lepidopterologistas exclui dos seus trabalhos os microlepidópteros, que são apenas relativamente pequenos, não se pode censurar os dipterologistas que preferem tratar das numerosas formas maiores e mais vistosas e que podem ser estudadas sem aumentos fortes, considerando o estudo de tais formas diminutas como mera especialidade. Pessoalmente, posto que já tenha observado de passagem maior número de espécies indígenas, também hesitaria a sacrificar o tempo que um estudo mais minucioso exige, e apenas a importância prática, ligada hoje ao estudo de todos os dípteros hematófagos, me levou a aprofundar este assunto difícil, a fim de estabelecer uma base para pesquisas subseqüentes.

Morfologia, anatomia e biologia dos primeiros estados

Na descrição dos primeiros estádios das Ceratopogoninae e principalmente das espécies hematófagas não me baseio somente na literatura, que é bastante incompleta (sendo que os seus dados muitas vezes não se aplicam às nossas espécies) mas, de preferência, em observações próprias, feitas ora ocasionalmente (principalmente durante os longos estudos que realizei sobre os nossos culicídeos) ora instituídas especialmente para a solução das questões pendentes.

Os ovos são alongados, em grau variável; nos Culicoides têm a forma ovocilíndrica alongada e um pouco encurvada que se pode comparar à das bananas; a casca de branco puro enegrece logo depois da expulsão, mas é tão fina, que a larva, e principalmente as manchas oculares desta, podem ser percebidas antes do desalagamento. As larvas novas se distinguem das mais velhas, principalmente pelas dimensões e só podem ser percebidas a olho nu em condições muito favoráveis, visto não serem somente muito curtas, mas também extremamente finas e transparentes.

As larvas das Ceratopogoninae manifestam certa tendência a emancipar-se das águas correntes ou estagnadas, que, como para as outras Chironomidae, devem ser consideradas como habitat primitivo e normal; podem viver fora da água, mas, assim mesmo, precisam, sem dúvida, de bastante umidade. Na Europa, algumas espécies foram encontradas debaixo da casca de árvores, na madeira podre ou na seiva, que corre de certas árvores, o que pode ser considerado como uma transição do meio úmido para o ar. Estas observações não devem ser consideradas como regra geral e, mesmo que se aplicassem a todas as espécies européias, o que me parece muito duvidoso, não teriam o mesmo valor para as nossas espécies indígenas. Estas, pelo menos em parte, são francamente aquáticas, algumas só vivem no litoral e outras, das quais algumas são hematófagas, vivem em água doce corrente ou estagnada, sendo muitas vezes especialmente adaptadas à água contida em certas plantas, como bromeliáceas e bambusáceas.

Uma das razões por que estas larvas facilmente passam despercebidas é que não gostam muito da luz. Se muitas Chironomidae fabricam tubos na lama, nos quais se escondem, as Ceratopogoninae muitas vezes se escondem, penetrando no fundo lodoso da água. Sem dúvida, aparecem, de vez em quando, na superfície, mas só com bastante esforço e com fortes movimentos serpeantes e logo afundamse outra vez, se não acham um ponto de apoio. Neste ou no fundo, podem ficar imóveis durante muito tempo. Quando, em lugares úmidos, saem da água, o que às vezes se observa, são dificilmente percebidas, por causa da sua transparência. Mais facilmente encontram-se as pupas maduras que se demoram na superfície e os casulos vazios que bóiam, até achar um corpo sólido no qual geralmente se prendem. Os casulos maduros mostram as mesmas particularidades.

As larvas que vivem em buracos de caranguejos nas bromeliáceas ou nos internódios das taquaras devem, às vezes, passar quase ou inteiramente sem luz. A pouca claridade, que porventura entra, deve servir aos dípteros recém-saídos das ninfas para mostrar o caminho do ar livre. Estes dípteros também mais tarde procuram muito a luz.

As larvas de Culicoides, pelo menos as aquáticas, que nos interessam especialmente, têm todas o mesmo tipo, que se pode chamar vermicular ou nematóide . O corpo cilíndrico é sempre muito delgado com as extremidades afiladas, a cefálica um pouco menos do que a caudal. A base da cabeça não se destaca por maior grossura e a cápsula cefálica, quitinosa, é delgada, e apenas ligeiramente amarelada. O corpo é formado por 12 segmentos, separados por constrições bastante profundas. A superfície, nos Culicoides, é quase completamente glabra; em outros gêneros é munida de algumas cerdas finas de cor clara, sendo o número, em cada segmento, pequeno. Há outros com pêlos ramificados. Culicoides têm também alguns pêlos isolados, principalmente nas duas extremidades do corpo. As larvas, ao princípio, são completamente transparentes; mais tarde, principalmente em alguns gêneros, tornam-se mais opacas pelo desenvolvimento do corpo adiposo, mas, sempre, se distinguem facilmente os órgãos internos. Consistem no intestino, com dois tubos de Malpighi muito contortos; o coração e o sistema nervoso aparecem distintamente. Além disso, o corpo é percorrido por dois tubos traqueais, adelgaçados nas duas extremidades e tendo ramificações finas, formando um sistema fechado sem comunicações com estigmas. Há, todavia, uns apêndices branquiais, mais ou menos desenvolvidos, que podem ser evertidos, apresentando a forma de estrela, sendo formados de ramificações quase cônicas. A cápsula cefálica é bastante longa, um pouco dirigida para baixo e munida de antenas e palpos muito reduzidos. Os olhos são formados por pequenas manchas de pigmento singelas ou duplas; o olho composto só aparece depois da metamorfose.

Correspondendo à cabeça delgada o orifício bucal é muito fino; sendo também os órgãos de mastigação pouco desenvolvidos, só poderão ser aproveitados para partículas alimentares muito miúdas. O processo de nutrição parece pouco ativo e o período larval pode durar bastante tempo.

As ninfas, pouco móveis, parecem-se com as de culicídeos sendo todavia mais finas e alongadas. Como nos pequenos culicídeos, o período ninfal é muito curto e a ecdise parece realizar-se de modo perfeitamente análogo. As pupas aquáticas dos ceratopogonídeos terminam em duas pontas subcônicas de direção variável, funcionando como órgão de propulsão. Sobre o dorso do cefalotórax da ninfa há dois tubos respiratórios, cuja forma é o melhor distintivo das espécies e, quiçá, também, dos gêneros.

As larvas das bromeliáceas, que fornecem geralmente espécies de Ceratopogon s. str. e de Forcipomyia, aproximam-se mais do tipo das larvas de Chironomus, possuindo no último e, às vezes, também no primeiro anel do corpo dos dois pés truncados, nem sempre bem separados, mas tendo, cada um, uma coroa terminal de ganchos. A cabeça com os seus apêndices é menos reduzida, os segmentos mostram cerdas compridas simples ou compostas, em número ora maior ora menor. Larvas análogas acham-se também nos bambus ao lado de larvas típicas de Culicoides. As espécies marinhas de Ceratopogon têm o corpo quase tão glabro como os Culicoides mas a cabeça é mais quitinizada e mais grossa.

A morfologia dos primeiros estádios nos vários gêneros e, talvez, mesmo nas espécies dos mesmos, varia conforme o modo de viver, devendo-se evitar a generalização das poucas observações até hoje feitas.

Das Ceratopogoninae observadas em zonas quentes e que atacam o homem e os grandes animais domésticos, quase todas as espécies, principalmente as do mangue, pertencem ao gênero Culicoides Latreille que difere de Ceratopogon pelos empódios pouco desenvolvidos dos adultos e pelas larvas. O desenho e revestimento piloso das asas parece constituir uma distinção adicional de percepção mais fácil. Pelo menos, as espécies que eu conheço e que formam um grupo muito homogêneo não mostram os pêlos maiores tão igualmente espalhados sobre as asas como os têm a maior parte das espécies de Ceratopogon e Forcipomyia, mas a asa é caracterizada por uma particularidade que falta a estes últimos. Quero falar da presença de manchas redondas, faixas ou zonas extensas de coloração mais clara, já visíveis por transparência, mas, destacando-se muito mais à iluminação lateral, assumindo, então, a asa aspecto muito esquisito. No interior, conheço uma ou duas espécies hematófagas que, julgando somente pelos caracteres das asas deviam, ser classificadas como Ceratopogon ; todavia, representam, indubitavelmente, novo gênero. As larvas destes talvez se desenvolvam nas bromeliáceas que são hábitat predileto dos gêneros Ceratopogon e Forcipomyia ; as taquaras parecem ser preferidas pelo gênero Culicoides.

Não posso deixar de observar aqui que, provavelmente, as diferenças mais importantes entre os gêneros serão dadas pelos caracteres das partes bucais. Assim Culicoides, ao contrário do que se observa em Atrichopogon e Ceratopogon, tem sempre seis lâminas quitinosas, mesmo, no macho, mas também toda a tromba tem uma forma diferente. Parece isso uma regra geral para todos os gêneros hematófagos; os outros têm um número reduzido de partes bucais. O revestimento do corpo pode ter importância, mostrando, às vezes, escamas distintas, embora estreitas. A forma dos ovos, que pode ser reconhecida na fêmea madura, contribui ocasionalmente para distinguir os gêneros. Assim, achei-os muito compridos em Ceratopogon e Culicoides e curtos em Forcipomyia. As diferenças tiradas do tamanho do empódio não podem sempre ser utilizadas, parecendo haver formas de transição. O que Johannsen menciona como pequenas cerdas na base das unhas não me parece nada mais que as primeiras plumas do empódio e sem valor distintivo. Julgo, todavia, que Latreille foi muito bem inspirado, quando separou Culicoides e Ceratopogon, havendo diferenças nas asas, na tromba, nas larvas e ninfas e, finalmente, também, nos hábitos.

As espécies conhecidas de Culicoides do mangue, com hábitos semelhantes aos do nosso maruim, são as seguintes: Ceratopogon phlebotomus Williston, e molestus Skuse que, sem dúvida, pertencem aos Culicoides. 8 Há outras espécies de Williston (1908), Skuse (1890) e Philippi (1865) que, provavelmente, entram no mesmo grupo. Concordo com a opinião de vários autores de que, também, a Oecacta furens de Poey (1851) é um Culicoides; parece ser, também, espécie de mangue.

No mangue de Manguinhos, há quatro ou cinco espécies que pertencem a este grupo e, uma delas, que aparece em número maior, é geralmente conhecida. Outras espécies acham-se no interior das regiões habitadas como o C. pulicaris L . de Europa e um Culicoides que descobri em São Paulo, descrito por Coquillett (1904) sob o nome de Ceratopogon guttatus.

Não se pode determinar exatamente o número de espécies do mangue já conhecidas, porque as descrições e as indicações de hábitat são geralmente muito vagas; pode-se presumir todavia que haja maior número, visto num só lugar existirem quatro ou cinco. De Culicoides, em geral, Kieffer registra 49 espécies, mas este número só tem valor relativo, visto que os autores, na sua maior parte, não se preocuparam com a determinação do gênero.

Uma particularidade dos mosquitinhos-do-mangue, bem conhecida pelo povo, consiste no fato que, sem serem limitados a uma estação, eles, às vezes, aparecem em número maior e incomodam os habitantes da região vizinha a tal ponto que estes, em certas regiões, preferem abandonar o lugar, durante o período de maior freqüência. Do outro lado, há dias onde se pode passear no próprio mangue, sem ser picado. Esta abundância ou falta de maruim é geralmente atribuída às fases da lua e às marés dependentes destas.

No intuito de verificar a exatidão destas opiniões populares dirigi a minha atenção especialmente sobre a freqüência do maruim, sendo que Manguinhos se presta muito a estes estudos, por incluir em sua área um pedaço de mangue. Deve mesmo o seu nome a este fato.

Tratava-se em primeiro lugar de resolver a questão do hábitat normal das larvas de maruim. Se, dum lado, era opinião corrente que estes sugadores se criavam no mar, ninguém lhes tinha achado os ovos, larvas ou ninfas. Discordavam, ainda, as declarações dos autores no tocante ao habitat das larvas das Ceratopogoninae, especialmente das dos sugadores de sangue que geralmente criam, seja debaixo da casca ou na madeira podre de árvores, seja na seiva, emanando destas.

Já faz alguns anos que colhi a primeira vez o lodo tenaz e de mau cheiro, em vários pontos do mangue, ora embaixo da água, ora na margem desta, mas, com muito trabalho, achei apenas uma larva, que parecia pertencer a uma das formas procuradas. O exame é muito difícil e demorado, porque o lodo não passa por peneiras e redes bastante finas e mal se deixa lavar e decantar. Contém poucas formas animais, o que não admira, em vista do cheiro pronunciado de gás sulfídrico que se nota nele. Também, o exame da água do mangue não deu resultado e parecia claro que por este caminho não se chegaria ao fim de conhecer e estudar os primeiros estádios. Um exame minucioso, nas árvores do mangue, do tronco e das raízes expostas, tantos das adventícias como respiratórias, não permitiu encontrar as larvas. Tanto por exclusão, como em virtude de razões teóricas, voltei ao exame dos buracos de caranguejo que, a princípio, também, não me tinham dado resultados.

Convém mencionar que o mangue é habitado por uma série de crustáceos braquiúros9 quase todos muito numerosos; mas, nem todos eles fazem buracos. Na localização destes pode-se distinguir duas categorias. Uns fazem buracos no lodo que fica constantemente, ou pelo menos uma parte do tempo, debaixo da água, nunca secando completamente, o que facilita o trabalho de escavação. Principalmente a Uca vocator existe em número enorme e os seus buracos pequenos e muito conchegados, geralmente pouco profundos, contêm água mais ou menos salgada; outras espécies fazem buracos largos, profundos e às vezes bastante tortuosos. Isso se dá com Oedipleura cordata, encontrada mais isoladamente no meio das ucas. Do outro lado, há uma espécie maior, terrestre, o guaiamu (Cardisoma guanhumi) cujos buracos tem o orifício a alguma distância e acima do nível médio do mar, onde geralmente o terreno é mais arenoso. A água, que ali se encontra em certa profundidade, é doce ou apenas salobra, mas sempre muito mais clara e limpa, tendo sofrido uma filtração pela areia que substitui em parte o lodo.10

Procurei então estabelecer, dum modo definitivo, se os buracos de caranguejos e quais deles podiam servir de criadouro de maruim. Com este fim, construí sobre um pedaço do mangue banhado uma espécie de tolda baixa de papel, pintada de óleo de linhaça cozido, na qual adeririam os mosquitinhos que, saindo das ninfas, procurassem voar. Nos buracos maiores, ou por cima destes, foram colocadas garrafas de boca larga ou cristalizadores, que mais tarde foram, em parte, substituídas pelas campânulas de vidro, geralmente conhecidas e usadas para apanhar moscas. O rego interior recebeu uma mistura de água, álcool e glicerina em partes iguais, com adição dum pouco de ácido fênico que mata rapidamente os mosquitinhos e os conserva bem. Podem ser examinados neste líquido ou transportados imediatamente para gelatina glicerinada.

Sendo os buracos geralmente habitados por caranguejos, estes freqüentemente protestavam dum modo enérgico, entornando os vidros e puxando as garrafas para fora; houve também outras dificuldades. Nem por isso toda a questão não tardou a ser resolvida em princípio.11

Enquanto os buracos do lodo, mais ou menos submergidos, não davam quase resultado, os maiores com a abertura no seco forneceram abundantes exemplares de uma espécie de Culicoides (C. reticulatus n. sp.). Notou-se no mesmo tempo que eram habitados constantemente por duas espécies de mosquitos, a saber: Culex corniger Theob. e uma outra espécie muito comum, o Culex (Culicelsa) taeniorhynchus. Ambas podem viver também em outras águas, mas são adaptados especialmente à vida nos buracos de caranguejo e só se encontram no litoral. De outro lado, tanto nestas investigações como em outras anteriores, nunca foi encontrado um Deinocerites e este gênero não parece ser representado na nossa zona de observação.

Procurei em seguida aspirar a água dos buracos grandes, por meio de bombas, mas eram eles tão profundos e tortuosos que não raras vezes era preciso cavar primeiro, mais ou menos profundamente.12 Então, na água retirada e na que se juntava na cova apareciam larvas, ora no fundo, onde, às vezes, se escondiam, ora mesmo na superfície, serpeando vivamente e, às vezes, subindo mesmo nas paredes de vidro. Os movimentos geralmente são muito vivos, enquanto a larva não tem ponto de apoio; achando este, pode tornar-se completamente imóvel. As ninfas mostram poucos movimentos e só se conservam constantemente na tona d’água quando o inseto está para sair.

Por grande número de experiências, feitas durante muito tempo, verifiquei de modo seguro que, das quatro ou cinco espécies hematófagas do mangue, só uma vivia nos buracos de “guaiamu”, em água mais ou menos doce. Esta, precisamente, mostrava menos periodicidade, sendo em grande parte independente dos movimentos da maré. Quanto às outras espécies, tornei a procurá-las na água do mar que circulava livremente no mangue. Numa ocasião de grande freqüência do maruim, foram encontradas ninfas vivas que produziram mais três espécies das de conhecida periodicidade. O inseto pode sair da ninfa, boiando, mas tenho razões para pensar que, geralmente, estas só se formam quando o fundo do mangue fica seco. Os casulos podem ser distinguidos, mas na primeira ocasião não foram separadas e mais tarde, em várias ocasiões, só se obtiveram casulos vazios13 de várias espécies.

Os buracos maiores de caranguejo legítimo (Oedipleura cordata), que ficavam expostos apenas com maré baixa, e, também, os pequenos da Uca vocator não forneceram as larvas procuradas. Estas vivem na zona inundada e, portanto, é quase certo que se escondam muito bem por dentro da própria lama. Sendo esta exposta, e tendo tempo de secar um pouco, provavelmente, dá impulso à metamorfose de muitas larvas em ninfas, saindo o inseto poucos dias depois. A cultura da espécie Culicoides reticulatus mostra que, se o período larval pode ser muito longo, todavia o estado da ninfa sempre dura pouco tempo, o que explica a sua raridade comparativa. A paedogenesis observada em outras Chironomidae nunca o foi neste gênero. Lembrei-me desta possibilidade porque, na espécie mais comum, a maturação dos ovos é muito vagarosa e de observação difícil. Finalmente, obtive sempre alguns ovos depositados sobre a água, mas desconfio que, em condições normais, todas as espécies marinhas desovem em lugares momentaneamente expostos pela maré baixa.

Se não consegui descobrir as outras larvas de Culicoides, achei, pelo menos, duas espécies de Ceratopogon e uma de Forcipomyia completamente marinhos, vivendo escondidas na lama, abaixo da sua superfície. As ninfas aparecem mais à vista, geralmente, presas às algas que cobrem, muitas vezes, as raízes respiratórias.

Consegui, finalmente, encontrar no mar algumas larvas de Culicoides, comportandose como as de C. reticulatus, mas tendo muito mais tendência a esconder-se. Pertencem à pequena espécie, idêntica ao C. maculithorax Williston, e a outra maior (C. insignis n. sp . ). Para obter os maruins em maior número e fazer observações sobre a relativa freqüência com que aparecem os adultos, foi preciso procurar outros métodos dos quais foram usados, de preferência, os quatro seguintes:

1. O método de apanhar os mosquitinhos no mangue, ou perto dos buracos de caranguejo, por meio de redes finas, ou de outro aparelho apropriado, pelo qual se obtém ambos os sexos. é pouco rendoso, porque falta geralmente vegetação apropriada sobre a qual se poderia, facilmente, colher as mosquinhas. Para certas formas de água doce este método, empregado perto dos criadouros, dá resultados ótimos.

2. A caça dos maruins, quando atacam o homem, ou animais maiores, pode fornecer muitas fêmeas e dar idéia sobre a freqüência relativa das diversas espécies. O melhor processo será explicado mais abaixo.

3. A procura dos maruins, principalmente das fêmeas repletas, nas casas, cocheiras etc. geralmente não dá grande resultado. Todavia numa estrebaria, situada perto do mangue, as fêmeas da espécie mais comum podiam ser encontradas de manhã em lugares escuros da parede, em número relativamente grande, mesmo quando se tinha notado que não atacavam as pessoas. Sobre os vidros das janelas, ambos os sexos podem ser encontrados, mas, geralmente, em menor número do que era de esperar. Sendo eles freqüentes, pode se colher maior número em teias de aranha, mas estes exemplares, que só na menor parte estão cheios de sangue, geralmente pouco prestam. Nunca se observa um aparecimento tão grande, como em certas outras Chironomidae, onde há formação de verdadeiras nuvens.

4. Os melhores resultados são, sem, dúvida, obtidos pela caça com a luz, como já conhecia por observações, feitas há muitos anos. Com este modo, só em Manguinhos obtive mais de uma dúzia de espécies de Ceratopogoninae, em parte, muito interessantes e, muitas vezes, fêmeas com ovos já bastante desenvolvidos.

Comecei por estabelecer no mangue um aparelho apropriado, consistindo de vela, com a chama protegida por uma campânula de vidro e mantida sempre na mesma altura, por uma mola, em espiral. Abaixo da campânula havia um receptáculo apropriado, contendo o líquido já mencionado e que recebia as mosquinhas ao cair da campânula de vidro. Para melhor comparação, todas as noites se acendia uma vela, que ardia até ao fim. Assim, apanhava-se naquele lugar principalmente as espécies do mangue, porém não exclusivamente, porque na vizinhança havia também água doce empoçada ou em gragoatás (bromeliáceas). Usei também, com bom resultado, um aparelho com lâmpada de querosene.

Mais tarde, empreguei uma lâmpada elétrica de fios metálicos, representando o poder luminoso de cinqüenta velas, fixada a alguma distância do mangue, num poste de cerca de nove metros de altura e visível de todos os lados. Freqüentemente, era mantida acesa toda a noite e o receptáculo, colocado embaixo, dava sempre resultado, às vezes pobre, outras vezes muito rico. Havia percentagem maior de mosquitinhos de origem palustre e de outros insetos, especialmente pequenas mariposas, cujas escamas, misturando-se ao líquido, eram um tanto incômodas. Ao lado de culicídeos observava-se uma série de novas espécies de Ceratopogon e Palpomyia, como, também, outros representantes dos nematóceros.

A caça pela luz dá idéia aproximativa do número de mosquitinhos existentes, mas não está livre de fontes de erro, porque, quando há luar forte, ou com tempo desfavorável (vento e chuva forte, frio), os resultados são mínimos. Também, a observação direta da disposição agressiva do maruim é sujeita aos mesmos erros, se não for feita no próprio mangue, porque a distribuição maior ou menor dos mosquitinhos em torno do mangue depende de condições meteorológicas.

Para verificar o número dos maruins foram feitas notas sobre a sua tendência agressiva. Aparecendo eles principalmente no crepúsculo e de noite, pedi ao sr. A. Paecke, que trabalha neste Instituto e mora com a sua família num lugar muito perto do mangue, para registrar as suas observações, o que ele fez com muita regularidade durante seis meses. As suas informações, muitas vezes conferidas por mim, concordam, dum modo geral, com os resultados obtidos por outros métodos.

O resultado final de todas estas observações era que os maruins principiavam, geralmente, poucos dias antes da lua cheia, ou nova, a ficar mais freqüentes, sendo muito abundantes durante alguns dias e diminuindo depois, gradualmente, até às vezes desaparecer, por completo. Assim, as marés cheias podem coincidir com um maior número, mas, o princípio do aumento indica, antes, influência das marés vazias.** Na baía do Rio de Janeiro, onde está situado Manguinhos, a altura das marés não é das mais fortes e a sua marcha regular é bastante alterada pela influência das condições meteorológicas, que também agem sobre o maruim, o que tudo contribui para produzir certa irregularidade; assim, as regras citadas só têm valor geral e aproximativo, não sendo raras as observações contraditórias.

Sobre as espécies que aqui existem no interior, em matas úmidas, só posso dizer que não aparecem sempre com a mesma freqüência e tendência agressiva, embora não se conheça periodicidade certa. Parece que secas prolongadas constituem condição desfavorável. Em geral, estas espécies não aparecem em territórios extensos, nem saem muito do seu hábitat constante.

Falta ainda dizer algumas palavras sobre os hábitos hematófagos. São observadas nas fêmeas de muitas espécies que pertencem a vários gêneros (Tersesthes Townsend, Mycteromyia Noe, Culicoides Latreille e Johannseniella Williston (= Ceratolophus Kieffer) que diferem bastante entre si. Os representantes dos outros gêneros, provavelmente, se alimentam com os sucos de animais menores, como sejam insetos, o que foi várias vezes verificado. Assim recebi, ainda há pouco, do sr. Townsend fêmeas de uma espécie de Forcipomyia, colhidas no Peru, no ato de sugar uma lagarta de Sphyngidae, e outra do sr. prof. Bezzi, colecionada por Barbiellini, em São Paulo, em circunstâncias análogas. Quanto aos machos, provavelmente, não procuram alimentação de origem animal. As fêmeas das espécies hematófagas têm seis estiletes na tromba, as outras, apenas quatro ou dois.

As espécies de Culicoides mostram, no lugar, a posição habitual, com as asas paralelas superpostas e cruzadas. Assim, se distinguem facilmente das espécies de Simulium e Phlebotomus; o seu tamanho pequeno não permite confusão com outros dípteros hematófagos. Por causa da tromba curta, os estiletes devem entrar na pele até perto da base, ficando a cabeça completamente encostada. Assim mesmo, muitas vezes, não conseguem alcançar bastante sangue com a primeira punção e a ingestão sempre dura muito tempo. Por isso, torna-se fácil matar os mosquitinhos, mas difícil tirá-los, vivos, de sobre a pele, na qual os órgãos de punção ficam de tal modo presos que só podem ser retirados com esforço evidente. Também nestes hematófagos a quantidade de sangue absorvida parece desproporcional, distendendo o abdome que toma forma de óvalo grosso.

Querendo colecionar-se as fêmeas a seco, o melhor é aspirá-las logo, por meio de tubo de vidro, obtendo-se assim, rapidamente, um número maior. A caça por meio de provetas ou outros vidros precisa de bastante tempo, durante o qual o caçador se arrisca a muitas picadas. Aparecendo os maruins, geralmente, em grande número, convém expor somente a mão e o antebraço do lado esquerdo, onde é fácil observar e apanhá-los. Não se precisando de exemplares conservados a seco, o melhor método é tocá-los com um pincel, que fica conservado num vidrinho meio cheio de álcool ou de líquido citado. Voltando o pincel para o vidro, o inseto, aderente, se destaca e mergulha no líquido, podendo se colher assim muitos exemplares, em pouco tempo.

As ninfas destas espécies e de mais duas (incluindo o maruim mais comum) foram obtidas apanhando-se com uma pá as camadas superficiais do lodo do mangue ainda molhado. Guardadas em cima do lodo úmido deixaram sair em pouco tempo os maruins adultos.

A respeito da conservação, convém observar que estes mosquitinhos são tão diminutos que é difícil espetá-los. Querendo fazê-lo, convém empregar o que se encontra de mais fino em alfinetes e passar estes pelo tórax, de lado a lado, o que protege as pernas e não prejudica partes essenciais. Como material geralmente abunda, convém espetar vários exemplares no mesmo alfinete, colocando este horizontalmente numa rolha. Fazendo-se uma rotação do alfinete, podem facilmente ser examinados em todos os aspectos.

Podem-se também espetar estes mosquitinhos, seja por baixo, seja de lado, por meio de alfinetes curtos e finíssimos, passados por um pedacinho de sabugo (ou tecidos vegetais análogos) ou gomá-los em lingüetas de papel. Estas deixam-se dispor em grande número no mesmo alfinete em forma de leque ou de espiral, o que também facilita muito o exame. Os exemplares espetados podem ser conservados em tubos largos e curtos, fincando-os na rolha, como é a praxe neste Instituto. Em outros tubos iguais, podem-se conservar exemplares não montados e também os preparados microscópicos, o que dá aspecto homogêneo a toda a coleção. A conservação de exemplares montados em caixas maiores, como se usa para os lepidópteros, não se recomenda, por diversas razões.

Depois de secos, os Ceratopogoninae ainda podem ser montados, mas o exame minucioso e a confecção de preparados microscópicos torna-se mais difícil. No líquido indicado ou em glicerina diluída, conservam o aspecto natural, sem retrairse ou tornar-se quebradiços. A maior transparência deve ser levada em conta, mas parece antes vantajosa. Para um exame bem minucioso não se pode dispensar os preparados microscópicos. Faça-os, seja em bálsamo-do-canadá, seja na gelatina glicerinada. Seguindo a técnica indicada, ambos os métodos dão bom resultado, facilitando o estudo das partes mais delicadas, mas o desenho das asas aparece menos do que no inseto seco. Também, os desenhos característicos do escudo são de percepção menos fácil, porque os mosquitinhos, na preparação, sempre ocupam a posição lateral, a menos que se usem processos especiais para impedi-lo.14

Resta ainda fornecer alguns dados sobre a morfologia das Ceratopogoninae adultas.

Morfologia do inseto adulto

Dos apêndices da cabeça, são os palpos os que mais valor têm para a determinação das espécies. Quando bem desenvolvidos, consistem num artículo basal curto e, nem sempre, bem destacado e de quatro artículos, de comprimento variável, podendo ser aproveitados na caracterização das espécies, o que, todavia, é pouco cômodo. Mais importante e de apreciação mais fácil é a formação do artículo terceiro (segundo, dos compridos) que muitas vezes mostra uma dilatação fusiforme, sempre acompanhada pela presença do órgão que mencionei no meu último trabalho sobre simuliídeos (1910). Esse mostra, na cavidade, pequenos bastonetes ou pêlos. Não havendo esta dilatação, o órgão citado pode faltar ou estar presente, mas no último caso será sempre pequeno. As antenas, em todas as nossas espécies hematófagas, não diferem muito; o penacho do macho, freqüentemente, é mais ou menos dobrado, sendo então geralmente dirigido para fora. Quando completamente aberto pode cercar inteiramente a antena e assumir aspecto imponente.

O escudo muitas vezes apresenta desenhos característicos, situados no tegumento quitinoso e livres de pêlos ou escamas. O abdome, na maioria das espécies, é pouco característico; às vezes, o lado dorsal mostra uma cor mais escura geral ou manchas retangulares. Observei uma espécie de Ceratopogon com escamas bem nítidas nesta região e outra mostrando apêndices pilosos, em forma de cristas laterais no abdome. Os apêndices genitais do macho seguem um tipo, observado também em outros nematóceros, sendo formado por dois pares diferentes de pinças de preensão.

As asas, nos machos, são um pouco mais estreitas, mas a forma é geralmente sempre a mesma, variando, todavia, nas espécies, as nervuras, os pêlos e os desenhos de cor. A disposição das nervuras dificilmente se entende, à primeira vista, porque são em parte espessadas e em parte muito finas ou faltam completamente. Do outro lado, há nervuras rudimentares, linhas em sentido paralelo às nervuras e dobras que podem contribuir para produzir uma impressão anormal.

Na determinação das nervuras, convém partir na quarta nervura longitudinal ou discoidal, que é a mais comprida, estendendo-se da base à ponta da asa. As mais vezes, é bifurcada e a forquilha inclui a ponta; sendo simples, acaba perto dela. Para trás, segue a quinta longitudinal ou anal que é bifurcada; a sexta e sétima são indistintas, quando não faltam completamente. As nervuras mencionadas são todas muito finas. Para diante, geralmente ligado à discoidal por uma nervura transversal, existe um sistema de nervuras mais grossas e em parte de curso irregular. Mais em cima, se vê a marginal ou costa, terminada, ora antes, ora depois do meio da margem; antes da sua terminação recebe a extremidade da primeira nervura longitudinal ou subcostal. Desta nasce outra, geralmente na altura da transversal, já citada; tem a parte inferior em ângulo, parecendo ora uma continuação da transversal, ora uma outra. O resto é curvado, aproximando-se da subcostal, com a qual pode ser ligada por uma transversal curta ou fundir-se mesmo, em extensão variável. A maior parte dos autores considera esta nervura como terceira longitudinal ou cubitus, sendo que, neste caso, a segunda faltaria completamente. Em conseqüência disso, deve-se considerar supranumerária uma nervura forquilhada, não pedunculada, que se encontra, às vezes, na extremidade da asa, entre a ponta e o meio da asa e sem continuação com outras nervuras. Skuse tem outro modo de ver, que a priori parece mais natural, considerando esta forquilha como terceira longitudinal rudimentar, sendo a grossa e curva, a segunda.

Aliás o nome pouco influi, se não houver equívoco sobre a coisa designada. Entre a costa e a subcostal há, às vezes, uma nervura fina, apenas indicada, que se costuma designar como nervura auxiliar.

Nos gêneros Ceratopogon e Forcipomyia, geralmente, todo o fundo da asa é revestido de pêlos bastante longos e densos. Nos Culicoides são geralmente mais curtos e em maior número na extremidade da asa. Acompanham o curso das nervuras longitudinais, sem chegar completamente perto delas. Além disso, toda a asa é pontuada de pêlos microscópicos finos e curtos que, em certos lugares, se tornam ainda mais finos e claros, de modo que, sobre o fundo enfumaçado, aparecem manchas mais claras e transparentes. Enquanto que no preparado microscópico, em algumas espécies, são pouco apreciáveis, podendo até passar despercebidas, examinando-se a seco, com certa iluminação oblíqua, aparecem no fundo escuro como manchas iriantes, em branco-amarelo, dando a estas espécies aspecto muito vistoso. O grupamento e a extensão das partes claras variam muito nas diversas espécies; geralmente trata-se de pequenas manchas redondas ou ovais ou de tarjas das nervuras, podendo em algumas espécies ser muito parecidas, sem deixar de mostrar pequenas diferenças, mais apreciáveis em fotografias ou desenhos do que em descrições. Às vezes, também, algumas partes das asas mostram colorido escuro, quase preto, aumentando assim os contrastes. As manchas claras parecem constantes em todas as nossas espécies de Culicoides e a sua falta deveria, provavelmente, indicar uma separação genérica, visto que a natureza dos empódios, por si só, não parece caráter suficiente.

Os halteres, muitas vezes, se salientam por uma cor muito clara.

As pernas são geralmente unicolores, na sua totalidade; às vezes, as articulações são marcadas por manchas escuras. No ápice do fêmur e da tíbia e na base desta, encontram-se, em algumas espécies de Culicoides, faixas claras; em duas, no joelho dobrado, as faixas claras dos dois lados da mancha articular escura formam uma linha contínua. Existem também muitos pêlos, geralmente mais desenvolvidos no macho, além de espinhos e formas de transição. Uma espécie de Ceratotopogon ( C. squamitibia n. sp.) tem nas tíbias uma fileira de escamas claviformes salientes. Geralmente as tíbias do primeiro e terceiro par têm esporas apicais, ora claras, ora escuras; não são muito grandes e nem sempre se distinguem bem de espinhos colocados a seu lado. As unhas, geralmente, são iguais e de forma simples, sem valor para a determinação. Atrichopogon, Ceratopogon e Palpomyia têm empódio ciliado bem acusado; em Culicoides, nem sempre se pode bem percebê-lo, por ser mais curto e escondido entre as unhas.

Falta ainda dizer algumas palavras sobre os modos de livrar-se dos ataques do maruim. Com a drenagem do solo, a sua transformação por cultura, a construção de cais etc. a pouco e pouco desaparecem as condições nas quais o mangue se forma e, com ele, ao menos entre nós, também, acabam os maruins. Assim, as cidades dos portos podem ser livradas desta praga. Também em outros lugares diminui com a cultura dos terrenos. De outros meios, não se pode esperar muitos resultados. Não é difícil deitar petróleo nos buracos de guaiamus e poder-se-ia conseguir, assim, a exterminação do Culicoides reticulatus e da Culicelsa taeniorhynchus, mais desagradável ainda; mas, o maruim comum não é alcançado por esta medida. Aparelhos automáticos que apanham os maruins por meio de faróis, embora racionais, na prática, provavelmente, não seriam suficientes, além de bastante caros. Contra a perseguição pelos maruins, qualquer fumaça é muito ativa e a do pó-da-pérsia ou fumo, ainda mais. Também os ventiladores devem ser úteis. Véus e tecidos de arame são insuficientes, a menos que sejam tão finos que a ventilação fique quase suspensa.

Sendo que, pelos nossos conhecimentos atuais, os Culicoides não fazem o papel de transmissor de moléstias humanas (devido talvez a sua vida breve), parece que basta o conselho de afastar as habitações humanas dos seus territórios, até que estes sejam completamente transformados, de usar as precauções citadas na obrigação de visitá-los, e evitá-los completamente, nos períodos conhecidos, quando o maruim aparece em maior número.

A reação produzida pelas picadas do maruim, a princípio, é muito forte e dura bastante tempo, mas, dá-se adaptação do organismo, no sentido de que mais tarde esta reação se torna mais curta e menos intensa.

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